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quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

As doutrinas filosóficas materialistas antigas (Índia)


A filosofia não nasceu na Grécia Antiga, a índia e a China praticaram-na muito antes. Devemos considerar a Grécia como berço da filosofia ocidental, mundial, não, de modo algum. É certo que a filosofia grega (que começou nas colónias formadas pelos gregos nas ilhas e no continente do que é hoje o Médio Oriente) foi adquirindo pelo intercâmbio entre as cidades-estado traços que a distinguiram e a conduziram às influentes escolas epicurista, socrático-platónica, estoicista, aristotélica, etc., influentes em todo o Mediterrâneo e, sobretudo, dominaram o pensamento da antiga Europa. Certo é também que a filosofia ocidental (ou europeia) veio a ligar-se ao desenvolvimento do racionalismo e do espírito científico, base do experimentalismo técnico-industrial que passou a dominar o mundo. Contudo, não devemos ignorar que outras civilizações produziram e exportaram a sua própria filosofia, a qual, de resto, se cruzou com a filosofia ocidental em diversas épocas, com mediações e influências recíprocas.


A índia é um dos primeiros territórios onde aparece e se desenvolve a filosofia, desde os fins do II milénio e inícios do I milénio A.C. Os seus mais importantes monumentos literários, os Vedas («saber») e os Upanishadas, escritos depois em forma de contos e diálogos sobre temas filosóficos, atestam o profundo interesse que os temas filosóficos suscitavam: fundamentação de doutrinas idealistas religiosas, mas também controvérsias sobre o materialismo filosófico. Os vedas são compilações de hinos e preces onde se trabalham com conceitos tipicamente filosóficos, como o que é o ser, a primeira substância, espaço, tempo, causa, etc.


Tal como viria a suceder com a primitiva filosofia grega, as explicações que os mais filósofos hindus davam sobre as coisas observadas e pensadas, prendiam-se com a formulação de princípios naturais, fossem eles a água ou o fogo, o ar ou a luz. Estas explicações «naturalistas» demonstram a existência de uma corrente materialista de pensamento (tal como viria a verificar-se, por influência directa ou indirecta, em Tales de Mileto, Empédocles, e outros filósofos gregos.


Na sua obra Filosofia da Índia, o doutor S. Radhakrishnan (1956), que publicou na Índia uma História da Filosofia ( 2 volumes , 1952-1953) demonstra que o materialismo já se encontra como linha filosófica antes do período budista (o budismo surge no século VI A.C.) repartido em quatro escolas, sendo que a principal diferença entre elas desenrolava-se à volta da questão da natureza da alma, mas coincidindo na afirmação de que a alma é exclusivamente um fenómeno natural. Em suma: o materialismo antigo hindu, embora diverso, sustentava que tudo que existe no mundo é composto de matéria e de mudança. A explicação por meio dos quatro princípios naturais (terra, fogo, água e ar) era comum; algumas destas escolas (Charvaka ou Lokayata; Brihapasti o seu fundador) defendiam com argumentação tipicamente filosófica a não existência de deuses ou de um deus, da alma e da transmigração das almas (que muitos ocidentais julgam erradamente a única asserção do pensamento hindu). Segundo estas escolas materialistas do pensamento hindu a percepção é a única fonte segura do conhecimento, pois que é por meio dos nossos sentidos que conhecemos a existência dos quatro elementos materiais. A diversidade das coisas é gerada pela própria matéria sem outra intervenção «fora dela» que não ela mesma. Matéria, dita prakriti ( escola de Sankhya, séc. VII A.C.), dotada de movimento, espaço e tempo. Na Índia Antiga o materialismo atomista existiu, tal como existiu na Grécia Antiga. Nas seis escolas Nyaya e Vaiseshika podemos verificar essa doutrina segundo a qual os átomos eternos e imutáveis de terra, água, fogo e ar, são os elementos primários. Materialismo ingénuo, com certeza, porém tão ingénuo como o foi na Grécia Antiga. E, todavia, admiráveis ambos.

1 comentário:

Manuel Veiga disse...

"aprender, aprender, aprender sempre!..."

sempre importante ler-te.

abraços

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