Bancos apossam-se da Europa
por Adriano Benayon [*]
A oligarquia financeira está empurrando, goela abaixo da União Européia (UE), um "acordo" que estabelece regras rígidas para que a Europa seja governada (ou desgovernada), de forma absoluta, por bancos, liderados pelo Goldman Sachs, de Nova York.
2. Embora as modificações desse acordo aos Tratados da UE dependam de aprovação legal em cada país membro – processo que poderia durar anos – os manipuladores financeiros assumiram o poder à força e irão em frente, a menos que o impeça a resistência dos povos, ainda sem organização.
3. Com a experiência da pequena Islândia, em duas consultas ao povo, a última em abril de 2011, os predadores perceberam que qualquer outra, em qualquer país, implica a derrota de suas proposições. Bastou o ex-primeiro-ministro da Grécia falar em referendo para ser demitido.
4. Mesmo antes de 09/12/2011 – quando foi encenada "reunião de cúpula", e Sarkozy (França) e Angela Merkel (Alemanha) anunciaram o tal "acordo" – o Goldman Sachs (GS) já havia posto três de seus prepostos em posições-chave: Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu; Mario Monti, primeiro-ministro da Itália; Lucas Papademos, primeiro-ministro da Grécia, envolvido em operações do Goldman Sachs com a dívida grega resultantes em sua elevação.
5. Os países da Zona Euro (os 17 membros da UE cuja moeda é o euro) serão obrigados a aceitar o "acordo". Sarkozy e Merkel dizem que os dirigentes dos outros 15 países foram consultados, mera formalidade. Nove outros Estados participam da União Europeia, mas não adotam o euro: Reino Unido e Dinamarca (isentos), e mais sete que poderiam ainda aderir à Zona.
6. Aqueles portavozes apresentaram o pacote envolto neste rótulo: "salvar o euro"; "reforçar e harmonizar" a integração fiscal e orçamentária da Europa. Na realidade, trata-se de destruir a Europa econômica e politicamente, sem garantir a sobrevida do euro, além de aprofundar a depressão, com o arrasamento das políticas de bem-estar social, instituindo uma espécie de "lei de responsabilidade fiscal", como a que manieta o Brasil.
7. O "acordo" impõe duras sanções aos países que não o cumpram, ademais de ser fiscalizados pelo Tribunal Europeu de Justiça. Os Chefes de Estado e de governo passam a reunir-se mensalmente durante a crise. Com isso, reduz-se o poder dos burocratas da Comissão Europeia, mas essa mudança nada altera, dado que estes também executam fielmente os desejos da oligarquia anglo-americana.
8. Sarkozy é cópia piorada de Mussolini, pois este pôs os bancos sob o controle do Estado – e não o contrário, como se faz agora com a Europa, EUA etc. Submisso às diretivas da oligarquia financeira, o presidente da França declara que os benefícios sociais não são sustentáveis, na hora em que eles são mais necessários que nunca, dado o desemprego grassante.
9. O pacote quer obrigar, punindo os que não o cumpram, que os países da Zona Euro reduzam seus déficits orçamentários para 0,5% do PIB, ou seja, seis vezes menos que o limite de 3%, prescrito no Tratado de Maastricht.
10. Isso significa que Grécia, Itália, Espanha, Portugal e outros terão de cortar ainda mais despesas, depois de já as terem cortado, fazendo, assim, a depressão aprofundar-se. A depressão já causou queda nas receitas fiscais. Combinada a queda das receitas fiscais com o crescimento do serviço da dívida pública, decorrente da alta das taxas de juros, temos, juntos, dois fatores de elevação do déficit orçamentário.
11. Que fazer? Cortar toda despesa que não as da dívida, desmantelando as políticas sociais e deixando de investir na infra-estrutura econômica e na social. Isso trará, entre outros danos irreparáveis, o aumento da disparidade entre membros mais e menos desenvolvidos, inviabilizando a permanência destes na Zona Euro, o que implica sua desintegração.
12. A periferia europeia está, pois, ingressando no Terceiro Mundo, caminho aberto também ao restante da Europa, já que acaba de lhe ser prescrita a receita usual do FMI, a qual ajudou a manter o Brasil e outros no subdesenvolvimento.
13. A dupla franco-alemã infla seus egos brincando de diretório europeu, mas Merkel, obedecendo aos bancos alemães, rejeitou a possibilidade de o Banco Central Europeu (BCE) emitir títulos para substituir os dos países devedores. Os bancos querem continuar emprestando aos governos, para receber os juros.
14. Essa rejeição deve levar ao fim do euro, se este já não está perto do fim mesmo sem ela. Traz consequências danosas para a própria Alemanha e para a França, pois obriga os devedores mais problemáticos a continuar pagando taxas de juros demasiado elevadas nos seus títulos.
15. Isso promove crise ainda maior de suas dívidas, com o que credores – bancos alemães, franceses e norte-americanos – chegarão mais rápido ao colapso. Mostra-se, portanto, quimérica outra pretensão do "acordo": a de enquadrar os países no limite de 60% do PIB para suas dívidas.
16. Não é para a União Europeia que os países europeus estão perdendo a soberania. É em favor da oligarquia financeira que renunciam formalmente, através de atos irresponsáveis de seus chefes de governo.
17. A perda de soberania não se restringe às regras draconianas citadas, por si sós conducentes à ruína financeira e econômica. Inclui também que os países devedores liquidem – a preço de salvados do incêndio – inalienáveis patrimônios do Estado, como já foi determinado à Grécia e a outros. É a privatização, objeto das mais colossais corrupções vistas na história do Brasil.
18. Os analistas ligados ao sistema de poder atribuem a crise dos países europeus mais pobres a terem estes gastado acima de suas possibilidades, e mesmo economistas mais sérios oferecem explicações para a derrocada europeia que omitem sua causa principal.
19. Essa causa é a depressão econômica mundial, resultante do colapso financeiro armado pela finança oligárquica centrada em Nova York e Londres. Ele eclodiu em 2007, iniciando a depressão que se desenha como a mais profunda e longa da História, se não for interrompida pela terceira guerra mundial, planejada pelo complexo financeiro-militar dos EUA.
20. Martin Feldstein, professor de Harvard, aponta diferenças institucionais e nas políticas monetária e fiscal entre os EUA e a UE. Ele e muitos, como Delfim Neto, atribuem grande importância à taxa de câmbio. Argumentam que os europeus em crise não têm como desvalorizar a moeda para se tornarem mais competitivos, uma vez que adotaram o euro.
21. Robert Solow, prêmio Nobel, salienta que a UE transfere recursos de pequena monta aos membros menos avançados, pois o orçamento unificado da UE equivale a só 1% de seu PIB. Já nos EUA o governo federal fez vultosas transferências de recursos aos Estados e para regiões críticas.
22. Ainda assim, Itália, Espanha, Grécia, Portugal suportaram a situação até surgir a depressão mundial. Tendo exportações de menor conteúdo tecnológico que Alemanha, Holanda, França, e dependendo do turismo, foram duramente atingidos até pela queda da produção e do emprego nos países ditos ricos, inclusive extra-continentais, como EUA e Japão.
23. A depressão, por sua vez, adveio das bandalheiras financeiras geradas a partir de Wall Street e bases off-shore, sem regulamentação, atuantes no esquema da City de Londres, desembocando no colapso financeiro que eclodiu em 2007 e se direciona para novo estágio, mais destrutivo.
24. Os europeus envolveram-se na onda dos derivativos, quando bancos suíços e alemães adquiriram alguns bancos de investimento de Wall Street. Mesmo assim, os bancos dos EUA estão tão ou mais encalacrados que os europeus nos títulos podres resultantes da abusiva criação dos derivativos.
25. Ademais, Grécia, Espanha, Itália e outros foram enrolados pela engenharia financeira de Wall Street, Goldman Sachs à frente, que lesou investidores, camuflando os riscos, além de proporcionar créditos àqueles países, ao mesmo tempo em que fazia hedge, jogando contra seus devedores, com o resultado de elevar os juros das dívidas.
26. O assaltante está tendo por prêmio ficar com a casa do assaltado. Mas, antes da ocupação dos governos pelos bancos, agora ostensiva, as pretensas democracias ocidentais já não tinham autonomia, mesmo com parlamentos eleitos escolhendo o primeiro-ministro.
27. Como os principais partidos políticos são controlados pela oligarquia financeira – na Europa, nos EUA etc – e se diferenciam apenas por ideologias pró-forma, acomodáveis a qualquer prática, pode-se dizer que a escolha eleitoral se limita à marca do azeite com o qual os eleitores serão fritados.
28. O "acordo" agora imposto à Europa surge como culminação de uma guerra financeira que completa o trabalho realizado nas duas primeiras Guerras Mundiais. Estas destruíram a Alemanha e a França como grandes potências. O império anglo-americano só não conseguira retirar esse "status" da Rússia, mas o logrou, ao final da Guerra Fria (1989), conquanto a Rússia busque agora recuperá-lo.
29. Para que a Europa não afunde, terá de tomar rumo radicalmente diferente daquele em que foi colocada e no qual segue em aceleração impulsionada pelo "acordo" a ser celebrado, a pretexto de salvar a moeda única.
30. O General De Gaulle, nos anos 60, insurgiu-se contra o privilégio dos EUA, de cobrir seus enormes déficits externos, simplesmente emitindo dólares, e exigiu a conversão para o ouro das reservas da França. Profeticamente advertiu que a entrada da Inglaterra na UE seria uma operação "cavalo de Troia".
31. Hoje o dólar continua sendo sustentado pela condição de divisa internacional, instituída em 1944 (acordos de Bretton Woods), e mais ainda pelo poder militar. Os EUA forçam, por exemplo, que seja liquidado em dólares o petróleo comerciado entre terceiros países.
32. Percebe-se o móvel de desviar para a Europa o foco da crise econômica e financeira, que deveria estar nos EUA e do Reino Unido. Ele foi posto na Eurolândia, através de jogadas dos bancos de Wall Street com suas subsidiárias baseadas no grande paraíso fiscal que é a City de Londres.
33. Os mercados financeiros parecem teatro do absurdo. Se não, como explicar que os títulos de longo prazo norte-americanos paguem juros de menos de 2% a.a., enquanto os da Itália, de dois anos de prazo, subiram para 8% a.a.? E como explicar que a cotação do risco de crédito da Alemanha e da França esteja sendo rebaixada, enquanto isso não se dá com os títulos norte-americanos?
34. Deveria ser o contrário, pois: 1) as emissões de dólares em moeda e em títulos públicos são muito maiores que as de euros; 2) a dívida pública dos EUA atinge 120% do PIB (muito mais que os países da Zona Euro), e seria muitíssimo maior sem as enormes compras de títulos do Tesouro dos EUA pelo FED e as emissões desbragadas do FED; 3) o déficit orçamentário dos EUA supera 10% do PIB, enquanto a média europeia é 4%. 4) o déficit nas transações com o exterior dos EUA, em 2010, correspondeu a 3,9% do PIB, enquanto a Alemanha teve superávit de 5,7% do PIB, e os déficits da França e da Itália foram 2% e 3% do PIB.
35. Não bastasse, os grandes bancos americanos têm vultosas carteiras de títulos podres (sobretudo derivativos), mesmo depois de grande parte deles ter sido comprada pelo FED e por agências do governo dos EUA, em operações caracterizadas por grau incrível de corrupção.
36. Como aponta o Prof. Michael Hudson, um quarto dos imóveis nos EUA vale menos que suas hipotecas. Cidades e Estados estão em insolvência, grandes companhias falindo, fundos de pensão com pagamentos atrasados.
37. A economia britânica também cambaleia, mas os títulos governamentais pagam juros de só 2% a.a., enquanto os membros da Zona Euro enfrentam juros acima de 7% a.a, porque não têm a opção "pública" de criar dinheiro.
38. O artigo 123 do Tratado de Lisboa proíbe o BCE fazer o que os bancos centrais devem fazer: criar dinheiro para financiar déficits do orçamento público e rolar as dívidas do governo. Tampouco o pode o banco central alemão, por força da Constituição da Alemanha (país ocupado).
39. Conclui Hudson: "se o euro quebrar será porque os governos da UE pagam juros aos banqueiros, em vez de se financiarem através de seus próprios bancos centrais". Dois poderes caracterizam o Estado-Nação: criar dinheiro e governar a política fiscal. O primeiro já não existia para os europeus, e o segundo está sendo cassado com o presente "acordo".
13/Dezembro/2011
[*] Doutorado em Economia, autor de "Globalização versus Desenvolvimento", abenayon.df@gmail.com
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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terça-feira, 27 de dezembro de 2011
quinta-feira, 22 de dezembro de 2011
Pelo Socialismo
Questões político-ideológicas com actualidade
http://www.pelosocialismo.net
________________________________
Texto publicado na revista “Études Marxistes” n.º 88 de 12 Abril de 2010.
Tradução do francês de AA em 05.05.2010
POL DE VOS*
A VENEZUELA E O SOCIALISMO DO SÉCULO 21
A difícil construção do «partido da revolução»
Hugo Chávez é presidente da Venezuela desde 1999. Passados cerca de cinco anos, ele avança
explicitamente com «o socialismo do século 21» como objectivo da sua revolução bolivariana. No
número anterior de “Ètudes marxistes”, analisámos esta luta a partir do quadro de referência de uma
revolução democrática nacional1. A presente contribuição trata da construção do Partido Socialista
Unificado da Venezuela (PSUV) e analisa em que medida este partido conseguirá transformar-se
em força motriz da revolução.
A necessidade de um «partido da revolução»
Na América latina, a dominação agressiva da América do Norte constitui o problema principal. O
acordo militar de Agosto de 2009, entre os Estados Unidos e a Colômbia, que prevê a instalação de
toda uma série de novas bases americanas e o reforço de algumas já existentes, é um exemplo
recente do objectivo dos Estados-Unidos – que continuará imutável com o presidente Obama – de
manter a sua hegemonia na região.
Hugo Chávez compreende que tem de desenvencilhar o seu país do garrote económico e político
americano. Só assim os venezuelanos terão as mãos livres para determinarem, eles-mesmos, o seu
futuro. En 2005, Chávez déclarava: «Nós temos uma dupla tarefa: enterrar o acordo de livre-troca
americano (ALCA) e o modelo imperialista e capitalista, por um lado, e, por outro lado, fazer
nascer uma nova era, chegar à integração latino-americana, a alternativa bolivariana – a ALBA.
E, além disso, enterrar o capitalismo para criar o socialismo do século 21, um novo projecto
socialista histórico.E não poderemos aí chegar se não nos unirmos 2.»
Para assegurar esta unidade e concretizar uma larga colaboração entre todos os grupos,
organizações e classes que sustentam a revolução, é necessária uma vigorosa política de partido.
Em 2005, o Partido Comunista da Venezuela (PCV) escrevia: «Em cada uma destas confrontações
(com os Estados Unidos e as elites venezuelanas a eles ligadas), torna-se cada vez mais claro que a
ausência de uma vanguarda colectiva organizada da revolução tem um peso enorme sobre o
processo. Uma vanguarda que sustente o conjunto em todas as circunstâncias e que consolide as
posições alcançadas. Construir esta vanguarda a partir das experiências concretas de colaboração
é uma das tarefas mais urgentes das forças revolucionárias e populares e o PCV tem a firme
intenção de se empenhar nesse objectivo3.»
2
O Partido Socialista Unificado da Venezuela
No outono de 2006, Hugo Chávez sublinhou e repetiu várias vezes a importância de um partido
unido e forte e lançou a proposta de construir o Partido Socialista Unificado da Venezuela (PSUV).
Até então, existia um Movimento para a quinta república (MVR), sob a direcção do próprio
Chávez. Este MVR era sobretudo um aparelho destinado a intervir nas eleições. Discussões
organizadas, por exemplo, sobre os candidatos eleitorais ou sobre a composição do governo não
existiam. As decisões eram tomadas pelo presidente Chávez e alguns dos seus homens de
confiança.
Depois de 1999, os partidários de Chávez adquiriram uma grande experiência de organização, no
decurso de uma longa série de campanhas eleitorais, mas também na luta popular contra o golpe de
Estado de 11 de Abril de 2002, assim como contra o lock-out e as sabotagens patronais do final
desse ano e inícios de 2003. Além disso, os militantes eram, em simultâneo, dirigentes populares no
seio da plétora de comités de bairro, de comités da terra ou de comités de camponeses existentes por
todo o país.
Hugo Chávez justifica a fundação do PSUV com a necessidade de «um partido novo, a partir da
base, e ao serviço da população e da revolução, do socialismo». O novo partido elegeria
democraticamente os seus representantes e o porta-voz. Por outro lado, o partido não poderia mais
ser uma máquina eleitoral, mas deveria principalmente agarrar o trabalho de organização da base. O
que é específico nesta situação, é a criação de um partido revolucionário a partir de nada, ou quase
nada, enquanto se detém o poder de Estado.
Numa primeira fase, Hugo Chávez tentou convencer todos os partidos políticos e grupos que
sustentavam a sua revolução bolivariana a dissolverem-se e a entrarem para o PSUV. Rapidamente,
o Movimento para a 5.ª República de Chávez e uma série de pequenos partidos fusionaram-se.
Outros partidos, entre os quais o Partido Comunista da Venezuela, decidiram não adoptar esta via,
preferindo conservar a sua própria organização4.
O congresso de preparação e fundação
A 5 de Março de 2007, Hugo Chávez anunciou o início oficial da criação do PSUV. Entre 29 de
Abril e 10 de Junho de 2007, mais de cinco milhões inscreveram-se como candidatos a membros do
PSUV, ou seja, cerca de 80% do número total de pessoas que votaram Chávez nas últimas eleições.
Em Julho de 2007, começou uma segunda fase. Todos os candidatos foram convidados a
organizarem-se em «batalhões socialistas», com cerca de 300 membros cada um. Neste período
inicial, pediu-se-lhes para organizarem três reuniões, a fim de se concretizar a criação do partido.
Eles discutiram política, economia, o Estado, etc. Os que não desejavam ou não podiam participar
nestas reuniões e formações continuaram candidatos. Na prática, a distinção entre candidatos a
membros, membros e militantes continuava muito vaga.
Os números oficiais do PSUV consideram que 25% – ou seja, 1,4 milhão dos 5,7 milhões de
candidatos a membros originais – participaram regularmente naquelas reuniões. A participação real
situa-se, provavelmente, nos 15%, ou seja, 900.000 membros5. Hugo Chávez: «É normal que nem
toda a gente se empenhe a fundo. Nós estávamos convencidos que, nesta segunda fase, um grande
número de pessoas inscritas não participariam, por diversas e compreensíveis razões. Alguns por
causa do trabalho, outros por obrigações familiares e outros porque ainda estão insuficientemente
preparados para se tornarem militantes6.»
3
A 29 de Setembro de 2007, designou-se um porta-voz em cada batalhão, em simultâneo com um
suplente e cinco «delegados». Oito a doze batalhões constituem uma circunscrição, que representa a
zona. Os porta-vozes e os delegados dos diversos batalhões elegeram, por circunscrição, um
representante ao congresso de fundação.
Este congresso estava previsto para o último trimestre de 2007. Mas este género de processos
desenrola-se lentamente. Além do mais, os preparativos coincidiam com a campanha para um
referendo sobre a constituição (a 2 de Dezmbro de 2007). A proposta de uma nova «constituição
socialista» estava complicada. Tanto mais que a questão não era clara, pois estava insuficientemente
ligada ao seu meio de existência. A campanha teve de ser desenvolvida com um partido em
construção, que não possuía ainda a conveniente estrutura. O conteúdo complexo e a ausência de
um partido verdadeiramente eficaz influenciaram, inevitavelmente, o resultado do referendo.
Chávez perdeu-o7.
O congresso do partido iniciou-se, finalmente, a 12 de Janeiro de 2008. Iria necessitar de seis finsde-
semana completos, entre meados de Janeiro e o início de Março (estatutos, programa, etc.).
Em 2008 e 2009, o partido adquiriu progressivamente mais estrutura e corpo. Os batalhões foram
reforçados, tendo em vista, em primeiro lugar, as eleições locais de Dezembro de 2008. No dia 1 de
Junho de 2008, cerca de 3,5 milhões de membros do PSUV participavam nas eleições internas de
candidatos. Em Dezembro, o PSUV ganhou as eleições em 17 dos 22 Estados do país e em 265 das
327 municipalidades, apesar de ter perdido a capital. Logo de seguida, houve uma nova mobilização
geral para o referendo de Fevereiro de 2009, no qual se propunha uma modificação da constituição,
permitindo a reeleição ilimitada do presidente.
Agosto de 2009: reorganização do PSUV
O balanço de um ano, levou a direcção a propor uma reorganização. No dia 1 de Agosto, em todo o
país, os membros do PSUV reuniram 1.556 assembleias locais (93,6 % das 1.663 que o partido
tinha previsto). Apresentou-se uma análise da situação nacional e internacional, que foi discutida
em todas essas assembleias. Este documento (ver caixa) esboçava um quadro da situação política.
Extractos do documento de discussão do PSUV (Agosto de 2009)
É de extrema importância «acelerar imediatamente a transição para o socialismo»: «As lições do
golpe [de Estado, nas Honduras] são: que o imperialismo é o principal inimigo do processo
revolucionário; que toda a revolução ou todo o processo de democratização devem poder defenderse
e, para o fazer, devem poder contar com um partido revolucionário unificado com fortes raízes
populares; e, enfim, que nos devemos preparar para qualquer possível escalada de agressões contra
a nossa revolução, através do reforço da unidade de todas as forças anti-imperialistas e
progressistas, no plano continental e mundial.
Um dos mais importantes sucessos da nossa política governamental foi a política anti-crise, que
impediu a recessão económica. Esta política também tornou possível a continuação da melhoria de
importantes indicadores sociais, respeitantes ao emprego e à pobreza.
Mas não podemos deixar de constatar que temos de desenvolver ainda maiores esforços para
melhorar a eficácia da gestão pública e o aprofundamento da revolução. O PSUV tem um papel
central como garante da gestão pública, mas também na direcção política do governo.
4
Nós temos de aperfeiçoar os mecanismos que nos permitirão reforçar a nossa influência sobre a
política governamental, a todos os níveis. Se tivéssemos de resumir as três grandes linhas de acção
da nossa estratégia para acelarar a transição para o socialismo, teríamos de referir:
a) A transformação do Estado burguês num Estado revolucionário e democrático, que encontra
nas comunas uma das expressões principais do poder popular.
b) O desenvolvimento económico e a criação de rendimentos socialistas da propriedade dos
meios de produção.
c) A criação de uma consciência revolucionária nos trabalhadores, resultante de uma profunda
revolução ideológica e cultural.»
Nós devemos ser vigilantes e mostrar, nas nossas acções, que a Venezuela não é as Honduras e que
esta revolução está à altura de defender o seu caminho para o socialismo.
Na base das experiências passadas, apresentou-se a proposta de modificar a organização de base dos
«batalhões», robustos, de 300 homens e mulheres, para constituir «patrulhas» locais de 20
membros, no mínimo, e de 30, no máximo. A intenção é a de que os militantes que se conhecem e
que habitam na mesma rua, no mesmo bloco de apartamentos, ou na mesma comunidade local, ou
que trabalham na mesma empresa ou na mesma instituição, possam unir-se no seio de tais patrulhas.
O menor tamanho destes grupos de militantes teria, sem qualquer dúvida, um efeito «autoselectivo
» e reforçaria a sua capacidade organizativa e a sua coesão. Isso deve reforçar também a
participação activa na base e a democracia, no seio do PSUV.
A direcção esperava que, durante os meses seguintes, na preparação do segundo congresso nacional
do PSUV, previsto para Outubro de 20098, se pudessem formar «entre 100 000 e 200 000
patrulhas». Esta margem tão larga (100 000 a 200 000) mostra a que ponto se ignora ainda – mesmo
na direcção do partido – a verdadeira força organizativa da base. A organização dos jovens do
PSUV lançou igualmente um apelo à criação de patrulhas nas universidades e escolas superiores.
Apesar de 60 % do milhão e meio de novos membros que fizeram a sua inscrição em 2009 terem
menos de 29 anos, a participação dos jovens nas assembleias continua muito limitada9.
Análise do PSUV enquanto «partido da revolução»
Um partido de massas
Hoje, o PSUV é, em primeiro lugar, um grande partido de massas dotado de uma base activa e
entusiasta. A maioria das patrulhas foram criadas nos bairros populares das grandes cidades mas, no
campo e nas empresas, os grupos são igualmente activos. A base é composta de habitantes dos
bairros populares, de trabalhadores, de operários agrícolas, de camponeses, de representantes das
comunidades indígenas, de estudantes, de intelectuais, de pequenos comerciantes. Para muitos,
trata-se de uma primeira experiência de envolvimento político, muitas vezes inspirada na noção de
que o PSUV é «o partido de Chávez». A consciência política dos membros do partido é muito
heterogénea. Esperar outra coisa seria um voto piedoso. O aspecto positivo é o de que, pela primeira
vez na história da Venezuela, amplos grupos de gente simples do povo vêem que, eles mesmos,
podem mudar qualquer coisa e envolvem-se nisso. O desafio consiste em dar a cada um o lugar que
lhe convém e em organizar um leque muito diversificado de formações.
Nas altas esferas do partido encontram-se frequentemente pessoas provenientes de diversas
correntes da sociedade e que apoiam Chávez, mas, sobretudo, pessoas da pequena burguesia, ao
lado de representantes da burguesia nacional. Algumas dessas pessoas têm um passado no
movimento político muito fragmentado da esquerda que o país conheceu depois de 1960 (partidos,
guerrilha, organizações de base). A posição de força de um partido governamental teve como
5
consequência que o nepotismo, o oportunismo e o arrivismo se insinuaram, inevitavelmente, no seio
do partido. O próprio Chávez contribuiu para isso, quando declarou que todos os que não se
tornassem membros do PSUV eram contra-revolucionários e que o PSUV ia ser o partido
governamental.
O papel de Hugo Chávez
A importância de Hugo Chávez enquanto dirigente da revolução bolivariana dificilmente pode ser
sobrestimado. Numa situação onde apenas existe uma estrutura de partido e onde o movimento
social e político progressista se caracterizava, até há pouco tempo, pela fraqueza e divisões, Chávez
conseguiu mobilizar grandes massas e uni-las em torno de um projecto comum. A história é feita
pelas massas. Mas, ao mesmo tempo, os dirigentes carismáticos revelam-se essenciais nos
momentos cruciais em que é necessário romper com uma situação cristalizada. Os exemplos são
muitos: Lénine, Mao Zedong, Gandhi, Martin Luther King, Nelson Mandela, Fidel Castro.
Hugo Chávez tem uma posição anti-imperialista forte. Ele desempenha não só um papel central na
revolução bolivariana, mas assume igualmente um papel dirigente em toda a América latina (e
mesmo longe, no exterior: por exemplo, também no Médio-Oriente Chávez é muito popular). Ele é
um dos raros dirigentes mundiais, na actual crise económica mundial, a reclamar uma alternativa
socialista. Hoje, ele estimula activamente o debate sobre o socialismo do século 21, embora o seu
conteúdo tenha falta de clareza.
Contudo, ele é igualmente a grande fraqueza da revolução bolivariana. A ausência de um partido
robusto conduziu à dependência de uma única pessoa. Chávez torna-se assim o tendão de Aquiles
do movimento bolivariano. As suas fraquezas políticas continuam sem um contra-peso. E, se lhe
vier a acontecer alguma coisa, todo o movimento se arrisca, a muito curto prazo, a dividir-se.
As contradições no seio do PSUV: confusão entre partido e frente
O PSUV é, na realidade, uma frente, uma aliança no seio da qual existem, já hoje, contradições
agudas entre a esquerda e a direita, entre a base de trabalhadores, de camponeses e de pessoas do
povo vindas do sector informal, por um lado, e uma fracção de direita que opta pelo «chavismo»
sem socialismo e que reagrupa representantes da burguesia nacional e oportunistas10, por outro lado.
Na Venezuela, estes últimos são apelidados de «boli-burguesia»: gente que acumula dinheiro e
poder guindando-se ao topo do aparelho do Estado bolivariano e das suas empresas. Esta fracção
não quer ouvir falar das virtualidades da democracia de base ou da prestação de contas. Em
numerosas empresas do Estado também há quadros membros do PSUV que limitam o mais que
podem a participação sindical e que favorecem os empreiteiros privados. Esta «boli-burguesia»
ocupa altas funções nos ministérios, na fracção do PSUV do Parlamento e nas direcções locais do
PSUV (comunas, Estados). Ela exerce igualmente a sua influência no exército ou, pelo menos,
nalguns dos seus sectores.
Dos Estados de Miranda, Anzoátegui e Falcon chegaram muitas informações, dizendo que os
governadores se imiscuíam na designação dos porta-vozes dos batalhões socialistas. Eles enviavam
os seus testas de ferro às assembleias, para influenciarem o voto. Desmascarou-se, com
regularidade, esta manipulação, o que reforçou a autoridade dos dirigentes de base.
A cada vitória de Chávez, quer se tratasse de uma vitória eleitoral, quer de melhorias concretas nas
condições de vida, o entusiasmo com os resultados alcançados foi acompanhado de um
descontentamento crescente da base popular, perante a fracção de direita do PSUV, que trava essa
política e mantém a ineficiência reinante. Assim, os cuidados de saúde (atribuídos com profusão
com a ajuda de médicos cubanos) nos bairros populares de Caracas são muito apreciados. Mas, em
6
simultâneo, cresce um enorme descontentamento a propósito dos hospitais que recusam os
pacientes desses bairros. Muitas vezes são recusados e têm de andar de um hospital para outro para
encontrarem uma cama, e o problema termina frequentemente de forma dramática. As tentativas de
remediar esta ineficiência, integrando todos os hospitais num conjunto único, chocaram com uma
forte resistência das diferentes redes de hospitais (do Estado, da segurança social, das comunas, do
exército, etc.).
No seio do PSUV, a direita viu o seu poder aumentar depois da rejeição, em Dezembro de 2007, de
uma reforma radical da constituição. Chávez seguiu então uma política dupla. Por um lado, fez
algumas concessões à pesada pressão interna da direita, que queria menos medidas radicais e mais
poder político. A influência da direita no seio do governo reforçou-se então. Ao mesmo tempo,
Chávez acelarou a instalação de um sector económico público e colectivo, no qual se
experimentam, por um lado, relações de trabalho socialistas, mas onde, por outro lado, uma «boliburguesia
» das mais ávidas está igualmente activa. Além disso, muitas vezes ligadas ao precedente,
fundaram-se «comunas socialistas» nos lugares onde os numerosos programas de desenvolvimento
dos bairros foram particularmente avançados. Esta complexa situação reforça as contradições
internas do PSUV. Cedo ou tarde, esta bomba tem de rebentar. Quanto mais a situação durar, mais
as massas populares ganhas para Chávez correm o risco de desanimar.
Já, em Dezembro de 2006, os comunistas do PCV respondiam à proposta de Chávez de formar o
PSUV, dizendo que era necessário reflectir «sobre as características de classe do partido que deve
ser criado e por isso devemos estabelecer se se tratará de uma frente de classes, como se torna
necessário na fase de libertação nacional, ou de uma organização com identidade de classe
precisa, que compreende a classe operária e as outras classes e camadas da população oprimidas
pelo capital e que visa consolidar e desenvolver esta fase inicial de transição para o socialismo»
Questões político-ideológicas com actualidade
http://www.pelosocialismo.net
________________________________
Texto publicado na revista “Études Marxistes” n.º 88 de 12 Abril de 2010.
Tradução do francês de AA em 05.05.2010
POL DE VOS*
A VENEZUELA E O SOCIALISMO DO SÉCULO 21
A difícil construção do «partido da revolução»
Hugo Chávez é presidente da Venezuela desde 1999. Passados cerca de cinco anos, ele avança
explicitamente com «o socialismo do século 21» como objectivo da sua revolução bolivariana. No
número anterior de “Ètudes marxistes”, analisámos esta luta a partir do quadro de referência de uma
revolução democrática nacional1. A presente contribuição trata da construção do Partido Socialista
Unificado da Venezuela (PSUV) e analisa em que medida este partido conseguirá transformar-se
em força motriz da revolução.
A necessidade de um «partido da revolução»
Na América latina, a dominação agressiva da América do Norte constitui o problema principal. O
acordo militar de Agosto de 2009, entre os Estados Unidos e a Colômbia, que prevê a instalação de
toda uma série de novas bases americanas e o reforço de algumas já existentes, é um exemplo
recente do objectivo dos Estados-Unidos – que continuará imutável com o presidente Obama – de
manter a sua hegemonia na região.
Hugo Chávez compreende que tem de desenvencilhar o seu país do garrote económico e político
americano. Só assim os venezuelanos terão as mãos livres para determinarem, eles-mesmos, o seu
futuro. En 2005, Chávez déclarava: «Nós temos uma dupla tarefa: enterrar o acordo de livre-troca
americano (ALCA) e o modelo imperialista e capitalista, por um lado, e, por outro lado, fazer
nascer uma nova era, chegar à integração latino-americana, a alternativa bolivariana – a ALBA.
E, além disso, enterrar o capitalismo para criar o socialismo do século 21, um novo projecto
socialista histórico.E não poderemos aí chegar se não nos unirmos 2.»
Para assegurar esta unidade e concretizar uma larga colaboração entre todos os grupos,
organizações e classes que sustentam a revolução, é necessária uma vigorosa política de partido.
Em 2005, o Partido Comunista da Venezuela (PCV) escrevia: «Em cada uma destas confrontações
(com os Estados Unidos e as elites venezuelanas a eles ligadas), torna-se cada vez mais claro que a
ausência de uma vanguarda colectiva organizada da revolução tem um peso enorme sobre o
processo. Uma vanguarda que sustente o conjunto em todas as circunstâncias e que consolide as
posições alcançadas. Construir esta vanguarda a partir das experiências concretas de colaboração
é uma das tarefas mais urgentes das forças revolucionárias e populares e o PCV tem a firme
intenção de se empenhar nesse objectivo3.»
2
O Partido Socialista Unificado da Venezuela
No outono de 2006, Hugo Chávez sublinhou e repetiu várias vezes a importância de um partido
unido e forte e lançou a proposta de construir o Partido Socialista Unificado da Venezuela (PSUV).
Até então, existia um Movimento para a quinta república (MVR), sob a direcção do próprio
Chávez. Este MVR era sobretudo um aparelho destinado a intervir nas eleições. Discussões
organizadas, por exemplo, sobre os candidatos eleitorais ou sobre a composição do governo não
existiam. As decisões eram tomadas pelo presidente Chávez e alguns dos seus homens de
confiança.
Depois de 1999, os partidários de Chávez adquiriram uma grande experiência de organização, no
decurso de uma longa série de campanhas eleitorais, mas também na luta popular contra o golpe de
Estado de 11 de Abril de 2002, assim como contra o lock-out e as sabotagens patronais do final
desse ano e inícios de 2003. Além disso, os militantes eram, em simultâneo, dirigentes populares no
seio da plétora de comités de bairro, de comités da terra ou de comités de camponeses existentes por
todo o país.
Hugo Chávez justifica a fundação do PSUV com a necessidade de «um partido novo, a partir da
base, e ao serviço da população e da revolução, do socialismo». O novo partido elegeria
democraticamente os seus representantes e o porta-voz. Por outro lado, o partido não poderia mais
ser uma máquina eleitoral, mas deveria principalmente agarrar o trabalho de organização da base. O
que é específico nesta situação, é a criação de um partido revolucionário a partir de nada, ou quase
nada, enquanto se detém o poder de Estado.
Numa primeira fase, Hugo Chávez tentou convencer todos os partidos políticos e grupos que
sustentavam a sua revolução bolivariana a dissolverem-se e a entrarem para o PSUV. Rapidamente,
o Movimento para a 5.ª República de Chávez e uma série de pequenos partidos fusionaram-se.
Outros partidos, entre os quais o Partido Comunista da Venezuela, decidiram não adoptar esta via,
preferindo conservar a sua própria organização4.
O congresso de preparação e fundação
A 5 de Março de 2007, Hugo Chávez anunciou o início oficial da criação do PSUV. Entre 29 de
Abril e 10 de Junho de 2007, mais de cinco milhões inscreveram-se como candidatos a membros do
PSUV, ou seja, cerca de 80% do número total de pessoas que votaram Chávez nas últimas eleições.
Em Julho de 2007, começou uma segunda fase. Todos os candidatos foram convidados a
organizarem-se em «batalhões socialistas», com cerca de 300 membros cada um. Neste período
inicial, pediu-se-lhes para organizarem três reuniões, a fim de se concretizar a criação do partido.
Eles discutiram política, economia, o Estado, etc. Os que não desejavam ou não podiam participar
nestas reuniões e formações continuaram candidatos. Na prática, a distinção entre candidatos a
membros, membros e militantes continuava muito vaga.
Os números oficiais do PSUV consideram que 25% – ou seja, 1,4 milhão dos 5,7 milhões de
candidatos a membros originais – participaram regularmente naquelas reuniões. A participação real
situa-se, provavelmente, nos 15%, ou seja, 900.000 membros5. Hugo Chávez: «É normal que nem
toda a gente se empenhe a fundo. Nós estávamos convencidos que, nesta segunda fase, um grande
número de pessoas inscritas não participariam, por diversas e compreensíveis razões. Alguns por
causa do trabalho, outros por obrigações familiares e outros porque ainda estão insuficientemente
preparados para se tornarem militantes6.»
3
A 29 de Setembro de 2007, designou-se um porta-voz em cada batalhão, em simultâneo com um
suplente e cinco «delegados». Oito a doze batalhões constituem uma circunscrição, que representa a
zona. Os porta-vozes e os delegados dos diversos batalhões elegeram, por circunscrição, um
representante ao congresso de fundação.
Este congresso estava previsto para o último trimestre de 2007. Mas este género de processos
desenrola-se lentamente. Além do mais, os preparativos coincidiam com a campanha para um
referendo sobre a constituição (a 2 de Dezmbro de 2007). A proposta de uma nova «constituição
socialista» estava complicada. Tanto mais que a questão não era clara, pois estava insuficientemente
ligada ao seu meio de existência. A campanha teve de ser desenvolvida com um partido em
construção, que não possuía ainda a conveniente estrutura. O conteúdo complexo e a ausência de
um partido verdadeiramente eficaz influenciaram, inevitavelmente, o resultado do referendo.
Chávez perdeu-o7.
O congresso do partido iniciou-se, finalmente, a 12 de Janeiro de 2008. Iria necessitar de seis finsde-
semana completos, entre meados de Janeiro e o início de Março (estatutos, programa, etc.).
Em 2008 e 2009, o partido adquiriu progressivamente mais estrutura e corpo. Os batalhões foram
reforçados, tendo em vista, em primeiro lugar, as eleições locais de Dezembro de 2008. No dia 1 de
Junho de 2008, cerca de 3,5 milhões de membros do PSUV participavam nas eleições internas de
candidatos. Em Dezembro, o PSUV ganhou as eleições em 17 dos 22 Estados do país e em 265 das
327 municipalidades, apesar de ter perdido a capital. Logo de seguida, houve uma nova mobilização
geral para o referendo de Fevereiro de 2009, no qual se propunha uma modificação da constituição,
permitindo a reeleição ilimitada do presidente.
Agosto de 2009: reorganização do PSUV
O balanço de um ano, levou a direcção a propor uma reorganização. No dia 1 de Agosto, em todo o
país, os membros do PSUV reuniram 1.556 assembleias locais (93,6 % das 1.663 que o partido
tinha previsto). Apresentou-se uma análise da situação nacional e internacional, que foi discutida
em todas essas assembleias. Este documento (ver caixa) esboçava um quadro da situação política.
Extractos do documento de discussão do PSUV (Agosto de 2009)
É de extrema importância «acelerar imediatamente a transição para o socialismo»: «As lições do
golpe [de Estado, nas Honduras] são: que o imperialismo é o principal inimigo do processo
revolucionário; que toda a revolução ou todo o processo de democratização devem poder defenderse
e, para o fazer, devem poder contar com um partido revolucionário unificado com fortes raízes
populares; e, enfim, que nos devemos preparar para qualquer possível escalada de agressões contra
a nossa revolução, através do reforço da unidade de todas as forças anti-imperialistas e
progressistas, no plano continental e mundial.
Um dos mais importantes sucessos da nossa política governamental foi a política anti-crise, que
impediu a recessão económica. Esta política também tornou possível a continuação da melhoria de
importantes indicadores sociais, respeitantes ao emprego e à pobreza.
Mas não podemos deixar de constatar que temos de desenvolver ainda maiores esforços para
melhorar a eficácia da gestão pública e o aprofundamento da revolução. O PSUV tem um papel
central como garante da gestão pública, mas também na direcção política do governo.
4
Nós temos de aperfeiçoar os mecanismos que nos permitirão reforçar a nossa influência sobre a
política governamental, a todos os níveis. Se tivéssemos de resumir as três grandes linhas de acção
da nossa estratégia para acelarar a transição para o socialismo, teríamos de referir:
a) A transformação do Estado burguês num Estado revolucionário e democrático, que encontra
nas comunas uma das expressões principais do poder popular.
b) O desenvolvimento económico e a criação de rendimentos socialistas da propriedade dos
meios de produção.
c) A criação de uma consciência revolucionária nos trabalhadores, resultante de uma profunda
revolução ideológica e cultural.»
Nós devemos ser vigilantes e mostrar, nas nossas acções, que a Venezuela não é as Honduras e que
esta revolução está à altura de defender o seu caminho para o socialismo.
Na base das experiências passadas, apresentou-se a proposta de modificar a organização de base dos
«batalhões», robustos, de 300 homens e mulheres, para constituir «patrulhas» locais de 20
membros, no mínimo, e de 30, no máximo. A intenção é a de que os militantes que se conhecem e
que habitam na mesma rua, no mesmo bloco de apartamentos, ou na mesma comunidade local, ou
que trabalham na mesma empresa ou na mesma instituição, possam unir-se no seio de tais patrulhas.
O menor tamanho destes grupos de militantes teria, sem qualquer dúvida, um efeito «autoselectivo
» e reforçaria a sua capacidade organizativa e a sua coesão. Isso deve reforçar também a
participação activa na base e a democracia, no seio do PSUV.
A direcção esperava que, durante os meses seguintes, na preparação do segundo congresso nacional
do PSUV, previsto para Outubro de 20098, se pudessem formar «entre 100 000 e 200 000
patrulhas». Esta margem tão larga (100 000 a 200 000) mostra a que ponto se ignora ainda – mesmo
na direcção do partido – a verdadeira força organizativa da base. A organização dos jovens do
PSUV lançou igualmente um apelo à criação de patrulhas nas universidades e escolas superiores.
Apesar de 60 % do milhão e meio de novos membros que fizeram a sua inscrição em 2009 terem
menos de 29 anos, a participação dos jovens nas assembleias continua muito limitada9.
Análise do PSUV enquanto «partido da revolução»
Um partido de massas
Hoje, o PSUV é, em primeiro lugar, um grande partido de massas dotado de uma base activa e
entusiasta. A maioria das patrulhas foram criadas nos bairros populares das grandes cidades mas, no
campo e nas empresas, os grupos são igualmente activos. A base é composta de habitantes dos
bairros populares, de trabalhadores, de operários agrícolas, de camponeses, de representantes das
comunidades indígenas, de estudantes, de intelectuais, de pequenos comerciantes. Para muitos,
trata-se de uma primeira experiência de envolvimento político, muitas vezes inspirada na noção de
que o PSUV é «o partido de Chávez». A consciência política dos membros do partido é muito
heterogénea. Esperar outra coisa seria um voto piedoso. O aspecto positivo é o de que, pela primeira
vez na história da Venezuela, amplos grupos de gente simples do povo vêem que, eles mesmos,
podem mudar qualquer coisa e envolvem-se nisso. O desafio consiste em dar a cada um o lugar que
lhe convém e em organizar um leque muito diversificado de formações.
Nas altas esferas do partido encontram-se frequentemente pessoas provenientes de diversas
correntes da sociedade e que apoiam Chávez, mas, sobretudo, pessoas da pequena burguesia, ao
lado de representantes da burguesia nacional. Algumas dessas pessoas têm um passado no
movimento político muito fragmentado da esquerda que o país conheceu depois de 1960 (partidos,
guerrilha, organizações de base). A posição de força de um partido governamental teve como
5
consequência que o nepotismo, o oportunismo e o arrivismo se insinuaram, inevitavelmente, no seio
do partido. O próprio Chávez contribuiu para isso, quando declarou que todos os que não se
tornassem membros do PSUV eram contra-revolucionários e que o PSUV ia ser o partido
governamental.
O papel de Hugo Chávez
A importância de Hugo Chávez enquanto dirigente da revolução bolivariana dificilmente pode ser
sobrestimado. Numa situação onde apenas existe uma estrutura de partido e onde o movimento
social e político progressista se caracterizava, até há pouco tempo, pela fraqueza e divisões, Chávez
conseguiu mobilizar grandes massas e uni-las em torno de um projecto comum. A história é feita
pelas massas. Mas, ao mesmo tempo, os dirigentes carismáticos revelam-se essenciais nos
momentos cruciais em que é necessário romper com uma situação cristalizada. Os exemplos são
muitos: Lénine, Mao Zedong, Gandhi, Martin Luther King, Nelson Mandela, Fidel Castro.
Hugo Chávez tem uma posição anti-imperialista forte. Ele desempenha não só um papel central na
revolução bolivariana, mas assume igualmente um papel dirigente em toda a América latina (e
mesmo longe, no exterior: por exemplo, também no Médio-Oriente Chávez é muito popular). Ele é
um dos raros dirigentes mundiais, na actual crise económica mundial, a reclamar uma alternativa
socialista. Hoje, ele estimula activamente o debate sobre o socialismo do século 21, embora o seu
conteúdo tenha falta de clareza.
Contudo, ele é igualmente a grande fraqueza da revolução bolivariana. A ausência de um partido
robusto conduziu à dependência de uma única pessoa. Chávez torna-se assim o tendão de Aquiles
do movimento bolivariano. As suas fraquezas políticas continuam sem um contra-peso. E, se lhe
vier a acontecer alguma coisa, todo o movimento se arrisca, a muito curto prazo, a dividir-se.
As contradições no seio do PSUV: confusão entre partido e frente
O PSUV é, na realidade, uma frente, uma aliança no seio da qual existem, já hoje, contradições
agudas entre a esquerda e a direita, entre a base de trabalhadores, de camponeses e de pessoas do
povo vindas do sector informal, por um lado, e uma fracção de direita que opta pelo «chavismo»
sem socialismo e que reagrupa representantes da burguesia nacional e oportunistas10, por outro lado.
Na Venezuela, estes últimos são apelidados de «boli-burguesia»: gente que acumula dinheiro e
poder guindando-se ao topo do aparelho do Estado bolivariano e das suas empresas. Esta fracção
não quer ouvir falar das virtualidades da democracia de base ou da prestação de contas. Em
numerosas empresas do Estado também há quadros membros do PSUV que limitam o mais que
podem a participação sindical e que favorecem os empreiteiros privados. Esta «boli-burguesia»
ocupa altas funções nos ministérios, na fracção do PSUV do Parlamento e nas direcções locais do
PSUV (comunas, Estados). Ela exerce igualmente a sua influência no exército ou, pelo menos,
nalguns dos seus sectores.
Dos Estados de Miranda, Anzoátegui e Falcon chegaram muitas informações, dizendo que os
governadores se imiscuíam na designação dos porta-vozes dos batalhões socialistas. Eles enviavam
os seus testas de ferro às assembleias, para influenciarem o voto. Desmascarou-se, com
regularidade, esta manipulação, o que reforçou a autoridade dos dirigentes de base.
A cada vitória de Chávez, quer se tratasse de uma vitória eleitoral, quer de melhorias concretas nas
condições de vida, o entusiasmo com os resultados alcançados foi acompanhado de um
descontentamento crescente da base popular, perante a fracção de direita do PSUV, que trava essa
política e mantém a ineficiência reinante. Assim, os cuidados de saúde (atribuídos com profusão
com a ajuda de médicos cubanos) nos bairros populares de Caracas são muito apreciados. Mas, em
6
simultâneo, cresce um enorme descontentamento a propósito dos hospitais que recusam os
pacientes desses bairros. Muitas vezes são recusados e têm de andar de um hospital para outro para
encontrarem uma cama, e o problema termina frequentemente de forma dramática. As tentativas de
remediar esta ineficiência, integrando todos os hospitais num conjunto único, chocaram com uma
forte resistência das diferentes redes de hospitais (do Estado, da segurança social, das comunas, do
exército, etc.).
No seio do PSUV, a direita viu o seu poder aumentar depois da rejeição, em Dezembro de 2007, de
uma reforma radical da constituição. Chávez seguiu então uma política dupla. Por um lado, fez
algumas concessões à pesada pressão interna da direita, que queria menos medidas radicais e mais
poder político. A influência da direita no seio do governo reforçou-se então. Ao mesmo tempo,
Chávez acelarou a instalação de um sector económico público e colectivo, no qual se
experimentam, por um lado, relações de trabalho socialistas, mas onde, por outro lado, uma «boliburguesia
» das mais ávidas está igualmente activa. Além disso, muitas vezes ligadas ao precedente,
fundaram-se «comunas socialistas» nos lugares onde os numerosos programas de desenvolvimento
dos bairros foram particularmente avançados. Esta complexa situação reforça as contradições
internas do PSUV. Cedo ou tarde, esta bomba tem de rebentar. Quanto mais a situação durar, mais
as massas populares ganhas para Chávez correm o risco de desanimar.
Já, em Dezembro de 2006, os comunistas do PCV respondiam à proposta de Chávez de formar o
PSUV, dizendo que era necessário reflectir «sobre as características de classe do partido que deve
ser criado e por isso devemos estabelecer se se tratará de uma frente de classes, como se torna
necessário na fase de libertação nacional, ou de uma organização com identidade de classe
precisa, que compreende a classe operária e as outras classes e camadas da população oprimidas
pelo capital e que visa consolidar e desenvolver esta fase inicial de transição para o socialismo»
quinta-feira, 15 de dezembro de 2011
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A Europa e o Goldman Sachs
Posted: 14 Dec 2011 04:32 PM PST
Há dias, o sítio “Cubadebate” publicou o artigo que adiante se transcreve, omitindo-se somente algumas linhas que mencionam os órgãos de comunicação ligados ao tratamento do tema e aos seus protagonistas. Não sendo já uma novidade, as espúrias e criminosas relações entre os banqueiros e os governos de serviço ao grande capital, o texto vale a leitura pelos dados informativos que fornece.
O Goldman Sachs é um poderoso banco estadunidense, com representação em todo o mundo. Ele ganhou fortunas apostando contra os fundos de hipotecas subprime que vendia aos seus próprios clientes e a bancos de Londres e alemães. E continuou colectando dólares e euros aos montes. O Lehman Brothers foi a pique, mas não o Goldman Sachs. E-mails trocados entre os seus principais executivos, tornados conhecidos em Abril de 2010, mostrou-os divertindo-se a provocar os clientes. David Viniar, director financeiro, gabava-se de ter ganho US $ 50 milhões em um único dia!
E punição para uma tal destruição? Muito pouco, quase nada. Pesquisa promovida pela Comissão de valores (SEC), com audições no Senado, arrastada por meses e meses e, no final, eles foram punidos (!) com uma modesta coima de US $ 550 milhões. Para continuar a operar, feliz, com derivativos financeiros, sem controles governamentais, com consultadorias e comunicações, petróleo e serviços de investimentos.
Os Citigroup e Bank Of America necessitaram do apoio financeiro de Barack Obama. O Goldman Sachs não precisou, pois tinha ganho antes da crise e continuou embolsando. No primeiro trimestre de 2010 teve lucros de US $ 3,3 bilhões. Os seus “colegas” também ganharam: o Citigroup 4.400 milhões de dólares, o JP Morgan 3.3 bilhões e o Bank of America 2.800 milhões.
O Goldman Sachs tira proveito dos antigos gestores e executivos com longos anos de serviço, que passaram a assumir cargosem governos. Osucessor de Silvio Berlusconi no Palazzo Chigi, Mario Monti, foi gerente do banco desde 2005, além de ter sido comissário europeu. Este “Super Mário” estreou-se com um pacote de ajuste, o sétimo contra os italianos nos últimos tempos. O país está super-endividado por um equivalente a 120 por cento do PIB. Berlusconi e os seus antecessores viveram numa festa, sem qualquer intervenção da Comissão Europeia, onde trabalhava Monti. Com o “Decreto Salva Itália”, eles querem fazer um ajuste de 24.000-30.000 milhões de euros, com cada vez mais impostos, com empresas públicas a privatizar e apertando as regras do sistema de reformas (que passará a exigir 42 anos de contribuições).(…)
Outros homens seus
“Onde está o poder mundial”? A resposta deve ter um nome e um local: na sede do banco de negócios Goldman Sachs. O banco norte-americano alcançou um feito raro na história política do mundo: colocar os seus homens na cabeça de dois governos europeus e do banco que governou os destinos das políticas económicas da União Europeia. Mario Draghi, o actual Presidente do Banco Central Europeu; Mario Monti, Presidente do Conselho de Ministros italiano, que substituiu Silvio Berlusconi; Lucas Papademos, o novo primeiro-ministro grego, todos pertencem ao conglomerado do Goldman Sachs.
Outros meios de imprensa divulgaram que Draghi era o encarregado por este banco para vender produtos financeiros “Swap” na Europa, que estiveram no cerne da crise que estalou em 2007-2008. E agora os seus patrões recompensaram-no, com uma posição-chave no continente europeu? Esses “swaps” permitiram ao governo grego a maquilhagem da sua dívida em 2000, para os seus números manipulados permitirem a entrada do país na zona euro. Vendidos por Draghi e comprados pela Grécia, o titular do Banco Central grego era Lucas Papademos, aquele que recebeu agora em Atenas o cargo de chefe de governo, após a derrocada do “socialista” Yorgos Papandreou.
É de supor que agora o titular do BCE e o premier grego estarão de acordo mais facilmente, dada a sua estreita relação e o facto de obedecerem aos mesmos chefes. Papademos estudou em universidades americanas e de lá saltou para altos postos de gestão no banco. Papandreou também foi aluno nos Estados Unidos, embora depois tenha tomado o lado da social-democracia. Os magnatas das finanças são hábeis em colocar os ovos em várias cestas. Eles apostam nos “swaps”, ADO, subprime, dólar, euro, iene, marco ou qualquer outra coisa, mas sempre saem em vantagem.
Dias atrás Papademos apresentou o enésimo plano de ajustamento para os helenos, que foi aprovado: impostos mais elevados, garantindo 7,1 por cento mais nas receitas e um corte dos de salários e seguros sociais de 5 bilhões de €. O primeiro ministro não chorou como a ministra do Trabalho italiana Elsa Fornero, ao informar as más notícias sobre estes ajustes no seu país.
As medidas na Grécia motivaram a sétima greve geral dos sindicatos que tendem a mobilizar-se activamente e a chocarem com a polícia. É um caso muito avançado em toda a Europa nos movimentos de indignados, geralmente mais passivos nesta matéria.
Você também, Geithner?
O domínio que o Banco Goldman Sachs exerce sobre os poderes políticos não é limitado às fronteiras da Europa. A sua sede foi sempreem Nova York, com tentáculos até à Casa Branca, através da Secretaria do Tesouro.
O actual ocupante desta última unidade, Timothy Geithner, foi gerente da empresa de Henry Kissinger em primeira instância, do FMI em seguida e posteriormente do Goldman. Esta semana foi para a Europa para conversar com as autoridades da União sobre como podem desactivar os “incêndios” no velho continente, antes que os próprios fogos norte-americanos se propaguem outra vez.
O Secretário do Tesouro cruzou o Atlântico para se encontrar com Draghi em Frankfurt, com as autoridades francesas, com o futuro presidente do governo de Espanha, Mariano Rajoy e mais tarde em Milão com Monti, o presidente do Conselho de Ministros italiano. Como se vê, o cartel dos Goldman´s boy´s está muito activo; ele alega estar a reparar os danos de uma crise que ele mesmo causou.
Antes de Geithner no Tesouro esteve Henry Paulson, com George W. Bush, depois de ter sido director da Goldman Sachs de1974 a1998. Paulson trabalhou com Lawrence Summers, também da equipe do banco, que foi funcionário de Bill Clinton junto com Robert Rubin, do Citibank, passando em2009 aconselheiro económico de Obama.
Por isso, alguns autores têm apontado a ligação do banco com ministros e chefes de governo. “Raposas para cuidar das galinhas: homens de Goldman Sachs tomam as rédeas da Europa”, publicou A.G. em “El Confidencial, 17/11. Aqui citou um artigo publicado no Le Monde, referindo as relações políticas entre Monti, Draghi e Papademos.
Entre os muitos vasos comunicantes desta entidade bancária com baseem Nova Yorkcom a política internacional, menciona-se também Paul Deighton, que trabalhou durante 22 anos no banco e agora é director-geral do Comité de organização dos Jogos Olímpicos de Londres 2012.”
Para quê este banco estadunidense e os colegas Citigroup, Bank Of America, etc, usam a sua influência política? O negócio está à vista. Em primeiro lugar,
para garantir a impunidade por crimes cometidos no desencadear da crise. Em segundo lugar, para garantir bons pacotes de auxílios estatais, enquanto durar a situação de emergência. E terceiro, para ganhar mais contratos com as acessórias a governos e empresas, durante a crise e a futura saída [?!] da mesma.
Enquanto isso, desmentindo todas as declarações e todos os compromissos, os controles e regulamentos para o capital financeiro e a especulação dormem algures em alguma gaveta no G-20. Achave atirou-a ao mar o Goldman Sachs e nesse mar também faz negócios: tem acções na Desiré, uma empresa britânica que procura petróleo nas Malvinas.
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A Europa e o Goldman Sachs
Posted: 14 Dec 2011 04:32 PM PST
Há dias, o sítio “Cubadebate” publicou o artigo que adiante se transcreve, omitindo-se somente algumas linhas que mencionam os órgãos de comunicação ligados ao tratamento do tema e aos seus protagonistas. Não sendo já uma novidade, as espúrias e criminosas relações entre os banqueiros e os governos de serviço ao grande capital, o texto vale a leitura pelos dados informativos que fornece.
O Goldman Sachs é um poderoso banco estadunidense, com representação em todo o mundo. Ele ganhou fortunas apostando contra os fundos de hipotecas subprime que vendia aos seus próprios clientes e a bancos de Londres e alemães. E continuou colectando dólares e euros aos montes. O Lehman Brothers foi a pique, mas não o Goldman Sachs. E-mails trocados entre os seus principais executivos, tornados conhecidos em Abril de 2010, mostrou-os divertindo-se a provocar os clientes. David Viniar, director financeiro, gabava-se de ter ganho US $ 50 milhões em um único dia!
E punição para uma tal destruição? Muito pouco, quase nada. Pesquisa promovida pela Comissão de valores (SEC), com audições no Senado, arrastada por meses e meses e, no final, eles foram punidos (!) com uma modesta coima de US $ 550 milhões. Para continuar a operar, feliz, com derivativos financeiros, sem controles governamentais, com consultadorias e comunicações, petróleo e serviços de investimentos.
Os Citigroup e Bank Of America necessitaram do apoio financeiro de Barack Obama. O Goldman Sachs não precisou, pois tinha ganho antes da crise e continuou embolsando. No primeiro trimestre de 2010 teve lucros de US $ 3,3 bilhões. Os seus “colegas” também ganharam: o Citigroup 4.400 milhões de dólares, o JP Morgan 3.3 bilhões e o Bank of America 2.800 milhões.
O Goldman Sachs tira proveito dos antigos gestores e executivos com longos anos de serviço, que passaram a assumir cargosem governos. Osucessor de Silvio Berlusconi no Palazzo Chigi, Mario Monti, foi gerente do banco desde 2005, além de ter sido comissário europeu. Este “Super Mário” estreou-se com um pacote de ajuste, o sétimo contra os italianos nos últimos tempos. O país está super-endividado por um equivalente a 120 por cento do PIB. Berlusconi e os seus antecessores viveram numa festa, sem qualquer intervenção da Comissão Europeia, onde trabalhava Monti. Com o “Decreto Salva Itália”, eles querem fazer um ajuste de 24.000-30.000 milhões de euros, com cada vez mais impostos, com empresas públicas a privatizar e apertando as regras do sistema de reformas (que passará a exigir 42 anos de contribuições).(…)
Outros homens seus
“Onde está o poder mundial”? A resposta deve ter um nome e um local: na sede do banco de negócios Goldman Sachs. O banco norte-americano alcançou um feito raro na história política do mundo: colocar os seus homens na cabeça de dois governos europeus e do banco que governou os destinos das políticas económicas da União Europeia. Mario Draghi, o actual Presidente do Banco Central Europeu; Mario Monti, Presidente do Conselho de Ministros italiano, que substituiu Silvio Berlusconi; Lucas Papademos, o novo primeiro-ministro grego, todos pertencem ao conglomerado do Goldman Sachs.
Outros meios de imprensa divulgaram que Draghi era o encarregado por este banco para vender produtos financeiros “Swap” na Europa, que estiveram no cerne da crise que estalou em 2007-2008. E agora os seus patrões recompensaram-no, com uma posição-chave no continente europeu? Esses “swaps” permitiram ao governo grego a maquilhagem da sua dívida em 2000, para os seus números manipulados permitirem a entrada do país na zona euro. Vendidos por Draghi e comprados pela Grécia, o titular do Banco Central grego era Lucas Papademos, aquele que recebeu agora em Atenas o cargo de chefe de governo, após a derrocada do “socialista” Yorgos Papandreou.
É de supor que agora o titular do BCE e o premier grego estarão de acordo mais facilmente, dada a sua estreita relação e o facto de obedecerem aos mesmos chefes. Papademos estudou em universidades americanas e de lá saltou para altos postos de gestão no banco. Papandreou também foi aluno nos Estados Unidos, embora depois tenha tomado o lado da social-democracia. Os magnatas das finanças são hábeis em colocar os ovos em várias cestas. Eles apostam nos “swaps”, ADO, subprime, dólar, euro, iene, marco ou qualquer outra coisa, mas sempre saem em vantagem.
Dias atrás Papademos apresentou o enésimo plano de ajustamento para os helenos, que foi aprovado: impostos mais elevados, garantindo 7,1 por cento mais nas receitas e um corte dos de salários e seguros sociais de 5 bilhões de €. O primeiro ministro não chorou como a ministra do Trabalho italiana Elsa Fornero, ao informar as más notícias sobre estes ajustes no seu país.
As medidas na Grécia motivaram a sétima greve geral dos sindicatos que tendem a mobilizar-se activamente e a chocarem com a polícia. É um caso muito avançado em toda a Europa nos movimentos de indignados, geralmente mais passivos nesta matéria.
Você também, Geithner?
O domínio que o Banco Goldman Sachs exerce sobre os poderes políticos não é limitado às fronteiras da Europa. A sua sede foi sempreem Nova York, com tentáculos até à Casa Branca, através da Secretaria do Tesouro.
O actual ocupante desta última unidade, Timothy Geithner, foi gerente da empresa de Henry Kissinger em primeira instância, do FMI em seguida e posteriormente do Goldman. Esta semana foi para a Europa para conversar com as autoridades da União sobre como podem desactivar os “incêndios” no velho continente, antes que os próprios fogos norte-americanos se propaguem outra vez.
O Secretário do Tesouro cruzou o Atlântico para se encontrar com Draghi em Frankfurt, com as autoridades francesas, com o futuro presidente do governo de Espanha, Mariano Rajoy e mais tarde em Milão com Monti, o presidente do Conselho de Ministros italiano. Como se vê, o cartel dos Goldman´s boy´s está muito activo; ele alega estar a reparar os danos de uma crise que ele mesmo causou.
Antes de Geithner no Tesouro esteve Henry Paulson, com George W. Bush, depois de ter sido director da Goldman Sachs de1974 a1998. Paulson trabalhou com Lawrence Summers, também da equipe do banco, que foi funcionário de Bill Clinton junto com Robert Rubin, do Citibank, passando em2009 aconselheiro económico de Obama.
Por isso, alguns autores têm apontado a ligação do banco com ministros e chefes de governo. “Raposas para cuidar das galinhas: homens de Goldman Sachs tomam as rédeas da Europa”, publicou A.G. em “El Confidencial, 17/11. Aqui citou um artigo publicado no Le Monde, referindo as relações políticas entre Monti, Draghi e Papademos.
Entre os muitos vasos comunicantes desta entidade bancária com baseem Nova Yorkcom a política internacional, menciona-se também Paul Deighton, que trabalhou durante 22 anos no banco e agora é director-geral do Comité de organização dos Jogos Olímpicos de Londres 2012.”
Para quê este banco estadunidense e os colegas Citigroup, Bank Of America, etc, usam a sua influência política? O negócio está à vista. Em primeiro lugar,
para garantir a impunidade por crimes cometidos no desencadear da crise. Em segundo lugar, para garantir bons pacotes de auxílios estatais, enquanto durar a situação de emergência. E terceiro, para ganhar mais contratos com as acessórias a governos e empresas, durante a crise e a futura saída [?!] da mesma.
Enquanto isso, desmentindo todas as declarações e todos os compromissos, os controles e regulamentos para o capital financeiro e a especulação dormem algures em alguma gaveta no G-20. Achave atirou-a ao mar o Goldman Sachs e nesse mar também faz negócios: tem acções na Desiré, uma empresa britânica que procura petróleo nas Malvinas.
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quarta-feira, 14 de dezembro de 2011
O Código de Hammurabi era mais sábio
A escravidão da dívida – Porque ela destruiu Roma e porque nos destruirá se não for travada
por Michael Hudson
O Livro V da Política, de Aristóteles, descreve a eterna transição de oligarquias que se transformam a si próprias em aristocracias hereditárias – as quais acabam por ser derrubadas por tiranos ou desenvolvem rivalidades internas quando algumas famílias decidem "trazer a multidão para o seu campo" e introduzir solenemente a democracia, dentro da qual mais uma vez emerge uma oligarquia, seguida por aristocracia, democracia e assim por diante ao longo da história.
A dívida tem sido a dinâmica principal que conduz estas mudanças – sempre com novas reviravoltas. Ela polariza riqueza para criar uma classe credora, cujo domínio oligárquico é finalizado quando novos líderes ("tiranos" para Aristóteles) ganham apoio popular através do cancelamento de dívidas e redistribuição da propriedade ou pela captação do seu usufruto para o estado.
Desde o Renascimento, contudo, banqueiros transferiram seu apoio político para democracias. Isto não reflectiu convicções políticas igualitárias ou liberais, mas antes um desejo de melhor segurança para os seus empréstimos. Como explicou James Steuart em 1767, contratações de empréstimos da realeza permaneciam assuntos privados ao invés de dívidas verdadeiramente públicas. Para que dívidas de um soberano se tornassem vinculada a todo o país, representantes eleitos tinham de aprovar impostos para pagar os encargos de juros.
Ao dar aos contribuintes esta voz no governo, as democracias holandesa e britânica proporcionaram aos credores muito mais segurança de pagamento do que as que tinham com reis e príncipes cujas dívidas morriam consigo. Mas os recentes protestos da dívida da Islândia à Grécia e à Espanha sugerem que os credores estão a transferir o seu apoio para longe de democracias. Eles estão a exigir austeridade fiscal e mesmo privatizações baratas.
Isto é uma viragem da finança internacional para um novo modo de guerra. O seu objectivo é o mesmo das conquistas militares de tempos passados: apropriar-se de recursos minerais e territoriais, assim como da infraestrutura pública, e extrair tributos. Em resposta, democracias estão a exigir referendos sobre se pagam a credores através da liquidação do domínio público e aumentos de impostos para impor desemprego, salários em queda e depressão económica. A alternativa é reduzir dívidas ou mesmo anulá-las, e reafirmar o controle regulador sobre o sector financeiro.
Governantes do Médio Oriente proclamavam tábuas rasas para devedores a fim de preservar o equilíbrio económico
A cobrança de juros sobre avanços de bens ou dinheiro originalmente não se destinava a polarizar economias. Administrados a princípio no terceiro milénio AC como um acordo contratual entre templos e palácios sumérios com mercadores e empresários que tipicamente trabalhavam na burocracia real, supunha-se que o juro a 20 por cento (duplicando o principal em cinco anos) se assemelhasse a uma fatia razoável dos retornos do comércio a longa distância ou do arrendamento de terra e outros activos públicos tais como oficinas, barcos e casas de bebidas alcoólicas.
Como esta prática foi privatizada pelos cobradores reais de licenças de uso e de rendas, a "divina majestade" protegia devedores agrários. As leis de Hammurabi (1750 AC) cancelavam suas dívidas em tempos de enchentes ou de seca. Todos os governantes da sua dinastia na Babilónia principiavam o seu primeiro ano no ano com o cancelamento de dívidas agrárias de modo a remover pagamentos atrasados através da proclamação de uma tábua rasa (clean slate). Direitos sobre escravos, terra ou colheitas e outros compromissos eram devolvidos aos devedores para "restaurar a ordem" numa idealizada condição "original" de equilíbrio. Esta prática sobreviveu no Ano Jubileu da Lei Mosaica em Leviticus 25.
A lógica era bastante clara. Sociedades antigas precisavam por exércitos em campo para defender a sua terra e isto exigia libertar cidadãos endividados da servidão. As leis de Hammurabi protegiam carroceiros e outros combatentes de serem reduzidos à servidão da dívida e impediam credores de tomarem as colheitas de arrendatários das terras reais e de outras terras públicas e ainda da terra comunal que devia [fornecer] mão-de-obra e serviço militar ao palácio.
No Egipto, o faraó Bakenranef (720-715 AC, "Bocchoris" em grego) proclamou um amnistia da dívida e aboliu a servidão da dívida quando confrontado com uma ameaça militar da Etiópia. De acordo com Diodorus da Sicília (I, 79, escrevendo em 40-30 AC), ele determinou que se um devedor contestasse a pretensão, a dívida era anulada se o credor não pudesse apoiar a sua pretensão através de um contrato escrito (parece que os credores sempre tiveram inclinação a exagerar o saldo devido). O faraó raciocinou que "os corpos dos cidadãos deveriam pertencer ao estado, a fim de que ele possa dispor dos serviços que os seus cidadãos devem prestar-lhe, tanto em tempos de guerra como de paz. Portanto ele sentiu que seria absurdo para um soldado ... ser arrastado para a prisão pelo seu credor devido a um empréstimo não pago, e que a cobiça de cidadãos privados assim poria em perigo a segurança de todos".
O facto de os principais credores do Médio Oriente serem o palácio, templos e seus cobradores tornava politicamente fácil cancelar as dívidas. É sempre fácil anular dívidas devidas a si próprio. Mesmo imperadores romanos queimaram os registos de impostos para impedir uma crise. Mas era muito mais difícil cancelar dívidas devidas a credores privados quando a prática de cobrar juros difundiu-se às tribos do Mediterrâneo ocidental após cerca de 750 AC. Ao invés de permitir a famílias colmatarem fossos entre rendimento e despesa, a dívida tornou-se a principal alavanca da expropriação de terra, polarizando comunidades entre oligarquias credoras e clientes endividados. Em Judá, o profeta Isaias (5:8-9) condenou arrestos por parte de credores os quais "acrescentavam casa a casa e juntavam campo a campo até que nenhum espaço fosse deixado e você vivesse solitário na terra".
O poder do credor e o crescimento estável raramente andaram juntos. A maior parte das dívidas pessoais neste período clássico eram o produto de pequenas quantias de dinheiro emprestadas a indivíduos a viverem à beira da subsistência e que não podiam sustentar-se. O confisco de terra e activos – e da liberdade pessoal – forçava devedores à servidão que se tornava irreversível. Por volta do século VII AC, "tiranos" (líderes populares) emergiram para derrubar as aristocracias Corinto e outras ricas cidades gregas, ganhando apoio pelo cancelamento de dívidas. De um modo menos tirânico, Sólon fundou a democracia ateniense em 594 AC ao banir a servidão da dívida.
Mas ressurgiram oligarquias e exigiram pagamento em Roma quando os reis Agis e Cleómenes de Esparta, e seu sucessor Nabis, quis cancelar dívidas no fim do terceiro milénio AC. Eles foram mortos e os seus apoiantes expulsos. Tem sido uma constante política da história, desde a antiguidade, que interesses de credores se oponham tanto à democracia popular como ao poder real capaz de limitar a conquista financeira da sociedade – uma conquista destinada ligar pretensões a dívidas portadoras de juros ao pagamento de tanto quanto possível do excedente económico.
Quando os irmãos Graco e os seus seguidores tentaram reformar as leis do crédito em 133 AC, a classe senatorial dominante actuou com violência, matando-os e inaugurando um século de Guerra Social, resolvida pela ascensão de Augusto a imperador, em 29 AC.
A oligarquia credora de Roma vence a Guerra Social, escraviza a população e provoca uma Época de Trevas
As coisas foram mais sangrentas no exterior. Aristóteles não mencionou a construção do império como parte do seu esquema político, mas a conquistas estrangeira sempre foi um factor importante na imposição de dívidas e as dívidas de guerra sempre foram a principal causa da dívida pública em tempos modernos. A mais rude imposição de dívida da antiguidade foi a de Roma, cujos credores a difundiram para assolar a Ásia Menor, sua província mais próspera. A regra da lei quase desapareceu quando chegaram os "cavaleiros" colectores de impostos. Mitríades de Pontus levou a três revoltas populares, populações locais em Efeso e outras cidades levantaram-se e mataram 80 mil romanos em 88 AC. O exército romano retaliou e Sila impôs um tributo de guerra de 20 mil talentos em 84 AC. Encargos por juros atrasados multiplicaram esta soma em seis vezes por volta de 70 AC.
Dentre os principais historiadores de Roma, Lívio, Plutarco e Diodorus atribuíram a queda da República à intransigência dos credores ao travar a Guerra Social de um século marcada pelo assassínio político de 133 a 29 AC. Líderes populistas quiseram ganhar adeptos advogando cancelamentos de dívida (ex., a conspiração de Catilina em 63-62 AC). Eles foram mortos. Por volta do segundo século DC cerca de um quarto da população estava reduzida à servidão. No século V a economia de Roma entrou em colapso, despojada de dinheiro. A subsistência regrediu ao mundo rural.
Credores encontram uma razão legalista para apoiar a democracia parlamentar
Quando a banca recuperou-se depois de as Cruzadas saquearem Bizâncio e injectarem prata e ouro para ressuscitar o comércio da Europa Ocidental, a oposição cristã à cobrança de juro foi ultrapassada pela combinação de prestamistas prestigiosos (os Cavaleiros Templários e Hospitalários que proporcionaram crédito durante as Cruzadas) e seu principais clientes – reis, primeiro para pagar a Igreja e cada vez mais para travar a guerra. Mas dívidas reais ficavam inválidas quando morriam reis. Os Bardi e Peruzzi foram à bancarrota em 1345 quando Eduardo III repudiou suas dívidas de guerra. Famílias banqueiras perderam mais com empréstimos aos Habsburgo e Bourbon, déspotas nos tronos de Espanha, Áustria e França.
As coisas mudaram com a democracia holandesa, que procurava ganhar e assegurar a sua liberdade dos Habsburgo da Espanha. O facto de que o seu parlamento estava a contratar dívidas públicas permanentes por conta do estado permitiu aos Países Baixos levantar empréstimos para empregar mercenários numa época em que dinheiro e crédito eram o dinheiro para o financiamento da guerra. O acesso ao crédito "era consequentemente a mais poderosa arma na luta pela sua liberdade", escreveu Richard Ehrenberg em seu Capital and Finance in the Age of the Renaissance (1928): "Alguém que desse um crédito a um príncipe sabia que o reembolso da dívida dependia apenas da capacidade e vontade de pagar do devedor. O caso era muito diferente para as cidades, as quais tinham poder como soberanas, mas eram também corporações, associações de indivíduos mantidos em vínculo comum. De acordo com a lei geralmente aceite cada burguês individual era responsável pelas dívidas da cidade tanto com a sua pessoa como com a sua propriedade".
O feito financeiro do governo parlamentar foi portanto estabelecer dívidas que não eram meramente obrigações pessoais de príncipes, mas eram verdadeiramente públicas e vinculativas sem importar quem ocupasse o trono. Eis porque as duas primeiras nações democráticas, a Holanda e a Grã-Bretanha após a sua revolução de 1688, desenvolveram os mercados de capital mais activos e progrediram até tornarem-se as principais potências militares. O irónico é que foi a necessidade de financiamento de guerra que promoveu a democracia, formando uma trindade simbiótica entre fazer guerra, crédito e democracia parlamentar que perdurou até os dias de hoje.
Nesta época "a posição legal do Rei enquanto tomar de empréstimos era obscura e ainda era duvidoso que os seus credores tivessem qualquer remédio isso em caso de incumprimento" (Charles Wilson, England's Apprenticeship: 1603-1763: 1965). Quanto mais despóticas se tornavam a Espanha, Áustria e França, maior a dificuldade que encontravam para financiar as suas aventuras militares. No fim do século XVIII a Áustria foi deixada "sem crédito e, consequentemente, sem muita dívida", o país da Europa com crédito menos valioso e o pior armado, totalmente dependente de subsídios britânicos e garantias de empréstimos no tempo das Guerras Napoleónicas.
As finanças acomodam-se à democracia, mas então pressionam pela oligarquia
Enquanto as reformas democráticas do século XIX reduziram o poder das aristocracias territoriais de controlar parlamentos, banqueiros movimentaram-se com flexibilidade para alcançar um relacionamento simbiótico com praticamente toda forma de governo. Em França, seguidores de Saint-Simon promoveram a ideia de bancos a actuarem como fundos mútuos, concedendo crédito contra participação no lucro. O estado alemão fez uma aliança com a grande banca e a indústria pesada. Marx escreveu optimistamente acerca de como o socialismo faria as finanças produtivas ao invés de parasitas. Nos Estados Unidos, a regulação de empresas de serviços públicos (utilities) andou de mãos dadas com retornos garantidos. Na China, Sun-Yat-Sen escreveu em 1922: "Pretendo por todas as indústrias nacionais da China dentro de um Great Trust possuído pelo povo chinês e financiado com capital internacional para benefício mútuo".
A I Guerra Mundial assistiu os Estados Unidos a substituírem a Grã-Bretanha como a principal nação credora, e no fim da II Guerra Mundial haviam açambarcado uns 80 por cento do ouro monetário do mundo. Seus diplomatas moldaram o FMI e o Banco Mundial de acordo com linhas orientadas para o credor que financiavam a dependência comercial, principalmente dos Estados Unidos. Empréstimos para financiar défices comerciais e de pagamentos foram sujeitos a "condicionalidades" que mudavam o planeamento económico para oligarquias clientes e ditaduras militares. A resposta democrática aos planos de austeridade resultantes que extorquiam o serviço da dívida foi incapaz de ir muito além dos "tumultos FMI", até que a Argentina rejeitou a sua dívida externa.
Uma austeridade semelhante, orientada para o credor, está agora a ser imposta à Europa pelo Banco Central Europeu (BCE) e a burocracia da UE. Ostensivamente, governos sociais-democratas foram direccionados para o salvamento de bancos ao invés de relançar o crescimento económico e o emprego. Perdas com empréstimos bancários apodrecidos e especulações são levadas para dentro do balanço público ao mesmo tempo que se verificam reduções de despesas públicas e mesmo liquidações de infraestruturas. A resposta de contribuintes presos à dívida resultante tem sido o aumento de protestos populares, a começar pela Islândia e Letónia, em Janeiro de 2009, e mais manifestações generalizadas na Grécia e Espanha neste Outono para protestar contra a recusa dos seus governos a efectuar referendos sobre estes salvamentos fatídicos de possuidores estrangeiros de títulos.
A transferir o planeamento para banqueiros e para longe de representantes públicos eleitos
Toda economia é planeada. Isto tradicionalmente tem sido a função do governo. Abdicar deste papel com o slogan dos "mercados livre" deixa-a nas mãos de bancos. Mas o planeamento que privilegia a criação e distribuição de crédito torna-se ainda mais centralizado do que aquele de responsáveis públicos eleitos. E para tornar as coisas piores, o período de tempo financeiro habitual é o curto prazo, acabando na venda de activos. Ao procurarem os seus próprios ganhos, os bancos tendem a destruir a economia. O excedente acaba por ser consumido pelos juros e outros encargos financeiros, não deixando receitas para novo investimento de capital ou despesas sociais básicas.
Esta é a razão porque abdicar do controle político em favor de uma classe credora raramente anda junto com o crescimento económico e a elevação de padrões de vida. A tendência para as dívidas crescerem mais rapidamente do que a capacidade da população para pagar tem sido uma constante básica ao longo de toda a história registada. As dívidas aumentam exponencialmente, absorvendo o excedente e reduzindo grande parte da população ao equivalente da servidão da dívida. Para restaurar o equilíbrio económico, o clamor da antiguidade pelo cancelamento de dívida procurava o que a Idade do Bronze no Médio Oriente alcançou por decreto real: cancelar o super-crescimento de dívidas.
Em tempos mais modernos, as democracias têm pressionado um estado forte a tributar o rendimento e a riqueza rentista e, quando preciso, a reduzir (write down) dívidas. Isto é feito mais prontamente quando o próprio estado cria moeda e crédito. E é feito menos facilmente quando bancos traduzem os seus ganhos em poder político. Quando é permitido aos bancos auto-regularem-se e lhes é dado poder de veto sobre reguladores do governo, a economia é distorcida para permitir aos credores entregarem-se a jogos especulativos e a fraude directa que assinalaram a última década. A queda do Império Romano demonstra o que acontece quando exigências de credores não são controladas. Sob estas condições a alternativa ao planeamento e regulação governamental do sector financeiro torna-se uma estrada para a servidão da dívida.
Finanças versus governo; oligarquia versus democracia
Democracia envolve subordinação da dinâmica financeira a fim de servir o equilíbrio e o crescimento económica – e tributação do rendimento rentista ou manutenção de monopólios básicos no domínio público. O rendimento "livre" da propriedade não tributada ou privatizada fica comprometido com os bancos, a ser capitalizado em empréstimos maiores. Financiada pela alavancagem da dívida, a inflação dos preços dos activos aumenta a riqueza rentista enquanto endivida a economia como um todo. A economia contrai-se, caindo em situação líquida negativa.
O sector financeiro já ganhou influência suficiente para utilizar tais emergências como oportunidades para convencer governos de que a economia entrará em colapso se eles não "salvarem os bancos". Na prática isto significa consolidar o seu controle sobre a política, a qual eles utilizam de maneiras que promovem a polarização das economias. O modelo básico é o que ocorreu na Roma antiga, movendo-se da democracia para oligarquia. De facto, dar prioridade a banqueiros e deixar o planeamento económico ser ditado pela UE, BCE e FMI ameaça despir o estado-nação do poder de cunhar ou imprimir moeda e cobrar impostos.
O conflito resultante está a contrapor os interesses financeiros à auto-determinação nacional. A ideia de um banco central independente ser "a característica da democracia" é um eufemismo para abdicar da mais importante decisão política – a capacidade de criar dinheiro e crédito – em favor do sector financeiro. Ao invés de deixar a opção política a referendos populares, o resgate de bancos organizado pela UE e BCE representa agora a categoria máxima de dívida nacional ascendente. As dívidas de banco privados assumidas do balanço do governo na Irlanda e na Grécia foram transformadas em obrigações do contribuinte. O mesmo é verdadeiro para os US$13 milhões de milhões (trillion) da América acrescentados desde Setembro de 2008 (incluindo US$5,3 milhões de milhões em hipotecas podres Fannie Mae e Freddie Mac assumidos dentro do balanço do governo, e os US$2 milhões de milhões de swaps "dinheiro-por-lixo" ("cash-for-trash") do Federal Reserve).
Isto está a ser ditado por mandatários financeiros eufemizados como tecnocratas. Designados pelos lobbystas credores, o seu papel é apenas calcular quanto desemprego e depressão é preciso para extorquir um excedente a fim de pagar credores por dívidas agora na contabilidade. O que torna este cálculo auto-derrotante é o facto de que a contracção económica – deflação da dívida – torna o fardo da dívida ainda mais impagável.
Nem bancos nem autoridades públicos (ou académicos da corrente principal, a propósito) calcularam a capacidade realista da economia para pagar – isto é, para pagar sem contrair a economia. Através dos seus media e dos seus think tanks, eles convenceram populações que o meio de ficarem ricos mais rapidamente é tomar dinheiro emprestado para comprar imobiliário, acções e títulos a aumentarem de preço – por serem inflacionados pelo crédito bancário – e reverterem a tributação progressiva da riqueza do século passado.
Para colocar as coisas mais directamente, o resultado tem sido teoria económica lixo. O seu objectivo é desactivar limitações e inspecções públicas, comutando o poder de planeamento para as mãos da alta finança sob a presunção de que esta é mais eficiente do que a regulação pública. Acusa-se o planeamento e a tributação do governo de serem "a estrada da servidão", como se os "mercados livres" controlados por banqueiros com liberdade de movimento para actuarem imprudentemente não fosse planear em favor de interesses especiais por caminhos que são oligárquicos, não democráticos. Dizem aos governos para pagar salvamentos de dívidas assumidas não para defender países em guerras militares, como em tempos passados, mas para beneficiar a camada mais rica da população através da transferência das suas perdas para os contribuintes.
O fracasso em tomar em consideração os desejos dos eleitores deixa as resultantes dívidas nacionais em terreno politicamente, e mesmo legalmente, instável. Dívidas impostas por decreto, por governos ou agências financeiras estrangeiras diante de forte oposição popular podem ser tão frágeis como aquelas dos Habsburgos e outros déspotas em épocas passadas. Na falta de validação popular, elas podem morrer com o regime que as contraiu. Novos governos podem actuar democraticamente para subordinar a banca e o sector financeiro a fim de servirem a economia, não o inverso.
No mínimo, eles podem procurar pagar através da reintrodução da tributação progressiva da riqueza e do rendimento, comutando o fardo fiscal para a riqueza e propriedade rentista. A re-regulamentação da banca e providenciar uma opção pública para serviços de crédito e banca renovariam o programa social-democrata que parecia bem encaminhado um século atrás.
A Islândia e a Argentina são os exemplos mais recentes, mas também se pode recordar a moratória das dívidas de armas Inter-Aliados e das reparações alemãs em 1931. Um princípio matemático básico, e também político, está em acção: Dívidas que não podem ser pagas, não o serão.
O original encontra-se em www.counterpunch.org/... . Tradução de JF.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
A escravidão da dívida – Porque ela destruiu Roma e porque nos destruirá se não for travada
por Michael Hudson
O Livro V da Política, de Aristóteles, descreve a eterna transição de oligarquias que se transformam a si próprias em aristocracias hereditárias – as quais acabam por ser derrubadas por tiranos ou desenvolvem rivalidades internas quando algumas famílias decidem "trazer a multidão para o seu campo" e introduzir solenemente a democracia, dentro da qual mais uma vez emerge uma oligarquia, seguida por aristocracia, democracia e assim por diante ao longo da história.
A dívida tem sido a dinâmica principal que conduz estas mudanças – sempre com novas reviravoltas. Ela polariza riqueza para criar uma classe credora, cujo domínio oligárquico é finalizado quando novos líderes ("tiranos" para Aristóteles) ganham apoio popular através do cancelamento de dívidas e redistribuição da propriedade ou pela captação do seu usufruto para o estado.
Desde o Renascimento, contudo, banqueiros transferiram seu apoio político para democracias. Isto não reflectiu convicções políticas igualitárias ou liberais, mas antes um desejo de melhor segurança para os seus empréstimos. Como explicou James Steuart em 1767, contratações de empréstimos da realeza permaneciam assuntos privados ao invés de dívidas verdadeiramente públicas. Para que dívidas de um soberano se tornassem vinculada a todo o país, representantes eleitos tinham de aprovar impostos para pagar os encargos de juros.
Ao dar aos contribuintes esta voz no governo, as democracias holandesa e britânica proporcionaram aos credores muito mais segurança de pagamento do que as que tinham com reis e príncipes cujas dívidas morriam consigo. Mas os recentes protestos da dívida da Islândia à Grécia e à Espanha sugerem que os credores estão a transferir o seu apoio para longe de democracias. Eles estão a exigir austeridade fiscal e mesmo privatizações baratas.
Isto é uma viragem da finança internacional para um novo modo de guerra. O seu objectivo é o mesmo das conquistas militares de tempos passados: apropriar-se de recursos minerais e territoriais, assim como da infraestrutura pública, e extrair tributos. Em resposta, democracias estão a exigir referendos sobre se pagam a credores através da liquidação do domínio público e aumentos de impostos para impor desemprego, salários em queda e depressão económica. A alternativa é reduzir dívidas ou mesmo anulá-las, e reafirmar o controle regulador sobre o sector financeiro.
Governantes do Médio Oriente proclamavam tábuas rasas para devedores a fim de preservar o equilíbrio económico
A cobrança de juros sobre avanços de bens ou dinheiro originalmente não se destinava a polarizar economias. Administrados a princípio no terceiro milénio AC como um acordo contratual entre templos e palácios sumérios com mercadores e empresários que tipicamente trabalhavam na burocracia real, supunha-se que o juro a 20 por cento (duplicando o principal em cinco anos) se assemelhasse a uma fatia razoável dos retornos do comércio a longa distância ou do arrendamento de terra e outros activos públicos tais como oficinas, barcos e casas de bebidas alcoólicas.
Como esta prática foi privatizada pelos cobradores reais de licenças de uso e de rendas, a "divina majestade" protegia devedores agrários. As leis de Hammurabi (1750 AC) cancelavam suas dívidas em tempos de enchentes ou de seca. Todos os governantes da sua dinastia na Babilónia principiavam o seu primeiro ano no ano com o cancelamento de dívidas agrárias de modo a remover pagamentos atrasados através da proclamação de uma tábua rasa (clean slate). Direitos sobre escravos, terra ou colheitas e outros compromissos eram devolvidos aos devedores para "restaurar a ordem" numa idealizada condição "original" de equilíbrio. Esta prática sobreviveu no Ano Jubileu da Lei Mosaica em Leviticus 25.
A lógica era bastante clara. Sociedades antigas precisavam por exércitos em campo para defender a sua terra e isto exigia libertar cidadãos endividados da servidão. As leis de Hammurabi protegiam carroceiros e outros combatentes de serem reduzidos à servidão da dívida e impediam credores de tomarem as colheitas de arrendatários das terras reais e de outras terras públicas e ainda da terra comunal que devia [fornecer] mão-de-obra e serviço militar ao palácio.
No Egipto, o faraó Bakenranef (720-715 AC, "Bocchoris" em grego) proclamou um amnistia da dívida e aboliu a servidão da dívida quando confrontado com uma ameaça militar da Etiópia. De acordo com Diodorus da Sicília (I, 79, escrevendo em 40-30 AC), ele determinou que se um devedor contestasse a pretensão, a dívida era anulada se o credor não pudesse apoiar a sua pretensão através de um contrato escrito (parece que os credores sempre tiveram inclinação a exagerar o saldo devido). O faraó raciocinou que "os corpos dos cidadãos deveriam pertencer ao estado, a fim de que ele possa dispor dos serviços que os seus cidadãos devem prestar-lhe, tanto em tempos de guerra como de paz. Portanto ele sentiu que seria absurdo para um soldado ... ser arrastado para a prisão pelo seu credor devido a um empréstimo não pago, e que a cobiça de cidadãos privados assim poria em perigo a segurança de todos".
O facto de os principais credores do Médio Oriente serem o palácio, templos e seus cobradores tornava politicamente fácil cancelar as dívidas. É sempre fácil anular dívidas devidas a si próprio. Mesmo imperadores romanos queimaram os registos de impostos para impedir uma crise. Mas era muito mais difícil cancelar dívidas devidas a credores privados quando a prática de cobrar juros difundiu-se às tribos do Mediterrâneo ocidental após cerca de 750 AC. Ao invés de permitir a famílias colmatarem fossos entre rendimento e despesa, a dívida tornou-se a principal alavanca da expropriação de terra, polarizando comunidades entre oligarquias credoras e clientes endividados. Em Judá, o profeta Isaias (5:8-9) condenou arrestos por parte de credores os quais "acrescentavam casa a casa e juntavam campo a campo até que nenhum espaço fosse deixado e você vivesse solitário na terra".
O poder do credor e o crescimento estável raramente andaram juntos. A maior parte das dívidas pessoais neste período clássico eram o produto de pequenas quantias de dinheiro emprestadas a indivíduos a viverem à beira da subsistência e que não podiam sustentar-se. O confisco de terra e activos – e da liberdade pessoal – forçava devedores à servidão que se tornava irreversível. Por volta do século VII AC, "tiranos" (líderes populares) emergiram para derrubar as aristocracias Corinto e outras ricas cidades gregas, ganhando apoio pelo cancelamento de dívidas. De um modo menos tirânico, Sólon fundou a democracia ateniense em 594 AC ao banir a servidão da dívida.
Mas ressurgiram oligarquias e exigiram pagamento em Roma quando os reis Agis e Cleómenes de Esparta, e seu sucessor Nabis, quis cancelar dívidas no fim do terceiro milénio AC. Eles foram mortos e os seus apoiantes expulsos. Tem sido uma constante política da história, desde a antiguidade, que interesses de credores se oponham tanto à democracia popular como ao poder real capaz de limitar a conquista financeira da sociedade – uma conquista destinada ligar pretensões a dívidas portadoras de juros ao pagamento de tanto quanto possível do excedente económico.
Quando os irmãos Graco e os seus seguidores tentaram reformar as leis do crédito em 133 AC, a classe senatorial dominante actuou com violência, matando-os e inaugurando um século de Guerra Social, resolvida pela ascensão de Augusto a imperador, em 29 AC.
A oligarquia credora de Roma vence a Guerra Social, escraviza a população e provoca uma Época de Trevas
As coisas foram mais sangrentas no exterior. Aristóteles não mencionou a construção do império como parte do seu esquema político, mas a conquistas estrangeira sempre foi um factor importante na imposição de dívidas e as dívidas de guerra sempre foram a principal causa da dívida pública em tempos modernos. A mais rude imposição de dívida da antiguidade foi a de Roma, cujos credores a difundiram para assolar a Ásia Menor, sua província mais próspera. A regra da lei quase desapareceu quando chegaram os "cavaleiros" colectores de impostos. Mitríades de Pontus levou a três revoltas populares, populações locais em Efeso e outras cidades levantaram-se e mataram 80 mil romanos em 88 AC. O exército romano retaliou e Sila impôs um tributo de guerra de 20 mil talentos em 84 AC. Encargos por juros atrasados multiplicaram esta soma em seis vezes por volta de 70 AC.
Dentre os principais historiadores de Roma, Lívio, Plutarco e Diodorus atribuíram a queda da República à intransigência dos credores ao travar a Guerra Social de um século marcada pelo assassínio político de 133 a 29 AC. Líderes populistas quiseram ganhar adeptos advogando cancelamentos de dívida (ex., a conspiração de Catilina em 63-62 AC). Eles foram mortos. Por volta do segundo século DC cerca de um quarto da população estava reduzida à servidão. No século V a economia de Roma entrou em colapso, despojada de dinheiro. A subsistência regrediu ao mundo rural.
Credores encontram uma razão legalista para apoiar a democracia parlamentar
Quando a banca recuperou-se depois de as Cruzadas saquearem Bizâncio e injectarem prata e ouro para ressuscitar o comércio da Europa Ocidental, a oposição cristã à cobrança de juro foi ultrapassada pela combinação de prestamistas prestigiosos (os Cavaleiros Templários e Hospitalários que proporcionaram crédito durante as Cruzadas) e seu principais clientes – reis, primeiro para pagar a Igreja e cada vez mais para travar a guerra. Mas dívidas reais ficavam inválidas quando morriam reis. Os Bardi e Peruzzi foram à bancarrota em 1345 quando Eduardo III repudiou suas dívidas de guerra. Famílias banqueiras perderam mais com empréstimos aos Habsburgo e Bourbon, déspotas nos tronos de Espanha, Áustria e França.
As coisas mudaram com a democracia holandesa, que procurava ganhar e assegurar a sua liberdade dos Habsburgo da Espanha. O facto de que o seu parlamento estava a contratar dívidas públicas permanentes por conta do estado permitiu aos Países Baixos levantar empréstimos para empregar mercenários numa época em que dinheiro e crédito eram o dinheiro para o financiamento da guerra. O acesso ao crédito "era consequentemente a mais poderosa arma na luta pela sua liberdade", escreveu Richard Ehrenberg em seu Capital and Finance in the Age of the Renaissance (1928): "Alguém que desse um crédito a um príncipe sabia que o reembolso da dívida dependia apenas da capacidade e vontade de pagar do devedor. O caso era muito diferente para as cidades, as quais tinham poder como soberanas, mas eram também corporações, associações de indivíduos mantidos em vínculo comum. De acordo com a lei geralmente aceite cada burguês individual era responsável pelas dívidas da cidade tanto com a sua pessoa como com a sua propriedade".
O feito financeiro do governo parlamentar foi portanto estabelecer dívidas que não eram meramente obrigações pessoais de príncipes, mas eram verdadeiramente públicas e vinculativas sem importar quem ocupasse o trono. Eis porque as duas primeiras nações democráticas, a Holanda e a Grã-Bretanha após a sua revolução de 1688, desenvolveram os mercados de capital mais activos e progrediram até tornarem-se as principais potências militares. O irónico é que foi a necessidade de financiamento de guerra que promoveu a democracia, formando uma trindade simbiótica entre fazer guerra, crédito e democracia parlamentar que perdurou até os dias de hoje.
Nesta época "a posição legal do Rei enquanto tomar de empréstimos era obscura e ainda era duvidoso que os seus credores tivessem qualquer remédio isso em caso de incumprimento" (Charles Wilson, England's Apprenticeship: 1603-1763: 1965). Quanto mais despóticas se tornavam a Espanha, Áustria e França, maior a dificuldade que encontravam para financiar as suas aventuras militares. No fim do século XVIII a Áustria foi deixada "sem crédito e, consequentemente, sem muita dívida", o país da Europa com crédito menos valioso e o pior armado, totalmente dependente de subsídios britânicos e garantias de empréstimos no tempo das Guerras Napoleónicas.
As finanças acomodam-se à democracia, mas então pressionam pela oligarquia
Enquanto as reformas democráticas do século XIX reduziram o poder das aristocracias territoriais de controlar parlamentos, banqueiros movimentaram-se com flexibilidade para alcançar um relacionamento simbiótico com praticamente toda forma de governo. Em França, seguidores de Saint-Simon promoveram a ideia de bancos a actuarem como fundos mútuos, concedendo crédito contra participação no lucro. O estado alemão fez uma aliança com a grande banca e a indústria pesada. Marx escreveu optimistamente acerca de como o socialismo faria as finanças produtivas ao invés de parasitas. Nos Estados Unidos, a regulação de empresas de serviços públicos (utilities) andou de mãos dadas com retornos garantidos. Na China, Sun-Yat-Sen escreveu em 1922: "Pretendo por todas as indústrias nacionais da China dentro de um Great Trust possuído pelo povo chinês e financiado com capital internacional para benefício mútuo".
A I Guerra Mundial assistiu os Estados Unidos a substituírem a Grã-Bretanha como a principal nação credora, e no fim da II Guerra Mundial haviam açambarcado uns 80 por cento do ouro monetário do mundo. Seus diplomatas moldaram o FMI e o Banco Mundial de acordo com linhas orientadas para o credor que financiavam a dependência comercial, principalmente dos Estados Unidos. Empréstimos para financiar défices comerciais e de pagamentos foram sujeitos a "condicionalidades" que mudavam o planeamento económico para oligarquias clientes e ditaduras militares. A resposta democrática aos planos de austeridade resultantes que extorquiam o serviço da dívida foi incapaz de ir muito além dos "tumultos FMI", até que a Argentina rejeitou a sua dívida externa.
Uma austeridade semelhante, orientada para o credor, está agora a ser imposta à Europa pelo Banco Central Europeu (BCE) e a burocracia da UE. Ostensivamente, governos sociais-democratas foram direccionados para o salvamento de bancos ao invés de relançar o crescimento económico e o emprego. Perdas com empréstimos bancários apodrecidos e especulações são levadas para dentro do balanço público ao mesmo tempo que se verificam reduções de despesas públicas e mesmo liquidações de infraestruturas. A resposta de contribuintes presos à dívida resultante tem sido o aumento de protestos populares, a começar pela Islândia e Letónia, em Janeiro de 2009, e mais manifestações generalizadas na Grécia e Espanha neste Outono para protestar contra a recusa dos seus governos a efectuar referendos sobre estes salvamentos fatídicos de possuidores estrangeiros de títulos.
A transferir o planeamento para banqueiros e para longe de representantes públicos eleitos
Toda economia é planeada. Isto tradicionalmente tem sido a função do governo. Abdicar deste papel com o slogan dos "mercados livre" deixa-a nas mãos de bancos. Mas o planeamento que privilegia a criação e distribuição de crédito torna-se ainda mais centralizado do que aquele de responsáveis públicos eleitos. E para tornar as coisas piores, o período de tempo financeiro habitual é o curto prazo, acabando na venda de activos. Ao procurarem os seus próprios ganhos, os bancos tendem a destruir a economia. O excedente acaba por ser consumido pelos juros e outros encargos financeiros, não deixando receitas para novo investimento de capital ou despesas sociais básicas.
Esta é a razão porque abdicar do controle político em favor de uma classe credora raramente anda junto com o crescimento económico e a elevação de padrões de vida. A tendência para as dívidas crescerem mais rapidamente do que a capacidade da população para pagar tem sido uma constante básica ao longo de toda a história registada. As dívidas aumentam exponencialmente, absorvendo o excedente e reduzindo grande parte da população ao equivalente da servidão da dívida. Para restaurar o equilíbrio económico, o clamor da antiguidade pelo cancelamento de dívida procurava o que a Idade do Bronze no Médio Oriente alcançou por decreto real: cancelar o super-crescimento de dívidas.
Em tempos mais modernos, as democracias têm pressionado um estado forte a tributar o rendimento e a riqueza rentista e, quando preciso, a reduzir (write down) dívidas. Isto é feito mais prontamente quando o próprio estado cria moeda e crédito. E é feito menos facilmente quando bancos traduzem os seus ganhos em poder político. Quando é permitido aos bancos auto-regularem-se e lhes é dado poder de veto sobre reguladores do governo, a economia é distorcida para permitir aos credores entregarem-se a jogos especulativos e a fraude directa que assinalaram a última década. A queda do Império Romano demonstra o que acontece quando exigências de credores não são controladas. Sob estas condições a alternativa ao planeamento e regulação governamental do sector financeiro torna-se uma estrada para a servidão da dívida.
Finanças versus governo; oligarquia versus democracia
Democracia envolve subordinação da dinâmica financeira a fim de servir o equilíbrio e o crescimento económica – e tributação do rendimento rentista ou manutenção de monopólios básicos no domínio público. O rendimento "livre" da propriedade não tributada ou privatizada fica comprometido com os bancos, a ser capitalizado em empréstimos maiores. Financiada pela alavancagem da dívida, a inflação dos preços dos activos aumenta a riqueza rentista enquanto endivida a economia como um todo. A economia contrai-se, caindo em situação líquida negativa.
O sector financeiro já ganhou influência suficiente para utilizar tais emergências como oportunidades para convencer governos de que a economia entrará em colapso se eles não "salvarem os bancos". Na prática isto significa consolidar o seu controle sobre a política, a qual eles utilizam de maneiras que promovem a polarização das economias. O modelo básico é o que ocorreu na Roma antiga, movendo-se da democracia para oligarquia. De facto, dar prioridade a banqueiros e deixar o planeamento económico ser ditado pela UE, BCE e FMI ameaça despir o estado-nação do poder de cunhar ou imprimir moeda e cobrar impostos.
O conflito resultante está a contrapor os interesses financeiros à auto-determinação nacional. A ideia de um banco central independente ser "a característica da democracia" é um eufemismo para abdicar da mais importante decisão política – a capacidade de criar dinheiro e crédito – em favor do sector financeiro. Ao invés de deixar a opção política a referendos populares, o resgate de bancos organizado pela UE e BCE representa agora a categoria máxima de dívida nacional ascendente. As dívidas de banco privados assumidas do balanço do governo na Irlanda e na Grécia foram transformadas em obrigações do contribuinte. O mesmo é verdadeiro para os US$13 milhões de milhões (trillion) da América acrescentados desde Setembro de 2008 (incluindo US$5,3 milhões de milhões em hipotecas podres Fannie Mae e Freddie Mac assumidos dentro do balanço do governo, e os US$2 milhões de milhões de swaps "dinheiro-por-lixo" ("cash-for-trash") do Federal Reserve).
Isto está a ser ditado por mandatários financeiros eufemizados como tecnocratas. Designados pelos lobbystas credores, o seu papel é apenas calcular quanto desemprego e depressão é preciso para extorquir um excedente a fim de pagar credores por dívidas agora na contabilidade. O que torna este cálculo auto-derrotante é o facto de que a contracção económica – deflação da dívida – torna o fardo da dívida ainda mais impagável.
Nem bancos nem autoridades públicos (ou académicos da corrente principal, a propósito) calcularam a capacidade realista da economia para pagar – isto é, para pagar sem contrair a economia. Através dos seus media e dos seus think tanks, eles convenceram populações que o meio de ficarem ricos mais rapidamente é tomar dinheiro emprestado para comprar imobiliário, acções e títulos a aumentarem de preço – por serem inflacionados pelo crédito bancário – e reverterem a tributação progressiva da riqueza do século passado.
Para colocar as coisas mais directamente, o resultado tem sido teoria económica lixo. O seu objectivo é desactivar limitações e inspecções públicas, comutando o poder de planeamento para as mãos da alta finança sob a presunção de que esta é mais eficiente do que a regulação pública. Acusa-se o planeamento e a tributação do governo de serem "a estrada da servidão", como se os "mercados livres" controlados por banqueiros com liberdade de movimento para actuarem imprudentemente não fosse planear em favor de interesses especiais por caminhos que são oligárquicos, não democráticos. Dizem aos governos para pagar salvamentos de dívidas assumidas não para defender países em guerras militares, como em tempos passados, mas para beneficiar a camada mais rica da população através da transferência das suas perdas para os contribuintes.
O fracasso em tomar em consideração os desejos dos eleitores deixa as resultantes dívidas nacionais em terreno politicamente, e mesmo legalmente, instável. Dívidas impostas por decreto, por governos ou agências financeiras estrangeiras diante de forte oposição popular podem ser tão frágeis como aquelas dos Habsburgos e outros déspotas em épocas passadas. Na falta de validação popular, elas podem morrer com o regime que as contraiu. Novos governos podem actuar democraticamente para subordinar a banca e o sector financeiro a fim de servirem a economia, não o inverso.
No mínimo, eles podem procurar pagar através da reintrodução da tributação progressiva da riqueza e do rendimento, comutando o fardo fiscal para a riqueza e propriedade rentista. A re-regulamentação da banca e providenciar uma opção pública para serviços de crédito e banca renovariam o programa social-democrata que parecia bem encaminhado um século atrás.
A Islândia e a Argentina são os exemplos mais recentes, mas também se pode recordar a moratória das dívidas de armas Inter-Aliados e das reparações alemãs em 1931. Um princípio matemático básico, e também político, está em acção: Dívidas que não podem ser pagas, não o serão.
O original encontra-se em www.counterpunch.org/... . Tradução de JF.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
segunda-feira, 12 de dezembro de 2011
Os discípulos de Goebbels contra a Síria
Domenico Losurdo
Não há quaisquer dúvidas de que Goebbels, o pérfido e brilhante
ministro do III Reich, deixou escola. Há que reconhecer, aliás, que os
seus discípulos de Washington e Bruxelas conseguiram superar o nunca
olvidado mestre.
Qual a natureza do conflito que desde há meses assola a Síria? Com este artigo é meu
intuito suscitar em todos os que defendem a causa da paz e da democracia nas
relações internacionais algumas perguntas elementares. Pela minha parte, tratarei de
responder dando a palavra a órgãos de imprensa e jornalistas insuspeitos de qualquer
cumplicidade com os dirigentes de Damasco.
1) Ocorre antes de mais nada perguntar qual a situação deste país do Médio Oriente
antes da chegada ao poder, em 1970, dos Assad (pai e filho) e do regime actual. Pois
bem, antes daquela data, «a república síria era um estado débil e instável, um palco
para as rivalidades regionais e internacionais»; os acontecimentos dos últimos meses
significam de fato o regresso à «situação anterior a 1970». Quem se expressa nesses
termos é Itamar Rabinovich, ex-embaixador de Israel em Washington, no
International Herald Tribune de 19-20 de Novembro. Podemos extrair uma primeira
conclusão: a rebelião apoiada em primeiro lugar pelos EUA e pela União Europeia
pode fazer a Síria retroceder a uma situação semicolonial.
2) As condenações e sanções do Ocidente e a sua aspiração a uma mudança de regime
na Síria estão inspiradas na indignação pela «repressão brutal» de manifestações
pacíficas, uma repressão exercida pelo poder? Na realidade, já em 2005 «George
Bush pretendia derrubar Bashar al-Assad». Continuam a ser palavras do exembaixador
israelita em Washington, o qual acrescenta que agora o governo de
Telavive se juntou a esta política de regime change na Síria: há que acabar de uma
vez por todas com o grupo dirigente que a partir de Damasco apoia «o Hezbollah no
Líbano e o Hamas em Gaza» e estreita relações com Teheran. Sim, «profundamente
preocupado pela ameaça iraniana, Israel é de opinião de que, se retirar o tijolo sírio
do muro iraniano, a política regional poderia entrar numa nova fase. É evidente que o
Hezbollah, tal como o Hamas, se movem agora com mais cautela». De modo que o
alvo da rebelião e das manobras com ela relacionadas não é apenas a Síria, são
2
também a Palestina, o Líbano e o Irão: trata-se de desferir um golpe decisivo na causa
do povo palestino e de consolidar o domínio neocolonial de Israel e do Ocidente
numa região de crucial importância geopolítica e geoeconómica.
3) Como atingir este objectivo? Guido Olimpio, no Corriere della Sera de 29 de
Outubro, explica-o claramente: em Antakya, uma região da Turquia confinante com a
Síria, opera já o «Exército Livre Sírio, uma organização que pratica a luta armada
contra o regime de Assad». É um exército que recebe armas e instrução militar da
Turquia. Além disso (continua Guido Olimpio no Corriere della Sera de 13 de
Novembro), Ancara «ameaçou criar uma faixa tampão de 30 quilómetros em
território sírio». Vemos pois que o governo sírio tem de fazer frente não apenas a uma
rebelião armada, mas a uma rebelião armada apoiada por um país que dispõe dum
dispositivo militar de primeira ordem, que é membro da NATO e que ameaça invadir
a Síria. Quaisquer que sejam os erros ou as culpas dos seus dirigentes, este pequeno
país está a sofrer, de facto, uma agressão militar. A Turquia, que tem tido um período
de forte crescimento económico, desde há algum tempo dá mostras de impaciência
relativamente ao domínio de Israel e dos EUA no Oriente Médio. Obama responde a
essa impaciência empurrando os dirigentes de Ancara para um sub-imperialismo
neo-otomano, controlado evidentemente por Washington.
4) Da análise e dos testemunhos trazidos depreende-se que a Síria se vê obrigada a
lutar em condições muito difíceis para a manutenção da sua independência, fazendo
face a um formidável bloqueio económico, político e militar. Além disso, a OTAN
ameaça directa ou indirectamente os dirigentes de Damasco com a possibilidade de
lhes reservar o mesmo fim que teve Khadafi, o assassínio e o linchamento. A infâmia
da agressão devia pois ser evidente para todos os que estão dispostos a fazer ao
menos um pequeno esforço intelectual. E, todavia, o Ocidente, valendo-se da sua
terrível potência de fogo mediático e das novas técnicas de manipulação
proporcionadas pelo desenvolvimento da Internet, apresenta a crise síria como um
exercício de uma violência brutal e gratuita contra manifestantes pacíficos e nãoviolentos.
Não há quaisquer dúvidas de que Goebbels, o pérfido e brilhante ministro
do III Reich, deixou escola. Há que reconhecer, aliás, que os seus discípulos de
Washington e Bruxelas conseguiram superar o nunca olvidado mestre.
24.11.2011
Tradução de João Carlos Graça
Domenico Losurdo
Não há quaisquer dúvidas de que Goebbels, o pérfido e brilhante
ministro do III Reich, deixou escola. Há que reconhecer, aliás, que os
seus discípulos de Washington e Bruxelas conseguiram superar o nunca
olvidado mestre.
Qual a natureza do conflito que desde há meses assola a Síria? Com este artigo é meu
intuito suscitar em todos os que defendem a causa da paz e da democracia nas
relações internacionais algumas perguntas elementares. Pela minha parte, tratarei de
responder dando a palavra a órgãos de imprensa e jornalistas insuspeitos de qualquer
cumplicidade com os dirigentes de Damasco.
1) Ocorre antes de mais nada perguntar qual a situação deste país do Médio Oriente
antes da chegada ao poder, em 1970, dos Assad (pai e filho) e do regime actual. Pois
bem, antes daquela data, «a república síria era um estado débil e instável, um palco
para as rivalidades regionais e internacionais»; os acontecimentos dos últimos meses
significam de fato o regresso à «situação anterior a 1970». Quem se expressa nesses
termos é Itamar Rabinovich, ex-embaixador de Israel em Washington, no
International Herald Tribune de 19-20 de Novembro. Podemos extrair uma primeira
conclusão: a rebelião apoiada em primeiro lugar pelos EUA e pela União Europeia
pode fazer a Síria retroceder a uma situação semicolonial.
2) As condenações e sanções do Ocidente e a sua aspiração a uma mudança de regime
na Síria estão inspiradas na indignação pela «repressão brutal» de manifestações
pacíficas, uma repressão exercida pelo poder? Na realidade, já em 2005 «George
Bush pretendia derrubar Bashar al-Assad». Continuam a ser palavras do exembaixador
israelita em Washington, o qual acrescenta que agora o governo de
Telavive se juntou a esta política de regime change na Síria: há que acabar de uma
vez por todas com o grupo dirigente que a partir de Damasco apoia «o Hezbollah no
Líbano e o Hamas em Gaza» e estreita relações com Teheran. Sim, «profundamente
preocupado pela ameaça iraniana, Israel é de opinião de que, se retirar o tijolo sírio
do muro iraniano, a política regional poderia entrar numa nova fase. É evidente que o
Hezbollah, tal como o Hamas, se movem agora com mais cautela». De modo que o
alvo da rebelião e das manobras com ela relacionadas não é apenas a Síria, são
2
também a Palestina, o Líbano e o Irão: trata-se de desferir um golpe decisivo na causa
do povo palestino e de consolidar o domínio neocolonial de Israel e do Ocidente
numa região de crucial importância geopolítica e geoeconómica.
3) Como atingir este objectivo? Guido Olimpio, no Corriere della Sera de 29 de
Outubro, explica-o claramente: em Antakya, uma região da Turquia confinante com a
Síria, opera já o «Exército Livre Sírio, uma organização que pratica a luta armada
contra o regime de Assad». É um exército que recebe armas e instrução militar da
Turquia. Além disso (continua Guido Olimpio no Corriere della Sera de 13 de
Novembro), Ancara «ameaçou criar uma faixa tampão de 30 quilómetros em
território sírio». Vemos pois que o governo sírio tem de fazer frente não apenas a uma
rebelião armada, mas a uma rebelião armada apoiada por um país que dispõe dum
dispositivo militar de primeira ordem, que é membro da NATO e que ameaça invadir
a Síria. Quaisquer que sejam os erros ou as culpas dos seus dirigentes, este pequeno
país está a sofrer, de facto, uma agressão militar. A Turquia, que tem tido um período
de forte crescimento económico, desde há algum tempo dá mostras de impaciência
relativamente ao domínio de Israel e dos EUA no Oriente Médio. Obama responde a
essa impaciência empurrando os dirigentes de Ancara para um sub-imperialismo
neo-otomano, controlado evidentemente por Washington.
4) Da análise e dos testemunhos trazidos depreende-se que a Síria se vê obrigada a
lutar em condições muito difíceis para a manutenção da sua independência, fazendo
face a um formidável bloqueio económico, político e militar. Além disso, a OTAN
ameaça directa ou indirectamente os dirigentes de Damasco com a possibilidade de
lhes reservar o mesmo fim que teve Khadafi, o assassínio e o linchamento. A infâmia
da agressão devia pois ser evidente para todos os que estão dispostos a fazer ao
menos um pequeno esforço intelectual. E, todavia, o Ocidente, valendo-se da sua
terrível potência de fogo mediático e das novas técnicas de manipulação
proporcionadas pelo desenvolvimento da Internet, apresenta a crise síria como um
exercício de uma violência brutal e gratuita contra manifestantes pacíficos e nãoviolentos.
Não há quaisquer dúvidas de que Goebbels, o pérfido e brilhante ministro
do III Reich, deixou escola. Há que reconhecer, aliás, que os seus discípulos de
Washington e Bruxelas conseguiram superar o nunca olvidado mestre.
24.11.2011
Tradução de João Carlos Graça
domingo, 11 de dezembro de 2011
Ficar ou sair da zona euro?
por Vaz de Carvalho
1 – Apareceram como cogumelos neste Outono (do nosso descontentamento) comentadores a fazerem críticas à UE e (veja-se lá!) até mesmo à Alemanha. Ainda há pouco lacrimejavam pelos contribuintes alemães que se "sacrificavam" pelos despesistas países periféricos. São os mesmos que incensavam os tratados da UE como portadores de futuros radiosos e apostrofavam como sacrílegos os que se atreviam a criticar sua eminência Trichet ou punham em dúvida a "bondade" dos mercados.
E no entanto, houve quem avisasse que a entrada na UE traria problemas insolúveis ao país e que a adesão ao euro seria um desastre. Era fácil ver que em todas as actividades básicas e estratégicas para o desenvolvimento nacional (na indústria, na agricultura, nas pescas) já então os países da UE eram excedentários. Para silenciar as críticas proclamava-se que teríamos 500 milhões de consumidores, à nossa disposição! Omitiam que havia centenas de milhões de produtores com produtividades muito superiores à nossa.
Pelos habituais "30 dinheiros", fecharam-se empresas, desmantelou-se a produção agrícola, abateram-se embarcações. Os responsáveis por esta situação – para mostrarem preocupação – agora vão falando das potencialidades do país naquelas áreas.
CRÍTICAS INÓCUAS
2 – Tais críticas são inócuas e circunstanciais. As pseudo soluções desses comentadores passam sempre pelo que lá de fora façam por nós, isto é, por eles. Dizem que o BCE deve garantir as dívidas soberanas ameaçadas pela desconfiança dos mercados, que deve ser reforçada a coordenação fiscal, que devem ser lançados eurobonds. Além disto, a Alemanha deve congelar a sua ortodoxia em relação ao controlo da inflação e funcionar como motor da economia europeia.
Não passam de votos piedosos sobre a reforma da UE que não saem dos critérios neoliberais, nem atacam os problemas de fundo: tenta-se "mudar alguma coisa para ficar tudo na mesma".
Vejamos, o BCE não está em condições de garantir nada quanto ao descrédito do euro. Foi graças às suas políticas que a economia europeia entrou em estagnação, sob ataque do dólar e de agências de notificação, os países com elevadíssimos défices, os bancos em crise de financiamento vivendo de capital fictício e continuando inconscientemente na senda da especulação, tolerada e incentivada pelo BCE/UE.
Os eurobonds seriam pouco mais que lixo, mesmo que a Alemanha não os tivesse já recusado vezes sem conta. Os BRIC já demonstraram que ignoram os problemas do euro. A Europa não tem aliados. Os EUA transformaram-na num satélite: ao mesmo tempo que se servem dela para a sua política imperial, movem-lhe guerra pelo dólar contra o euro.
A China e a Rússia não têm qualquer interesse estratégico em fortalecer à sua custa os que estão incondicionalmente do lado dos seus adversários reais (os EUA).
OS ILUSIONISTAS AUTÓCTONES
3 – A Alemanha não pode, por muito que custe aos ilusionistas da política nacional, ajudar ninguém. Aliás a condição que apresenta para alterar o funcionamento do BCE é passar a ter controlo sobre os orçamentos dos demais países. Ou seja: sem qualquer garantia sobre coisa alguma, concretizar o velho sonho imperial alemão de tornar os demais países suas colónias. Nem o Governo Federal dos EUA tem este poder sobre os Estados. Claro que para os que apoiam o governo – tal como os que se abstêm…– e que pretendem acabar com o feriado do 1º de Dezembro, a questão da independência nacional pouco ou nada deve dizer. O seu reaccionarismo pseudo nacionalista resume-se a atacar os imigrantes pobres – ao mesmo tempo que aconselham os jovens a irem-se embora do país…
A Alemanha não pode ajudar ninguém e dificilmente a ela própria, sob pena de perder a sua posição competitiva na primeira linha das tecnologias avançadas – as key enabling tecnologies: biotecnologia industrial, micro e nanoelectrónica, novos materiais, fotónica, tecnologias avançadas de fabrico. A Alemanha faz parte do reduzidíssimo grupo de países líderes nestas áreas com os EUA e Japão. Além destes com participação bastante inferior vêm a França, o Reino Unido, a Coreia do Sul, a Holanda, a que se junta, procurando recuperar atrasos, a China.
São tecnologias que necessitam de elevadíssimo nível de capitais para investigação e investimentos, com taxas de retorno muito reduzidas por ora. A Alemanha atrasar-se neste domínio seria perder o seu estatuto tecnológico. O que a Alemanha precisa é que os seus bancos transformem em capital real o capital fictício de que estão atulhados e de mão-de-obra barata de países seus satélites na UE.
A Alemanha precisa do euro suficientemente alto para a sua finança e suficientemente baixo em relação à sua produtividade para a sua indústria. Por isto, a Alemanha precisa do euro, e precisa de países europeus que mantenham a sua Balança de Transacções altamente excedente (131 mil milhões de euros, previstos para este ano).
Trata-se no entanto de uma contradição maior – uma antinomia, em termos da filosofia: para salvar a economia destrói a finança; para salvar a finança destrói a economia. Em qualquer dos casos, destrói os demais países europeus. O que é de salientar é que todos aqueles comentadores a que nos referimos consideram que se a UE não se empenhar em resolver os problemas de Portugal, estaremos condenados a seguir o caminho da Grécia! Mas é o que já está a acontecer. De forma que são totalmente ridículas – em termos da matemática ou da física dir-se-ia, desprezáveis – aquelas criticas à D. Merkel.
O CAMINHO DA SERVIDÃO
4 – A questão permanece: ficar ou sair da zona euro. Recentemente uma sondagem dava conta que mais de 73,8% dos inquiridos não queria que Portugal saísse do euro. O que é curioso é que com a desinformação e propaganda a favor do euro mais de 26% não o aprovem. Ora ninguém disse que saindo do euro acabavam as dificuldades: o problema é que ficando no euro o caminho é a servidão, a redução de Portugal a país colonizado pelos tais "países amigos".
Dizia o gen. De Gaulle – ao que parece repetindo Richelieu – que em política externa não há ideologias, só interesses. Desenganem-se, pois, os que vão nos cantos de sereia de "mais Europa". Aliás quanto "mais Europa", pior os seus países têm ficado. A Alemanha e os mais fortes hão de defender os seus interesses à custa dos mais fracos. Todos os tratados da UE mostram isto mesmo. D. Merkel diz que salva o euro tendo controlo sobre os OE dos outros países. É espantoso que isto seja dito e tolerado, mas além do mais é uma mentira: a Alemanha não tem capacidade para salvar o euro. O que pretende é colocar os outros países na sua órbita, reduzi-los à condição de mão de obra barata e sem direitos.
Nenhum problema do país vai ser resolvido, por este caminho. Vamos ficar com mais dívida, mais desemprego, mais falências, mais recessão, mais exploração interna e externa. Só em 2010 foram transferidos para fora do país, 17 700 milhões de euros de rendimentos. Um país pobre?!
Conforme dissemos anteriormente: "Com o euro estão anunciados 10 anos de sacrifícios, isto é, "ad aeterno ceteris paribus" (até à eternidade em iguais circunstâncias…). Sair do euro: 6 meses de sacrifícios e esforços, recompensados". [1] Isto é, os custos da nossa saída da zona euro seriam temporários ao passo que os custos de permanecermos serão inultrapassáveis, pois apenas aprofundaremos a situação a que chegamos, de meros servos da dívida, a versão actual dos servos da gleba medievais, submetidos ao capital financeiro do "eixo franco-alemão" [2]
FALSAS ALEGAÇÕES
Referimos também em como eram falsas as alegações catastrofistas de, abandonando o euro, aumentar a dívida e não haver dinheiro para pagar salários e pensões, além de outros aspectos. Vejamos agora outras alegações que parecem pertinentes: desvalorização, inflação, perda de valor dos depósitos, perda de poder de compra.
Desvalorização – claro que o "novo escudo" seria desvalorizado, o que seria benéfico para a economia nacional, reduzindo o défice externo, aumentando exportações, reduzindo importações, fomentando a produção nacional e o emprego.
Uma das regras da economia clássica mais comummente aceite é que o valor da moeda de um país deve reflectir o equilíbrio das suas contas externas. Temos uma moeda sobrevalorizada em relação à produtividade e estrutura produtiva nacionais – situação de desastre, cuja bancarrota da Argentina no início do século serve de exemplo. A actual cotação do euro apenas serve a Balança Comercial da Alemanha e países próximos a ela intimamente associados como a Holanda e a Áustria.
Inflação dispara – num primeiro momento sim, mas este é justamente o critério que Keynes assumiu – e durante décadas posto em prática – para ultrapassar as crises capitalistas. Para Keynes o problema económico não era a inflação, era o desemprego, Entre uma coisa e outra mais valia prejudicar a finança, mas salvar a economia e dar solução às pessoas. É evidente que a inflação se reduziria à medida que a produção nacional aumentasse e o desemprego diminuísse.
Os depósitos perderiam o seu valor – independentemente de com o euro estarem e continuarem a perde-lo, é certo que com nova moeda perderiam – pelo menos transitoriamente – em relação a moedas estrangeiras, o que importaria fundamentalmente a quem exporta capital, mas isto do ponto de vista do país seria benéfico. Internamente o seu valor seria o do poder de compra da nova moeda. Aliás o poder de compra do euro – já não falando do dos portugueses – é cada vez menor. A nova moeda permitiria também nestas condições um aumento da poupança nacional que bem necessária é, em vez de se escoar para o estrangeiro como areia entre os dedos.
O poder de compra seria drasticamente reduzido – não parece fazer muito sentido esta alegação, atendendo ao que acontece e às perspectivas futuras, quando já nem os ministros nem os seus propagandistas conseguem garantir como e quando a descida do poder de compra para. A única forma do poder de compra subir é abandonar o euro, promover a produção nacional, reduzir o desemprego, ter um sistema fiscal não determinado pelos interesses da finança.
Dizer que passaríamos a viver com 25 ou 40% menos é errado. É confundir o valor dos bens com a sua expressão monetária. Os bens transaccionáveis manteriam o seu valor expresso em euros ou noutra moeda. Põe-se o problema, sim, de como pagar as importações, que se reduziriam. Mas como paga-las estando na zona euro? Endividando-nos sem fim.
A questão é, pois, produzir bens transaccionáveis. Ora, como o euro não o conseguimos, como está mais que provado, a única forma de o fazer é de facto negociar a saída da zona euro. [3]
É evidente que problemas de ordem prática e técnica se colocam numa substituição da moeda. São questões técnicas, umas menores – como a alteração das caixas registadoras – outras maiores cuja solução reside na alteração do estatuto e funcionamento do Banco de Portugal – hoje uma espécie de barco encalhado ao sabor das marés da finança internacional.
Sem dúvida que uma das medidas para defesa da riqueza nacional seria o controlo e a temporária proibição de exportação de rendimentos acima de determinados valores. [4] Se a UE tivesse soluções há muito que as teria tomado. Dominada pela superstição neoliberal chegou a este impasse. A Alemanha já perdeu mais esta guerra pelo domínio da Europa, mas como dantes quer arrastar todos consigo. Não há que ter ilusões, Srs. do "federalismo" europeu, para Portugal e outros países o plano nem sequer passa por "região autónoma": apenas a servidão neocolonial.
Portugal necessita recuperar urgentemente um desígnio de independência nacional. A solução para a crise está no projecto constitucional que traduziu os anseios do povo no tão almejado 25 de Abril.
O caminho que este governo pretende seguir foi recentemente definido pela personagem digna de figurar numa história do Tim Tim – uma espécie de Dupond, mas do lado do Rastapopoulos – que é hoje o sr. ministro das Finanças: Diz que a sujeição à chantagem e à usura é "ganhar a confiança dos mercados". Pelos vistos a confiança dos portugueses pouco lhe importa. Quanto aos mercados, riram-se-lhe na cara, aplaudindo as medidas do OE e aumentando os juros no mesmo dia. Entretanto o primeiro-ministro com inusitado alheamento das consequências, promete mais austeridade…
1 – Ver O Euro e as Escolhas , 16/Nov/2011
2 – O termo "eixo" foi aplicado à aliança das potências fascistas na II Guerra Mundial.
3 – Desde a entrada no euro o crescimento médio anual do PIB entre 2001 e 2010 foi de apenas 0,7%. Em resultado desta "década perdida" agora teremos como média entre 2001 e 2012 (conforme previsões) uns 0,15% de média anual. Um total descalabro para a economia nacional.
4 – Medidas deste tipo foram comuns mesmo em países desenvolvidos. Por exemplo, a Inglaterra assim procedeu nos anos 60 do século passado, no governo do trabalhista MacMillan.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
por Vaz de Carvalho
1 – Apareceram como cogumelos neste Outono (do nosso descontentamento) comentadores a fazerem críticas à UE e (veja-se lá!) até mesmo à Alemanha. Ainda há pouco lacrimejavam pelos contribuintes alemães que se "sacrificavam" pelos despesistas países periféricos. São os mesmos que incensavam os tratados da UE como portadores de futuros radiosos e apostrofavam como sacrílegos os que se atreviam a criticar sua eminência Trichet ou punham em dúvida a "bondade" dos mercados.
E no entanto, houve quem avisasse que a entrada na UE traria problemas insolúveis ao país e que a adesão ao euro seria um desastre. Era fácil ver que em todas as actividades básicas e estratégicas para o desenvolvimento nacional (na indústria, na agricultura, nas pescas) já então os países da UE eram excedentários. Para silenciar as críticas proclamava-se que teríamos 500 milhões de consumidores, à nossa disposição! Omitiam que havia centenas de milhões de produtores com produtividades muito superiores à nossa.
Pelos habituais "30 dinheiros", fecharam-se empresas, desmantelou-se a produção agrícola, abateram-se embarcações. Os responsáveis por esta situação – para mostrarem preocupação – agora vão falando das potencialidades do país naquelas áreas.
CRÍTICAS INÓCUAS
2 – Tais críticas são inócuas e circunstanciais. As pseudo soluções desses comentadores passam sempre pelo que lá de fora façam por nós, isto é, por eles. Dizem que o BCE deve garantir as dívidas soberanas ameaçadas pela desconfiança dos mercados, que deve ser reforçada a coordenação fiscal, que devem ser lançados eurobonds. Além disto, a Alemanha deve congelar a sua ortodoxia em relação ao controlo da inflação e funcionar como motor da economia europeia.
Não passam de votos piedosos sobre a reforma da UE que não saem dos critérios neoliberais, nem atacam os problemas de fundo: tenta-se "mudar alguma coisa para ficar tudo na mesma".
Vejamos, o BCE não está em condições de garantir nada quanto ao descrédito do euro. Foi graças às suas políticas que a economia europeia entrou em estagnação, sob ataque do dólar e de agências de notificação, os países com elevadíssimos défices, os bancos em crise de financiamento vivendo de capital fictício e continuando inconscientemente na senda da especulação, tolerada e incentivada pelo BCE/UE.
Os eurobonds seriam pouco mais que lixo, mesmo que a Alemanha não os tivesse já recusado vezes sem conta. Os BRIC já demonstraram que ignoram os problemas do euro. A Europa não tem aliados. Os EUA transformaram-na num satélite: ao mesmo tempo que se servem dela para a sua política imperial, movem-lhe guerra pelo dólar contra o euro.
A China e a Rússia não têm qualquer interesse estratégico em fortalecer à sua custa os que estão incondicionalmente do lado dos seus adversários reais (os EUA).
OS ILUSIONISTAS AUTÓCTONES
3 – A Alemanha não pode, por muito que custe aos ilusionistas da política nacional, ajudar ninguém. Aliás a condição que apresenta para alterar o funcionamento do BCE é passar a ter controlo sobre os orçamentos dos demais países. Ou seja: sem qualquer garantia sobre coisa alguma, concretizar o velho sonho imperial alemão de tornar os demais países suas colónias. Nem o Governo Federal dos EUA tem este poder sobre os Estados. Claro que para os que apoiam o governo – tal como os que se abstêm…– e que pretendem acabar com o feriado do 1º de Dezembro, a questão da independência nacional pouco ou nada deve dizer. O seu reaccionarismo pseudo nacionalista resume-se a atacar os imigrantes pobres – ao mesmo tempo que aconselham os jovens a irem-se embora do país…
A Alemanha não pode ajudar ninguém e dificilmente a ela própria, sob pena de perder a sua posição competitiva na primeira linha das tecnologias avançadas – as key enabling tecnologies: biotecnologia industrial, micro e nanoelectrónica, novos materiais, fotónica, tecnologias avançadas de fabrico. A Alemanha faz parte do reduzidíssimo grupo de países líderes nestas áreas com os EUA e Japão. Além destes com participação bastante inferior vêm a França, o Reino Unido, a Coreia do Sul, a Holanda, a que se junta, procurando recuperar atrasos, a China.
São tecnologias que necessitam de elevadíssimo nível de capitais para investigação e investimentos, com taxas de retorno muito reduzidas por ora. A Alemanha atrasar-se neste domínio seria perder o seu estatuto tecnológico. O que a Alemanha precisa é que os seus bancos transformem em capital real o capital fictício de que estão atulhados e de mão-de-obra barata de países seus satélites na UE.
A Alemanha precisa do euro suficientemente alto para a sua finança e suficientemente baixo em relação à sua produtividade para a sua indústria. Por isto, a Alemanha precisa do euro, e precisa de países europeus que mantenham a sua Balança de Transacções altamente excedente (131 mil milhões de euros, previstos para este ano).
Trata-se no entanto de uma contradição maior – uma antinomia, em termos da filosofia: para salvar a economia destrói a finança; para salvar a finança destrói a economia. Em qualquer dos casos, destrói os demais países europeus. O que é de salientar é que todos aqueles comentadores a que nos referimos consideram que se a UE não se empenhar em resolver os problemas de Portugal, estaremos condenados a seguir o caminho da Grécia! Mas é o que já está a acontecer. De forma que são totalmente ridículas – em termos da matemática ou da física dir-se-ia, desprezáveis – aquelas criticas à D. Merkel.
O CAMINHO DA SERVIDÃO
4 – A questão permanece: ficar ou sair da zona euro. Recentemente uma sondagem dava conta que mais de 73,8% dos inquiridos não queria que Portugal saísse do euro. O que é curioso é que com a desinformação e propaganda a favor do euro mais de 26% não o aprovem. Ora ninguém disse que saindo do euro acabavam as dificuldades: o problema é que ficando no euro o caminho é a servidão, a redução de Portugal a país colonizado pelos tais "países amigos".
Dizia o gen. De Gaulle – ao que parece repetindo Richelieu – que em política externa não há ideologias, só interesses. Desenganem-se, pois, os que vão nos cantos de sereia de "mais Europa". Aliás quanto "mais Europa", pior os seus países têm ficado. A Alemanha e os mais fortes hão de defender os seus interesses à custa dos mais fracos. Todos os tratados da UE mostram isto mesmo. D. Merkel diz que salva o euro tendo controlo sobre os OE dos outros países. É espantoso que isto seja dito e tolerado, mas além do mais é uma mentira: a Alemanha não tem capacidade para salvar o euro. O que pretende é colocar os outros países na sua órbita, reduzi-los à condição de mão de obra barata e sem direitos.
Nenhum problema do país vai ser resolvido, por este caminho. Vamos ficar com mais dívida, mais desemprego, mais falências, mais recessão, mais exploração interna e externa. Só em 2010 foram transferidos para fora do país, 17 700 milhões de euros de rendimentos. Um país pobre?!
Conforme dissemos anteriormente: "Com o euro estão anunciados 10 anos de sacrifícios, isto é, "ad aeterno ceteris paribus" (até à eternidade em iguais circunstâncias…). Sair do euro: 6 meses de sacrifícios e esforços, recompensados". [1] Isto é, os custos da nossa saída da zona euro seriam temporários ao passo que os custos de permanecermos serão inultrapassáveis, pois apenas aprofundaremos a situação a que chegamos, de meros servos da dívida, a versão actual dos servos da gleba medievais, submetidos ao capital financeiro do "eixo franco-alemão" [2]
FALSAS ALEGAÇÕES
Referimos também em como eram falsas as alegações catastrofistas de, abandonando o euro, aumentar a dívida e não haver dinheiro para pagar salários e pensões, além de outros aspectos. Vejamos agora outras alegações que parecem pertinentes: desvalorização, inflação, perda de valor dos depósitos, perda de poder de compra.
Desvalorização – claro que o "novo escudo" seria desvalorizado, o que seria benéfico para a economia nacional, reduzindo o défice externo, aumentando exportações, reduzindo importações, fomentando a produção nacional e o emprego.
Uma das regras da economia clássica mais comummente aceite é que o valor da moeda de um país deve reflectir o equilíbrio das suas contas externas. Temos uma moeda sobrevalorizada em relação à produtividade e estrutura produtiva nacionais – situação de desastre, cuja bancarrota da Argentina no início do século serve de exemplo. A actual cotação do euro apenas serve a Balança Comercial da Alemanha e países próximos a ela intimamente associados como a Holanda e a Áustria.
Inflação dispara – num primeiro momento sim, mas este é justamente o critério que Keynes assumiu – e durante décadas posto em prática – para ultrapassar as crises capitalistas. Para Keynes o problema económico não era a inflação, era o desemprego, Entre uma coisa e outra mais valia prejudicar a finança, mas salvar a economia e dar solução às pessoas. É evidente que a inflação se reduziria à medida que a produção nacional aumentasse e o desemprego diminuísse.
Os depósitos perderiam o seu valor – independentemente de com o euro estarem e continuarem a perde-lo, é certo que com nova moeda perderiam – pelo menos transitoriamente – em relação a moedas estrangeiras, o que importaria fundamentalmente a quem exporta capital, mas isto do ponto de vista do país seria benéfico. Internamente o seu valor seria o do poder de compra da nova moeda. Aliás o poder de compra do euro – já não falando do dos portugueses – é cada vez menor. A nova moeda permitiria também nestas condições um aumento da poupança nacional que bem necessária é, em vez de se escoar para o estrangeiro como areia entre os dedos.
O poder de compra seria drasticamente reduzido – não parece fazer muito sentido esta alegação, atendendo ao que acontece e às perspectivas futuras, quando já nem os ministros nem os seus propagandistas conseguem garantir como e quando a descida do poder de compra para. A única forma do poder de compra subir é abandonar o euro, promover a produção nacional, reduzir o desemprego, ter um sistema fiscal não determinado pelos interesses da finança.
Dizer que passaríamos a viver com 25 ou 40% menos é errado. É confundir o valor dos bens com a sua expressão monetária. Os bens transaccionáveis manteriam o seu valor expresso em euros ou noutra moeda. Põe-se o problema, sim, de como pagar as importações, que se reduziriam. Mas como paga-las estando na zona euro? Endividando-nos sem fim.
A questão é, pois, produzir bens transaccionáveis. Ora, como o euro não o conseguimos, como está mais que provado, a única forma de o fazer é de facto negociar a saída da zona euro. [3]
É evidente que problemas de ordem prática e técnica se colocam numa substituição da moeda. São questões técnicas, umas menores – como a alteração das caixas registadoras – outras maiores cuja solução reside na alteração do estatuto e funcionamento do Banco de Portugal – hoje uma espécie de barco encalhado ao sabor das marés da finança internacional.
Sem dúvida que uma das medidas para defesa da riqueza nacional seria o controlo e a temporária proibição de exportação de rendimentos acima de determinados valores. [4] Se a UE tivesse soluções há muito que as teria tomado. Dominada pela superstição neoliberal chegou a este impasse. A Alemanha já perdeu mais esta guerra pelo domínio da Europa, mas como dantes quer arrastar todos consigo. Não há que ter ilusões, Srs. do "federalismo" europeu, para Portugal e outros países o plano nem sequer passa por "região autónoma": apenas a servidão neocolonial.
Portugal necessita recuperar urgentemente um desígnio de independência nacional. A solução para a crise está no projecto constitucional que traduziu os anseios do povo no tão almejado 25 de Abril.
O caminho que este governo pretende seguir foi recentemente definido pela personagem digna de figurar numa história do Tim Tim – uma espécie de Dupond, mas do lado do Rastapopoulos – que é hoje o sr. ministro das Finanças: Diz que a sujeição à chantagem e à usura é "ganhar a confiança dos mercados". Pelos vistos a confiança dos portugueses pouco lhe importa. Quanto aos mercados, riram-se-lhe na cara, aplaudindo as medidas do OE e aumentando os juros no mesmo dia. Entretanto o primeiro-ministro com inusitado alheamento das consequências, promete mais austeridade…
1 – Ver O Euro e as Escolhas , 16/Nov/2011
2 – O termo "eixo" foi aplicado à aliança das potências fascistas na II Guerra Mundial.
3 – Desde a entrada no euro o crescimento médio anual do PIB entre 2001 e 2010 foi de apenas 0,7%. Em resultado desta "década perdida" agora teremos como média entre 2001 e 2012 (conforme previsões) uns 0,15% de média anual. Um total descalabro para a economia nacional.
4 – Medidas deste tipo foram comuns mesmo em países desenvolvidos. Por exemplo, a Inglaterra assim procedeu nos anos 60 do século passado, no governo do trabalhista MacMillan.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
quinta-feira, 8 de dezembro de 2011
O golpe
1
Pelo Socialismo
Questões político-ideológicas com atualidade
http://www.pelosocialismo.net
_____________________________________
Publicado em: http://www.polemia.com/article.php?id=4297
Tradução do francês de PAT
Colocado em linha em: 2011/11/27
Draghi, Papademos, Monti: o golpe do
Goldman Sachs sobre a Europa (édito 11/2011)
Mario Draghi é o novo patrão do Banco Central Europeu (BCE). Loukas Papademos
acaba de ser designado Primeiro-ministro grego. Mario Monti é apontado como
presidente do conselho italiano. Destes três financeiros formados nos Estados
Unidos, dois são ex-responsáveis do sulfuroso banco Goldman Sachs. É razoável
recrutar incendiários para bombeiros? Explicações.
O primeiro chama-se Mario Draghi. É diplomado em economia pelo Instituto
de Tecnologia de Massachussets (ITM). Foi encarregado das privatizações italianas,
de 1993 a 2001. Tornou-se governador do Banco de Itália em 2006. De 1993 a 2006
teve assento em diversos conselhos de administração de bancos. De 2002 a 2006 foi
vice-presidente para a Europa do Goldman Sachs, o sulfuroso banco de investimento
americano. Acaba de ser nomeado presidente do Banco Central Europeu (BCE).
O segundo chama-se Loukas Papademos. Também é diplomado pelo Instituto
de Tecnologia de Massachussets (ITM). Foi professor na Universidade americana de
Columbia antes de se tornar conselheiro económico do banco da reserva federal de
Boston. De 1944 a 2002 foi governador do Banco da Grécia – posto que ocupava
quando a Grécia se “qualificou” para entrar no euro, graças às contas falsificadas pelo
Goldman Sachs. Depois, foi vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE). Acaba
de ser nomeado, sob pressão da União Europeia e do G20, Primeiro-ministro da
Grécia, com o apoio dos dois partidos dominantes.
O terceiro chama-se Mario Monti. É diplomado pela Universidade de Yale.
Estudou o comportamento dos bancos em regime de monopólio. Depois, foi
comissário europeu durante dez anos, de 1994 a 2004. Primeiro, “no mercado
interior e nos direitos aduaneiros” (ou, mais precisamente, na sua supressão), depois
na concorrência. Membro da Trilateral e do grupo de Bilderberg – segundo a
Wikipédia – foi nomeado conselheiro internacional do Goldman Sachs em 2005.
Acaba de ser nomeado senador vitalício e a União Europeia e o G20 tentam impô-lo
como presidente do conselho italiano.
São três financeiros europeus (?), três homens da superclasse mundial,
formados nas universidades americanas e estreitamente ligados ao Goldman Sachs.
“Governo Sachs” aos comandos da Europa?
2
O banco Goldman Sachs é conhecido nos Estados Unidos como “governo Sachs” tal é
a sua influência sobre o governo americano. O Secretário do Tesouro de Clinton,
Robert Rubin, que procedeu à desregulamentação financeira, veio do Goldman
Sachs. Tal como o Secretário do Tesouro de Bush, Hank Paulson, que transferiu para
os Estados as dívidas tóxicas dos bancos, durante a crise financeira. O atual
presidente do Goldman Sachs, Lloyd Blankfein, gosta de dizer que “faz o trabalho de
deus”. Com efeito, Goldman Sachs está no coração da predação financeira e
implicado em numerosos escândalos financeiros: o dos “subprimes”, o do engano dos
seus clientes (a quem recomendava a compra de produtos financeiros sobre os quais
especulava, quando em baixa), o da maquilhagem das contas gregas.
Estes são os homens do Goldman Sachs que, hoje, são colocados nos comandos. Por
que meios? E com que fins? Para fazer pagar aos povos as falcatruas dos bancos? Para
fazer com que os europeus salvem a América?
Em seis meses – salvo algum imprevisto – os franceses vão eleger um novo
presidente da República: seria prudente da sua parte exigir aos três principais
candidatos (François Hollande, Marine Le Pen e Nicolas Sarkozy) o compromisso de
não imporem como Primeiro-ministro um … ex-Goldman Sachs.
10 de novembro de 2011
(Fonte: Wikipedia)
Pelo Socialismo
Questões político-ideológicas com atualidade
http://www.pelosocialismo.net
_____________________________________
Publicado em: http://www.polemia.com/article.php?id=4297
Tradução do francês de PAT
Colocado em linha em: 2011/11/27
Draghi, Papademos, Monti: o golpe do
Goldman Sachs sobre a Europa (édito 11/2011)
Mario Draghi é o novo patrão do Banco Central Europeu (BCE). Loukas Papademos
acaba de ser designado Primeiro-ministro grego. Mario Monti é apontado como
presidente do conselho italiano. Destes três financeiros formados nos Estados
Unidos, dois são ex-responsáveis do sulfuroso banco Goldman Sachs. É razoável
recrutar incendiários para bombeiros? Explicações.
O primeiro chama-se Mario Draghi. É diplomado em economia pelo Instituto
de Tecnologia de Massachussets (ITM). Foi encarregado das privatizações italianas,
de 1993 a 2001. Tornou-se governador do Banco de Itália em 2006. De 1993 a 2006
teve assento em diversos conselhos de administração de bancos. De 2002 a 2006 foi
vice-presidente para a Europa do Goldman Sachs, o sulfuroso banco de investimento
americano. Acaba de ser nomeado presidente do Banco Central Europeu (BCE).
O segundo chama-se Loukas Papademos. Também é diplomado pelo Instituto
de Tecnologia de Massachussets (ITM). Foi professor na Universidade americana de
Columbia antes de se tornar conselheiro económico do banco da reserva federal de
Boston. De 1944 a 2002 foi governador do Banco da Grécia – posto que ocupava
quando a Grécia se “qualificou” para entrar no euro, graças às contas falsificadas pelo
Goldman Sachs. Depois, foi vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE). Acaba
de ser nomeado, sob pressão da União Europeia e do G20, Primeiro-ministro da
Grécia, com o apoio dos dois partidos dominantes.
O terceiro chama-se Mario Monti. É diplomado pela Universidade de Yale.
Estudou o comportamento dos bancos em regime de monopólio. Depois, foi
comissário europeu durante dez anos, de 1994 a 2004. Primeiro, “no mercado
interior e nos direitos aduaneiros” (ou, mais precisamente, na sua supressão), depois
na concorrência. Membro da Trilateral e do grupo de Bilderberg – segundo a
Wikipédia – foi nomeado conselheiro internacional do Goldman Sachs em 2005.
Acaba de ser nomeado senador vitalício e a União Europeia e o G20 tentam impô-lo
como presidente do conselho italiano.
São três financeiros europeus (?), três homens da superclasse mundial,
formados nas universidades americanas e estreitamente ligados ao Goldman Sachs.
“Governo Sachs” aos comandos da Europa?
2
O banco Goldman Sachs é conhecido nos Estados Unidos como “governo Sachs” tal é
a sua influência sobre o governo americano. O Secretário do Tesouro de Clinton,
Robert Rubin, que procedeu à desregulamentação financeira, veio do Goldman
Sachs. Tal como o Secretário do Tesouro de Bush, Hank Paulson, que transferiu para
os Estados as dívidas tóxicas dos bancos, durante a crise financeira. O atual
presidente do Goldman Sachs, Lloyd Blankfein, gosta de dizer que “faz o trabalho de
deus”. Com efeito, Goldman Sachs está no coração da predação financeira e
implicado em numerosos escândalos financeiros: o dos “subprimes”, o do engano dos
seus clientes (a quem recomendava a compra de produtos financeiros sobre os quais
especulava, quando em baixa), o da maquilhagem das contas gregas.
Estes são os homens do Goldman Sachs que, hoje, são colocados nos comandos. Por
que meios? E com que fins? Para fazer pagar aos povos as falcatruas dos bancos? Para
fazer com que os europeus salvem a América?
Em seis meses – salvo algum imprevisto – os franceses vão eleger um novo
presidente da República: seria prudente da sua parte exigir aos três principais
candidatos (François Hollande, Marine Le Pen e Nicolas Sarkozy) o compromisso de
não imporem como Primeiro-ministro um … ex-Goldman Sachs.
10 de novembro de 2011
(Fonte: Wikipedia)
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