Greg Godels
Nos últimos sessenta anos, a pequena Cuba tem sido o farol da solidariedade e do internacionalismo para as gerações futuras. Os internacionalistas cubanos têm ajudado e lutado ao lado de quase todos os movimentos legítimos de libertação, todos os movimentos pelo socialismo na Ásia, África e América do Sul.
foto: Internacionalismo: está morto ou morrendo? - MLToday
É difícil pensar em Cuba sem nos envolvermos emocionalmente. Não consegui voltar a dormir na outra noite, angustiado com o trágico apagão de quase todo o país com um furacão a aproximar-se.
Sim, o genocídio na Palestina e no Líbano evoca acessos semelhantes de emoção e insónia; as ações do governo israelita são obscenamente bestiais e criminosas. No entanto, Cuba, em virtude das suas mais de seis décadas de desafio ao imperialismo dos EUA e dos seus enormes sacrifícios por outros povos, ocupa um lugar especial para mim.
Nenhum país com tão pouco fez tanto pelos outros.
Na primeira metade do século XX, o exemplo do apoio altruísta à República Espanhola em dificuldades definiu a solidariedade com os outros, bem como o internacionalismo. A União Soviética enviou armas e conselheiros, desafiando o bloqueio das grandes potências e confrontando o apoio nazi alemão e fascista italiano aos militares insurretos. Dezenas de milhares de voluntários, em grande parte organizados pela Internacional Comunista, foram para Espanha clandestinamente, superando fronteiras fechadas, para defender a República nascente.
Milhões de pessoas fizeram manifestações de apoio à República – embora ela tenha caído, em parte significativa por causa da indiferença e hostilidade ativa das chamadas democracias. Como foi possível — e muitos chegaram a ver isso pela primeira vez — que as democracias não defendessem uma democracia emergente?
Nos últimos sessenta anos, a pequena Cuba tem sido o farol da solidariedade e do internacionalismo para as gerações futuras. Os internacionalistas cubanos têm ajudado e lutado ao lado de quase todos os movimentos legítimos de libertação, todos os movimentos pelo socialismo na Ásia, África e América do Sul. Médicos e trabalhadores humanitários cubanos correram para desastres em incontáveis países. Onde quer que surgisse a necessidade, os cubanos foram os primeiros a voluntariarem -se, incluindo nos EUA (Furacão Katrina), o país cujo governo tem sido o mais prejudicial para o destino de Cuba.
Não há muito tempo, Cuba organizou assistência aos combatentes pela liberdade vietnamitas.
Ainda mais recentemente, devemos lembrar, também, aqueles heróis que sacrificaram a vida e os membros para ajudar a libertar as colónias portuguesas de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau. Os cubanos heroicamente deram as suas vidas lutando e derrotando os militares racistas do apartheid da África do Sul e os agentes dos EUA, infligindo um dos golpes mais significativos contra o imperialismo dos EUA desde a guerra do Vietname. A classe dominante dos EUA nunca esqueceu essa derrota humilhante.
Sem dúvida, o apartheid acabaria por cair, mas aquelas dezenas de milhares de voluntários cubanos apressaram esse fim por muitos e muitos anos.
Mas os cubanos estavam a sacrificar-se pela liberdade dos outros antes dessa luta notável e depois dela. Parafraseando a música sobre Joe Hill, onde quer que as pessoas estivessem em luta, encontraríamos internacionalistas cubanos – do Congo de Lumumba ao Chile de Allende, da Granada de Bishop à Venezuela de Chávez.
Foto:https://www.campograndenews.com.br/politica/morre-fidel-castro-aos-90-anos-lider-da-revolucao-cubana
Alguns lembrar-se-ão de que, quando Nelson Mandela foi libertado, ele decidiu primeiro visitar Cuba para agradecer ao povo cubano pela sua contribuição para a libertação africana.
Claro, Cuba sozinha não tinha os recursos materiais para confrontar os militares bem armados do apartheid e os seus colaboradores africanos armados pelo Ocidente. Ao lado de Cuba e por trás de Cuba estava o apoio material e militar da União Soviética. Esse legado do internacionalismo soviético, combinado com o altruísmo inspirador da Cuba de Fidel, deu esperança a muitos milhões lutando para se libertar do jugo do imperialismo e do capitalismo.
Sem dúvida, a causa primordial da dor contínua de Cuba são os Estados Unidos e os seus aliados mais próximos. As grandes potências nunca perdoaram Cuba por montar a primeira e única revolução socialista nas Américas, assim como nunca perdoaram o Haiti por mostrar que os escravos africanos podiam levantar-se e derrotar uma grande potência e libertar um povo escravizado. O bloqueio dos EUA a Cuba causou danos irreparáveis a um povo que esperava desenvolver-se e seguir um rumo político independente. O imperialismo pune um povo que valoriza a sua soberania com a mesma integridade intransigente que demonstra com seu compromisso apaixonado com a solidariedade com os outros e o seu internacionalismo altruísta.
No entanto, o povo cubano persevera. Não passa despercebido aos conspiradores da CIA e outras agências funestas e ao Departamento de Estado que — mesmo no seu estado mais enfraquecido, nos seus momentos mais desafiadores — o povo cubano mantém acesa a tocha que lhe foi passada por Fidel. Apesar dos melhores esforços do gigante capitalista do Norte, o socialismo cubano perdura.
Em tempos melhores, a União Soviética generosamente ajudou Cuba no caminho de desenvolvimento por ela escolhido. Na falta de poucos recursos industrialmente desejáveis e apesar dos efeitos entorpecentes de séculos de exploração imperialista, a ajuda soviética permitiu que Cuba se integrasse no Conselho de Assistência Económica Mútua (CAME) da comunidade socialista em pé de igualdade, e até mesmo privilegiado. A media capitalista frequentemente comparava a ajuda do CAME a Cuba à robusta ajuda dos EUA a Israel. Ironicamente, Cuba usou a ajuda para se tornar uma força para a justiça social global, enquanto Israel usou o subsídio dos EUA para fazer o mal, para se tornar uma força para campanhas genocidas para criar um Israel "maior".
Mas a ajuda soviética acabou.
É uma fonte de tristeza, e não menos vergonha, que nenhum país que confessa o caminho socialista ou beneficia dos sacrifícios de Cuba se tenha se apresentado para preencher, mesmo que parcialmente, o vazio. Claro, países considerados "amigos" de Cuba fizeram fortes declarações condenando o bloqueio, fizeram gestos "fraternais" e enviaram remessas simbólicas de alimentos básicos, mas não o suficiente para permitir que Cuba se afastasse do terrível desastre económico que foi multiplicado cem vezes pelo bloqueio dos EUA.
Terras onde os combatentes internacionalistas cubanos estão enterrados, terras com abundantes recursos energéticos, terras com economias modernas que ofuscam a antiga economia soviética, não se lembram dos sacrifícios altruístas de Cuba com promessas de ajudar ou organizar ajuda neste momento particularmente difícil. Pode ser presunçoso esperar que os destinatários da amizade e solidariedade cubanas façam sacrifícios semelhantes por Cuba — é isso que torna o legado do Fidelismo tão especial nos anais do socialismo. Mas, certamente, esses países poderiam, individual ou coletivamente, reparar e garantir as infraestruturas básicas de Cuba sem grandes sacrifícios — para dar a Cuba os meios mínimos para sobreviver à punição que o imperialismo impôs.
É preciso dizer que o “socialismo com características nacionais” parece excluir o internacionalismo tão central para o socialismo no século XX.
Na verdade, que tipo de socialismo deixa de sacrificar pouco para ajudar um país socialista em dificuldades, sufocado por um bloqueio capitalista?
Numa nota pessoal, lembro-me bem de passar, de regresso, pelo Checkpoint Charlie – o famoso portal entre o socialismo alemão e o capitalismo alemão. Turistas e outras pessoas do Ocidente, que iam visitar Berlim Oriental, tinham que voltar pelo checkpoint. Eles aprenderam no seu regresso que não podiam nem trocar nem manter a moeda da RDA que sobrava da sua visita à República Democrática Alemã. Os guardas ofereceram gentilmente uma opção aos que regressavam, muitas vezes infelizes. Apontavam para um grande navio cheio de dinheiro com uma placa em vários idiomas: "Ajude a reconstruir o Vietname".
Senti orgulho em saber que era uma pequena parte de um movimento global determinado a ajudar a reconstruir o que o imperialismo havia destruído.
Vejo esse compromisso com o internacionalismo novamente honrado na recusa dos trabalhadores em carregar munições com destino a Israel no porto de Pireu, na Grécia.
Só posso esperar que o socialismo do século XXI restaure o internacionalismo que foi uma marca registada do socialismo do século XX.
Fonte: https://mltoday.com/internationalism-is-it-dead-or-dying/, publicado e acedido em 11.11.2024
Tradução de TAM
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