Pelo Socialismo
Questões político-ideológicas com atualidade
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Publicado em: http://www.nodo50.org/ceprid/spip.php?article1600
Tradução do castelhano de MF
Colocado em linha em: 2013/02/17
O auge da luta socialista na China
Alberto Cruz *
Quarta-feira, 16 de Janeiro de 2013, por CEPRID
O XVIII Congresso do Partido Comunista Chinês é já história. As análises que lhe foram feitas abarcam quase todos os aspetos, menos um: o povo chinês. E um exame detalhado das resoluções deste congresso mostra um medo aberto da direção do Partido ao auge da luta socialista no país que, ao longo de 2012, adquiriu proporções desconhecidas nos últimos 30 anos. Há quem fale mesmo, com mais entusiasmo do que a realidade permite, de uma nova Revolução Cultural em amadurecimento e só esta menção faz com que um calafrio percorra a espinha dorsal da elite chinesa e do capitalismo ocidental.
É um facto que, em cada ano que passa, cresce o descontentamento social com as medidas económicas capitalistas impulsionadas pela direção do PCCh e o repúdio à introdução de métodos ocidentais de estudo nas universidades – multiplicaram-se as greves operárias, não só contra empresas estrangeiras, mas também nacionais (afetando setores informáticos ou da saúde), surgiram protestos dos jornalistas pelo «impacto corrosivo da comercialização» no tratamento da informação e continua o descrédito generalizado da grande maioria dos dirigentes civis. Estes são só alguns indicativos de que o melhor está para vir.
E é isto que preocupa tanto o «situacionismo» dos novos dirigentes como o dos académicos. Os primeiros viram-se obrigados a realizar uma série de gestos inabituais nos últimos 30 anos. Por exemplo, publicar a sua vida familiar (fotos da infância, adolescência e primeiros passos políticos), perfis na internet, ou percorrer as zonas mais pobres do país (as imagens do recém-eleito secretário-geral do PCCh no XVIII Congresso, Xi Jinping, a visitar as aldeias da província de Hubei, nos dias 29 e 30 de Dezembro1 e as suas dificuldades em caminhar sobre a neve e o barro são comovedoras). Gestos que vão acompanhados de uma maçadora insistência para se combater a corrupção (Jinping mostrou-se «indignado»2 ao comprovar, na sua visita às aldeias de Hebei, o desvio de fundos contra a pobreza) e de uma insólita exortação a todos os níveis do Partido para um comportamento exemplar. Os segundos publicaram uma carta aberta, advertindo que o
1 Diário do Povo, 31 de Dezembro de 2012.
2 Ibid.
2
país «corre o risco de uma violenta revolução» se o governo não responder à pressão pública e não acelerar as «reformas políticas suspensas»3 .
São reações da direita, porque são as políticas de direita pró-capitalistas que estão a ser fortemente contestadas. E são os representantes e defensores deste setor que têm medo do povo chinês. Em 2011, pela primeira vez em muito tempo, os chineses celebraram o nascimento de Mao com manifestações massivas e peregrinações à sua cidade natal. Milhões de chineses de todo o tipo, universitários, operários e camponeses realizaram por todo o país reuniões para comemorar «o legado do presidente Mao» e, a 9 de fevereiro de 2011 (dia de entrada do Ano Novo chinês), 700.000 pessoas acorreram a Shaoshan, a cidade natal de Mao, para «lhe render respeito e homenagem». O interessante é que foi uma celebração espontânea e, muitas vezes, desafiando os poderes locais. O facto foi tão surpreendente para o poder que o Diário do Povo teve de fazer eco deste fenómeno4, não sem certa surpresa. Mas, a partir daí, o poder aprendeu e agora junta-se ao coro, sem deixar de fazer uma crítica expressa ao maoísmo. Assim, por um lado, melhoraram as infraestruturas para facilitar a afluência de gente a Shaoshan e existe um grupo de voluntários municipais que atendem as pessoas que acorreram à homenagem a Mao na sua cidade – o seu nascimento foi a 28 de Dezembro de 1893 – com pratos de macarrão e carne5, enquanto, por outro lado, se multiplicaram os artigos e conferências de académicos e intelectuais sobre as «tragédias» que o Grande Salto em Frente ou a Revolução Cultural implicaram. É preciso referir que estas comemorações pró-Mao se verificaram durante dois meses, desde a data do nascimento até à celebração do ano novo chinês.
Mas o povo está disposto a surpreender e em cada aniversário surge um novo elemento com que o poder não conta. Nesta ocasião, as dezenas de milhares de pessoas reunidas em Shaoshan, no dia 28 de Dezembro, entoaram uma emblemática canção maoísta, «O Oriente é vermelho» (1965), o símbolo da Revolução Cultural que muitos interpretaram como uma claro desafio à contrapropaganda oficial face à celebração popular da data de nascimento de Mao.
É que Mao continua a desfrutar de uma grande estima entre uma enorme massa da população chinesa. Tanto que um dos «pequenos príncipes» do PCCh, Bo Xilai, não hesitou em utilizar elementos maoístas – com o que enfrentava o aparelho, já que desautorizava a prática de Deng Xiaoping – para impulsionar a sua política social e económica em Chongqing. Isso custou-lhe a sua destituição, em março de 2012, e mesmo a sua posterior expulsão do Partido (4 de novembro), depois de um processo que terminou, curiosamente, quatro dias antes do XVIII Congresso.
É preciso determo-nos no processo a Bo e no que ele representava para entender o que foi aprovado no XVIII Congresso. Bo Xilai era membro do Burô Político do PCCH e responsável do Partido em Chongqing. A sua queda em desgraça foi muito semelhante à de Lin Biao, em 1971 (considerado o herdeiro de Mao, mas que se foi distanciando deste quando o «grande timoneiro» colocou a aproximação aos EUA para enfrentar a URSS).
3 Reuters, 31 de dezembro de 2012.
4 Alberto Cruz, «China: exército, geopolítica e regresso a Mao» – http://www.nodo50.org/ceprid/spip.php?article1205&lang=es
5 Diário do Povo, 28 de Dezembro de 2012.
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Mas a diferença entre um e outro é que, enquanto Lin Biao era um militar preocupado com a geoestratégia, Bo Xilai tinha-se inclinado para a economia e tinha adotado o Modelo Chongqing, um sistema económico que contrastava de forma aberta com o Modelo Guangdong, impulsionado a partir do poder de Pequim. Não obstante, tanto Lin como Bo se preocupavam com a ideologia e pretendiam «revitalizar as ideias socialistas» a partir de diferentes perspetivas.
Em síntese, o Modelo Guangdong pressupõe um mercado mais livre, um aumento da desigualdade social e um maior esforço produtivo dedicado à exportação. É o modelo em que se baseou o crescimento anual chinês, que colocou o país já como a primeira economia do mundo, como reconhece o próprio FMI, ao vaticinar que será assim sem qualquer dúvida em 2016. Ao contrário, o Modelo Chongqing acolhia medidas económicas com um maior controlo dos poderes públicos e medidas populares para um crescimento rápido e equilibrado.
O surpreendente do caso é que o Modelo Chongqing se aplicava apenas numa reduzida zona da China que, segundo o censo de 2010, tinha 32 milhões de habitantes (um número ridículo num país que roça os 1500 milhões). Logo, a explicação da queda em desgraça de Bo é muito simples: evitar que este modelo económico alternativo se consolidasse, que o seu promotor adquirisse mais poder no Burô Político e eliminar a possibilidade de uma mudança mais igualitária no «caminho para o desenvolvimento» da China.
Chongqing, a cidade vermelha
Chongqing é uma cidade conhecida em todo o país e o seu legado estuda-se nos livros de história, pois foi a capital chinesa durante a invasão japonesa e berço da luta antifascista entre 1937-46. Teve também um papel importante na fundação da República Popular da China, em 1949. A história da cidade foi tida em conta por Pequim na hora de lhe outorgar a categoria de municipalidade dependente do governo central, não do provincial (Sichuan), e, mais tarde, de a elevar à categoria de província, em 1997. O historial de lutas operárias na cidade é espetacular e esteve na vanguarda de muitas delas, especialmente contra a privatização de empresas estatais, até 2000.
Bo Xilai só chegou à cidade em 2003, mas soube captar muito bem o espírito combativo da sua população e encontrou um bom caldo de cultura para a sua experiência económica, ampliando significativamente o papel local na economia e tomando em mãos empresas que iam ser privatizadas. Ao mesmo tempo atribuiu pensões de reforma, construiu habitações públicas de aluguer a baixos preços – o que proporcionou que muitos migrantes rurais encontrassem rápido alojamento na cidade, ao contrário do que acontece no resto do país – e desenvolveu a educação, sobretudo a infantil, e os cuidados com a saúde. É o que ficou conhecido como «Os dez pontos da vida do povo», baseados em que 51% dos gastos do governo local eram destinados à melhoria do bem-estar público. A esquerda chinesa diz que Bo, entre outras coisas, soube «redirecionar» a conflitualidade na cidade com medidas deste tipo, daí que, como se verá, tenha apoiado muitas destas medidas e o Modelo Chongqing.
Isso não quer dizer que Bo Xilai desse primazia a esta componente em detrimento da
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outra. Era muito cuidadoso e sabia o que enfrentava. Enquanto melhorava o bem-estar da população na base destes parâmetros, oferecia facilidades para a instalação de empresas, como a Foxconn, que deslocalizou uma parte da sua produção de Shenzen. Mas enquanto que em Shenzen os protestos operários foram frequentes, em Chongqing evitaram-se, entre outras coisas graças ao programa de habitações sociais de aluguer, como se referia elogiosamente na Agência Xinhua6 quando Bo ainda não tinha caído em desgraça. Quando, em julho de 2010, os velhos revolucionários, personalidades que participaram na Grande Marcha e fundadores do PCCh, elaboraram uma carta pública de apoio às lutas operárias7 – precisamente o contrário do que fizeram agora uns quantos académicos – apenas se mencionava o tratamento que os operários da Foxconn recebiam em Shenzen, não em Chionqing.
Esta política impulsionada por Bo Xilai é o que se chamou «promover a prosperidade comum» e que agora, depois do XVIII Congresso, se assume oficialmente com um discurso diferente do de Bo, mas reconhecendo que não estava errado: «A China deve ser uma sociedade moderadamente próspera». Mas os matizes são importantes e, entre «prosperidade comum» e «sociedade moderadamente próspera» há uma diferença que põe em causa a essência do sistema.
A esquerda chinesa entende que para conseguir o primeiro, o governo tem de implementar uma série de medidas destinadas ao restabelecimento dos vínculos orgânicos do PCCh com as bases. Traduzido, luta massiva contra a corrupção - e não só contra a privada, mas também, e sobretudo, contra a estatal - e aplicação da «justiça revolucionária». Mas não adiantemos acontecimentos.
Bo tinha-se tornado um problema sério para o Partido. Por isso, quando foi destituído, em Março de 2012, Wen Jiabao – primeiro-ministro – criticou abertamente o Modelo Chongqing e acusou Bo Xilai de «reviver a Revolução Cultural». Curiosamente, enquanto que no interior da China apenas se voltou a falar de Bo até agosto – quando se iniciou o julgamento contra a sua mulher e as suas práticas corruptas – toda uma maquinaria internacional (Wall Street Journal, New York Times, Finantial Times e, até, a seita Falung Gong, todos eles têm páginas web em chinês e publicam suplementos semanais sobre a China) fez lenha da árvore caída, publicando uma saga de corrupção à volta do ex-dirigente de Chongqing. Era preciso extirpar um modelo económico que, num futuro não muito distante, poderia comprometer o capitalismo realmente existente e que adquiria a força do exemplo na China e um não oculto temor entre a classe dirigente, corrupta e pró-capitalista. E não falamos do Ocidente.
A esquerda chinesa: O Coletivo Utopia
Aqui é necessário falar da esquerda chinesa, agrupada à volta do Coletivo Utopia (a sua página web, www.wyzxsx.com, é bloqueada intermitentemente pelo poder e no momento de escrever este artigo estava inacessível). A Utopia tinha manifestado publicamente o seu
6 Xinhua, 27 de julho de 2011.
7 Li Chengrui, Xiantian Gong, Han Xiya, Rixin Liu y Zhao Guangwu: «China: Os velhos revolucionários tomam posição sobre a atual proliferação de greves de trabalhadores» http://www.nodo50.org/ceprid/spip.php?article892
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apoio ao Modelo Chongqing, ainda que as suas propostas vão muito mais além, como a socialização da riqueza, a propriedade pública dos meios de produção e o fortalecimento da moral socialista. Mas tanto a Utopia como Bo Xilai coincidiam no impulsionar uma ampliação do setor público e do bem-estar social, assim como da recuperação dos valores culturais e morais da etapa maoísta. É o que em Chongqing se denominou «promover a cultura vermelha» e que consistia em recuperar as expressões artísticas maoístas – entoar «O Oriente é vermelho» no aniversário de Mao é uma manifestação de como este sentimento calou na população – e «fortalecer a moral socialista», para o que era imprescindível contar com os meios de comunicação. Aqui voltava a haver uma coincidência estratégica entre a Utopia e Bo Xilai, já que as propostas de ambos consistiam em firmar uma televisão e rádio populares, sem publicidade, e «com orientação didática».
E, de novo, o aparelho dirigente, juntamente com bloguistas seguidos no Ocidente – como alguns casos famosos em Cuba ou no Yemen, para mencionar os mais apelativos – e os meios ocidentais capitalistas voltaram a atacar este «projeto de renovação socialista», que equiparavam pura e simplesmente com a Revolução Cultural. Contudo, goste-se ou não, na China há memória e grande parte da população continua a considerar que o país era, sob Mao, um dos mais igualitários do mundo e agora é precisamente o contrário.
O poder sabe-o, e teme a reação social. Daí que, depois do XVIII Congresso do PCCh, «o socialismo com características chinesas» comece a abarcar aspetos como a luta contra a pobreza, a redução das desigualdades e o desenvolvimento sustentável, que não tinham sido tidos em consideração nestes 30 anos do caminho económico idealizado por Deng Xiaoping.
Iniciou-se uma tímida retificação por medo, não por necessidade, e nela influenciaram tanto as turbulências económicas que o mundo vive desde o início da crise capitalista, em 2008, como as respostas populares que se estão a verificar em toda a parte. A atitude do aparelho do PCCh face aos protestos não é muito diferente das que os governos direitistas de Madrid, Atenas ou o Cairo adotam: a repressão. Como um aviso à navegação, no dia 21 de dezembro, a polícia dissolveu com dureza uma manifestação de operários de uma fábrica de sapatos em Guangan (Sichuan), a cidade natal de Deng Xiaoping, que exigiam o pagamento de dois meses de salários. No dia 25 de Dezembro, a situação voltava a repetir-se em Wuhan (capital da empobrecida Hubei), quando os operários protestavam pelo não pagamento de salários e o encerramento da fábrica de papel em que trabalhavam. Mas os operários não só se manifestavam como ocupavam a Câmara Municipal. Quatro dias mais tarde, como se disse antes, o novo secretário-geral do PCCh visitava várias localidades de Hubei. E no mesmo dia 25 de dezembro, em Tongling (Anhui), centenas de médicos e enfermeiras de um hospital pertencente a uma importante empresa estatal, Tongling Nonferrous Metals, bloquearam todos os acessos à cidade, reclamando o pagamento dos seus salários.
Poder-se-ia relatar milhares destas manifestações e protestos. Em muitas delas, as pessoas levam os retratos de Mao como bandeira, sem outros slogans. Há um contínuo de lutas operárias e, ao mesmo tempo, constata-se um cerrar de fileiras entre o capital transnacional, o aparelho do PCCh, os meios de comunicação e um certo setor dos intelectuais e académicos (como os do manifesto citado acima), que farão todo o possível
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para as reconduzir ou para as reprimir. A viagem do novo secretário-geral do Partido a Hubei vai nessa direção e, ironia do destino, é algo que Bo Xilai tinha impulsionado: em Chongqing, os funcionários do Comité Local tinham de realizar visitas semanais às zonas rurais para observar a situação e receber as queixas e sugestões da população. Nessas visitas tinham de viver nas casas dos aldeãos e não podiam alojar-se em hotéis. Precisamente o que fez agora Xi Jinping, que partilhou comidas com aldeãos nas suas casas.
É altura de saber se neste momento o PCCh vai aplicar as resoluções do XVIII Congresso ou os gestos que agora está a fazer vão ser algo mais que gestos, uma mudança de rumo. Vem-se falando, desde 1996, da construção de uma «civilização socialista espiritual», que não é mais do que uma denominação cínica de um corrosivo enriquecimento da elite política e económica; e no anterior congresso, em 2006, foi aprovada uma resolução que defendia «o sistema socialista como um valor fundamental». Nada disso foi levado à prática até agora, à exceção de um fugaz momento, em 2011, por ocasião da comemoração do 90.º aniversário da constituição do PCCh. Terminados os festejos, terminadas as intenções. O PCCh, os líderes civis, para sermos exatos, poderão manter a promessa de defender a constituição socialista ainda vigente – mas só aplicada em parte – ou cair definitivamente no capitalismo neoliberal que têm desenvolvido nos últimos 30 anos. Perante si, têm uma base histórica operário-camponesa, a que agora se juntam universitários e jovens que apostam numa viragem à esquerda e num futuro socialista. Inclusivamente, o Coletivo Utopia e as suas propostas de «renovação socialista» chegaram mesmo a afirmar que o Modelo Chongqing era a única esperança para evitar uma «revolução violenta» na China, ainda que haja quem, como Sima Nan, um dos seus mais conhecidos integrantes, considere que foi um erro estratégico o identificarem-se demasiado com os postulados de Bo Xilai.
O capitalismo está em fase terminal, mas o processo acelerar-se-ia se na China houvesse uma viragem à esquerda. Daí o pânico que no Ocidente se sente perante iniciativas tão moderadas como as do Modelo Chongqing, ou perante a cada vez maior onda de protestos sócio-políticos do povo chinês contra o modelo imposto a partir de Pequim. Intui-se uma reorientação deste modelo nas resoluções do XVIII Congresso, pois não é em vão que se fala de uma reorientação da economia para deixar de estar centrada unicamente na exportação e começar a ter em conta o consumo interno, assim como na menção a uma «sociedade moderadamente próspera». Mais uma curiosidade que aparece nas resoluções: acontece que agora o poder chinês se apercebe de que é necessário «regular» o papel dos meios de comunicação, porque o que há «não se ajusta ao novo contexto» e «não pode separar-se da realidade política do país»8. Ou seja, o mesmo que Bo Xilai havia colocado, o que o Coletivo Utopia reclama e o que os jornalistas criticam pelo «impacto corrosivo da comercialização» no tratamento da informação.
Se se cumprir tudo o que foi decidido neste XVIII Congresso, e não for apenas outra demonstração mais de retórica, assistiremos a uma viragem gigantesca, ou no mínimo moderada, no conhecido até agora, uma vez que já não se legislará unicamente para a classe média urbana – e, sobretudo para a situada nas cidades costeiras – mas para todo povo. E isso, na China, é abarcar uma enorme massa de camponeses e operários muito descontentes com o modelo atual, que não os teve em conta.
Depois deste XVIII Congresso do PCCh o país está numa encruzilhada: ou se transforma num refúgio seguro do capitalismo global ou o enterra definitivamente. No interior do Partido há várias correntes que, sem ser expressamente maoístas, se opõem às medidas neoliberais. Algumas delas participaram nos atos comemorativos do nascimento de Mao, organizados pelo Coletivo Utopia, em Pequim – com a assistência de ex-funcionários do governo, generais do exército e reconhecidos maoístas9 – ainda que não esteja claro o que significa este passo e se ele é o início de uma corrente de esquerda dentro do Partido, ou o anúncio de uma maior resistência aos neoliberais, que continuam a desmantelar o sistema de bem-estar público. As bases – camponeses, operários, trabalhadores migrantes e pobres – já reagiram e começaram a passar à ofensiva. Um dado: a Organização Internacional do Trabalho (OIT) reconhece que, graças à luta operária, os salários na China triplicaram na última década e, para o corrente ano de 2013, subirão mais 9%10.
* Alberto Cruz é jornalista, politólogo e escritor. O seu último livro é «A violência política na Índia. Para lá do mito de Gandhi», editado por La Caída com la colaboração do CEPRID. Os pedidos podem ser dirigidos a libros.lacaida@gmail.com ou a ceprid@nodo50.org albercruz@eresmas.com
8 Diário do Povo
9 Global Times, 28 de Dezembro de 2012.
10 OIT, «Rapport mundial sur les salaires 2012/13: Salaires et croissance équitable», 7 de Dezembro de 2012