"(...) III
O marxismo do leste europeu é um fenómeno relativamente complexo, uma vez
que, por um lado, engloba países com distintas tradições históricas e, por outro, se refere a
um período de aproximadamente 45 anos, diferenciado em seu interior. Procuraremos abaixo
apresentar diferentes propostas de classificação e periodização de seu desenvolvimento e, desta
maneira, melhor situar a evolução intelectual de Karel Kosik.
Leszek Kołakowski, em seu livro Główne Nurty Marksizmu (Tendências Principais do
Marxismo), identifica os seguintes períodos no desenvolvimento do marxismo no leste europeu:
a) 1945-1949: se caracteriza, no tocante ao pensamento filosófico e social, pela existência de
elementos de um pluralismo político e cultural que se expressava na presença de diferentes
professores estranhos à tradição marxista nas diferentes instituições universitárias,
particularmente importantes na Polônia e na Tchecoslováquia. No decorrer do período
este pluralismo se restringirá gradualmente;
b) 1949-1954: unificação do “campo socialista” nos aspectos políticos e ideológicos e
stalinização da cultura. Transformação da “filosofia marxista-leninista” – através de
métodos administrativos, tais como o afastamento e a proibição do ensino dos antigos
professores – em filosofia oficial.
c) 1955-1968: surgem, por efeito da desestalinização, diferentes tendências anti-stalinistas e
revisionistas.(...)d) A partir de 1969, período caracterizado pela derrota e expurgo das diferentes correntes
criticas, com o afastamento da vida pública ou o exílio de seus principais representantes.7
(KOLAKOWSKI, op. cit., p. 923)Uma segunda proposta de periodização parece ser sugerida pelo filósofo italiano
Guido D. Neri. Em seu livro “Aporie della realizzazione: Filosofia e Ideologia nel socialismo reale”,
Neri aponta uma diferença ligada a uma vivência geracional, distinguindo a geração de György
Lukács e Ernst Bloch – que retornaram respectivamente à Hungria e a RDA após o fim da II
guerra mundial – e uma segunda geração formada após a guerra, a qual pertenceriam, entre
outros, Leszek Kołakowski, na Polônia e Karel Kosik, na Tchecoslováquia.8
(NERI, 1980.)
Por fim, podemos destacar a classificação realizada por György Márkus (MÁRKUS,
1974, pp.113-129) em relação às mais significativas correntes existentes no interior do marxismo
da Europa Oriental. A primeira corrente – identificada em linhas gerais com a “filosofia marxistaleninista”
- é a “tendência extensional”, segundo a qual a “teoria marxista se aplica ao conjunto da
realidade, ou seja, à natureza, a sociedade e ao pensamento” (MÁRKUS, 1974, p. 114). Como
conseqüência da desestalinização teriam surgido duas correntes opostas, próximas as existentes
na Europa Ocidental”, uma “cientificista”, que privilegia uma reflexão metodológica sobre as
ciências naturais (MÁRKUS, 1974, pp. 119-120) e outra, “ideológica-crítica”, que identificaria
a filosofia como uma visão do mundo voltada à crítica das ideologias. (MÁRKUS, 1974, pp.
120-121) Márkus identifica ainda a corrente da “ontologia social” – que seria representada por
Lukács. (MÁRKUS, 1974, pp. 121-123)
É importante destacar aqui que uma preocupação de
inúmeros filósofos foi, justamente, a de superar a polaridade entre a corrente “cientificista” e a
“antropológica” ou “existencialista”.9
(LUKÁCS, 1982, p. 36-176 e KOSIK, 1969).
Podemos afirmar, em linhas gerais, que esta classificação das diferentes correntes teóricas proposta por Márkus é aceita por outros historiadores do pensamento marxista no
leste europeu."
in Revista Novos Rumos
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