guaikuru index | editado e publicado por M. Rocha |
Biografia sumária
Antonio Negri nasceu em Pádua em 1933. Durante a adolescência foi militante da Juventude Italiana de Ação Católica, como Umberto Eco e outros intelectuais italianos. Em 1954 entrou no PSIUP de Pádua (partido que posteriormente se integraria ao Partido Socialista), que possuía a maioria do movimento operário, em virtude da grande concentração industrial da região. No mesmo ano recebeu uma bolsa para estudar na Sorbonne, onde seguiu cursos de Ferdinand Alquié, Georges Gurvitch, Gaston Bachelard, Maurice Merleau-Ponty e Jean Hyppolite. Também estuda na Alemanha com Ernst Bloch e outros nas universidades de Tubingen, Freiburg, Heidelberg, Hannover, Munich e Frankfurt.
Universidade de Pádua
Em 1956 licenciou-se em Filosofia pela Universidade de Pádua com uma tese sobre o historicismo alemão. Também exerceu o cargo de diretor da revista Il Bó, órgão de expressão dos estudantes paduanos. No ano seguinte já é professor assistente de Filosofia do Direito na Faculdade de Jurisprudência e professor de Ciências Políticas. Em 1958 torna-se livre-docente em Filosofia do Direito na Universidade de Pádua.
Em 1959 é eleito conselheiro municipal pelo PSI e dirige o Il progresso Veneto, revista do partido. Nesse mesmo ano inicia a experiência política vinculada à criação, por Raniero Panzieri, de uma revista teórica nos meios da esquerda socialista e sindical: os Quaderni Rossi.
Em junho de 1962 ocorre a primeira greve selvagem na Fiat de Turim e os enfrentamentos da Piazza Statuto, onde é saqueada a sede do sindicato social-democrata. Começa o ciclo de lutas dos operários imigrados do sul da Itália.
Em 1963, quando o PSI realiza sua primeira coalizão com a Democracia Cristã, para formar um governo de centro-esquerda, Negri abandona o partido. Junto com sua mulher Paola Meo e Massimo Cacciari organizam seminários sobre O Capital para os operários do complexo industrial de Porto-Marghera.
Entre 1963 e 1966 ocorre a cisão dos Quaderni Rossi. Mario Tronti, Romano Alquati, Sergio Bologna e Negri, entre outros, criam um periódico político de intervenção: Classe Operaia. É o começo doOperaismo
Em 1966 se dissolve o movimento criado ao redor da Classe Operaia sobre a questão da organização operária, com a cisão entre os que apostam em uma renovação do PCI e os que defendem uma organização distinta do movimento operário tradicional, com Negri entre os segundos.
Em 1967 se torna catedrático em Teoria do Estado na Faculdade de Ciências Políticas e diretor do Instituto de Ciências Políticas de Pádua, onde dirige pesquisas para o Centro Nazionale della Ricerca. No mesmo ano se forma o primeiro grupo Potere Operaio de Veneza, do qual participa.
O ano seguinte é do movimento estudantil e do desenvolvimento dos grupos terceiro-mundistas, maoístas e trotskistas e do "maio quente" na Itália. No outono de 69 ocorre a renovação das negociações coletivas, marcado por lutas operárias e pelos movimentos de ocupação de casas. É também o ano da fundação dos grupos nacionais Potere Operaio eLotta Continua.
Em 12 de dezembro de 1969 ocorre o "Massacre de Estado": bombas colocadas por fascistas, e manipuladas pelos serviços secretos italianos que praticam a "estratégia da tensão" (o que só se saberá anos mais tarde), explodem na estação de Milão, matando várias pessoas. O anarquista Pietro Valpreda é acusado e preso por dois anos, injustamente.
conflitos nas ruas de Milão, 1969
Em 1971 são fundadas as Brigate Rosse a partir do movimento estudantil da esquerda católica da Universidade de Trento e de antigos membros das organizações juvenis do PCI - nesse ano há a primeira aparição das BR nas lutas da Pirelli em Milão. Entre 1970 e 1972 se desenvolve o movimento dos delegados de empresa e o nascimento das confederações unitárias de sindicatos.
Em 1972, Negri dirige a coleção Materiali Marxisti para a Editora Feltrinelli. Na primavera de 1973 ocorre a semana de lutas da Fiat de Turim, com a ocupação e paralisação da fábrica. No verão do mesmo ano o Potere Operaio se dissolve no congresso de Rosolina. Negri e muitos outros militantes das cidades do norte da Itália abandonam a organização e propõem "partir do zero sem retroceder". É o início da Autonomia Operaia.
Na primavera de 74 aparece em Milão o periódico político Rosso, no qual colabora Negri, e que se converte no ponto de referência mais importante da Autonomia no norte da Itália.
Em setembro, uma ano após o golpe militar que derrubou Salvador Allende no Chile, Enrico Berlinguer anuncia a estratégia do "Compromisso histórico", que exclui a possibilidade de um governo de unidade da esquerda na Itália. Ainda nesta mesma época, ocorrem lutas pela redução das tarifas elétricas e movimentos de ocupação de casas no bairro de San Basílio, em Roma.
Entre 1975 e 1977 crescem os movimentos sociais, culturais e políticos que emanam da Autonomia. E ocorrem os movimentos dos jovens proletários das grandes cidades italianas. Ocorre também a dissolução do grupo extraparlamentar Lotta Continua, cujo leninismo é questionado sobretudo pelos grupos feministas e pelos autonomistas dos coletivos de bairro. Introduzem-se regras de exceção no sistema judiciário italiano. E em 1976 aparece a Radio Alice, primeira rádio livre italiana.
[+ Rádio Alice + artigo em PDF]
A primavera de 1977 verá a eclosão do movimento dos Emarginati em todas as cidades da Itália. Os movimentos culturais pós-68 conhecem uma expansão sem precedentes. É o momento das manifestações com violentos enfrentamentos em Bolonha, apresentados como "ruptura docompromisso histórico". Após a morte de um militante de extrema esquerda, acontecem grandes manifestações em toda a Itália. Torna-se freqüente a aparição pública de armas (a pistola P38).
Lama, secretario geral da Central Sindical CGIL é expulso da Universidade de Roma pelo movimento estudantil. A ruptura é radical, pois os laços não se haviam rompido de todo desde 68-69, entre os movimentos sociais e a extrema esquerda extra-parlamentar com o PCI. Em setembro de 77 acontece uma concentração internacional contra a repressão do Estado italiano contra os movimentos, em resposta à convocação dos intelectuais franceses. Em 1977, por causa de investigações judiciais no Instituo de Ciência Política, Negri se vê obrigado a sair da Itália, passando a encarregar-se de cursos em Paris VIII (Jussieu), e na École Normale Superieure, convidado por Louis Althusser. Retornará à Itália quando a situação se esclarecer. Em 1978 a situação é de bloqueio no plano institucional e de exasperação das lutas sociais. Multiplicam-se os grupos armados (NAP, Prima Línea). Explode o "terrorismo".
Em 16 de março de 78 é seqüestrado Aldo Moro, homem chave da democracia cristã, no dia da posse do primeiro governo que desde 1947 se beneficiava do apoio explícito do PCI e da DC. Morrem cinco homens da escolta do político. Semanas depois, o corpo de Moro será encontrado em um carro, a meio caminho das sedes dos dois grandes partidos políticos italianos, o Partido Comunista e a Democracia Cristã.
Aldo Moro no cativeiro das BR
Entre 78 e 79 a Autonomia está em crise e é crescente a hegemonia das Brigate Rosse sobre o movimento. Em 7 de abril de 1979, Antonio Negri é detido juntamente com 67 componentes da Autonomia, entre os quais o professor Ferrari-Bravo, debaixo da aplicação das Leis de emergência. Negri é detido em Milão pelo juiz Calógero, magistrado de Pádua. É acusado de ser o chefe de uma organização única, que compreende um braço político (a Autonomia Operaia) e um braço armado (as Brigate Rosse). Cerca de trinta pessoas são detidas na ocasião.
Em 8 de abril, Negri é objeto de um novo mandado de detenção emitido pelo ministério fiscal de Roma, acusado de ser o organizador do seqüestro e assassinato de Moro, assim como de "insurreição armada contra os poderes do Estado".
Em 14 de abril é transferido de Pádua para o cárcere de Rebibbia, em Roma. Em Junho, sessenta delegados autônomos da Fiat de Turim são despedidos sob acusação de violência, mediante um procedimento judicial que fere a legislação trabalhista.
Em setembro, Negri é novamente transferido, agora para o cárcere especial de Fossombrone. Em novembro é levado para outro cárcere especial, em Palmi, na Calábria.
Em 17 de dezembro é promulgada a primeira lei Cossiga (então presidente do Conselho de Ministros), que prolonga de seis para onze anos o prazo máximo de prisão preventiva autorizada em caso de delitos de terrorismo, e concede a impunidade aos "arrependidos".
Negri em Pádua em 1979
Em 21 de dezembro, como conseqüência da confissão de Fioroni, o primeiro "arrependido", condenado em primeira instância a 28 anos de prisão por seqüestro e assassinato, começa a segunda grande onde repressiva contra a Autonomia. Negri recebe uma avalanche de mandatos de prisão e é acusado de 17 homicídios. Em março é novamente transferido, agora para a prisão especial de Trani.
O outono de 1980 assiste ao apogeu da ofensiva terrorista e a centenas de prisões em Milão e em outras cidades do Norte, após as "confissões" de outro "arrependido", Marco Barbone, assassino do jornalista Tobagi.
Promulgada a segunda Lei Cossiga, que reforça a legislação favorável aos "arrependidos". Em dezembro de 1980 acontece uma rebelião na prisão de Trani, acompanhada pelo seqüestro de uma alto magistrado pelas Brigate Rosse.
Negri e seus companheiros são acusados de organizar o movimento, e não serão absolvidos até 1985. Em janeiro de 1981, nova transferência para a prisão especial de Roma. Em fevereiro, a confissão de Fabrizio Peci, membro da direção estratégica das Brigate Rosse, feita no inicio do ano anterior, é tornada pública. Se conhece melhor a estrutura da organização e após essas revelações as BR sofrem seu primeiro desmantelamento sério.
Em fevereiro é dada uma ordem de suspensão do julgamento contra Negri por "insurreição armada contra os poderes do Estado" diante do tribunal de Roma. Se por um lado se beneficiará, por outro, ao longo de 1982, receberá toda uma série de processos em Milão, Turim, Pádua e Perugia, por diversos delitos. Também é acusado na Reggio Emilia e em Ancona por outro homicídio - de Alceste Campanile - do qual será absolvido em 1985.
Em janeiro de 82 é seqüestrado em Pádua o general americano Dozier, que trabalhava para a OTAN. Dozier é libertado pela polícia.
Antonio Savasta, organizador do seqüestro, é preso e "arrepende-se" de imediato. Suas confissões provocam o segundo desmantelamento das BR.
No verão desse mesmo ano ocorrerá a transferência dos acusados nos processos de 7 de abril para a prisão comum de Rebibbia, enquanto um documento assinado por 51 presos acusados de "terrorismo" defende o abandono da luta armada. Em 24 de fevereiro de 83 começa o processo do 7 de abril em Roma. No mesmo dia começa também um processo contra Negri e seus companheiros em Milão.
A defesa consegue a suspensão do processo. Em 2 de maio começa o interrogatório de Negri; em Junho, novos mandatos de prisão por juízes de Pádua e Perugia contra Negri. Nesse mês ocorrem as eleições gerais na Itália e Negri é eleito deputado em Milão, Roma e Nápoles, pelas listas do Partido Radical.
Com a suspensão do processo em 1 de julho, uma semana depois Negri sai da prisão; em 12 de julho é aberta a legislatura e começa um procedimento parlamentar para suspender a imunidade do deputado Negri. Em 14 de setembro, Negri lê sua intervenção na abertura dos debates na Câmara. Em 19 de setembro se refugia na França - onde será membro do College International de Philosophie.
Em 20 de setembro a Câmara dos deputados vota a autorização imediata da retirada da imunidade, por 300 votos contra 293. Os dez deputados do Partido Radical se abstém. Em 26 de setembro é reaberto o processo de 7 de abril em Roma e Negri é julgado à revelia.
Na primavera de 1984, Carlo Fioroni, principal testemunha de acusação contra Negri, com o qual jamais se encontrou durante toda a instrução do processo, não se apresenta para depor. Em resposta às interpelações parlamentares sobre o passaporte que lhe fora concedido pela presidência do Conselho de Ministros (Spadolini), alega-se que ele pertence aos serviços secretos italianos. Desaparece assim a testemunha nº 1.
Em Junho, Negri é condenado a 30 anos de prisão em Roma. Em 1985 é absolvido no processo pelo homicídio de Campanile, assim como no da rebelião no presídio de Trani e pelo seqüestro do Juiz d'Urso. Na primavera desse ano se iniciam os processos de Pádua e Milão contra a Autonomia e Negri.
Em 1992 reside em Paris, sem documentos, e ensina Ciência Política em Paris VIII. Funda a revista Futur Antérieur (com um grupo de pesquisadores, filósofos, economistas) e faz pesquisas para diversos ministérios franceses, além de colaborar com jornais e periódicos. O governo Mitterrand tolera sua presença e se nega a tramitar a permissão de residência. Negri tem pendentes vários processos e uma condenação perpetua por delito de opinião ("subversão contra o Estado"), determinada sem maiores provas além da interpretação de seus escritos e declarações de um "arrependido" - irregularidades denunciadas pela Anistia Internacional. Todos os condenados no processo de 7 de abril estão fora da prisão.
Em julho de 1997, Negri regressa à Itália e é novamente preso, ao desembarcar do avião em Roma. Foi levado para a prisão de Rebibbia e depois posto em regime de prisão domiciliar.
Em 2000 publica o livro manifesto Império, com Michael Hardt. Atualmente, após a suspensão de todas as acusações contra ele, definitivamente liberado, ele vive entre Paris e Veneza, escreve para revistas e jornais do mundo inteiro e publicou Multitudes [Multidão], com Michael Hardt. Em 2003 esteve na América do Sul (Brasil e Argentina) em sua primeira viagem internacional após décadas entre o cárcere e o exílio.
Em 2005 e 2006 Negri retornou várias vezes à América do Sul (Brasil, Argentina, Chile etc.).
Negri no Fórum Social Europeu em 2003
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