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quinta-feira, 27 de junho de 2024

 O vício é a tal homenagem à virtude

 

   O grande dilema para aqueles que não querem o socialismo experimentado, nem o capitalismo comprovado há dois séculos, é descobrir outra alternativa. 

Deixe-se a descoberta à experimentação? à chamada "prática"? Ao devir dos acontecimentos que geram outros acontecimentos, sem modelos a priori?

Mas, então, como agir politicamente sem um programa estratégico?

Parece-me que o dilema capitalismo/socialismo é apenas fonte de confusões e arma de arremesso, divisão hostil. Os partidos auto designados socialistas (o PS português ou o francês) nada tiveram alguma vez a ver com socialismos em chave teórica e muito menos prática. Portanto, o termo antagonista "socialismo" é ambíguo, uma invenção das alas moderadas ou moderadoras do capitalismo. Julgo que esta afirmação é tão comprovada que é já uma banalidade. Por outro lado, os socialismos "realmente existentes", ou seja, os modelos que se auto designaram de socialistas, passaram mais depressa ou mais devagar a mostrar os vícios imanentes da falta de democracia (governo do povo pelo povo ,para o povo, com o povo), vícios que começam por serem visíveis logo no funcionamento do "centralismo" (orgânica interna) dos partidos que se reivindicam de comunistas e eclodiram exuberantemente na completa privatização e planificação da economia sem as maduras condições objetivas internas e externas, na censura sectária e securitária aos direitos de informação e de expressão, na violência da repressão e vigilância permanente por uma polícia política (aspetos absolutamente incompatíveis com o marxismo de Marx e Engels e com as liberdades políticas e culturais). Não vale a pena sequer lembrar que vícios têm-nos também os Estados do capitalismo e os partidos respetivos da Direita. Aqui os vícios derivam rapidamente para o fascismo e outras formas de autoritarismo.

(Os partidos comunistas necessitam de uma organização diferente para desenvolverem atividade diariamente e em todas as frentes na prossecução dos seus programas revolucionários. É a esta forma de organização - centralismo-democrático - que se aplica a expressão "Leninista". )

Aquele que não quer o passado, embora reconheça nele atos de imenso heroísmo e muitas façanhas notabilíssimas (a URSS, por exemplo, prova-as bem a quem não tiver palas nos olhos!), que lhe resta pois?

A utopia. É esta solução (?) que se cultiva sobretudo nos desaires e crises, e nos países onde sempre se mostrou impossível a revolução socialista pugnada por uma escassa minoria, ainda que esta fosse meritória a todos os níveis (a Grã-Bretanha e os EUA por exemplo).

Ou um programa de economia mista, que não afronte demasiado o sistema capitalista imperialista (e se proteja juntando-se a outros na mesma situação), e com garantias práticas (não apenas constitucionais) de respeito pelos direitos políticos individuais e coletivos.

No entanto, nesta solução coloca-se a interrogação capital : quem governa? quem controla o poder central? 

Se vier a ser uma coligação de partidos de esquerda, pode vir a suceder pelo menos, que alguns dos vícios apontados nos partidos comunistas não se manifestem (não convém de todo numa coligação!). 

Todavia, ou então a crise é tão profunda que uma coligação de esquerda (divergente no seu seio) aceita reformas profundas de salvação e aceita unanimemente usar todos os meios coercivos para se defender dos inimigos internos e externos. Nesse caso os abusos voltam inevitavelmente. Talvez que mobilizando permanentemente as massas populares (como mobilizá-las permanentemente se a economia tem que funcionar permanentemente ?), comunicando corretamente, criando condições de participação em todos os lugares e tempos, construindo comunas e outras instituições de crítica e fiscalização, se diminuam os inevitáveis. Talvez. Ma se a utopia é bem bonita, a ilusão não o é.

   Exemplos negativos :

   A URSS que se defendeu dos inimigos internos e externos (inventando alguns inimigos internos, como sucede sempre nessas situações de cerco e guerra quente ou fria) recorrendo a meios repressivos intoleráveis e anti democráticos , ou anti socialistas se preferirmos. Certamente que as causas da sua implosão foram mais complexas do que unicamente o cansaço ou desagrado popular (as sondagens à época não pareceram confirmar estes sentimentos). 

  A orgulhosa e digna Cuba, que, sobretudo após a implosão da URSS, viu o seu modelo de privatizações e estatização falhar completamente. Hoje apenas resiste aos apelos das sereias. Esperemos que não as oiça. E encontre uma saída democrático-socialista para o desenvolvimento e forneça a vida boa que o povo tanto merece.

E aquele que não quer de modo algum qualquer forma de capitalismo, isto é, de empresas nas quais boa parte do lucro é conseguida através da exploração da força de trabalho e, portanto, será sempre necessário que haja alguém que não possua nem controle mais nada senão a sua força de trabalho e que não tenha mais nada para subsistir senão vendê-la por um salário?

A esta alguém só lhe resta aguardar pacientemente que o cooperativismo floresça em toda a parte, que um Estado social proteja quem trabalha para o bem comum e que o trabalhador, seja qual for a profissão, participe nos planos da empresa e no controlo da produção e distribuição. E que não espere que tal se realize amanhã pela manhãzinha.

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