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quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Entrevista a um cientista nem otimista, nem pessimista



https://www.publico.pt/2022/12/28/azul/entrevista/filipe-duarte-santos-alteracoes-climaticas-passaram-parte-xadrez-geoestrategico-2032862

Filipe Duarte Santos: “As alterações climáticas passaram a fazer parte do xadrez geoestratégico”

A guerra na Ucrânia impulsionou uma crise energética e um novo proteccionismo, arrastando a descarbonização das economias para o xadrez geoestratégico, diz o geofísico Filipe Duarte Santos.

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O geofísico Filipe Duarte Santos é presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável Nuno Ferreira Santos

A guerra na Ucrânia abriu caminho não só para uma crise energética, mas também para relações internacionais mais proteccionistas e menos cooperativas — e, infelizmente, “as mudanças climáticas passaram a fazer parte deste xadrez geoestratégico”, afirma Filipe Duarte Santos, professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável.

Apesar de as mudanças ocorridas este ano no tabuleiro geopolítico criarem “dificuldades na cooperação estratégica”, Duarte Santos está optimista e vê na crise do gás uma “oportunidade para acelerarmos a transição energética”. A União Europeia e Portugal conseguiram reduzir as emissões apesar do regresso ao carvão, mas, ainda assim, “a procissão ainda vai no adro”, avisa o geofísico. Esta descarbonização mundial, alerta ainda o especialista, não poderá ser feita se deixarmos para trás os países em desenvolvimento.

O seu livro mais recente, Alterações Climáticas (Fundação FMS, 2021), foi publicado antes da guerra na Ucrânia e da crise energética. Se fosse reeditado hoje, que linhas teria de acrescentar à obra?
Este deplorável conflito que temos na Europa — trágico, em muitos aspectos — veio chamar a atenção do mundo para a grande dependência que o mundo tem dos combustíveis fósseis. Não quer dizer que isto não fosse conhecido antes. Mas uma coisa é as pessoas ouvirem dizer, há cerca de 50 anos, que 80% das fontes primárias de energia são combustíveis fósseis. Outra é sentirem que se lhe cortam ou reduzem o fornecimento de gás natural ou se o preço do petróleo aumenta muito isso tem consequências muito graves sobre a economia, sobre a vida de cada um de nós. Penso que este foi o aspecto mais saliente desta dependência. Temos feito avanços na transição energética mas ainda estamos muito longe de conseguirmos a descarbonização da economia europeia e, mais longe ainda, da mundial. Esta é, portanto, uma oportunidade de acelerarmos a transição energética. E isto é uma coisa que é positiva. Mas, entretanto, em 2022, atingiu-se o máximo do consumo de carvão a nível mundial.

Antes de a guerra na Ucrânia eclodir, pensava-se que estávamos na era do fim do carvão. Já não estamos?
Não, penso que vamos acabar por deixar de consumir carvão para geração de energia. Mas, neste momento e nos próximos anos, a China continua a ter uma dependência muito grande no carvão. É o maior consumidor de carvão do mundo. No que respeita ao petróleo, o maior consumidor e produtor de petróleo no mundo são os Estados Unidos da América. Quanto ao gás natural, a maior produção é dos Estados Unidos, seguidos pela Rússia. O uso do carvão vai diminuir, mas ainda vai passar um tempo considerável até praticamente não se usar no mundo. Porque há uma grande dependência, é um combustível que é relativamente abundante e relativamente barato.

E como se faz a transição energética entretanto?
Aquilo que acho importante termos presente é que temos dois grupos de países no mundo. Um com economias avançadas e outro com os restantes países. Nos chamados países desenvolvidos, como se costuma dizer, a transição energética está a fazer-se a um ritmo que é compatível com o cumprimento do Acordo de Paris. O problema é que nos restantes países do mundo isso não está a acontecer. Pelo contrário, a trajectória das emissões de gases com efeito de estufa é crescente, o que é incompatível com o Acordo de Paris. Há que ter em atenção que estamos perante um problema global e, portanto, o que interessa são as emissões globais mundiais.

E porquê? Porque esses outros países não beneficiaram — como beneficiou o Ocidente — de consumir grandes quantidades de energia sob a forma de combustíveis fósseis e, com isso, adquirir um bem-estar e uma prosperidade económica que é invejável. Quando se faz a história das emissões dos gases com efeito de estufa, é impressionante ver como as primeiras contribuições em larga escala das emissões de dióxido de carbono vieram do Reino Unido, que foi o primeiro a explorar carvão de uma forma intensiva. Depois, veio o resto da Europa, e depois vieram os Estados Unidos. Os Estados Unidos são, do ponto de vista histórico, aqueles que emitiu maior quantidade de CO2 — cerca de 25% da totalidade das emissões históricas. Têm um total de 1,5 milhões de milhões [biliões] de toneladas de CO2. É um número gigantesco. E cerca de 22% vieram da Europa a 27, mais a Grã-Bretanha.

Foi esse consumo intensivo de energia, juntamente com a ciência moderna, com a tecnologia e com a democracia (um aspecto muito importante), que deu [a estes países] nível de vida, prosperidade e bem-estar. Nem todas as pessoas em economias avançadas beneficiam dessa situação, mas, em média, avançou-se muito na qualidade de vida das pessoas. Mas, em termos estatísticos, esta não é a situação do resto do mundo, porque, para chegar ao mesmo estado de desenvolvimento socioeconómico, será necessário consumir mais energia per capita. É necessário que os países com economias avançadas, os países mais ricos, auxiliem os outros a fazerem a transição energética e, para isso, é necessário um financiamento muito considerável. E é aí que está uma das problemáticas mais difíceis para conseguirmos a descarbonização da economia mundial.

Os dados mais recentes do Eurostat mostram que as emissões europeias continuam a cair, apesar do regresso ao carvão. Temos razões para estar optimistas?
Sim. Fruto desta situação de guerra na Europa e do risco de haver cortes de energia em França e noutros países houve uma diminuição do consumo. Isto são boas notícias. Neste aspecto, estou optimista. Mas a população global está a aumentar, todos os países têm uma agenda de desenvolvimento e é perfeitamente legítimo almejarem uma melhor situação socioeconómica. Mas, para isso, é necessário muita energia. A procura actual por energia é gigante. Portanto, temos de encontrar as fontes de energia que sejam compatíveis com o ambiente, ou seja, temos de fazer a tal transição energética. Temos de diminuir a dependência dos combustíveis fósseis. Mas isso não é uma coisa fácil, tem muitas problemáticas.

Como por exemplo?
A procura por certos elementos, como sejam lítio, o cobalto e o cádmio. Existem muitas minas e ainda se irão encontrar outras, mas não são elementos minerais inesgotáveis.

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Filipe Duarte Santos é presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável desde 2017 Nuno Ferreira Santos

A própria extracção desses elementos não é isenta de custos ambientais.
Exactamente. Temos de ter em conta que, quaisquer que sejam as formas de energia, elas estão associadas a problemáticas que têm incidências ambientais. E é muito importante que sejamos todos mais conscientes da necessidade de praticar um conceito que é o de suficiência energética. Não é eficiência energética, mas sim suficiência energética. É no fundo dizer que se pode viver bem, com formas de prosperidade, mas que não precisamos de consumir tanta energia. Podemos planear melhor as deslocações, ser mais racionais nas nossas casas, repensarmos as temperaturas que consideramos ideais. Bem sei que há muitas pessoas em Portugal que vivem em condições em que há frio dentro das casas — e não é desses que estou a falar. Temos de ter presente que a energia não se produz. “Produzir energia” é uma expressão que se usa muito, mas é errada.

Qual seria a expressão correcta?
Nós só conseguimos converter energia de uma forma para outra. Com painéis fotovoltaicos, por exemplo, conseguimos converter energia radiante (a energia electromagnética proveniente do Sol) em energia eléctrica. É um processo de conversão [e não produção].

Portugal continua a reduzir emissões de gases com efeito de estufa, em parte graças a uma produção recorde de energia a partir de fontes renováveis. Podemos ficar descansados ou esta narrativa pode desincentivar a suficiência energética?
As pessoas certamente estão a ser influenciadas pelo custo da energia, que as desincentiva a consumir energia desnecessariamente. O processo de descarbonização que está a ser feito em Portugal, relativamente ao desenvolvimento das energias renováveis, é muito meritório em comparação a outros países da União Europeia. Mas, ainda assim, a procissão ainda vai no adro. Porque daqui até atingirmos a neutralidade carbónica vai uma distância muito considerável.

Vou dar um exemplo muito concreto: a indústria cimenteira. Temos uma grande experiência na produção de cimento e sabemos que é uma indústria que consome muita energia. Como é que vamos fazer a descarbonização deste sector? Há uma primeira fase em que podemos aumentar a eficiência energética. Para a mesma funcionalidade, diminuímos as emissões. Mas a certa altura podemos utilizar também biocombustíveis que fazem parte de um ciclo biológico: as árvores são utilizadas para gerar energia, mais tarde vão nascer outras nesses terrenos.

Mas a certa altura o que se pode fazer é a captura do dióxido de carbono que é emitido nesses processos de fabricação do cimento. É algo mais disruptivo, muito mais difícil de conseguir. Mas qual é o valor económico do CO2? Bom, a tecnologia está a evoluir. Podemos combinar o dióxido de carbono (retirado directamente dos efluentes de uma siderurgia, central térmica a carvão ou grande indústria) com o hidrogénio verde (obtido a partir de fontes renováveis). Podemos fazer outros combustíveis que podem ser utilizados, por exemplo, nos aviões. Isto praticamente sem emissões de gases com efeito de estufa (há sempre emissões residuais, mas são muito menores do que se utilizarmos directamente petróleo, carvão ou gás natural).

O facto de estarmos a lidar com os efeitos de uma guerra na Europa, uma crise energética e um período de inflação está a tirar força aos esforços de mitigação e adaptação?
É difícil prever. Quando nós tivemos a crise covid-19, uma coisa que se falava com frequência era que, pelo facto de as pessoas se deslocarem menos, estarem mais recolhidas nas suas casas, a natureza começou a “aparecer” nas cidades. Mas isso foi passageiro. Logo a seguir à fase mais exigente da pandemia, a ambição das pessoas era viajar para outras paragens. Como funcionamos? Como é a nossa psicologia?

Face a uma situação de crise, aquilo que vejo na descarbonização das economias, sobretudo dos Estados Unidos, da União Europeia e da China, é que passou a estar na ordem do dia uma competição tecnológica muito vincada. Os Estados Unidos querem preservar intacta a sua superioridade tecnológica, económica e militar. As mudanças climáticas passaram a fazer parte deste xadrez geoestratégico. Esta dificuldade na cooperação geoestratégica para as questões da transição energética não é favorável à acção climática à escala global.

Estamos numa situação em que a União Europeia vai começar a estabelecer um imposto para produtos que são importados de regiões em que há menos atenção à mitigação, ou seja, à redução de emissões. É um imposto fronteiriço. Por outro lado, a China domina tudo aquilo que diz respeito à indústria dos painéis fotovoltaicos. Uma nova lei foi aprovada no Congresso americano prevê um financiamento de 370 mil milhões de dólares, dos quais uma parte vai para a transição energética. Mas isto implica uma forma de proteccionismo porque há incentivos, por exemplo, para que estes painéis solares sejam fabricados nos Estados Unidos. Ficam mais baratos porque há incentivos — e isto não é preconizado pela Organização Mundial do Comércio. Pode gerar tensões.

Depois, há a questão dos elementos. A China tem uma capacidade muito grande de explorar essas terras raras. Mas nós temos um planeta que é finito. Há uma tendência de desaceleração do crescimento, é provável que a população mundial acabe por não ultrapassar muito os 11 mil milhões, mas também isso já é um número muito elevado. O planeta continua a ser o mesmo, com os mesmos recursos. Temos de encontrar uma forma de solidariedade entre todos os países, uma forma de compreensão dos problemas comuns para enfrentarmos estes desafios do nosso tempo.

A paz e a prosperidade criam um ambiente mais favorável para acção climática?
Sim, sem dúvidas. Os Estados Unidos e a China colaboravam em questões como o desenvolvimento de indústrias, tanto eólica como a fotovoltaica. Esses grupos de trabalho deixaram de funcionar neste Verão. De certo modo, em retaliação à visita a Taiwan de Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes. Houve agora uma conversa em Bali, durante a cimeira do G20, entre o Presidente dos Estados Unidos [Joe Biden] e o Presidente da China [Xi Jinping] sobre este assunto. E isso é uma coisa positiva. Mas estamos num mundo em que os grandes blocos tendem a ser mais proteccionistas — e a transição energética vai fazer parte deste processo. A transição energética beneficia de haver maior cooperação geoestratégica, que é uma coisa que neste momento não temos entre as grandes potências do mundo.

Escreveu num artigo de opinião em que o cânone actual está alicerçado na tecnologia. Qual é o risco que corremos quando vemos na tecnologia uma solução para todos os problemas climáticos?
Esta é uma pergunta muito interessante, e aí há notícias novas. Alcançámos recentemente aquilo a que se chama, em termos técnicos, o Critério de Lawson na fusão nuclear. Isto foi feito num laboratório que tem como uma das suas missões aperfeiçoar as bombas de hidrogénio. Eles produziram mais energia com a fusão do que gastaram com os feixes muito potentes de laser usados para gerar temperaturas muito elevadas. Mas ainda estamos longe de ter uma aplicação comercial, ainda estamos na fase das experiências.

Há muitas possibilidades tecnológicas. Mas a tecnologia, até a um certo ponto, é uma ilusão. Porque o mais importante somos nós próprios, seres humanos. As nossas capacidades e as nossas deficiências. Conhecermo-nos a nós próprios, como dizia o filósofo Sócrates. Somos muito motivados pela utilidade, ou seja, pelo consumo. Com as tais 11 mil milhões de pessoas que referi, não vejo como seja possível. Acresce que temos um mundo muito desigual e esse é o principal obstáculo.

O nosso cérebro foi desenhado pela evolução para tomar decisões em função de critérios de sobrevivência. Se a crise climática é um desafio de vida ou morte para a humanidade, por que razão há tanto cepticismo?
Primeiro deixe-me dizer que não estou nada convencido de que a nossa sobrevivência como espécie esteja em perigo. Excepto no caso de uma guerra nuclear — aí sim, as coisas são realmente muito mais complicadas.

Nem a longo prazo? Estou a pensar nas gerações seguintes.
Quanto mais longo é o prazo, maior é a incerteza. Estou convencido de que temos uma capacidade de adaptação muito grande. Aquilo que me ocorre dizer em resposta é que é possível resolver este problema da transição energética. Vou-lhe dar um exemplo muito concreto de um artigo que foi publicado na Science, que é uma revista americana, uma das melhores do mundo.

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Para Filipe Duarte Santos, "a guerra é o oposto da sustentabilidade" Nuno Ferreira Santos

É uma publicação científica revista por pares.
Exactamente. Foi publicado salvo erro em Outubro de 2020, no ano da pandemia. E o que eles fizeram foi comparar o investimento que foi feito pelos países mais desenvolvidos para combater a pandemia. Esse investimento foi feito em desenvolver as vacinas e em torná-las acessíveis. Em Portugal, como em tantos outros países, as pessoas foram vacinadas sem pagar.

Depois, os autores compararam esse custo, que é da ordem dos milhões de milhões, com o investimento necessário para fazer a transição energética. Poder-se-á dizer logo à partida: “Ah, bom, mas as coisas não são comparáveis.” Porque na covid era a vida das pessoas que estava em causa, ao passo que na mudança climática não é, embora haja um número elevado de vítimas nos eventos extremos. Mas há o facto de que o custo da transição energética é, realmente, muito menor se comparado ao investimento feito para se defenderem da covid-19.

Isto mostra que é possível?
É possível. Em relação às alterações climáticas, o problema é mais político do que económico. Não podemos deixar de dizer que há países, como os Estados Unidos, cuja economia e riqueza foram baseadas nos combustíveis fósseis. A indústria dos combustíveis fósseis é muito poderosa e optou por desinformar, semear alguma dúvida sobre a justificação de estas mudanças climáticas estarem relacionadas com a actividade humana. Isso é uma coisa que está muito bem estabelecida. E, portanto, isso será parte deste cepticismo que temos observado.

Tem um discurso optimista. Há algo que lhe tire o sono quando pensa na crise climática?
Acredito muito na nossa racionalidade. Penso que somos seres racionais, temos essa capacidade. E temos todas as outras características relacionadas com o circuito da dopamina no nosso cérebro. É um cérebro que é comum a todos os mamíferos. Mas nós, aquando da evolução do género Homo, do qual o Homo sapiens é a única espécie que ainda existe, tivemos o volume do nosso cérebro muito aumentado.

Temos este ciclo da dopamina que está muito relacionado com a reprodução, o prazer que nos dá a comida e com o consumo. A satisfação que nos dá ir a um hipermercado comprar alguma coisa, porque estamos aborrecidos com qualquer coisa, e aquela aquisição nos dá um certo alento. É muito importante conhecermos estes aspectos de como nós funcionamos. E termos a capacidade de amenizar estas tendências mais primitivas. Outro aspecto é a questão do tempo. Nós estamos muito mais centrados com o curto prazo, com aquilo que se vai passar na próxima semana, no próximo mês. Como é que vamos chegar ao fim do mês? E isso é perfeitamente justificável, mas também temos de pensar que os nossos filhos, os nossos netos, vão viver neste mundo. Não vão viver em Marte.

O que está a dizer é que, se vou a um shopping e compro um novo produto electrónico, o meu reforço é imediato. Ao passo que a recompensa por um esforço em prol da mitigação já será muito distante no tempo. É isso?
Exactamente. É uma recompensa em diferido. É muito mais complexa do ponto de vista mental. Até podemos não ver o benefício que os nossos bisnetos terão. É este o aspecto que acho importante as pessoas racionalizarem. Quanto mais pessoas racionalizarem isso, melhor será a nossa resposta. Mas insisto que o problema será muito diferente nos nossos países e em África, certos países da América Latina ou mesmo na Índia. Esta é a grande complexidade, porque temos realmente um mundo muito desigual. Todos os países têm interesses comuns em termos destes problemas climáticos globais, mas é muito difícil comunicar isto. Vamos ter de privilegiar aquilo que temos em comum. Temos de dar mais atenção ao nosso futuro comum e isso é realmente um esforço — mas acho que é um esforço que dará bons resultados no futuro.

Com o ano novo quase a bater à porta, qual é o seu desejo para o planeta em 2023?
Paz. A guerra é uma situação extrema — fala-se muito de sustentabilidade e a guerra é exactamente o oposto disso. Devíamos caminhar para um mundo com maior cooperação geoestratégica entre as grandes potências. Há espaço para todos.

  in jornal Público


Nada melhor que o contraditório

 

Want to sign? Please fill in this form.

Climate science should be less political, while climate policies should be more scientific. In particular, scientists should emphasize that their modeling output is not the result of magic: computer models are human-made. What comes out is fully dependent on what theoreticians and programmers have put in: hypotheses, assumptions, relationships, parameterizations, stability constraints, etc. Unfortunately, in mainstream climate science most of this input is undeclared.

To believe the outcome of a climate model is to believe what the model makers have put in.  This is precisely the problem of today’s climate discussion to which climate models are central. Climate science has degenerated into a discussion based on beliefs, not on sound self-critical science. We should free ourselves from the naïve belief in immature climate models. In future, climate research must give significantly more emphasis to empirical science.

There is no climate emergency

A global network of over 1400 scientists and professionals has prepared this urgent message. Climate science should be less political, while climate policies should be more scientific. Scientists should openly address uncertainties and exaggerations in their predictions of global warming, while politicians should dispassionately count the real costs as well as the imagined benefits of their policy measures.

Natural as well as anthropogenic factors cause warming

The geological archive reveals that Earth’s climate has varied as long as the planet has existed, with natural cold and warm phases. The Little Ice Age ended as recently as 1850. Therefore, it is no surprise that we now are experiencing a period of warming.

Warming is far slower than predicted

The world has warmed significantly less than predicted by IPCC on the basis of modeled anthropogenic forcing. The gap between the real world and the modeled world tells us that we are far from understanding climate change.

Climate policy relies on inadequate models

Climate models have many shortcomings and are not remotely plausible as global policy tools. They blow up the effect of greenhouse gases such as CO2. In addition, they ignore the fact that enriching the atmosphere with CO2 is beneficial.

CO2 is plant food, the basis of all life on Earth

CO2 is not a pollutant. It is essential to all life on Earth. Photosynthesis is a blessing. More CO2 is beneficial for nature, greening the Earth: additional CO2 in the air has promoted growth in global plant biomass. It is also good for agriculture, increasing the yields of crops worldwide.

Global warming has not increased natural disasters

There is no statistical evidence that global warming is intensifying hurricanes, floods, droughts and suchlike natural disasters, or making them more frequent. However, there is ample evidence that CO2-mitigation measures are as damaging as they are costly.

Climate policy must respect scientific and economic realities

There is no climate emergency. Therefore, there is no cause for panic and alarm. We strongly oppose the harmful and unrealistic net-zero CO2 policy proposed for 2050. If better approaches emerge, and they certainly will, we have ample time to reflect and re-adapt. The aim of global policy should be ‘prosperity for all’ by providing reliable and affordable energy at all times. In a prosperous society men and women are well educated, birthrates are low and people care about their environment.

Epilogue

The World Climate Declaration (WCD) has brought a large variety of competent scientists together from all over the world*. The considerable knowledge and experience of this group is indispensable in reaching a balanced, dispassionate and competent view of climate change.

From now onward the group is going to function as “Global Climate Intelligence Group”. The CLINTEL Group will give solicited and unsolicited advice on climate change and energy transition to governments and companies worldwide.

* It is not the number of experts but the quality of arguments that counts

World Climate Declaration plus all signatories in pdf

World Climate Declaration AMBASSADORS

NOBEL LAUREATE PROFESSOR IVAR GIAEVER NORWAY/USA
PROFESSOR GUUS BERKHOUT / THE NETHERLANDS
DR. CORNELIS LE PAIR / THE NETHERLANDS
PROFESSOR REYNALD DU BERGER / FRENCH SPEAKING CANADA
BARRY BRILL / NEW ZEALAND
VIV FORBES / AUSTRALIA
DR. PATRICK MOORE / ENGLISH SPEAKING CANADA
JENS MORTON HANSEN / DENMARK
PROFESSOR LÁSZIÓ SZARKA / HUNGARY
PROFESSOR SEOK SOON PARK / SOUTH KOREA
PROFESSOR JAN-ERIK SOLHEIM / NORWAY
STAVROS ALEXANDRIS / GREECE
FERDINAND MEEUS / DUTCH SPEAKING BELGIUM
PROFESSOR RICHARD LINDZEN / USA
HENRI A. MASSON / FRENCH SPEAKING BELGIUM
PROFESSOR INGEMAR NORDIN / SWEDEN
JIM O’BRIEN / REPUBLIC OF IRELAND
PROFESSOR IAN PLIMER / AUSTRALIA
DOUGLAS POLLOCK / CHILE
DR. BLANCA PARGA LANDA / SPAIN
PROFESSOR ALBERTO PRESTININZI / ITALY
PROFESSOR BENOÎT RITTAUD / FRANCE
DR. THIAGO MAIA / BRAZIL
PROFESSOR FRITZ VAHRENHOLT / GERMANY
THE VISCOUNT MONCKTON OF BRENCHLEY / UNITED KINGDOM
DUŠAN BIŽIĆ / CROATIA, BOSNIA AND HERZEGOVINA, SERBIA AND MONTE NEGRO

terça-feira, 27 de dezembro de 2022

O que estimula

   É um erro grave quando se subestima a moral, o seu papel na ação política. Tanto erram aqueles que ainda declaram que a moral marxista (qual?)  faz do seu seguidor um indivíduo com uma moralidade superior a todas as demais que existem, quanto aqueles que afirmam que a ética é sempre exclusivamente kantiana sem que Marx tenha criado alguma. Tanto o espírito de seita, como o desprezo pelos "reformismos" de fundo ético (como realmente foi o revisionismo de Bernstein) são errados. Provas não faltam. 

  A moral, enquanto concessionária de uma visão do mundo (por mais contraditória, anticientífica e meramente empírica que seja), explica a seu  modo o que fazer, como reagir, como avaliar. 

Numa sociedade de classes (e nunca houve outra que não o fosse) a moral dominante, senão mesmo a única nessa sociedade, é a conceção do mundo e da vida, o guia da ação e de interpretação, o avaliador comum espontâneo e quase automático, é o pensar comum, o pensar que melhor serve os interesses conservadores da classe que exerce a dominação social e cultural. Esta classe domina reprimindo outras regras ou princípios avaliadores que ponham em risco o seu domínio. A moral dominante é, por isso, sobretudo repressora, culpabilizadora, castradora.

  Nas épocas em que uma outra moral se lhe opõe, a combate, estimula e guia a luta, a transição revolucionária já começou. E chegará ao seu termo, dure o tempo que durar.

  Há que proceder a juízos morais (certo/errado, bem/mal), educar para o ajuizamento moral, provocar, assim, a indignação, e fazer da indignação a revolta, e da revolta a alternativa.

  Os valores morais são a alma da revolução.

domingo, 25 de dezembro de 2022

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Uma nova moral antes que o mundo acabe

 TESES

   O que conduz às mudanças de tipo moral é o processo histórico: as transformações no modo de vida material das coletividades humanas. A moral é um fenómeno embebido na e pela historicidade de todos os fenómenos, sociais e naturais. Estas morais relativas não possuem um núcleo a que possamos chamar de “essência da moral”. A essência, isto é, o núcleo de uma ontologia materialista e científica, encontra-se fora da cultura e da Ideologia. Segundo G. Lukács a categoria essencial numa ontologia do ser social é o trabalho. Ora, seja o trabalho seja outra categoria sociológica somente foi e é possível pela existência essencial da natureza, da materialidade do mundo, incluindo a espécie humana.

 Sendo que, como se disse, as mudanças nas diversas morais históricas são profundamente condicionadas pelas realidades a que chamamos Economia, Política, Antropologia, verifica-se que o modo de produção capitalista (desenvolvimento das forças produtivas que criam determinadas relações sociais e que se interinfluenciam) criou condições materiais e culturais (nomeadamente as ciências) que permitiriam uma nova moral completamente oposta. Uma moral para a qual efetivamente todos os seres humanos devem ser tratados como fins e não como meios ; o que significa o fim da exploração da força de trabalho pelos capitalistas. Com o termo da exploração (dita económica, mas que é simultaneamente moral e política) desapareceria a alienação do trabalhador. Sem esta exploração do assalariado desapareceria o mercado e, portanto, o fetichismo (feiticismo) da mercadoria.

  Podem novos Estados políticos, reformas revolucionárias na economia, experimentar justamente formas de democracia popular avançadas que coexistam com o modo d eprodução capitalista dominando-o, extraindo do mercado rendimentos que beneficiem populações trabalhadoras nomeadamente de áreas pobres. Contudo, a moral nova somente se implantará quando desaparecer qualquer forma de exploração do homem pelo homem. Entretanto, coexistem em conflito e contradição uma moral antiga, a capitalista, e elementos de uma moral não capitalista, normalmente designada como socialista, embora o termo seja muito controverso nessas condições.

  Consideradas estas teses só se pode concluir que os socialismos existentes no século passado não criaram uma nova moral, pelo menos no seu todo, que merecesse o termo socialista, tal como este se depreende dos textos de Marx. É verdade, não tenho dúvidas e reservas sobre isto, que construíram (algumas dessas experiências, e falamos nomeadamente da extinta URSS) elementos que cabem perfeitamente no termo socialismo , como sejam; saúde e ensino gratuito e universal, pleno emprego, habitação liberta do mercado, grande promoção da literacia, etc. Porém, em todas essas experiências mais ou menos longas a existência de liberdades coletivas e individuais foi sempre muito precária (damos como exemplo maior a existência de uma censura intoleravelmente policial) . Em algumas dessas experiências existentes ainda, tal como aquelas que se extinguiram rapidamente nas antigas colónias, muito embora não sejam (ainda??)  permitidas grandes empresas capitalistas, o tratamento do homem como um meio e não um fim permanece  ou adquiriu novas formas, particularmente sob a forma de um elite de partido que goza de benesses e de privilégios incompatíveis com uma nova moralidade. Refira-se a praga da corrupção que varreu Estados que se formaram com a independências das colónias. Factos que se chocam com qualquer moral existente no mundo desde séculos. As sociedades capitalistas vivem com a corrupção, como é evidente, porém mesmo elas proíbem-na ou censuram-na.

Assim a moral socialista e comunista ficou demasiado desacreditada para agora constituir uma dura tarefa reconvertê-la em credível. Para isso, há que demonstrar que esses socialismos não foram no rigor do termo ; foram, pelo contrário desvios muito graves. Tão profundos que continham a própria autonegação dos programas ditos socialistas (nalguns casos nada nesses programas foi cumprido). E tão graves que nenhum contexto conturbado permite justificar. A República Popular da Coreia (do Norte) contem, segundo julgo, importantes transformações económicas e sociais (ensino, saúde, habitação, ciência técnica) que seriam benéficas se fossem aplicadas em todo o mundo ; porém, não há retóricas que justifiquem que aquele Estado é democrático e muito menos socialista. E nunca virá a sê-lo se os ataques dos países imperialistas-colonialistas não cessarem. 

Devemos aprender com o passado pois ele é o único grande livro de aprendizagem. Mas nunca repeti-lo.

----Nozes Pires-----15/12/2022

   (Todos textos que publico são da minha exclusiva autoria, exceto os que vêm assinados por outros autores)

terça-feira, 13 de dezembro de 2022

O Inquérito Operário - Karl Marx

 

O Inquérito Operário

Karl Marx

20 de Abril de 1880


Primeira Edição: La Revue socialiste, April 20, 1880

Fonte: Karl Marx, Mao Tsé-tung: Inquérito Operário e Luta Política, Textos Marginais, Porto, 1974

Tradução do Prefácio: Reinaldo Pedreira Cerqueira da Silva

Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo.


capa

Introdução

Numa carta a Serge, em 5 de Novembro do 1880, Marx escrevia que redigira para a Revue Socialiste de Benoi Malon um «Questionneur» (sic) de que tinham sido distribuídas muitas cópias por toda a França. «Pouco depois, Guesde veio a Londres para preparar em colaboração connosco (eu, Engels e Lafargue) um programa eleitoral para os operários, por motivos das próximas eleições»(1)

O questionário foi publicado pela primeira vez na Revue Socialiste, a 20 do Abril de 1880. Além disso, distribuíram-se 25 000 exemplares «a todas as sociedades operárias, aos grupos e círculos socialistas e democráticos, aos jornais franceses e a todos os que o pediram». Estes exemplares não estavam datados.

O texto do questionário está precedido de um breve prefácio, que recorda os estudos e inquéritos realizados pelo Governo inglês sobre as condições da classe operária e recomenda ao Governo francês que o imite. Exorta os operários da Cidade e do campo a responderem às perguntas do questionário, porque só eles podem descrever «com pleno conhecimento de causa os males que suportam», «só eles e não um salvador providencial pode administrar energicamente os remédios dos males sociais de que padecem». O apelo vai dirigido também aos «socialistas de todas as escolas que desejam a reforma social e devem desejar, por conseguinte, ter um conhecimento exacto e positivo das condições em que vive e trabalha a classe operária, a classe a que pertence o futuro»

O prefácio declara, finalmente, que «as respostas serão classificadas e fornecerão dados para uma série de artigos especiais, que se publicarão na Revue Socialiste, para serem reunidos posteriormente num volume»(2)

O questionário divide-se em quatro partes e contêm, no total, 100 perguntas. A primeira parte refere-se ao emprego e às condições do trabalho; à segunda aos horários de trabalho e de tempo livre; a terceira às condições do contrato de trabalho, aos salários e ao custo de vida; a quarta à luta da classe operária pela melhoria das suas condições.

Prefácio

Nem um único governo, mesmo Monarquia ou República burguesa, ainda se aventurou a realizar uma investigação séria para a posição da classe operária francesa. Mas quantas investigações têm sido realizadas em crises – agrícolas, financeiras, industriais, comerciais e políticas!

As características sombrias da exploração capitalista que foram expostas pela investigação oficial organizada pelo governo inglês e a legislação que foi necessária lá como resultado dessas revelações (limitação legal da jornada de trabalho para 10 horas, a lei sobre o trabalho feminino e infantil, etc.), forçaram a burguesia francesa a tremer ainda mais diante dos perigos que uma investigação imparcial e sistemática possa representar. Na esperança de que talvez nós devamos induzir um governo republicano a seguir o exemplo do governo monárquico da Inglaterra e da mesma forma organizar uma investigação de grande envergadura em fatos e crimes de exploração capitalista, vamos tentar iniciar um inquérito deste tipo com os recursos pobres que estão à nossa disposição. Esperamos contrar, neste trabalho, com o apoio de todos os trabalhadores da cidade e do campo que entendem que só eles podem descrever com pleno conhecimento as desgraças que eles sofrem e que somente eles, e não salvadores enviados pela providência, podem energicamente aplicar a cura dos remédios para os males sociais que estão sofrendo. Nós também dependemos dos socialistas de todas as tendências que, sendo desejosos de uma reforma social, devem desejar um conhecimento exato e positivo das condições em que a classe trabalhadora – a classe a quem o futuro pertence – trabalha e se movimenta.

Estas declarações de queixas de trabalho são o primeiro ato que a democracia socialista deve executar, a fim de preparar o caminho para a regeneração social.

As cem perguntas seguintes são as mais importantes. Nas respostas deve ser dado o número de pergunta correspondente. Não é essencial responder a todas perguntas, mas nossa recomendação é que as respostas devam ser a mais detalhada e abrangente possível. O nome do trabalhador ou da trabalhadora que está respondendo não será publicado sem permissão especial, mas o nome e o endereço deve ser dado para que, se necessário, possamos enviar comunicação.

As respostas devem ser enviadas ao Secretário da Revue Socialiste, Sr. Lecluse, rue Royale, Nuvem Santa, nr. 28 Paris.

As respostas serão classificadas e vão servir como material para estudos especiais, que serão publicados na Revista e, mais tarde, reeditado em um volume separado.

O Questionário

I

1. Em que trabalhas?

2. A fábrica onde trabalhas pertence a um capitalista ou a uma sociedade por acções? Dá os nomes dos patrçoes ou dos directores da companhia.

3. Número de pessoas que trabalham na tua fábrica.

4. Idade e sexo dessas pessoas.

5. Com que idade mínima começam a trabalhar os jovens (rapazes e raparigas)?

6. Número de vigilantes e contramestres e de outros empregados que não sejam assalariados ordinários.

7. Há aprendizes? Quantos?

8. Além dos operários que trabalham normal e regularmente, há outros que só trabalham em períodos determinados?

9. A tua fábrica trabalha exclusiva ou fundamentalmente para o mercado local, para o mercado nacional ou para a exportação?

10. A fábrica está situada no campo ou na cidade? Indica o nome exacto do lugar.

11. Se a fábrica está situada no campo, chega-te para viver o que ganhas no trabalho industrial ou precisas de combiná-lo com o trabalho agrícola?

12. Trabalhas à mão ou com a aiuda de uma máquina?

13. Dá detalhes sobre a divisão do trabalho na tua fábrica.

14. Utiliza-se a força do vapor?

15. Número de oficinas em que se dividem os distintos sectores da fábrica. Descreve o sector especial em que trabalhas, com informação não só sobre os aspectos técnicos mas também sobre a tensão muscular e nervosa que implicam e sobre os efeitos gerais do trabalho na saúde dos operários.

16. Descreve as condições sanitárias da oficina, número de salas, espaço atribuído a cada operario; ventilação; temperatura, o branqueado das paredes, dos lavabos, limpeza geral; ruído das máquinas, pó, humidade, etc.

17. Existe alguma supervisão municipal ou governamental sobre as condições sanitárias das oficinas?

18. Há na tua fábrica gases nocivos que provoquem doenças específicas entre os operários?

19. Existe uma acumulação excessiva de máqumas nas oficinas?

20. Existe alguma protecção nas máquinas, nos sistemas de transmissão e nos motores para evitar os acidentes?

21. Enumera os acidentes de que tiveste conhecimento pessoal.

22. Se trabalhas numa mina, enumera as medidas preventivas adoptadas pelo patrão para assegurar uma ventilação adequada e impedir explosões o outros acidentes perigosos.

23. Se trabalhas na indústria química, na metalurgia ou em qualquer outro ramo particularmente perigoso enumera as medidas de segurança adoptadas pelo teu patrão.

24. Como está iluminada a tua fábrica (gás, parafina, etc)?

25 Em caso de incêndio, existem suficientes saídas de emergência?

26. Em caso de acidente, fica o teu patrão obrigado, por lei, a pagar uma indemnização ao operário ou à sua família?

27. Se não está obrigado, já pagou alguma indemnização aos que sofrem algum acidente enquanto trabalham para o enriquecerem?

28. Existe algum serviço médico na tua fábrica?

29. Se trabalhas em casa, descreva as condições da divisão de trabalho. Utilizas ferramentas ou máquinas pequenas? Os filhos ou outras pessoas (adultos ou crianças, homens ou mulheres) ajudam-te? Trabalhas para clientes individuais ou para um empreiteiro? Tratas directamente com este ou com intermediário?

II

30. Número de horas que trabalhas cada dia, e dias de trabalho da semana.

31. Dias de festa durante o ano.

32. Quantas interrupções fazes durante as horas de trabalho?

33. Comes com intervalos regulares ou de maneira irregular? Comes na própria fábrica ou num outro lugar?

34. Trabalhas durante as horas destinadas às refeições?

35. Se se utiliza a força do vapor, quando se põe em marcha e quando se desliga?

36. Há trabalho nocturno?

37. Quantas horas trabalham as crianças e os menores de dezasseis anos?

38. Há turnos de criança e jovens que se substituem durante a horas de trabalho?

39. O Govemo ou a municipalidade fazem aplicar as leis sobre o trabalho infantil? O patrão respeita-as?

40. Existem escolas para as crianças e jovens que trabalham na tua fábrica? Se existem qual o seu horário? Quem as dirige? O que se ensina nelas?

41. Quando o trabalho é contínuo, dia e noite, como se organizam os turnos?

42. Qual é o incremento normal das horas de trabalho durante os períodos de grande atividade industrial?

43. As máquinas são limpas por operários especialmente dedicados a esta tarefa ou são-no gratuitamente pelos próprios operários que as fazem funcionar durante as hons de trabalho?

44. Como se regula e castiga o facto de chegar tarde ao trabalho? A que horas começa o dia de trabalho e a que horas recomeça após a refeição?

45. De quanto tempo necessitas para chegar ao trabalho e para regressar a casa?

III

46. Que tipo de contrato de trabalho te liga ao teu patrão? Diário, semanal, mensal, etc?

47. Quais as condições do pré-aviso, por teu lado ou por lado do patrão?

48. Se se quebra o contrato, que castigo se impõe ao patrão em caso de ser ele o culpado?

49. E se a culpa é do operário, que castigo lhe é imposto?

50. Se há aprendizes quais os termos do seu contrato?

51. O teu trabalho é regular ou irregular?

52. No teu ramo, o teu trabalho é por temporadas ou mantêm, mais ou menos, o mesmo nível durante todo o ano, em épocas normais? Se é temporário, de que vives enquanto não trabalhas?

53. Pagam-te segundo o tempo de trabalho ou à tarefa?

54. Se te pagam segundo o tempo, é por horas ou por dias inteiros de trabalho?

55. Há algum pagamento adicionai pelo trabalho extra? A quanto monta?

56. Se te pagam por tarefa, qual é a tarifa? Se estás numa indústria em que o trabalho se mede pela quantidade ou peso, como acontece nas minas, o patrão ou os seus representantes costumam cometer fraudes para te roubarem uma parte do que ganhaste?

57. Se te pagam por tarefa, utilizam como pretexto a qualidade do artigo para reduzirem, fraudulentamente, o teu salário?

58. Se te pagam à tareia ou à hora, em que dia recebes? Ou, dito de outra maneira; quanto dura o crédito que abres ao teu patrão antes de receberes o preço do trabalho realizado? Cobras no final da semana, do mês, etc.?

59. O período de pagamento dos teus salários obriga-te a recorrer ao usurário, pagando um juro elevado e privando-te, assim, de coisas de que necessitas, ou a contrair dívidas com o lojista e a converteres-te em sua vítima pelo facto de lhe deveres dinheiro? Conheces algum caso em que os operários tenham perdido os seus salários devido à falência dos patrões?

60. É o patrão, directamente, ou os seus intermediários (sub-contratantes, etc.) quem paga os salários?

61. Se são os sub-contratantes ou outros intermediários que os pagam, quais os termos do teu contrato?

62. Qual a média diária e semanal do teu salário em dinheiro?

63. Que salários auferem as mulheres e as crianças que trabalham na tua fábrica?

64. Qual o salário mais alto na tua fábrica durante o mês passado?

65. Qual foi a tarifa mais elevada do salário por tarefa?

66. Qual foi o teu salário durante o mesmo período? Se tens família, quais foram os salários da tua mulher e dos teus filhos?

67. Se vives numa casa que o patrão te arrendou, quais são as condições? Reduz a renda do teu salário?

68. Quais são os preços dos artigos de primeira necessidade como:

  1. rendas de casa;
  2. condições de arrendamento;
  3. número de divisões, número de habitantes, reparações e seguros, compra e conservação dos móveis, aquecimento, luz, água;
  4. alimentação: pão, carne, legumes, batatas, etc., leite, ovos, peixe, manteiga, azeite, banha, açúcar, sal, especiarias, café, chicória, cerveja, cidra, vinho, etc., tabaco;
  5. roupa para os pais e filhos, lavagem da roupa, higiene pessoal, banhos, sabão, etc.;
  6. despesas diversas: correios, juros dos empréstimos, escola dos filhos ou gastos com as despesas de aprendizagem de um ofício, jornais e livros, quotas das sociedades recreativas ou contribuições para as greves, para as cooperativas e sociedades de defesa;
  7. despesas causadas pelo teu trabalho, se as há;
  8. impostos

69. Tenta estabelecer uma relação das receitas e despesas semanais e anuais tuas e da tua família.

70. Comprovaste pessoalmente uma maior elevação dos preços dos artigos de primeira necessidade (como os alimentos e o alojamento) do que dos salários?

71. Flutuações que conheças dos índices de salários?

72. Redução de salários durante 0s períodos de estagnação e de crises industriais.

73. Aumentos de salários durante os chamados períodos de prosperidade.

74. Indica as interrupções do trabalho devidas a alterações de hábitos e a crises particulares e gerais. Explica as tuas experiências pessoais de suspensão forçada do trabalho.

75. Compara o preço do artigo que produzes ou dos serviços que prestas com o preço do teu trabalho.

76. Cita algum caso que conheças de operários despedidos pela introdução de máquinas ou outros aperfeiçoamentos.

77. Com o desenvolvimento da maquinaria e da produtividade do trabalho, aumentaram ou diminuíram a intensidade e a duração do trabalho?

78. Conheces algum caso de aumento de salários devido ao aperfeiçoamento da produção?

79. Conheces algum trabalhador que se tenha podido retirar aos 50 anos e que possa viver com o dinheiro ganho como assalariado?

80. No teu ramo, quantos anos pode trabalhar um operário de saúde normal?

IV

81. Existem organizações de defesa no teu ramo? Como estão dirigidas? Envia os seus estatutos e regulamentos.

82. Quantas greves houve no teu ramo durante a tua vida de trabalhador?

83. Quanto tempo duraram estas greves?

84. Foram gerais ou parciais?

85. Foram para exigir um aumento de salários ou para se oporem a uma redução salarial? Referem-se à duração do dia de trabalho ou deviam-se a qualquer outro fator?

86. Que resultados se conseguiram?

87. O que pensas da actividade dos Prud’hommes?(3) (árbitros).

88. Fizeram, no vosso ramo, greves de solidariedade com os operários de outros ramos?

89. Descreve as regras e os castigos instituídos pelo teu patrão para controlar os seus assalariados.

90. Houve coligações de patrões para reduzirem os salários, incrementar as horas de trabalho, impedir as greves e, em geral, para imporem a sua vontade?

91. Conheces algum caso em que o Governo tenha posto as forças do Estado à disposição dos patrões contra os operários?

92. Conheces algum caso em que o Governo tenha intervido para proteger os operários contra as exacções dos patrões e suas coligações ilegais?

93. O Governo aplica a actual legislação do trabalho contra os seus patrões? Os inspectores cumprem o seu dever conscientemente?

94. Existe na tua fábrica ou no teu ramo alguma sociedade mútua para os casos de acidente, doença, morte, incapacidade temporária para o trabalho, velhice. etc.? Envia os respectivos estatutos e regulamentos.

95. A adesão a estas sociedades é voluntária ou obrigatória? Os seus fundos estão controlados unicamente pelos operários?

96. Se as quotas são obrigatórias e estão controladas pelos patrões deduzem-se dos salários? Paga-se juros por essas quotas? São devolvidas ao operário quando cessa o seu trabalho ou é despedido? Conheces algum caso em que os operários tenham beneficiado dos chamados fundos de aposentação, controlados pelos patrões, mas cujo capital vem dos salários dos operários?

97. Há sociedades cooperativas no vosso ramo? Como estão dirigidas? Utilizam trabalhadores exteriores à sociedade, tal como os capitalistas? Envia os estatutos e regulamentos respectivos.

98. No teu ramo há fábricas em que os operários sejam remunerados em parte com o salário e em parte com a chamada participação nos lucros? Compara as remunerações recebidas por estes operários com as dos operários das fábricas onde não existe a chamada participação nos lucros. Que obrigações têm os operários submetidos a este sistema? Podem fazer greves? Ou só se lhes permite serem os humildes servidores dos seus amos?

99. Qual é a condição geral, física, intelectual e moral dos operários (homens e mulheres que trabalham no teu ramo?

100. Observações gerais.


Notas de rodapé:

(1) Brief an F. A. Sorge und Andere, Stuttgart, 1906, p. 170. (retornar ao texto)

(2) Na realidade não se publicou nenhum resultado do inquérito. O número da Revue Socialiste de 5 de Julho de 1880 dizia que se tinham recebido muito poucas respostas e pedia aos leitores que enviassem as suas o mais depressa possível. Nos números seguintes não se fez referência alguma o inquérito e Revue deidou de publicar-se em 1881. (retornar ao texto

(3) O conselho dos Prud'hommes era um comité que arbritava as disputas entre os operários e os patrões. (retornar ao texto)

Viagem à Polónia

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Auschwitz: nele pereceram 4 milhôes de judeus. Depois dos nazis os genocídios continuaram por outras formas.

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Auschwitz, Campo de extermínio. Memória do Mal Absoluto.