Translate

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Pelo Socialismo
Questões político-ideológicas com atualidade
http://www.pelosocialismo.net
_____________________________________________
Enviado por mail
Tradução do francês de TAM
Colocado em linha em: 2013/08/16
Manifesto do PCF
Por uma democracia avançada,
por uma França socialista

[Nota dos Editores
Os editores consideram necessário fazer preceder o texto do «Manifesto de
Champigny», a seguir publicado, pela presente nota que o enquadra política e
historicamente.
Em 18 de novembro de1946, Maurice Thorez, secretário-geral do Partido
Comunista Francês, concede uma entrevista ao jornal inglês The Times. Nessa
entrevista, defende uma via francesa para o socialismo, diferente da via
soviética, pacífica e eleitoral, omite a ditadura do proletariado, e anuncia a
intenção de trabalhar para uma fusão com o Partido Socialista francês, criando
um grande partido operário. Relembre-se que o PCF tinha sido fundado na
Conferência de Tours, em 1920, a partir de uma cisão no Partido Socialista, na
sequência da sua posição de traição aos interesses da classe operária ao
apoiar a burguesia nacional francesa na I Guerra Mundial.
Em novembro de1946 tinham-se realizado eleições legislativas das quais o
PCF saiu como partido mais votado, com 28,26%, tendo Thorez ocupado o
cargo de vice-presidente do Conselho. Para reforçar as posições institucionais
do PCF, tranquilizar as classes e camadas não proletárias e conquistar o PS
para o seu lado, Thorez declara não querer estabelecer em França um regime
soviético, desejar trabalhar para a recuperação do país depois da guerra,
2
pretender respeitar as regras democráticas e querer manter a autonomia em
relação à URSS e distanciar-se de métodos violentos de conquista do poder.
A vida não tardaria a pôr em causa as ilusões eleitorais e parlamentaristas. Em
4 de dezembro, a investidura de Thorez na presidência do conselho foi
rejeitada pela Assembleia Nacional e os comunistas são banidos do governo
em 4 de maio de 1947, momento a partir do qual a reação francesa, com o
apoio dos EUA, e por intermédio do Partido Socialista (SFIO - Secção
Francesa da Internacional Operária), social-democrata, aproveitou para anular
as conquistas populares alcançadas pelos trabalhadores após a Libertação.
Compreenda-se o contexto francês e europeu no final da segunda grande
guerra. O papel ímpar e heróico do PCF na resistência ao nazismo e no
combate ao regime traidor e capitulacionista de Vichy deu-lhe uma enorme
influência e prestígio junto da classe operária francesa, do povo trabalhador e
dos antifascistas. O PCF ostentava merecidamente o título de «partido dos
fuzilados». A URSS tinha acabado de libertar a Europa da barbárie nazi à custa
de mais de vinte milhões de mortos e o socialismo adquiria cada vez maior
prestígio junto das massas trabalhadoras europeias. A libertação revolucionária
dos povos da Europa central e oriental, com a ajuda da URSS, estava a levar à
constituição de um sistema socialista. Os países capitalistas aliados
participavam na euforia da vitória. Os povos da Europa rejubilavam com a
libertação e o fim da guerra. Stálin, em tais condições, admitia que algumas
nações europeias libertadas e sob a influência política e militar da URSS
pudessem passar à fase socialista. A unidade antifascista tinha sido um
instrumento do combate ao nazi-fascismo e tinha posto em contacto as classes
e camadas antifascistas. Os partidos comunistas viam a sua força aumentar.
Uma avaliação da correlação de forças feita nesse momento corria todo o risco
de não ser incólume ao ambiente de então, subestimando o poder do inimigo
de classe nos países capitalistas. Nos momentos em que o caminho para o
socialismo toma a aparência de uma via mais facilitada os revolucionários
devem estar atentos, porque a ilusão de que esse caminho é fácil, de que o
inimigo de classe não mobilizará até à exaustão todas as forças necessárias
para preservar a sua manutenção como classe dominante, tarde ou cedo
levará à derrota das forças operárias e seus aliados.
A Internacional Comunista, com Dimitrov por dirigente, em meados da década
de 30, havia teorizado a unidade das classes e camadas atingidas nos seus
interesses objetivos pelo terror dos monopólios para o combate contra o nazifascismo
na fórmula de «frente popular». Tratava-se da existência de
interesses concordantes, num momento histórico particularíssimo, da classe
operária e de parte da burguesia nacional nos estados anti-hitlerianos para a
derrota militar do Eixo.
3
Sem dúvida uma aliança muito vasta, abarcando até classes antagónicas, mas
há que sublinhar três questões fundamentais sem as quais se pode fazer – e
fez-se, e ainda se faz – um aproveitamento oportunista dessa teorização.
A primeira é que se trata de alianças políticas e sociais para derrotar o nazifascismo,
portanto limitadas nos seus objetivos e tempo.
A segunda é que o tremendo esforço de unidade que se preconizava não
apagava nem diluía os interesses da classe operária no quadro desse objetivo
tático.
E a terceira, é que a vasta unidade não excluía, antes tornava obrigatória a
crítica e o combate comunista de classe das vacilações e traições dos aliados,
como de resto seria inevitável dada a natureza política e socialmente instável
de umas camadas e a natureza volátil da existência de objetivos comuns entre
classes antagónicas num momento histórico especial.
A várias décadas de distância, bem se poderá afirmar que tais precisões
teóricas não são difíceis de enunciar. No entanto, estas precisões teóricas são
absolutamente decisivas, pois é muito estreito e espinhoso o caminho por onde
continua a marchar a posição da classe de vanguarda, independente, da classe
operária e da sua ideologia.
Alianças alargadas da classe operária com objetivos anticapitalistas e
socialistas materializaram-se nas «democracias populares», regime que
acabou por enquadrar a luta pelo socialismo em alguns países europeus
libertados da ocupação nazi pela URSS e que nessa época realizaram as suas
revoluções.
Em Itália, Togliatti empenhava-se na estratégia da «democracia progressiva».
O contexto português era bastante diferente, como se sabe. De qualquer modo,
o fim da guerra, a derrota das potências do Eixo e o triunfo dos Aliados
constituíram uma grande esperança para o povo português, não só quanto à
queda da ditadura, mas também quanto à perspetiva de alívio da sua miséria.
Salazar tinha mantido a sua «neutralidade» a favor dos nazis, fazendo de
Portugal uma sua base logística importante. O papel que a URSS e o seu
principal dirigente, Stálin, tinham desempenhado nesse desfecho vitorioso era
bem conhecido do povo português.
Grandes manifestações se realizaram em que o povo fez extravasar a sua
alegria pelo fim da guerra, pela paz e pela derrota do nazismo, o que lhe
aumentava a esperança de que a ditadura portuguesa pudesse desaparecer
rapidamente com a ajuda dos Aliados – esperança completamente infundada,
como se sabe.
Nestas circunstâncias, e ainda antes do final da guerra, no Partido Comunista
Português, foi elaborada a teoria da «política de transição» por um conjunto de
4
camaradas presos no Tarrafal, entre os quais se encontrava Bento Gonçalves,
não tendo em conta as especificidades nacionais que tornavam a posição
portuguesa muito mais complicada, não levando em conta a magnitude das
forças do fascismo e esperando um apoio do capitalismo vencedor, confiando
no apoio da democracia burguesa para liquidar a ditadura fascista. Foi a teoria
da chamada «política de transição», que pretendia rever e substituir as
conclusões do III Congresso que apontavam a via insurrecional para o derrube
da ditadura fascista. Esta teoria foi considerada como um desvio direitista e
oportunista e retificada com êxito no IV Congresso do PCP em 1946.
A partir de 1943, Earl Browder, ex-secretário-geral do Partido Comunista dos
EUA, (secretário-geral entre 1934 e 1945 e depois expulso do Partido),
libertado nesse ano dos cárceres do imperialismo americano e a partir de então
a soldo dos serviços secretos, começou a difundir a teoria do fim da luta de
classes e da conciliação de classes, o papel “progressista” do capitalismo no
pós-guerra, a negar a necessidade de partidos de classe e a defender a sua
diluição noutras associações políticas. Esta linha revisionista não foi difundida
entre os comunistas portugueses, mas desempenhou um papel altamente
negativo nos partidos comunistas da América Latina, entre eles no do Brasil.
Na Europa o «browderismo» foi severamente criticado pelo PCF e,
designadamente, por um dos seus mais heróicos dirigentes, Jacques Duclos.
A entrevista de Thorez tornou-se uma importante referência do discurso
francês a partir de 1956, ano em que se realizou o XX Congresso do PCUS e
de que é inseparável o «relatório secreto» de Khrouchtchov, que pretende
«denunciar» o assim designado «estalinismo». Este Congresso e este
«relatório secreto» vêm abrir uma época desastrosa para o movimento
comunista internacional e para a URSS. Na base da condenação de Stálin está
a condenação de todo o período da construção socialista após a morte de
Lenine que permitiu a consolidação e o triunfo do socialismo na URSS e no
leste europeu, que permitiu a derrota do nazi-fascismo.
Na base da afirmação da diversidade e da originalidade das vias da passagem
ao socialismo e da consideração como possível de uma «via pacífica» para o
socialismo mesmo em países capitalistas desenvolvidos, tese saída desse
Congresso, uma onda de oportunismo perpassou pelos maiores e mais
influentes partidos comunistas da Europa capitalista.
Esta linha revisionista não só ditou o início da destruição do campo socialista,
como levou à derrota completa e à degeneração da esmagadora maioria dos
partidos comunistas quando a URSS e os países socialistas do leste foram
derrotados pelo capitalismo.
Logo após o XX Congresso do PCUS, o PCF retoma, com Waldeck Rochet
como secretário-geral, a teoria expendida por Thorez na sua entrevista ao
TheTimes em 1946, que tinha permanecido esquecida por uma década,
insistindo na especificidade francesa da via para o socialismo numa perspetiva
5
«legalista» da tomada do poder, ainda que Thorez e Togliatti tivessem
manifestado reservas à intervenção de Khruchtchov no referido Congresso, no
que se referia à crítica do período de construção do socialismo.
A influência do XX Congresso do PCUS em Portugal fez-se sentir no
lançamento da palavra de ordem tática da solução pacífica do problema político
português. Ganhou terreno a teoria da «desagregação irreversível» do
fascismo e da «transição pacífica» para a democracia, que vigorou como linha
política do PCP entre 56 e 59 e foi plasmada na resolução do seu V Congresso,
em 1957. Encontravam-se presos em Peniche muitos dos principais dirigentes
do PCP, entre eles Álvaro Cunhal.
O XX Congresso do PCUS afirmara, tendo como favorável a relação de forças
existente, a possibilidade da passagem ao socialismo, em diversos países
capitalistas, pela via eleitoral e utilizando as instituições parlamentares
existentes. O PCP consideraria esta orientação política como um desvio de
direita no caso específico português, o de um regime fascista, e procedeu à
sua correção na reunião do Comité Central de março de 1961, após a fuga de
Peniche em 1960.
O VI Congresso culminou o trabalho de rectificação dessa linha que foi
substituída pela linha do levantamento nacional, da insurreição nacional como
única via possível para o derrubamento do fascismo.
Em Itália, após o XX Congresso do PCUS, Togliatti apresenta a Vía Italiana al
socialismo e, em Espanha, o PCE teorizou a via pacífica para o derrube do
franquismo.
Em 5-6 de dezembro de 1968, numa Conferência do PCF, é aprovado o
Manifesto de Champigny, do nome da cidade onde se realizou a reunião que o
aprovou, «Por uma democracia avançada, por uma França socialista»
perspetivando o socialismo como decorrência direta do aprofundamento da
democracia burguesa por reformas sucessivas e contínuas. A democracia
avançada era concebida como uma formação política e económica entre o
socialismo e o capitalismo em que a progressiva transformação das estruturas
económicas pela nacionalização dos setores monopolistas abriria o caminho ao
socialismo sem um confronto revolucionário mais ou menos intenso entre as
principais classes antagónicas. Essa tese correspondia a uma espécie de
ressurgimento da teoria da «transformação pacífica do capitalismo em
socialismo» e da «democracia, criação contínua», defendida anteriormente por
Jean Jaurès e comum a Bernstein, que Lenine refutou implacavelmente. O
Manifesto de Champigny passa ao lado da teoria marxista-leninista do Estado,
não define a sua natureza na «democracia avançada» – se é burguês ou
proletário com os seus aliados – nem clarifica qual o modo de passagem e qual
a natureza das estruturas políticas que asseguram o domínio das classes
exploradoras para as estruturas políticas que servem a defesa dos interesses
das classes e camadas exploradas.
6
Na década de 70, o PCF, em conjunto com o PCI e o PCE, elaboram a «teoria»
do «eurocomunismo» com Georges Marchais, Enrico Berlinguer e Santiago
Carrillo, respectivamente, como secretários-gerais destes partidos. As teorias
«eurocomunistas» caracterizaram-se pelo abandono das posições
revolucionárias marxistas-leninistas. Abandonam o socialismo como objetivo, a
perspetiva revolucionária da transformação da sociedade, o papel de
vanguarda do partido operário, o papel de vanguarda da classe operária, o
marxismo-leninismo e as suas principais teses.
Após a derrota do sistema socialista, estes partidos desaparecem de cena
como partidos de classe e comunistas e perdem praticamente toda a influência
eleitoral e de massas.
O PCF prosseguiu a sua via revisionista. Com George Marchais, o PCF criticou
e abandonou a noção de ditadura do proletariado, renunciou à teoria marxista
do Estado como ditadura da burguesia e adotou a «via democrática para o
socialismo», eleitoralista.
Robert Hue aprofundou ainda mais o oportunismo no PCF, lançando a
«mutação» do partido, a qual deveria romper com o partido leninista de novo
tipo. O objetivo do socialismo era definitivamente posto de parte e classificado
como «desvio estatista», passando a defender a «economia social de
mercado»,
Marie-Georges Buffet, secretária-geral do PCF, integra o governo socialista de
Lionel Jospin até 2002 na qualidade de secretária nacional e dissolve
completamente o partido noutras organizações e movimentos políticos em
frentes eleitorais.
No seu 36º Congresso, em fevereiro de 2013, o PCF abandona a foice e o
martelo como seu símbolo, embora tivesse deixado de ser comunista há muito.
O PCE dissolve-se na Esquerda Unida, o PCI metamorfoseia-se em partido da
Oliveira, pulveriza-se e desaparece. Nasce o Partido da Esquerda Europeia –
com Pierre Laurent, “secretário nacional” do PCF, na sua presidência –
oportunista, divisionista, europeísta e imperialista, que procura dificultar a luta
emancipadora da classe operária e dos povos em relação à exploração e ao
imperialismo da União Europeia e apoia os ataques da NATO a países
soberanos.]

7
Manifesto do PCF
Por uma democracia avançada, por uma
França socialista
As grandes lutas políticas, económicas e sociais que se desenrolaram em França
a partir do XVIII Congresso do Partido Comunista Francês (janeiro de 1967)
submeteram à prova dos factos as ideias avançadas pelos comunistas.
Estas ideias passaram as provas com sucesso. A análise dos acontecimentos dos
dois últimos anos, e particularmente dos acontecimentos de maio-junho de
1968, dão-lhes um novo vigor. É por isso que o Partido Comunista Francês
considera necessário reafirmar e desenvolver a política definida pelos seus
congressos para ganhar a maioria do povo francês para a causa inseparável da
democracia avançada e do socialismo.
Os comunistas têm como primeiro objetivo a libertação do nosso país do poder
autoritário instaurado há dez anos e que não cessou, desde então, de servir os
interesses do grande capital monopolista.
Os comunistas lutam para substituir este poder reacionário por um governo
popular e de unidade democrática capaz de mobilizar o país para a via de
profundas transformações políticas, económicas e sociais, que a nossa época e
as necessidades do nosso país exigem.
Os comunistas estão convencidos de que uma democracia avançada, fruto da
unidade e de múltiplas lutas das massas populares, pode abrir o caminho para a
transformação socialista da sociedade francesa no interesse da classe operária,
do povo e da pátria.
Os comunistas afirmam que este objectivo será tanto mais seguramente
alcançado quanto mais clara for uma perspetiva que se abre às massas
populares, graças à união duradoura das organizações operárias e democráticas,
unidas em torno de um programa político inovador e desenvolvendo
conjuntamente uma ação resoluta.
Os primeiros elementos de um tal programa estão contidos nos acordos
concluídos em dezembro de 1966 e em fevereiro de 1968 pelos partidos
democráticos. Mas é necessário ir mais longe.
O Partido Comunista Francês deve, pois, relembrar e precisar o que deverá ser,
do seu ponto de vista, uma política democrática consequente e avançada,
abrindo o caminho para o socialismo.
8
I
POR UMA VASTA ALIANÇA DE TODAS AS CAMADAS
SOCIAIS VÍTIMAS DOS MONOPÓLIOS E DO SEU PODER
Produziram-se grandes mudanças na estrutura económica e social do nosso país.
Conforme o nosso Partido previu e como o mostraram com evidência os
poderosos movimentos populares de maio-junho de 1968, amadurecem
rapidamente as condições para uma ação comum de todas as camadas
atingidas ou ameaçadas pelos monopólios.
Com efeito, cada vez mais a sociedade francesa se caracteriza pela concentração
de um enorme poder nas mãos dum pequeno grupo de monopolistas por um
lado e, pelo outro, pelo agravamento das condições de vida e de trabalho da
imensa maioria da população.
Sob o regime de capitalismo monopolista de Estado, uma oligarquia financeira
restrita controla as alavancas essenciais da atividade política e económica do
país. O Estado está todo mobilizado para a salvaguarda e o aumento do lucro do
grande capital. Favorece sistematicamente a exploração capitalista à escala de
toda a sociedade. A sua política, interna e externa, identifica-se com os
interesses gerais dos monopólios. A principal vítima desta política é a classe
operária, a concentração monopolista traduz-se principalmente na
intensificação do trabalho e na sua duração excessiva, pela pressão sobre os
salários, pelo aumento de impostos, pelo desemprego.
Contrariamente às «teorias» dos apologistas do grande capital, a classe operária
com o seu núcleo proletário – cujo trabalho é a fonte de enriquecimento dos
monopólios – vê crescer constantemente a sua importância. Classe social
privada de toda a propriedade de meios de produção, sofrendo
consequentemente a exploração direta dos capitalistas, cada vez mais
concentrada em imensas empresas, possuindo uma longa tradição de lutas,
poderosamente organizada em sindicatos e com um Partido Comunista
fortalecido com uma doutrina científica e de uma organização eficaz, a classe
operária constitui a força decisiva da grande luta de classes do nosso tempo. A
despeito dos ideólogos burgueses e dos donos do capital, ela mostrou isso muito
bem nestes meses de maio e de junho de 1968.
A situação no campo, que é dominado pela concentração capitalista, a anarquia
da produção e a degradação das condições de existência da imensa maioria dos
camponeses, conduziu ao desenvolvimento de lutas camponesas e a novos
progressos da aliança dos trabalhadores das cidades e do campo.
Enquanto poderia ser posta ao serviço do bem-estar de todos, a prodigiosa
revolução científica e tecnológica que marca a nossa época, está inteiramente
submetida à lei do lucro e traduz-se no reforço da exploração dos trabalhadores.
9
Ao mesmo tempo, provoca o crescimento em massa e a mutação rápida de
camadas de assalariados, cujas condições salariais e de trabalho as aproximam
cada vez mais dos operários.
Aumenta sem cessar o número de engenheiros, técnicos, investigadores,
professores. Agora, contam-se por milhões os intelectuais de todas as
especialidades. Apesar de uma grande diversidade de situações, a imensa
maioria deles sofre o peso crescente da exploração capitalista. O regime dos
monopólios recusa-lhes qualquer participação criativa nos destinos económicos
e políticos do país, na elaboração de uma cultura viva. Aumenta o seu papel na
luta de classes. Certamente, a sua formação e a sua origem social não os
predispõem a reconhecer facilmente o papel determinante da classe operária.
Mas as lutas da primavera de 1968 mostraram que uma parte deles, muito mais
considerável que no período precedente, começa a participar ativamente no
combate ao lado dos operários e dos empregados. O Partido Comunista francês
considera como uma questão capital esta aliança necessária da classe operária e
dos intelectuais em relação à qual presta a maior atenção.
O capitalismo monopolista de Estado acelera a expulsão de numerosos artesãos
e comerciantes. Com as massas consideráveis de pequenos camponeses, vêm
engrossar o exército de trabalhadores assalariados, cujo número total
representa actualmente dois terços da população ativa.
Abandonada pelo poder e sobre-explorada pelo grande patronato, enquanto a
sua massa não pára de crescer, a juventude, e em primeiro lugar a juventude
trabalhadora, exige com uma combatividade acrescida o direito ao emprego, o
direito ao ensino e ao lazer e também o direito à palavra. Os jovens
desempenharam um grande papel nos acontecimentos recentes. A geração em
ascensão esteve nas primeiras linhas da batalha contra o gaullismo e o
capitalismo, pelas reivindicações e o progresso.
Assim, acentua-se e agrava-se a contradição que opõe, em conjunto com a classe
operária, a imensa maioria da população à grande burguesia capitalista e os
seus apaniguados.
Assim, desenvolvem-se as bases de uma comunidade de interesses de todas as
camadas sociais vítimas dos monopólios e da sua política e as possibilidades da
sua unidade em torno da classe operária.
É a grande lição que foi posta em evidência nas poderosas batalhas de classe de
maio e junho de 1968. Constituíram o primeiro grande confronto entre as
massas trabalhadoras e o poder dos monopólios em confronto com as
contradições que é incapaz de resolver.
A combatividade, a vontade de mudanças profundas que animam os milhões de
trabalhadores manuais e intelectuais e uma grande parte da juventude
estudantil, manifestaram-se no decurso das greves com ocupação dos locais de
trabalho, acções na universidade, poderosas manifestações de rua tanto em
10
Paris como na província. Às reivindicações imediatas colocadas pelas massas
trabalhadoras juntaram-se a contestação do poder pessoal e o domínio dos
monopólios, a exigência de uma democratização profunda da vida política,
económica e social.
Este poderoso movimento de uma amplitude inigualável na nossa história,
obrigou o poder e o patronato a fazerem importantes concessões tanto no plano
das reivindicações operárias como no da organização da educação nacional. Os
resultados obtidos mostram a eficácia da luta de massas, a possibilidade de
impor recuos importantes ao poder e ao grande capital e, ao mesmo tempo,
enfraquecê-los, de fazê-los tremer sob o peso da convergência das acções
populares.
Hoje, sob o peso de uma crise monetária de que são os únicos responsáveis, o
grande patronato e o poder gaullista mostram que, para eles, a única maneira de
resolver as contradições do seu sistema consiste em atacar os trabalhadores. O
Partido comunista francês considera que é necessário agir para defender e
consolidar as conquistas sociais de maio-junho e as reivindicações das massas
trabalhadoras.
A ação unida dos trabalhadores pode impedir o poder gaullista de lhes fazer
pagar os custos da especulação capitalista pela subida dos preços, das taxas e
dos impostos. Pode dificultar a ação do patronato em relação aos compromissos
assumidos em matéria de salários, impor a garantia do poder de compra e o
estabelecimento da escala móvel, a garantia de reinvestimento, uma gestão
democrática da Segurança social, a consolidação dos direitos e liberdades
sindicais.
Pode impor a redução das despesas improdutivas das quais a força de ataque
nuclear é o perigoso símbolo.
Ao mesmo tempo, é importante defender resolutamente as liberdades
democráticas, em todos os níveis e em todos os domínios, contra as tendências
autoritárias que se estão a intensificar. A ação das massas, perseverante e
diversificada da classe operária e dos outros trabalhadores, a generalização da
aliança entre o proletariado e as outras camadas sociais que sofrem com a
política dos monopólios, são a condição essencial de uma luta eficaz contra o
poder gaullista que elabora e realiza esta política antipopular.
Mas a luta contra este regime autoritário e reaccionário pelo progresso social, as
liberdades e a paz devem visar mais longe: para arrancar conquistas sociais
decisivas e consolidá-las duradouramente, não basta pôr em causa o regime
dos monopólios, é preciso fazê-lo recuar, é preciso derrotá-lo.
É por isso que, ao mesmo tempo que organiza incansavelmente a ação dos
trabalhadores manuais e intelectuais, os operários e camponeses pelas suas
reivindicações e direitos, o Partido comunista francês continuará a trabalhar
ativamente pela união de todas as forças operárias e democráticas quaisquer
11
que sejam as suas conceções filosóficas, crenças religiosas ou filiações
partidárias, para a luta pelo derrube do poder dos monopólios.
Já hoje, fruto da ação infatigável do nosso Partido, o progresso da aliança de
classes antimonopolistas encontrou a sua tradução, nestes últimos anos, na
aproximação e em certas acções comuns dos partidos de esquerda, sobretudo do
Partido comunista e do Partido socialista.
Contudo, os passos em frente que se deram foram limitados. É precisamente
utilizando o facto de as forças de esquerda não estarem suficientemente unidas
em torno de objectivos susceptíveis de abrir uma clara perspetiva às massas e
agitando o espantalho da “guerra civil” que o poder gaullista tem conseguido até
aqui manter a influência sobre uma parte importante do nosso povo incluindo
aqueles que são vítimas da política reacionária.
Pela sua parte, o Partido comunista francês reafirma a vontade dos comunistas
de trabalhar para a unidade de todas as forças operárias e democráticas na base
de um programa comum avançado, susceptível de ser apoiado pela maioria do
povo francês e abrir a perspetiva da renovação.
Não é de um remendo do gaullismo nem de uma coligação sem princípios que,
em nome do “centrismo”, faria uma política de direita, que o povo tem
necessidade, ele aspira a uma democracia inovadora.
O objectivo principal, na etapa actual, é e continua a ser a substituição do
poder gaullista dos monopólios por uma democracia política e económica
avançada, abrindo caminho ao socialismo.
II
O QUE É UMA DEMOCRACIA AVANÇADA ?
Uma política social avançada implica, antes de tudo, a satisfação das
reivindicações essenciais das massas laboriosas, isto é: a melhoria do poder de
compra dos salários; o pleno emprego para todos; a redução do tempo de
trabalho e o abaixamento da idade da reforma, condição para a eliminação do
desemprego e uma participação efetiva dos trabalhadores nas actividades
sociais, cívicas e culturais; a atribuição de um quarto do orçamento à Educação
nacional e uma reforma democrática do ensino; uma política agrícola que
assegure uma vida digna aos pequenos e médios camponeses e os encoraje a
cooperar sob todas as formas; uma ajuda adequada aos trabalhadores por conta
própria, aos pequenos industriais e aos comerciantes.
Uma tal política é possível.
12
Mas ela implica que seja tomado um conjunto de medidas destinadas a limitar
progressiva e sistematicamente as empresas monopolistas na economia
nacional, a enfraquecer o capitalismo monopolista de Estado nos seus meios
económicos e financeiros.
A primeira destas medidas deve ser, pois, a nacionalização dos grandes bancos e
dos ramos monopolistas da indústria que, na sua maior parte, recebem
subsídios do Estado das formas mais diversas. É de uma importância decisiva
que estas novas empresas nacionais e aquelas que já existem sejam
democraticamente dirigidas, isto é, com a participação dos trabalhadores. É a
condição essencial para que as empresas nacionais deixem de ser administradas,
como hoje acontece, de modo a beneficiar os trusts, mas no sentido do
desenvolvimento das forças produtivas da nação e das necessidades do povo.
Simultaneamente, a elaboração e a aplicação democráticas de um plano de
desenvolvimento económico e social, visando assegurar o desenvolvimento
harmonioso da economia nacional, a elevação constante do nível de vida das
massas, uma política coerente de investimentos contribuiriam para reforçar o
poder de decisão da massa dos cidadãos e para reduzir o das potências do
dinheiro.
Para este mesmo objetivo deveria contribuir também uma reforma democrática
da fiscalidade, aumentando os encargos das empresas capitalistas e dos
privilegiados pela sorte, enquanto diminuiria os impostos diretos e indirectos
suportados pelos assalariados e os pequenos produtores.
Para levar à prática estas medidas, é necessário impor profundas mudanças no
regime político do nosso país.
A Assembleia nacional eleita por sufrágio universal e com representação
proporcional deve ter um poder real de fazer as leis e de controlar o governo.
Uma sã estabilidade governamental será garantida pela realização de uma
política susceptível de ter o apoio das massas. Esta política comum
consubstanciará um contrato que obriga todos os partidos democráticos.
Todas as liberdades democráticas respeitantes à eleição pelo povo de todas as
assembleias deliberativas, à livre atuação dos partidos e sindicatos, à
informação, à laicidade do Estado e da escola, às liberdades de expressão e de
organização dos trabalhadores nas empresas, dos professores e dos estudantes
nas universidades, devem ser desenvolvidas e asseguradas na prática.
Uma democracia inovadora deve combinar as medidas tendentes a alargar os
direitos políticos das massas com as que visam organizar a sua participação na
direção e orientação da vida económica do país de que elas estão afastadas até
agora. A experiência de maio-junho confirmou a imensa capacidade de
iniciativa das massas trabalhadoras. Trata-se de a pôr à disposição do
13
desenvolvimento de todos os recursos económicos, científicos, técnicos e
culturais da nação.
Uma política interna democrática será acompanhada por uma política externa
democrática e pacífica.
Os problemas da política internacional são vitais para a paz e a segurança de
todos os povos e devem ser resolvidos no respeito pela soberania dos povos, da
independência das nações e da sua indispensável solidariedade. Os partidários
da «integração» capitalista da pequena Europa mostram de facto que a
independência nacional é um princípio válido para alguns países e ultrapassado
para outros. Os comunistas partem do ponto de vista de que cada país deve
decidir por si, sem ingerências exteriores, os problemas relativos à sua
organização social e política assim como à sua orientação económica.
Tendo em vista reforçar a cooperação económica e cultural, pode ser necessário
estabelecer relações especiais com os países vizinhos. Mas não devem ser
exclusivas e, no que respeita à França, o seu verdadeiro interesse é manter
relações económicas e culturais em pé de igualdade com todos os países sem
exceção, incluindo os países socialistas.
Uma política externa independente e pacífica exige a dissolução dos blocos
militares existentes no mundo, o desaparecimento simultâneo do Pacto do
Atlântico, concluído em primeiro lugar, e do Tratado de Varsóvia. No imediato,
a França não deve renovar os seus compromissos com o Pacto do Atlântico no
prazo posterior a 1969.
O imperialismo americano, apesar das suas derrotas e das suas dificuldades,
está sempre animado pela vontade de desempenhar o papel de gendarme
mundial, e mostra isso na América latina, em África, no Médio Oriente, no
sudeste asiático e, particularmente, no Vietname.
Devido às vitórias do povo vietnamita, à ajuda que lhe prestaram os países
socialistas e todas as forças progressistas mundiais, o imperialismo americano
teve de cessar incondicionalmente os bombardeamentos sobre a República
Democrática do Vietname e admitir a presença da F.N.L. nas conversações de
Paris. O dever da nossa classe operária é reforçar o seu apoio sem reservas ao
combate heróico do povo vietnamita pela sua independência, exigir a cessação
completa da agressão americana ao Vietname do Sul, a retirada das tropas
americanas, o respeito do direito do povo vietnamita do norte e do sul de decidir
ele próprio, sem ingerência externa, as questões postas pelo seu futuro, e
designadamente a reunificação da sua pátria.
Na Europa aumenta o perigo representado pelas tendências dos meios
dirigentes da Alemanha ocidental de exigir a revisão da situação criada pela
derrota do hitlerismo. Deve ser energicamente combatido. A paz e a segurança
no nosso continente exigem que todos os países, designadamente a França,
reconheçam sem restrições as atuais fronteiras da Europa e a existência da
14
República Democrática Alemã, que se oponham resolutamente às actividades
neonazis na Alemanha ocidental e ao seu acesso ao armamento nuclear sob
qualquer forma.
A coexistência pacífica não pode assentar no equilíbrio do terror nuclear. É
necessário que os trabalhadores franceses prossigam a sua ação para que o seu
país, em vez de participar na corrida ao armamento nuclear, adira a todos os
acordos que limitem o perigo das experiências ou da proliferação de armas de
destruição maciça, atue em prol de medidas de desarmamento mais gerais e, no
imediato, da democratização das forças armadas francesas que devem servir
exclusivamente para a defesa do território nacional.
Por fim, a França democrática deve reconhecer, como a todos os povos, o direito
à autodeterminação dos povos da Guiana, de Guadalupe, da Martinica, da ilha
de Reunião, da Nova Caledónia, da Polinésia, etc., e satisfazer a sua legítima
reivindicação de um estatuto de autonomia que lhes permita gerir livremente os
seus próprios assuntos no quadro da República francesa.
Seriam estes, na opinião dos comunistas, os principais aspectos de uma política
democrática avançada no plano das instituições, no plano de desenvolvimento
económico e social e das relações internacionais do nosso país.
Uma política antimonopolista consequente, conduzida por um poder que chama
à participação ativa as largas massas populares, permitiria o desenvolvimento
sempre crescente da democracia. A democracia deve ser uma criação contínua,
aprofundando e alargando sem cessar as conquistas económicas, sociais e
políticas dos trabalhadores.
Como mostra a história destes últimos decénios, são as classes exploradoras que
reduzem a democracia. Os trabalhadores, o povo vêem nela, pelo contrário, a
condição decisiva da realização das sus aspirações. O desenvolvimento contínuo
da democracia política e económica que queremos para o nosso país favorecerá
o reforço das posições da classe operária na sociedade e o enfraquecimento das
posições do grande capital.
Ao mesmo tempo, serão criadas melhores condições para que a maioria do
nosso povo se afirme favorável à transformação socialista da sociedade.

Sem comentários:

Viagem à Polónia

Viagem à Polónia
Auschwitz: nele pereceram 4 milhôes de judeus. Depois dos nazis os genocídios continuaram por outras formas.

Viagem à Polónia

Viagem à Polónia
Auschwitz, Campo de extermínio. Memória do Mal Absoluto.