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domingo, 17 de março de 2024

É por isto e por outras razões que os meninos votam (os que têm idade para isso) no Chega e assim pela Europa fora


Começar outra vez

É difícil explicar o que se sente quando rapazes que ainda nem são maiores de idade, defendem com toda a veemência que jamais aceitarão ter uma mulher que ganhe mais do que eles.


O cenário é o auditório de uma escola secundária do interior do país onde, sentados por turma, cerca de 200 adolescentes aguardam o início da sessão de Educação para a Saúde organizada pelo Gabinete de Psicologia. E enquanto fazemos um compasso de espera porque, ao que parece, falta chegar uma turma de Economia, aproveito para olhar para os miúdos que, curiosamente, fazem muito menos barulho do que seria expectável. Talvez o silêncio se deva ao facto de a grande maioria ter a cabeça enterrada num ecrã de telemóvel, é certo. Mas a tranquilidade relativa permite-me observá-los de verdade e, de repente, sinto que consigo vê-los.
Uma miúda loura, de faces muito ruborizadas, tem uma expressão que se assemelha a pânico. A forma como utiliza as mãos para se agarrar às laterais do assento deixa-me perturbada. Sinto que a cadeira é aquilo que a protege do mundo e, quase sem querer, creio ter descoberto o motivo. Há três miúdas, umas quantas filas atrás, que não param de olhar para ela e sussurrar. Cada sussurro é veneno.
Começar outra vez
E depois há um grupo de seis rapazes que, mais ou menos a meio do auditório, distribui sorrisos e acenos em todas as direcções. Parecem uma espécie de família real da escola. Os demais rapazes olham-nos com a esperança de serem chamados para perto de tão nobres figuras e as raparigas suspiram pelos cabelos cortados em formato de capacete. Já não me lembrava que o ensino secundário é mesmo um lugar estranho.

E é comigo perdida em devaneios que a turma em falta faz a sua entrada triunfal. As minhas companheiras de mesa olham-me e uma delas diz “vamos a isto?”. Começamos.

Eu, como acontece muitas vezes, vim falar sobre a importância de utilizar preservativo numa altura em que as campanhas sobre esta temática são escassas. Já aqui escrevi sobre o tema, mas deixem-me repetir que os números são cada vez mais preocupantes: desde que existe vigilância epidemiológica das Infecções Sexualmente Transmissíveis na Europa (2009), nunca tivemos tantos casos de gonorreia como em 2022. E a clamídia e a sífilis também seguem disparadas. Já agora, para que fique o registo, Portugal foi o sexto país da Europa com a taxa mais elevada de sífilis em 2022. E é urgente que se comece a trazer este assunto para a ordem do dia e que se invista a sério em campanhas de sensibilização para os mais jovens. Enfermeiras a falar em escolas ajudam, mas não são suficientes. Tal como o marketing da marca de preservativos Control que sozinho não faz milagres. É preciso entrar pela casa dos miúdos nem que, para isso, se tenham de fazer dancinhas de TikTok a explicar que a gonorreia pode causar infertilidade, que a clamídia pode provocar doença inflamatória pélvica e que a sífilis pode matar. O que vos digo, e o que digo também a estas duas centenas de miúdos, é que temos de acordar.

Mas não é sobre a minha conversa que quero escrever hoje porque, na verdade, este é um tema consensual. Já os dois temas seguintes, igualdade de género e violência no namoro, dão origem a um prolongado debate que, devo dizer, me deixa até indisposta.
Começar outra vez
Reparem, eu conheço os números. Ainda há cerca de uma semana, o El País publicava um estudo que mostrava claramente que os homens da geração Z eram mais conservadores e tinham uma visão mais negativa do feminismo do que aqueles que os antecederam. Já em 2022, o The Survey Center on American Life concluiu que homens e mulheres pertencentes à geração nascida entre 1997 e 2012 tinham percepções muito diferentes sobre temas como o aborto ou a igualdade de género. Eles eram mais conservadores e elas mais progressistas. Mas mesmo sabendo os conceitos e dados teóricos, é difícil explicar o que se sente quando rapazes que ainda nem são maiores de idade, defendem com toda a veemência que jamais aceitarão ter uma mulher que ganhe mais do que eles e que é ao homem que cabe garantir o sustento do lar. E esta é a parte em que eu podia dizer que estamos a voltar ao tempo das cavernas, mas a ciência, ela própria, tem vindo a mostrar-nos que aquela ideia enraizada do homem que saía para caçar mamutes enquanto a mulher cuidava da gruta tem pouca correspondência com a realidade. Aliás, o que se tem vindo a constatar, através da análise de ossadas, é que a divisão de tarefas entre feminino e masculino é muito mais recente do que o período paleolítico onde não existe grande dúvida de que as mulheres também eram, por exemplo, caçadoras.

Há uns meses, o meu filho Pedro disse-me que tinha aprendido na catequese que Deus tinha criado o mundo e que o homem foi a sua criação mais perfeita. A mulher, dizia ele, fora criada para ser companhia e veio directamente das costelas de Adão. E eu até senti um aperto no peito quando o ouvi. E muito devagarinho voltei a apresentar-lhe um senhor chamado Darwin e uns “primos afastados” chamados gorilas. Sabem o que me disse no final, de sorrisinho nos lábios? Que gostava mais da história do Adão e da Eva porque, assim, queria dizer que os meninos eram chefes das meninas. Engoli em seco e precisei de contar até dez. Mas o episódio serviu-me para perceber que mesmo nas coisas mais pequenas continuamos a transmitir a ideia de que o homem está um degrau acima de nós.

Nos adolescentes portugueses, nesta e noutras escolas, a ideia do “homem-alpha” defendida, por exemplo, por Andrew Tate, está viva. E se o TikTok de Tate, que contava com mais de 11,6 mil milhões de visualizações, foi desactivado, muitos outros por lá continuam a transmitir a ideia de que os homens têm de ser dominantes. E sim, a ideia de hipermasculinidade disseminada pelos influencers do movimento de Tate está presente. Demasiado presente.
Começar outra vez
Vivemos tempos estranhos, sabem? Em Espanha, mesmo aqui ao lado, 44% dos rapazes entre os 15 e os 25 anos consideram que o feminismo foi demasiado longe e que as mulheres, na tentativa de atingir a igualdade, desequilibraram a balança contra os homens. Ironia das ironias, em Espanha os homens continuam a ganhar, para os mesmos cargos, cerca de 9,4% mais do que as mulheres e, nos últimos dez anos, 1238 mulheres foram mortas às mãos de companheiros e ex-companheiros. E, não, este fenómeno não é exclusivo do país vizinho ainda que, em Portugal, não tenha conseguido encontrar grandes estudos sobre o tema.









sexta-feira, 15 de março de 2024

EPIGRAMA-2

    O mais assustador na política neste século está  a ser a normalização dos fascismos. Organizações fascistas integram-se nas instituições democráticas, no interior dos regimes das velhas democracias ocidentais. Organizações fascistas não são banidas e proscritas das Constituições : são governos de regimes democráticos, dispensando ditaduras nazi-fascistas à Hitler ;Mussolini, Salazar. Não se passeiam como milícias paramilitares. Passeiam-se como polícias, forças de choque nas ruas a bloquear manifestações que dantes eram instâncias de expressão e de poder republicano e democrático.

O fascismo deixou de ser o oposto das democracias. Deixou de ser totalitarismo. 

Virá ser novamente tudo que já foi?

É uma questão de tempo? Uma questão de relação de forças?

Aguardam a oportunidade?

O fascismo nas suas atuais vestes , com as suas diferenças (é mais grosseiro e racista em Portugal do que na França?), é manifestação de desespero do capitalismo perante a sua crise desde 2008?

Ou é uma prova de força, uma marcha triunfal?


EPIGRAMAS-1

   O neoliberalismo foi-se instalando nas consciências. Vem substituindo as antigas estruturas de conhecimento. As massas sociais foram-se habituando a pensar conforme convinha ao capitalismo neste ultima fase. Impregnou a linguagem. Impregnou a gramática e a semântica. Logo na infância, logo na família e na escola. Não tanto pelos livros, ou melhor : não só pelos livros de marketing de que estão repletas as livrarias, mas pelas estações e canais de televisão. Agora já pertencem ao senso-comum. Observa-se nos comentários opinativos nas redes sociais. 

Vamos pensar como eles querem. No ocidente. Naturaliza-se o fascismo. Naturaliza-se a "austeridade". Naturaliza-se a guerra. Naturaliza-se a exploração.

Termos como "burguesia", "proletariado" ou "classe operária", ou mesmo "capitalismo", vão desaparecendo. Agora : "empreendedorismo", "colaboradores", "empresários individuais"...

É uma novilíngua. 

Fala-se ao indivíduo, à sua liberdade. Não do coletivo, da coletividade, do bem público. Do comum. Falar disso é "comunismo", "regular a iniciativa individual livre".

Gene Sharp

 

Gene Sharp, o intelectual da Guerra Fria cujas ideias seduziram a esquerda

Tradução
Gercyane Oliveira

Gene Sharp foi considerado a figura política norte-americana mais importante da qual você nunca ouviu falar. Como um militante da Guerra Fria chegou a exercer tanta influência em movimentos de protesto da Venezuela ao Oriente Médio?

UMA ENTREVISTA DE

Branko Marcetic

Gene Sharp dificilmente é um nome conhecido, mas as ideias do falecido pensador sobre a ação não violenta têm permeado os movimentos de protesto nos Estados Unidos e em todo o mundo. E, no entanto, embora Sharp seja frequentemente classificado com líderes dissidentes como Gandhi e Martin Luther King, ele próprio não era uma figura anti-establishment. Confinado por décadas no Centro de Assuntos Internacionais de Harvard, ele trabalhou em estreita colaboração com intelectuais no centro do establishment de defesa dos EUA. Como um militante da Guerra Fria chegou a exercer tanta influência sobre os movimentos de protesto da Venezuela ao Oriente Médio?

Em um ensaio para o Nonsite, Marcie Smith, do John Jay College, apresentou algumas das descobertas de sua pesquisa sobre a vida e o trabalho de Sharp. Sharp, ela descobriu, foi, em suas palavras, “um dos mais importantes intelectuais de defesa da Guerra Fria que os EUA produziram” — um fato que pode surpreender alguns daqueles que foram influenciados por suas ideias.

Nesta entrevista com Branko Marcetic, da Jacobin, Smith expande seu ensaio, descrevendo a vida e a carreira de Sharp e como ele, paradoxalmente, ajudou a injetar ideias neoliberais sobre o Estado no clima intelectual da esquerda norte-americana.


BM

Vamos começar com uma explicação sobre quem foi Gene Sharp e por que ele foi uma figura tão importante. Em primeiro lugar, o que a levou a investigar a história dele?

MS

Gene Sharp é, como disse o Politico, a figura política norte-americana mais importante da qual você nunca ouviu falar. E acho que essa é uma avaliação justa. Ele foi um cientista social que faleceu no início de 2018 e que passou sua carreira escrevendo sobre a dinâmica da ação não violenta como ferramenta política. Se você pesquisar no Google sobre ele, verá muitos artigos falando sobre ele ao mesmo tempo que Gandhi e Martin Luther King Jr. Ele foi indicado várias vezes para o Prêmio Nobel da Paz.

Especialmente depois de seu falecimento, acho que podemos observar um esforço da classe dominante para quase santificá-lo, para canonizá-lo. Basta dar uma olhada na BBC, no New York Times ou no Washington Post, além de veículos como o Waging Nonviolence e outros veículos de esquerda, e ele é apresentado, geralmente sem ressalvas, como um herói dos movimentos populares em todo o mundo e um amigo da esquerda, em termos gerais.

Passei cerca de dez anos, de 2006 a 2016–2017, envolvida no movimento climático dos EUA, e também passei algum tempo trabalhando no movimento climático internacional. E, há cerca de três ou quatro anos, comecei a ficar extremamente consciente e com uma frustração em relação aos desafios crônicos que, na minha opinião, eu continuava observando — estranhos tiques idiossincráticos em nosso movimento que eu não conseguia entender.

Iniciei essa pesquisa como um esforço para entender esses desafios e, como parte disso, comecei a analisar de forma um pouco mais crítica alguns dos intelectuais e livros que circulavam no movimento, geralmente sem nenhum tipo de ceticismo ou engajamento crítico. Muitos desses manuais de organização são superficialmente apolíticos; não há uma ideologia óbvia que os origine. Na verdade, muitas vezes “ideologia” é tratada como uma palavra ruim. De qualquer forma, Gene Sharp é um dos intelectuais cujo nome sempre aparecia, e quanto mais eu lia sobre Sharp e lia o trabalho do próprio Sharp, mais eu ficava surpresa com o fato desse sujeito ser tão importante para os movimentos de protesto dos EUA e também para os movimentos de protesto internacionais.

Passei cerca de dois anos e meio aprendendo sobre Sharp e lendo seu corpus — ele escreveu prolificamente. Meu argumento é triplo. Acho que Sharp é melhor compreendido não como um Gandhi moderno, mas como um dos mais importantes intelectuais de defesa da Guerra Fria que os EUA produziram. Ele deve ser considerado e reconhecido ao lado de pessoas como o estrategista nuclear Thomas Schelling, que foi de fato seu mentor e foi quem o trouxe para o Centro de Assuntos Internacionais de Harvard.

Em segundo lugar, Sharp deve ser entendido como uma espécie de teórico neoliberal inicial da transformação do Estado. Porque, apesar de ter adotado um tipo de influência da realpolitik – esse é o tom de todos os seus principais trabalhos -, o que mais inspirou Sharp foi o fato da visão de mundo que ele tinha, assim como muitos dos guerreiros da Guerra Fria, em termos de bem e mal. Para ele, o mal era personificado pelos Estados Unidos, que eram os maiores inimigos do mundo. E, para ele, o mal era personificado pelo ditador totalitário.

Mas se você analisar mais de perto o trabalho de Sharp, verá que sua acusação não é apenas contra os ditadores, mas também contra o ” Estado centralizado” de forma mais ampla. Em sua opinião, esse estado centralizado é a principal fonte e vetor de violência no mundo moderno. É ele que produz a tirania, o genocídio e a guerra; se não fosse o Estado centralizado, o mundo não seria tão violento. Quais são as características do “estado centralizado” para Sharp? Características que são facilmente identificáveis para a maioria da esquerda como as principais características redistributivas do estado do New Deal — coisas como regulamentação econômica, propriedade pública de setores importantes. Sharp fala sobre como, em um ” Estado centralizado”, há muitos “controles governamentais” na economia.

Portanto, ele quer a “descentralização” do Estado, uma palavra de ordem comum na esquerda moderna dos EUA; ele quer “devolver” as principais funções do Estado a entidades “não estatais”. E, implicitamente, Sharp acredita que um Estado descentralizado produzirá menos violência. Ele chega a dizer que sua política de ação não violenta – sua teorização de como a ação não violenta pode ser usada para derrubar um ditador – pode ser usada de forma mais geral para difundir (essa é a palavra dele, “difundir”) ou “descentralizar” o poder do Estado.

O que é revelador sobre isso é que, repetidamente, essa “descentralização” do Estado é de fato o resultado de revoluções não violentas que usaram os métodos de Sharp, como as da União Soviética, Iugoslávia, as Revoluções Coloridas em lugares como Geórgia e Ucrânia. Isso praticamente se parece com a liberalização econômica, o que chamamos de “neoliberalismo”.

O que me leva à terceira parte de meu argumento. Acho que Sharp deve ser entendido como uma espécie de sábio dos movimentos anticomunistas, desde os estágios finais da Guerra Fria até os anos 2000. Sharp ofereceu a arte do protesto ao governo dos EUA para fins anticomunistas no exterior. Afirmo que se você não entender isso, não entenderá Sharp.

Sharp e seus colegas estavam em campo prestando consultoria aos movimentos secessionistas nos países bálticos. Eles estavam nos países bálticos e na Rússia consultando ativistas apenas um dia antes da dissolução da União Soviética. Havia padrões semelhantes na Iugoslávia: Sharp e a Albert Einstein Institution, que é a organização que ele fundou para promover a ação não violenta em todo o mundo, treinam pessoas na Iugoslávia que, por sua vez, treinam pessoas na Geórgia, na Ucrânia, na Primavera Árabe, na Venezuela. Em muitos casos, a AEI está trabalhando paralelamente ao National Endowment for Democracy e seus adjuntos.

Para Sharp, há uma crença afirmativa de que a política dos EUA em relação à Guerra Fria, interpretada de forma muito ampla, é uma coisa boa. Ele não se encontra trabalhando acidentalmente com pessoas como Thomas Schelling, em um centro que também abriga Henry Kissinger e assim por diante, apenas por acaso, ou porque ele é um vendido ou um idiota.

É porque Sharp pensa: “Concordo com a agenda anticomunista dos EUA, mas só quero que essa agenda seja promovida por meios não violentos em vez de meios violentos e, de fato, acho que a ação não violenta fará o trabalho de derrotar o comunismo com mais eficácia do que a violência”. E parece que Sharp estava certo. A URSS está morta, os vestígios do socialismo na Europa Oriental foram em grande parte eliminados por meio das Revoluções Coloridas, a Iugoslávia foi destruída e assim por diante, tudo de forma não violenta.

E, surpreendentemente, grande parte da esquerda dos EUA aplaudiu, mesmo quando esses eventos significam praticamente a destruição do sistema público de saúde e da moradia social, a destruição dos sindicatos, a imposição de uma austeridade severa de corte da rede de segurança social. Precisamos nos conscientizar.

Ao retrocedermos, a carreira completa de Sharp nos diz coisas importantes sobre a estratégia imperial moderna. Os trabalhadores devem comemorar quando os Estados Unidos avançam nos interesses da classe proprietária de forma não violenta? Muitos Sharpianos parecem pensar assim.

Sharp nos diz muito sobre como o protesto em si pode ser usado, mas também como pode ser abusado. Com muita frequência, há essa atitude de que, se virmos pessoas protestando nas ruas, isso é o começo e o fim da investigação, é uma prova prima facie de que elas são justas e que devem receber o que quiserem.

BM

O que, acho, estamos vendo um pouco na Venezuela agora. Isso dificulta para as pessoas que não estão no local, porque em um lugar como a Venezuela há definitivamente descontentamento com Maduro por parte dos apoiadores de Chávez, mas também há um movimento de base de direita contra ele. Essas coisas se misturam e pode ser muito difícil para quem está de fora entender o que está acontecendo.

MS

Sim, e vemos muito esse padrão em operações de mudança de regime. O povo venezuelano tem motivos para estar com raiva – embora, para ser clara, eu ache que muitos dos problemas que Maduro está tentando administrar não são de sua autoria. O povo norte-americano tem motivos para estar irritado com nosso governo e, de fato, um número substancial deles está. Nós ainda nos opomos à interferência internacional em nossa política interna, e acho que isso é algo que precisa ser ressaltado.

É disso que estamos falando em lugares como a União Soviética e a Iugoslávia. Não estamos falando apenas de movimentos de pessoas que querem se libertar da ditadura, estamos falando também de conflitos geoestratégicos em que os Estados Unidos e seus aliados têm interesses, e o resultado dos EUA e seus aliados conseguirem o que querem é a neoliberalização sistemática – austeridade, privatização, criação de zonas de livre comércio etc. – e, de modo geral, um padrão de vida em colapso para a pessoa comum.

Embora as pessoas certamente tenham motivos para criticar o regime de Maduro, o regime de Milosevic, a liderança soviética – essa é uma questão diferente de “os EUA devem intervir e com que finalidade os EUA estão intervindo?” Além disso, dizer que “Maduro é um ditador” não é uma análise.

BM

No artigo, você fala um pouco sobre a definição de violência de Sharp. Como Sharp definia a violência e como isso influenciava, ou talvez refletisse, sua filosofia política?

MS

No final da carreira de Sharp, ele chegou a definir formalmente a violência como a inflição direta de ferimentos, e essa palavra “direta” é muito importante. Ela implica que a lesão indireta é de alguma forma não violenta; de certa forma, é naturalizada. Há muitos danos injustos, porém indiretos, que o “mercado livre” inflige por toda parte. Coisas como pobreza, exploração – essas são formas indiretas de lesão, portanto, para Sharp, elas não contam como violência. Isso é conveniente.

Da mesma forma, as sanções. Para Sharp, as sanções não eram suficientemente diretas para serem consideradas violência. Na verdade, ele é um dos primeiros teóricos das sanções. Ele fundou um instituto em Harvard, dentro do Center for International Affairs, chamado Program on Nonviolent Sanctions in Conflict and Defense, que estuda o uso de sanções.

Isso começou em 1983, bem no início da política externa de “reversão” de Reagan. Em 1983, ele recebeu esse centro próprio e, no mesmo ano, também fundou o Albert Einstein Institution, uma ONG voltada para o público, dedicada a apoiar o uso de ações não violentas em todo o mundo, especialmente em lutas que supostamente tentam “promover a democracia”.

Olhando para aquela época, podemos ver agora a virada neoliberal em casa, mas há também um confronto mais agressivo com o comunismo na forma de uma política externa de retrocesso. Nesse contexto de retrocesso, Sharp está promovendo a ideia de sanções. Thomas Schelling, seu mentor estrategista nuclear, diz que quando o programa de sanções de Sharp foi fundado, isso foi um reconhecimento formal de Harvard de que esse é um campo de estudo legítimo. Embora não seja muito conhecido, aparentemente Sharp tinha um instituto realmente inovador.

BM

Como sua filosofia política ajudou a minar as revoluções que alguns desses movimentos conseguiram realizar?

MS

Gene Sharp às vezes é chamado de Maquiavel da não violência, e acho que isso é apropriado, mas acho que ele era como Maquiavel ao contrário. Enquanto Maquiavel estava interessado em questões de como consolidar o poder, como mantê-lo, como criar consentimento para um regime político, Sharp está interessado na questão de como dissolver essa vontade comum, essa lealdade comum, que sustenta todos os governos e, na verdade, todos os projetos políticos.

Em The Politics of Nonviolent Action (A política da ação não violenta), a grande obra de três volumes de Sharp, ele delineou um estilo de combate que chama de “jiu-jítsu político”. Trata-se basicamente de um sistema de armas, um dispositivo de demolição social, capaz de derrubar governos de todos os tipos, sejam eles ditatoriais ou democraticamente eleitos, não importa. A questão é que você ataca as fontes de legitimidade de um regime; você provoca o regime com retaliações violentas e expõe a força violenta na qual ele se baseia.

A definição de Estado, de acordo com Max Weber, é uma organização que detém o monopólio do uso legítimo da força. Portanto, quando houve uma insurreição secessionista no Báltico, que incluía muitas pessoas que queriam reafirmar suas relações de propriedade burguesas pré-soviéticas, era muito previsível que Gorbachev enviasse tanques e tentasse reprimi-la. Lembre-se de que Abraham Lincoln usou a força para reprimir um movimento secessionista no sul dos Estados Unidos, outro movimento secessionista que buscava restabelecer relações de propriedade altamente reacionárias. Portanto, estou tentando problematizar a história hegemônica, que é a de que esses movimentos Sharpianos, em virtude de serem não violentos e se oporem ao “Estado centralizado”, eram todos progressistas e, por extensão, que alguém como Gorbachev estava agindo ilegitimamente quando tentou preservar a União, embora fosse isso que a maioria dos cidadãos soviéticos dissesse que queria. As pesquisas mostraram que os cidadãos soviéticos queriam uma economia um pouco mais liberalizada e certamente mais liberdade política, mas não queriam que a União Soviética fosse totalmente dissolvida.

Portanto, não tenho tanta certeza de que a filosofia política de Sharp tenha prejudicado uma revolução política em um lugar como o Báltico. Em vez disso, acho que o uso de Sharp pelo movimento revela sua filosofia política. Não há nenhuma inconsistência aqui.

Dito isso, acho que os movimentos de esquerda que tentam encaixar seus objetivos na estrutura de Sharp, que tratam Sharp como o principal filósofo político moderno, terão problemas rapidamente. Porque, para Sharp, o vilão é sempre o Estado, e o mocinho é qualquer grupo que esteja nas ruas levantando os punhos. Sharp não é, de forma alguma, o único vetor disso; há uma longa tradição anarquista nos EUA com críticas contundentes ao Estado. Mas acho que a fixação de Sharp em ditadores e no “Estado centralizado” contribuiu para uma alergia e um estilo determinista de pensar em relação ao Estado. No esquema de Sharp, o Estado não é algo pelo qual se deva lutar, não é algo que se deva tentar controlar. É algo a ser dissolvido e destruído.

Então, e se o seu objetivo for tomar o Estado ou “expandir” o Estado por meio de algo como o Medicare for All? Você ficará muito confuso. E se as pessoas que estão levantando os punhos de forma não violenta na rua, ou fazendo o sit-in, ou fazendo a marcha permitida, e se elas forem fascistas? Não tenho certeza se a esquerda dos EUA entende que a incoerência ideológica, a fraqueza lógica, também é uma fraqueza estratégica. Minha opinião é que, na esquerda norte-americana, há uma tolerância perigosamente alta para argumentações ruins, desde que se tenha a posição moral correta.

Também nos deparamos com problemas quando usamos a estrutura de Sharpian para tentar interpretar as relações internacionais modernas. Uma parte considerável da esquerda foi treinada para fazer julgamentos sobre assuntos internacionais com base em quem é um “ditador”. Isso é tão simplista e tão inadequado. O comportamento ditatorial dos executivos políticos existe em um espectro e, além disso, se um território estiver sob ataque, militar, econômico ou qualquer outro, e se estiver tentando se defender, as relações políticas se tornarão militarizadas, ou seja, hierárquicas e ditatoriais. Mas, para fins de argumentação, vamos admitir que o grande problema nos assuntos internacionais é a presença de ditadores ruins. Portanto, uma porcentagem radicalmente pequena de uma população destitui o cara de forma não violenta. E minha pergunta é: ok, e depois? Você derrubou o regime nojento e corrupto existente – e depois? Repetidamente, pessoas muito sinceras e bem-intencionadas se inspiram nessa ideia de derrubar ditadores em todo o mundo, mas não descrevem muito bem o que deve vir depois e como fazer isso. O que acontece depois que o ditador cai? Qual é o seu programa afirmativo? Quais são suas ideias sobre como a economia deve ser organizada e elas são historicamente informadas? Como você comunica tudo isso publicamente? Essa estratégia foi desenvolvida com alguma consciência da realidade da luta de classes? Essas são perguntas que a esquerda precisa fazer a si mesma pelo menos com a mesma frequência que a pergunta sobre como nos livrarmos de um governo ruim. Porque se não fizermos um bom trabalho respondendo a essas perguntas e conseguirmos derrubar o governo existente, é muito provável que o poder acabe sendo consolidado por pessoas que tenham respostas claras a essas perguntas e que tenham consolidado suas forças e tenham disciplina material e ideológica – como vimos, por exemplo, depois da Primavera Árabe, muitas vezes essas são forças reacionárias.

A implicação das questões que estou levantando aqui não é que devamos abandonar todo o trabalho de Sharp, ou que devemos extirpar o trabalho de Sharp dos movimentos sociais. Em vez disso, precisamos ver Sharp em seu contexto completo e enxergar suas limitações muito importantes, porque se não o fizermos, há um risco real de nos vermos cercados de inimigos em um cenário político ainda mais caótico.

BM

Você mencionou a mudança climática anteriormente; sua investigação sobre Sharp surgiu do seu ativismo climático. Como as ideias de Sharp influenciaram o movimento pela justiça climática?

MS

Tratarei mais desse assunto na segunda parte do ensaio, que será publicada em breve – trata-se de como as ideias de Sharp se espalharam e migraram pela esquerda, como elas aparecem. Uma das coisas que comecei a ver, e que outros comentaram – e isso não ocorreu apenas no movimento climático, mas no cenário de protestos dos EUA de forma mais ampla – foi uma espécie de instrumentalização dos protestos. Quero dizer, elevar o protesto como um fim em si mesmo, em vez de reconhecê-lo como um meio para resultados políticos específicos. Essa ideia de que se protestarmos, coisas boas acontecerão. Se agirmos com retidão, o poder perceberá e obteremos a justiça e a liberdade que exigimos, seja lá o que isso signifique. O protesto é elevado muito acima de outras habilidades, como organização, educação política, trabalho intelectual, debate, habilidades de formação de alianças, ou seja, diplomacia, etc.

Eu mesmo estou envolvida nisso. Fui ativista do clima na faculdade e é muito estimulante envolver-se em movimentos de protesto, conectar-se e protestar nas ruas com outras pessoas que estão justamente indignadas com a injustiça de nossa situação atual. Mas sempre precisamos ser claros: o que estamos exigindo? E de quem ou do que estamos exigindo? E esse é o melhor e mais estratégico uso do tempo e dos recursos limitados, é informado pela história e pela dinâmica da luta de classes? E acho que os movimentos intergeracionais são essenciais se quisermos responder bem a essas perguntas. Não acho que seja coincidência o fato de que muitos movimentos Sharpianos tenham sido conduzidos por estudantes universitários urbanos de classe média, jovens com muita energia, a chamada clareza moral, mas que ainda estão negociando sua relação com a autoridade, têm poucas ou nenhuma conta para pagar, etc., e podem ser “provincianos cosmopolitas” em sua visão de mundo. Quando um movimento é de, por e para os trabalhadores, e inclui tanto a cidade quanto o campo, as coisas se complicam, como vimos na campanha de Sanders. “É a economia, estúpido.”

Deixe-me colocar a questão desta forma. Acho que quando você lê Sharp, fica claro que ele é um intelectual, é uma espécie de filósofo. Se o considerarmos sem nenhuma das ressalvas limitadoras que estou oferecendo e não adicionarmos a ele outros intelectuais importantes, a visão de mundo que teremos é aquela em que os ditadores do Estado centralizado são ruins; queremos nos livrar deles e o protesto nos ajuda a fazer isso; e se fizermos isso, a não violência, a paz, a harmonia e a justiça prevalecerão. 

Portanto, estamos operando com essas categorias muito moralistas que não oferecem grandes especificidades sobre o tipo de mundo que queremos, os tipos de relações produtivas que queremos e o que seria realmente necessário para alcançá-las diante de uma oposição extremamente poderosa.

Isso é perigoso. Os movimentos de protesto são colocados em uma posição em que podem ser facilmente cooptados, em que podem servir como uma espécie de aríete e, então, os especialistas neoliberais com as “boas ideias” aparecem com o conteúdo. Isso é algo que tenho visto e que me preocupa muito. Porque quando as forças supostamente progressistas triunfam, mas as condições para as pessoas comuns pioram – bem, isso está fazendo o trabalho dos fascistas para eles.

Sobre os autores

Marcie Smith

leciona no departamento de economia do John Jay College of Criminal Justice, City University of New York. Ela tem um JD da Faculdade de Direito da Universidade da Carolina do Norte.

é escritor da redação da Jacobin e mora em Toronto, Canada.

sábado, 9 de março de 2024

 

¿Dónde estamos? ¿En qué lugar y en qué momento de la historia nos encontramos? (II y final)

Publicado:

Sergio Rodríguez Gelfenstein.— En años recientes, tres acontecimientos vinieron a acelerar el proceso de construcción del nuevo mundo:

1. La pandemia de Covid19.

La pandemia puso en evidencia la incapacidad del sistema internacional y del capitalismo para enfrentar a un enemigo común de toda la humanidad. Fue un momento estelar para coordinar acciones y ponerse de acuerdo para cooperar, pero fue imposible porque primó el interés por mantener funcionando la economía por encima de la salud y asegurar el lucro y la ganancia en vez de preocuparse por salvaguardar la vida de los seres humanos. El país más rico del planeta con 330 millones de habitantes vio morir a casi 1.2 millones de ciudadanos por la incapacidad de proteger a su propia población. En el extremo opuesto, en China con 1.4 mil millones de habitantes, fallecieron 120 mil ciudadanos. Se puso sobre el tapete la forma diferente como ambos sistemas atienden la salud de los ciudadanos, manifestándose el contraste entre aquellos países que invierten en salud pública y los que la consideran un bien del mercado. Este hecho dio inicio al proceso de transformación global.

2. La Operación Militar Especia (OME) de Rusia en Ucrania.

Ante la incapacidad del sistema internacional por evitar que se siguiera consumando el genocidio contra la población ruso parlante en el este de Ucrania, ante el peligro de expansión del nazismo que tomó a ese país como base de su florecimiento mundial y en consideración del grave riesgo que significaba la expansión de la OTAN para su paz, la de la región y del mundo, Rusia se vio obligada a iniciar una OME en territorio ucraniano. Más allá del desarrollo del conflicto en su dimensión local y regional se debe considerar el impacto que está teniendo a nivel global. El 21 de marzo del año 2023 durante una visita a Moscú y en el momento que se despedía de su colega ruso, Xi Jinping le dijo a este: “Están ocurriendo cosas que hace 100 años no pasaban” y refiriéndose a sus países, remató “…y nosotros somos los protagonistas”. En esa frase se expone lo que está ocurriendo: cambios nunca antes vistos en más de un siglo.

Esto es trascendental en momentos en que Estados Unidos acentúa su crisis hegemónica, materializada en un perceptible debilitamiento de uno de sus pilares: el dólar, parte vital de su diplomacia de fuerza centrada en el unilateralismo agresivo. El otro instrumento de dominio, en el que aún conserva relevante capacidad y gran distancia respecto de sus adversarios es en el ámbito, cultural y mediático.

Mientras crecen los acuerdos comerciales bilaterales para usar monedas nacionales (India, Irán, Dubái, Malasia, Pakistán, Arabia Saudita, Sri Lanka, entre otros), Rusia y China crearon su propio sistema de pagos; también se alejan del dólar los BRICS, que planean una moneda fiduciaria común; Brasil y China acordaron comerciar con sus monedas, así mismo, una serie de países africanos plantean negociar con respaldo en títulos sobre tierras raras o metales. Si bien en el corto plazo no se vislumbra una masiva salida del dólar, este es un camino inexorable más allá del tiempo que demore en ocurrir. La abusiva racha de sanciones que ya traspasó la tolerancia y afecta a una treintena de regiones y naciones con impacto socioeconómico devastador ha acelerado tal proceso. La forma en que Estados Unidos abusa de su preponderancia monetaria es parte de una riesgosa diplomacia de fuerza.

Según el periódico chino Global Times en un artículo con el sugestivo nombre de “La desdolarización es inevitable”, el declive de la hegemonía, a menudo comienza con su moneda. Hace 10 años, 80% del comercio entre China y Rusia se realizaba en dólares, mientras que hoy el 90% es en yuanes y rublos.

La Asociación de Naciones del Sudeste Asiático (ASEAN, por sus siglas en inglés), en una reciente reunión, contempló el abandono del dólar y otras monedas. El grupo BRICS está avanzando hacia la creación de una nueva moneda que pueda sustituir al dólar estadunidense, empezando por el uso de sus monedas locales. Como se dijo antes, China y Brasil han tomado la decisión de realizar el comercio mutuo en yuanes abandonando el dólar mientras anuncian que se va a ampliar la oferta de alimentos, minerales y bienes de alto valor agregado. El comercio entre China y Brasil alcanzó una cifra récord equivalente a 150 mil millones de dólares (una cifra que no se puede desdeñar) y que está dejando de comercializarse en esa moneda para pasar al yuan.

El espacio estratégico global está dejando de ser el Atlántico en favor de Eurasia. Zbigniew Brzezinski advirtió que “el más peligroso escenario (para el status de Estados Unidos como poder global) sería una gran coalición de China, Rusia y quizás Irán […] una coalición antihegemónica”.

La reconciliación entre Arabia Saudita e Irán gracias a los buenos oficios de China abre esa zona del planeta a una era de paz en una región que es la mayor compradora de armas del mundo con lo cual se debilita económica, financiera y políticamente a Estados Unidos.

Por su parte, Europa y otros aliados claves de Estados Unidos están buscando salir del “hueco” en que se metieron. Francia busca inversiones en China, España rompe récord de compra de petróleo ruso, Alemania renovó el seguro del Nord Stream, Japón le dio la espalda a Washington para comprar petróleo ruso a precio de mercado, Arabia Saudita prefirió llegar a un acuerdo con Rusia y la OPEP que seguir los dictados de Washington de aumentar la oferta. El presidente de Francia, Emmanuel Macron, recomendó a Europa diseñar un proyecto de “autonomía estratégica” para no depender “de otros en temas críticos, porque el día que nos quedemos sin margen de maniobra en cuestiones como la energía, la defensa, las redes sociales o la inteligencia artificial, el día que nos quedemos sin la estructura necesaria sobre esos temas, nos quedaremos apartados del ritmo de la historia”. Eso ya está ocurriendo.

Por otro lado en África, en tiempos recientes Chad expulsó al embajador de Alemania, Jan-Christian Gordon acusándolo de “interferir en la política interior del país” y hacer “comentarios despectivos y tendenciosos que pueden trastornar la cohesión social”. El presidente de ese país Idriss Déby lo criticó por tener una “actitud descortés” y una “falta de respeto en prácticas diplomáticas”.

El presidente de Namibia, Hage Geingob, (ya fallecido) detuvo tajantemente al embajador alemán Herbert Beck que se quejaba de que hubiera más chinos que alemanes en ese país. El presidente de Ghana, Nana Akufo-Addo, dijo que “Estados Unidos está obsesionado con las actividades de China en África”. Por su parte, el presidente de Kenia, William Ruto, recomendó a su población deshacerse del dólar. Así mismo, el presidente de Ruanda, Paul Kagame, rechazó la actitud aleccionadora de la BBC, y le recordó que fueron gobiernos europeos los que cambiaron las fronteras de África a su antojo generando conflictos territoriales que no había, esparciendo odio entre pueblos africanos que derivaron en las guerras actuales.

El presidente de Uganda, Yoweri Museveni, opinó que los políticos europeos eran “insufribles” y que “creen que lo saben todo, pero están equivocados al exhibir su ignorancia allá donde van”. El Gobierno de Burkina Faso anuló un acuerdo de ayuda militar con Francia que llevaba 62 años de vigencia y le ordenó retirar a sus tropas. Malí declaró persona ‘non grata’ al jefe de los Derechos Humanos de Naciones Unidas, al mismo tiempo que obligó a Francia a retirar su contingente militar del país, donde se encontraban participando de operativos militares antiterroristas sin completarlos.

El presidente de la República Democrática del Congo, Felix Tshisekedi, le dijo a su homólogo francés, Emmanuel Macron: “Mírenos de otra manera, respetándonos, considerándonos como verdaderos socios y no siempre con una mirada paternalista, con la idea de saber siempre lo que nos hace falta”. En Gabón, Macron se vio obligado a anunciar que “la era de la ´Francáfrica` ha terminado”, lamentando que todavía se vea a su país como injerencista en los asuntos internos de las naciones africanas.

¿Quién lo hubiera pensado hace solo algunos años? El mundo está cambiando y todo se ha acelerado gracias a la OME de Rusia en Ucrania?

En el trasfondo, lo que está en crisis son los intereses superiores del capitalismo global que observa impávido la pérdida de su poder omnímodo. Ucrania es solo un instrumento despreciable para Occidente en la búsqueda de lograr su objetivo primordial que es salvar al capitalismo en el momento de su mayor y creciente debilidad. En particular está visto, que a través de la historia a Estados Unidos, nunca -cuando se trata de preservar su sistema – le ha importado sacrificar millones de vidas, incluyendo la de los ciudadanos estadounidenses humildes que son los que conforman su ejército. Sus 800 bases militares en todo el mundo y sus 11 portaviones son el instrumento más importante con que cuenta Estados Unidos para “resolver” los problemas que plantea el derecho internacional.

Durante los cinco últimos siglos, es decir desde que se inició la globalización hegemonizada por Occidente, el poder mundial se asentaba sobre el control de los mares. Eso ha comenzado a cambiar generando una transformación paradigmática en la que Estados Unidos está quedando fuera. La creación de un gran espacio euroasiático en territorio terrestre a partir de la alianza entre Rusia y China, establece parámetros novedosos en la estructuración del poder mundial. Hay que tener en cuenta que fueron pensadores occidentales como el inglés Halford Mackinder y el estadounidense de origen neerlandés Nicholas Spykman quienes expusieron que el control del Asia Central, como “corazón continental” o “área pivote”, conduciría al control del mundo.

En años recientes, la alianza ruso-china ha llegado al súmmum de su fortaleza tras la declaración conjunta del 4 de febrero de 2022 firmada por los presidentes de ambos países en Beijing, que en la práctica manifiesta la decisión de dar los primeros pasos para la creación de un nuevo orden mundial. Tras la derrota y huida de Afganistán por parte de Estados Unidos y la OTAN y después del fracaso de los golpes de Estado en Kirguistán en enero de 2020 y en Kazajistán en enero de 2022, se ha puesto de relieve la incapacidad de Estados Unidos por dominar ese territorio estratégico del planeta, más allá de su éxito en el derrocamiento del primer ministro de Pakistán, Imran Khan en abril de 2022 en una operación tramada por Washington y ejecutada por sus adláteres locales.

La alianza euroasiática se ha concretado a través del funcionamiento de varias organizaciones. Una de ellas, la Organización del Tratado de Seguridad Colectiva (OTSC), que mostró su eficacia, evitando el golpe de Estado en Kazajistán. Otra instancia creada y que ha mostrado su efectividad es la Organización de Cooperación de Shanghái (OCS), donde participan China, Rusia, Kazajistán, Kirguistán y Tayikistán como miembros fundadores. Después se han incorporado Uzbekistán, India, Pakistán e Irán con el objetivo de cooperar en materia política, económica y de seguridad. Bielorrusia, Mongolia y Afganistán esperan aprobación para su ingreso. De la misma manera la Unión Euroasiática conformada por cinco países constituye la extensión exitosa de vínculos económicos y comerciales en el más amplio espacio terrestre del planeta.

China por su parte promovió y creó la mayor alianza económica del mundo, la Asociación Económica Integral Regional (RCEP por sus siglas en inglés). Esta asociación está conformada por el 30% de la población mundial. Pero el ámbito de mayor alcance en la región y el mundo es la nueva Ruta de la Seda proyecto desarrollado por China para el cual ha destinado hasta ahora 900.000 millones de dólares distribuidos entre 72 países, con una población de unos 5.000 millones de habitantes o sea el 65% de la población mundial según apunta el periodista belga Marc Vandepitte en un reciente artículo.

El gran peligro para Estados Unidos y su sistema de predominio mundial es la incorporación de Europa y en particular de Alemania a este sistema. Si ello ocurriera, se desmoronaría irremediablemente todo la estructura hegemónica construida tras la segunda guerra mundial que tiene en la democracia representativa de corte occidental su sustento político, en la Organización de Naciones Unidas, su instrumento de control global, en la OTAN el soporte militar de presión, chantaje y amenaza y el Sistema de Bretton Woods constituido a partir del control occidental del Banco Mundial y el Fondo Monetario Internacional, como los pilares para sostener económica y financieramente su hegemonía global. La subordinación y control de Europa es fundamental para sustentar este modelo diseñado desde que se pusiera en práctica el Plan Marshall tras el fin de la segunda guerra mundial.

El objetivo fundamental de la política estadounidense ha sido evitar que se produjeran acuerdos de integración energética entre Rusia y Europa que podrían sellar una alianza estratégica mutuamente beneficiosa para ambas partes que, por añadidura enlazaría a Europa con China dejando a Estados Unidos alejado de la posibilidad de seguir manteniendo la supremacía energética en Europa, que junto a la OTAN configuran la garantía del control del Viejo Continente por parte de Estados Unidos.

3. La invasión de Israel a Gaza.

Aunque es un hecho muy reciente, que impide sistematizar de forma acabada, las repercusiones que pueda tener en el sistema internacional, vale analizar los acontecimientos en Asia Occidental como un evento que da continuidad a los dos anteriores y como expresión de la dinámica transformadora en el planeta, Por lo pronto, se ha cuestionado al eje sionista-imperialista desde el punto de vista político, militar, diplomático y hasta jurídico. Algo también impensable solo hace unos meses atrás.

Las nuevas coaliciones y alianzas que se están produciendo entre países árabes y musulmanes de tres continentes y la búsqueda de estos por abrirse un espacio más allá de la región a través de acuerdos con otras instancias como la Organización de Cooperación de Shanghái, la Ruta de la Seda, el Corredor Norte-Sur y sobre todo los BRICS son expresión de una realidad novedosa, sobre todo cuando se está hablando de la región que ocupa el primer lugar mundial en producción de energía…y en la compra de armas.

La cercanía cada vez mayor de estos países con Rusia y China y el papel más relevante que estas dos potencias están jugando como articuladores de procesos de negociación, y búsqueda de acuerdos en favor de la paz y la distensión, generan un nuevo momento en el planeta.

El eje de esta situación fue el inicio de la operación “Diluvio de Al-Quds” por las fuerzas políticas y militares palestinas y su soporte por parte del eje de la resistencia a través de variadas manifestaciones concretas de solidaridad y apoyo, sobre todo de Yemen, Irán, el Líbano, Siria e Irak, así como de la mayoría de los pueblos árabes y musulmanes, a menudo en franca contradicción con sus gobiernos.

Un gran influjo para que ello ocurriera, tuvo el acuerdo saudita-iraní para el restablecimiento de las relaciones diplomáticas, creando una situación mucho más ventajosa en la región para la lucha del pueblo palestino, aislando a Estados Unidos y al ente sionista.

A manera de conclusión pudiera señalarse que, vista la situación en la perspectiva planteada, se podría afirmar que se está avanzando hacia un sistema internacional inédito, jamás antes explicado e impensado incluso en el pasado más reciente. En un artículo en el periódico La Jornada de México, el laureado economista estadounidense Joseph Stiglitz opina que: ”Parece que Estados Unidos ha iniciado una nueva guerra fría”.

Pero a diferencia de la del siglo pasado en el que el elemento ideológico era el ordenador de las relaciones internacionales, Stiglitz afirma que ante la hipocresía estadounidense que sustenta sus puntos de vista en una supuesta defensa de la democracia, la de ahora “…hace pensar que, al menos en parte, lo que está en juego aquí es la hegemonía global más que una cuestión de valores”.

La avalancha de eventos internacionales de diferentes características durante los últimos meses, dan cuenta de la intensidad con la que se están moviendo los principales protagonistas en el escenario internacional y la vorágine de gestiones en las que se ven envueltos. Es necesario tomar cartas en el asunto en este mundo tan caótico y en plena efervescencia en la que el imperio arrecia su agresividad mientras se debate en una crisis multisectorial de la que -según lo visualizan- solo pueden salir solo a través de la guerra y un conflicto permanente que le asegure incrementar sus ingresos por la vía de su principal industria: la de la producción y venta de armas.

Así, llegamos a esta situación original y extraña enmarcada en la posibilidad de esa nueva guerra fría de la que habla Stiglitz. Lo novedoso es que la bipolaridad se manifiesta de manera diferente. Por una parte el polo occidental autodenominado “comunidad internacional” configurado por el 11% de la población del planeta y alrededor de 54 países del norte global, que funciona hacia el interior en términos unipolares con Estados Unidos actuando de forma hegemónica y teniendo a Europa, Australia, Nueva Zelanda y Japón como subordinados obedientes, incluso en desmedro de sus propios ciudadanos.

El otro polo, configurado por la gran mayoría de la humanidad se ha propuesto construir un gran ambiente multipolar en el que puedan participar varios centros de poder mundial en un espacio de cooperación y ayuda que ya se puso de manifiesto en el combate a la pandemia.

En este ámbito de confrontaciones y definiciones, se coteja la validez y persistencia de un derecho internacional construido tras siglos de búsqueda de la paz en el planeta versus la propuesta estadounidense de establecer “un sistema internacional basado en reglas” como forma de imposición unilateral de su lógica imperial. En este punto ya no se sabe cuál será el papel de la ONU en el futuro. Si sigue existiendo, habrá que definir, en qué condiciones lo hará, cuando observamos que la OTAN se ha apoderado de la principal organización multilateral del planeta.

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terça-feira, 5 de março de 2024

 

A extrema direita no Leste Europeu

Imagem: Rohan Hakani

Por EURICO PEREIRA DE SOUZA*

Os destinos do Ocidente e do Oriente estão extremamente interligados, e devem trabalhar juntos para que a Europa do passado não seja a Europa do futuro

Quando o site A Terra é Redonda inaugurou a série de suas entrevistas, o primeiro convidado, em julho de 2023, o Professor Paulo Arantes, indagado a respeito dos movimentos de direita e extrema direita no mundo, justificou vaga lembrança a um título publicado no Brasil, em meados dos anos 1990, de um autor identificado por Hockenos, que assinalava a emergência de grupos de extrema direita nos países do Leste Europeu, logo após a desagregação do socialismo real na região. Esta foi a pista que motivou a elaboração do presente texto.

Não se trata aqui de expor uma resenha, mas apenas algumas notas de HOCKENOS, Paul. Livres para odiar (Scritta, 1995), com vista a uma visão geral da obra. Certamente, devido tal escrito ter sido publicado no Brasil em 1995, os relatos dos eventos estão circunscritos ao período de 1989 a 1993. Porém, como o leitor deduzirá por si mesmo, tais registros têm impacto no momento atual.

Paul Hockenos visita os países do Leste Europeu logo após o colapso do sistema soviético e suas consequências na desestruturação dos regimes, agora pós-comunistas, da Alemanha Oriental, Hungria, Romênia, República Tcheca, Eslováquia e Polônia.

O autor é jornalista, e seu escrito tem um enfoque de grande reportagem, acompanhado de uma parte mais restrita com viés analítico. A visita ocorre entre 1989 e provavelmente 1992, e desse modo, o autor observará fenômenos políticos e sociais da transição dos regimes do socialismo real, nos referidos países, para as perspectivas otimistas, na época, com a edificação das experiências democráticas.

Porém, o que Paul Hockenos encontra, e enfatiza em seu texto, é o surgimento de forças de extrema direita sustentadas por ideologias ultranacionalistas, nacionalismos radicais de matriz étnica e movimentos fascistas.

Uma constante se apresenta nos países visitados pelo autor: com a queda dos regimes do socialismo real (apoiados, sustentados e pressionados pelo sistema soviético), o ódio contra os comunistas é moeda corrente; um conjunto de forças políticas caracterizadas por dissidentes democratas, nacionalistas, ultranacionalistas, setores de centro, movimentos de esquerda (críticos do regime soviético) e organizações fascistas tentam remodelar o destino de seus países.

Os primeiros anos após os regimes autoritários (1989 a 1991) sinalizam anseios de reflorescimento da experiência democrática cercada por incertezas e até desconfianças com antigos vizinhos devido a disputas territoriais e incômodos étnicos. As elites participantes desse processo político, entusiasmadas com os ideais da democracia liberal, e ansiosas para serem reincorporadas à Europa, aceitam os preceitos econômicos neoliberais via FMI e Banco Mundial. O resultado, nos poucos anos seguintes, com privatizações, desregulação das normas de mercado, diminuição ainda maior dos poucos gastos sociais, aumento da inflação e queda acentuada nos serviços estatais acessíveis à população, fez emergir uma grande frustração com relação ao futuro dos países em questão.

Ora, o fenômeno mais esperado diante desta situação seria a população da Europa Oriental questionar o modelo econômico neoliberal em decorrência dos pífios resultados sociais e econômicos. Mas, o que boa parte da população, em seus diferentes estratos sociais, manifestou foi a culpabilização de outro agente pelos difíceis resultados da transição dos regimes. Este outro agente foi “o estrangeiro”. Seja ele o cigano, o negro, o judeu, ou o vizinho de fronteira, no caso o romeno ou o húngaro, sejam os “irmãos ideológicos” que faziam intercambio de estudo ou trabalho, no caso os vietnamitas, cubanos, e alguns chilenos, perseguidos pelo regime de Augusto Pinochet. No caso dos negros, em particular na Alemanha Oriental, principalmente no início dos anos 1980, houve programas de convite para trabalho em decorrência do déficit de mão de obra, recebendo, desse modo, etíopes, angolanos, e moçambicanos.

Então, a culpabilização do estrangeiro fez com que parte da população (maior ou menor em cada país) moldasse a conjuntura política na Alemanha Oriental, Hungria, Romênia, República Tcheca, Eslováquia e Polônia, potencializando, assim, nacionalismos étnicos que, por sua vez, constituíram a base de forças ultranacionalistas e movimentos fascistas.

Ocorre que a referida região, entre a primeira e a segunda guerra mundial, e nas décadas posteriores a 1945, já conservava um caldo cultural de conflitos e desconfianças de ordem étnica. Nos países em questão, havia (e prosseguem até o presente) conflitos com base em litígios territoriais e perseguições étnicas. Exemplo: na Hungria há uma comunidade romena que sofre ameaças, não somente por parte da população, mas também, pela institucionalidade estatal; na Romênia há uma grande comunidade húngara em situação semelhante, inclusive que foi perseguida por Nicolau Ceausescu; na Alemanha Oriental, há trabalhadores poloneses que eram vistos como vagabundos e aproveitadores.

A Eslováquia guardava profunda crítica e desconfiança com a arrogância da República Tcheca (que é mais desenvolvida); na própria Eslováquia, há outra comunidade húngara que também é perseguida pela burocracia estatal. E há um conjunto de povos e etnias que são perseguidos em todos estes países: primeiramente os ciganos; em seguida os negros; judeus; e os demais povos do “terceiro mundo” – assim chamados, em tom ressentido, pelos cidadãos locais.

Paul Hockenos apresenta dados que salientam a existência de skinheads, mesmo no período de vigência do socialismo real, na Alemanha Oriental, Hungria, Romênia, República Tcheca, e Polônia. E tais grupos, ora perseguidos e presos pelo antigo regime, ora tolerados, já estabeleciam conexões com grupos de extrema direita dos países ocidentais, tais como a Ku Klux Klan nos EUA, e outros na Alemanha Ocidental.

Os movimentos ultranacionalistas e fascistas se materializaram em decorrência das frustrações com os resultados da economia de mercado neoliberal e também pela ação de membros da extrema direita que, encarcerados durante o período dos regimes socialistas, foram posteriormente libertados devido à anistia geral que acompanhou os momentos últimos do socialismo na região.

Paul Hockenos não diz, mas é possível inferir uma hipótese sobre um problema central que cerca a refundação de uma nova ordem política. Nitidamente, a transição em parte dos países em questão, sofreu pela falta de quadros para a gestão pública. Em certos países, a baixa organização e diversidade da sociedade civil (decorrente da ausência de participação política) aliada à ausência de experiências democráticas, fez com que, para o lugar dos funcionários do anterior estado burocrático sob o socialismo real, não houvesse lideranças com competência para a gestão pública.

Assim, para a “nova” administração do Estado, será formada uma composição de antigos comunistas (agora reinventados), forças democráticas, setores ultranacionalistas e até fascistas, constituindo uma mistura ideológica problemática e, certamente, geradora de novas instabilidades.

O fenômeno do nacionalismo étnico e a total ausência de um nacionalismo cívico é o que moldou toda a conjuntura política dos referidos países naqueles inícios dos anos 1990. E tal nacionalismo, como é de se esperar, resultou em conflitos étnicos, hostilidades raciais, perseguições, mortes, etc.

Todo este caldo político e cultural fez aparecer na região grandes movimentos de extrema direita compostos por partidos políticos e uma diversidade de grupos de interesses ideológicos comuns.

Na composição da administração pública, logo após a queda do muro, e nas posteriores eleições, outras sombrias articulações políticas, coligações pontuais ou conjunturais, apareceram. É conhecido que os setores mais duros dos regimes do socialismo real, nos referidos países, se situavam na área de segurança, por exemplo, na Stasi, que era a polícia secreta da Alemanha Oriental, na sua correlata Securitate, do Estado romeno. Os funcionários destes órgãos, além de manifestarem práticas autoritárias, guardavam sentimentos nacionalistas e potenciais preconceitos com relação a estrangeiros.

Ora, com a desestruturação dos Estados socialistas, tais setores serão incorporados às forças nacionalistas étnicas, cujos programas políticos eram claramente fascistas, ou serão reincorporados aos sistemas de segurança estatal quando, por meio de eleição, a direção do país caiu nas mãos de algum partido de direita. Ocorreu então que forças nacionalistas e ultranacionalistas, embora anticomunistas, tinham à disposição a expertise das antigas forças de segurança da antiga burocracia socialista.

O livro de Paul Hockenos ajuda a compreender – considerando fatos objetivos – aquilo que nos Estados das revoluções socialistas caracterizam os ganhos e as vicissitudes de um processo revolucionário. Nos países citados, tornar-se socialista, do ponto de vista do regime e da governança, não resultou de um envolvente processo revolucionário, como foi o caso da Rússia, ou mais tarde, o de Cuba. Alemanha Oriental, Hungria, Romênia, República Tcheca, Eslováquia e Polônia tornaram-se socialistas por meio de outras conveniências e não em decorrência de intenso processo de luta de massas.

Há que se lembrar, por exemplo, que a participação da Hungria na Segunda Guerra mundial foi de apoio aos países do Eixo. Logo, nas estruturas desses Estados, e em seus partidos comunistas, houve a composição de forças socialistas, com grupos nacionalistas étnicos, antissemitas, e até xenófobos. Com a desagregação dos regimes a partir de 1989, especificamente, tais forças políticas reacionárias, desalojadas do próprio Estado socialista em crise, vieram a se somar ideologicamente a outras forças reacionárias (anticomunistas e fascistas) e, desse modo, constituíram, nestes países, grupos de direita e extrema direita.

Precisamente sobre a Polônia, o texto de Paul Hockenos, acrescenta interessantes informações para além daquilo já conhecido no Brasil. Nos anos 1980, a esquerda brasileira acompanhou o surgimento do movimento Solidariedade, de origem sindical, cujo um de seus líderes, Lech Walesa, se tornará, depois, com a retomada do processo democrático, o presidente do país. O Solidariedade foi um movimento sindical que começou a confrontar o regime socialista polonês.

Ocorre que tal movimento é composto por diferentes frações políticas, desde grupos de esquerda críticos do regime, até grupos de centro e de direita. No movimento, Lech Walesa era o líder sindical representante da Igreja Católica Polonesa. Católico conservador, Walesa representava bem os interesses da Igreja na luta política. A Polônia, deste período, enfrentando a conjuntura política semelhante aos demais países do Leste, não pode ser compreendida sem a presença de sua Igreja Católica. Com 95% da população vinculada ao catolicismo, o país em questão, culturalmente guarda um vínculo inextricável entre catolicismo e nacionalismo. Em outras palavras, a ideia de nação para os poloneses está amarrada aos valores do cristianismo católico.

Assim, na transição do regime socialista para a possível gestão democrática posterior, a Igreja Católica assumiu o papel de mediadora entre as forças da burocracia comunista e as novas forças democráticas. Ocorre que a Igreja Católica polonesa, na época – e certamente ainda hoje – uma das mais conservadoras de todo cristianismo católico no mundo, manifestava uma relação ambígua com o Solidariedade e com as forças democráticas: de um lado, a cúpula legitimava a participação de sua base (clero e leigos) na luta política e mesmo no interior do Solidariedade; por outro lado, a própria cúpula ficava distante de tal envolvimento.

A rigor, como aponta Paul Hockenos, a elite da instituição cristã contribuía para o que ela compreendia como reflorescimento das experiências democráticas, mas acompanhava de perto as forças democráticas com o intuito destas “não saírem do controle” no sentido de defenderem proposições de uma experiencia democrática mais radical, inclusive no terreno dos costumes. Nesta questão, a título de esclarecimento, uma analogia pode ser estabelecida entre a Igreja Católica polonesa e o liberalismo no Ocidente: ambos manifestam a mesma ambiguidade com relação à democracia, pois apoiam o exercício democrático com desconfiança e, em decorrência, criam obstáculos objetivos à gestão que pretenda ser mais alargada e que inclua valores substantivos de igualdade e tolerância efetiva a novos costumes.

Na eleição que ocorreu no país, posteriormente à queda do socialismo, nenhum partido ousou confrontar a Igreja, e esta trabalhou nos momentos cruciais para fazer de Walesa o presidente, e marginalizar as forças mais à esquerda (ação que ela já efetivava nas divisões internas do Solidariedade). Mas algo mais sombrio se fez com as intervenções da Igreja no processo político polonês. Nos anos 1980, a Polônia era talvez o experimento e a esperança da cúpula do Vaticano em recriar uma sociedade cristã, um catolicismo puro e incorruptível para ser modelo para a Europa.

Sua missão não era reformar os valores, mas algo mais, isto é, reorganizar o cristianismo europeu e projetar a libertação do Ocidente moralmente doente (HOCKENOS, 1995). Há que se lembrar que, neste mesmo período, a Igreja Católica polonesa tinha um grande representante no cristianismo mundial, e um político para o mundo secular: o Papa, também polonês, Karol Wojtyla (João Paulo II). Tal Papa, como já se sabe, foi profundo aliado das forças conservadoras e neoliberais da época (Margareth Tatcher e Ronald Reagan), além de articulador internacional nas ações com vista a abreviar os regimes dos países do socialismo real, a começar pela Rússia de Gorbachev.

Mas apoiar as forças neoliberais não significa total compromisso com a ideologia dominante no Ocidente. João Paulo II e seu secretário Joseph Ratzinger (futuro Bento XVI), reprovavam certos traços do Ocidente tais como o relativismo dos valores, a frouxidão no âmbito dos costumes, e o extremo consumo. Assim, por exemplo, na Polônia dos anos 1990, qualquer político que assinalasse certa tolerância com relação às práticas de aborto, era claramente alijado do processo político. Isto fez com que, naquele momento, a institucionalidade polonesa com suas leis tivesse (junto com a Irlanda) uma das legislações mais truculentas contra médicos e gestantes que se envolvessem com os procedimentos de aborto. Evidentemente, o Papa e a Igreja Católica polonesa tinham uma postura crítica não somente contra a anterior experiencia socialista, mas também, contra certas bases da cultura do Ocidente.

Tal preocupação se mostra institucionalmente no partido político mais representativo dos interesses da Igreja, o CNU (União Nacional Cristã) que, entre 1991/1993, fez parte da coalizão do governo polonês, com seu programa claramente de direita, cujos princípios se intitulam “Cristianismo, Igreja, Pátria e Honra”. Tal partido se comportou como soldado leal da hierarquia da Igreja defendendo um programa de ideias de uma Polônia definida como Estado católico nacionalista; um posicionamento crítico ao liberalismo por meio da rejeição à economia de mercado; à condenação do sexo antes do casamento; rejeição do divórcio e do uso de contraceptivos. Para os jovens, o partido tinha uma missão bem específica:

Os jovens poloneses devem assumir o papel de “cruzados da moral” se quiserem sobrepujar “pequenos criminosos, alcoólatras e anarco-pacifistas”, pois, ‘um verdadeiro católico não é um cordeirinho que se conforma facilmente’ (HOCKENOS, 1995, 294).

O programa político do CNU projeta o país como expressão de uma unidade nacional e cristã. Logo, nação e espírito estão imbricados, tanto no projeto do partido, como para a Igreja. Para o partido, a nação é a um só tempo comunidade étnica de poloneses e comunidade espiritual de católicos. Ora, tal concepção que vincula raça e religião somente pode resultar em um sinistro projeto político. E este valor se materializa na defesa, pelo partido, da ideia de edificação na Polônia de uma “comunidade espiritual vital”, que, para ser alcançada “[…] depende de uma nação polonesa forte, que é baseada na comunidade de poloneses étnicos, devotados ao cristianismo. A mais elementar unidade dessa comunidade étnica é a família católica. A construção de uma nação-estado católica deve, portanto, começar na base da fraqueza da nação, ou seja, a família, e sua crise moral contemporânea” (HOCKENOS, 1995, 295).

O chamamento dos jovens e a exigência de constituição de uma comunidade forte, pois um verdadeiro católico não é um cordeirinho que se conforma facilmente, assinala o propósito do viés étnico presente no programa do CNU: um projeto eugênico, portanto, uma intenção de aperfeiçoamento da raça para criação de cidadãos fortes com a finalidade de enfrentar, por meio dos cruzados da moral, a “decadência dos valores ocidentais” que se avizinha à cultura polonesa. Sendo tal programa partidário efetivado com apoio da Igreja Católica local.

Neste aspecto, verifica-se na Polônia, após o difícil percurso rumo ao reflorescimento dos ideais democráticos e às frustrações provenientes dos resultados econômicos neoliberais, um vínculo entre conservadorismo da Igreja Católica e o projeto de movimentos de direita fascistas.

Adiciona-se a consideração de que a Opus Dei começou a penetrar na sociedade polonesa sob as bençãos de João Paulo II. Tal organização reacionária, inscrita no mundo institucional da Igreja em muitos países, defensora de um catolicismo extremamente conservador e com símbolos hierárquicos quase militares, se aproximou do país por meio da popularização de traduções dos textos de seu fundador, o padre espanhol Jose Maria Escriva de Belaguer. O pontificado de João Paulo II demonstrou simpatia para com a Opus Dei, e alçou fiéis dessa organização a altos postos no Vaticano. Para além disso, o Papa, contornando exigências de tempo para a canonização (entre cinquenta e cem anos), com apenas 17 anos após a morte de Belaguer (falecimento em 1975), inicia o processo de sua beatificação (HOCKENOS, 1995).

Por todo este relato sobre a política e a conjuntura da Polônia após a desagregação do socialismo real ali inscrito, o texto de Paul Hockenos (1995) situa a sombria trama muito refinada dos interesses compartilhados entre o Vaticano, a Igreja Católica polonesa e os partidos fascistas.

Um penúltimo aspecto a salientar é o posicionamento do autor sobre o objeto de seu livro. Paul Hockenos, sendo um jornalista americano, não escapa de uma certa crença em defesa da economia de mercado. A rigor, ao longo de seu texto, o autor hesita em afirmar que os países do Leste Europeu foram iludidos com o projeto neoliberal, cuja natureza não iria trazer bons resultados econômicos e sociais a curto e médio prazo; por outro lado, também professa de maneira implícita que o âmbito da política e da vida social devem se sustentar na economia de mercado, pois este é o caminho mais avançado, moderno e comprometido com os ideais democráticos.

Nesta perspectiva, nas entrelinhas de seu texto, sugere que há um desenvolvimento maior nos países ocidentais e isto já assinala uma superioridade com relação ao Leste da Europa. Seguindo neste mote, apresenta a comparação entre valores constituintes de projeto nacional. Para o autor, estruturando um argumento forçado, a experiência socialista de viés estalinista fortaleceu, nos países do Leste Europeu, nacionalismos étnicos com todas as suas consequências: racismos, xenofobia, fascismos de distintos matizes e articulações de movimentos de extrema direita. Nesta toada, o contrário ocorreu com o Ocidente que conseguiu disciplinar de maneira melhor suas forças políticas de direita, e as convergiu para compromissos com ideais democráticos.

Portanto, no juízo de Paul Hockenos, a equação é simples: a experiência autoritária do socialismo real contribuiu para o avanço da extrema direita na região em questão, enquanto no Ocidente, houve uma contenção do extremismo, compelindo-o para aceitação das regras do jogo democrático. Ora, tal argumento é forçado porque não se sustenta. Sobre o que o autor não diz, nem faz a mínima menção: os grandes movimentos fascistas do século XX tiveram origem nos países ocidentais, no caso, o nascedouro na Itália de Mussolini, o mais tenebroso na Alemanha de Hitler, e o mais longevo, na Espanha de Franco.

Aliás, o autor busca situar, de maneira implícita, que o fascismo na Europa Ocidental circunscreveu-se apenas ao período pré Segunda Guerra e, em seguida, foi desaparecendo, mas, esquece de que, no caso da Espanha, ele teve vida longa, iniciando-se em meados dos anos 1930 e chegando até a metade dos anos 1970.

Paul Hockenos admite algumas fragilidades do Ocidente, mas apresenta-as como algo pontual: cita a presença de skinheads na Alemanha Ocidental; contextualiza a contribuição de grupos de extrema direita de países ocidentais às organizações irmãs situadas no Leste e, na conclusão de seu livro, situa muito bem que o Ocidente Europeu mais prometeu do que cumpriu com projetos e programas que visassem incorporar países do Leste à comunidade da Europa. Proveniente do Ocidente não houve apenas a estratégia de danos previsíveis da política de mercado desregulado e demais exigências do FMI/Banco Mundial. Houve também ação deliberada em definir altos requisitos para os países do Leste se integrarem à Europa, criando, desse modo, propositais entraves decorrentes das suspeitas do alto custo de tal decisão para a economia da parte abastada da região. Neste aspecto, o autor faz o alerta:

O Ocidente não pode contar só com os quarenta anos de estabilidade, nem pode fechar a Europa Oriental como se os muros da Guerra Fria estivessem de pé. Os destinos do Ocidente e do Oriente estão extremamente interligados, e devem trabalhar juntos para que a Europa do passado não seja a Europa do futuro (HOCKENOS, 1995, p. 365).

Colocando-se as devidas ressalvas na suspeita ideia de que “o Ocidente teve quarenta anos de estabilidade,” o aviso de Hockenos é pertinente.

*Eurico Pereira de Souza é mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

 

Origens da operação militar especial russa na Ucrânia

Prof. Marcello Ferrada de Noli [*]

Acontecimentos de 2014.

O direito humano mais importante é o direito à vida, pelo que, por definição, os Médicos Suecos para os Direitos Humanos sempre se opuseram à guerra como meio de resolver conflitos geopolíticos. A comunidade internacional deve esforçar-se ao máximo para procurar e encontrar uma solução para os conflitos geopolíticos na mesa de negociações.

Na minha análise, essa abordagem negocial foi exatamente o que a Federação Russa pretendeu fazer, de forma proactiva e repetida. A Federação Russa apoiou e participou nos acordos de Minsk e noutras iniciativas de negociação – e respeitou esses acordos em conformidade. Apresentou, uma e outra vez, fórmulas para resolver o conflito com a Ucrânia em propostas feitas diretamente aos governos europeus, à liderança da NATO e aos EUA. No entanto, repetidamente, essas potências recusaram-se a considerar as propostas feitas pela Federação Russa. Além disso, a participação da Ucrânia na NATO – uma questão crucial para a segurança nacional da FR – foi mesmo declarada pelos EUA e aliados como um assunto não discutível.

Nós, na direção da SWEDHR, concordámos unanimemente no passado em denunciar as actividades intervencionistas conduzidas pela NATO e parceiros na Ucrânia desde o golpe de 2014. E continuamos a considerar que a melhor forma de contribuir para a paz é uma solução diplomática negociada que vise o estatuto de neutralidade e de não-alinhamento da Ucrânia. O mesmo estatuto que defendemos em relação à Suécia.

A intervenção militar russa poderia ter sido evitada. Principalmente, se a NATO e os "parceiros" – durante as conversações de dezembro de 2021 a fevereiro de 2022 – tivessem honrado as garantias documentadas dadas anteriormente à Rússia sobre a não expansão para leste.

Como já disse em declarações anteriores no Professor's Blog (o antecessor de The Indicter), uma contribuição anterior para a paz na região teria sido o reconhecimento pela ONU das repúblicas democráticas de Donetsk e Lugansk como independentes ou como fazendo parte da Federação Russa. E o reconhecimento da Crimeia como sendo russa.

I

Uma vez que o direito humano mais importante é o direito à vida, os Médicos Suecos para os Direitos Humanos opõem-se, por definição, à guerra.

Para além disso, o nosso manifesto fundador da SWEDHR apela explicitamente ao respeito pela Carta das Nações Unidas. Este principal acordo internacional tem sido sistematicamente violado ao longo das últimas décadas, por exemplo, nas guerras dos Balcãs, na invasão do Iraque, etc. Foram aplicados numerosos golpes de Estado com intervenção direta estrangeira, em violação dos princípios das Nações Unidas e do direito internacional. Os direitos humanos, tal como definidos pela ONU, têm sido constantemente desrespeitados – tanto no que se refere às nações como aos indivíduos – por muitos governos, incluindo as potências ocidentais e os membros da NATO e da UE.

Com base nos mesmos princípios, condenei, e continuo a condenar, as operações militares ucranianas contra as repúblicas de Donetsk e Lugansk, que declararam a sua independência através de um plebiscito.

Concomitantemente, proponho que continuemos a opor-nos às atividades militares e político-intervencionistas da NATO e dos seus parceiros, conduzidas na Ucrânia desde o golpe de 2014. Também nos devemos opor aos comportamentos actuais dos governos que, utilizando a crise da Ucrânia, embarcaram numa série de provocações que não só desestabilizam ainda mais a segurança da região, como – o que é mais concebível – podem acabar por conduzir a uma guerra prolongada e, possivelmente, nuclear.

Permitam-me que seja muito claro nesta discussão:   Considero a operação militar russa na Ucrânia como um ato de autodefesa. Por conseguinte, não a condeno.

Aqueles que consideraram a intervenção russa como inadequada e, portanto, condenável, parecem ignorar vários factos. Por exemplo:

  1. A Ucrânia já não é uma democracia que respeita as regras das Nações Unidas. Apoiada por potências estrangeiras ocidentais - que, na minha opinião, assumiram o controlo ideológico e cultural da Ucrânia -, este país tem-se entregado a graves violações dos direitos civis e dos direitos humanos dos seus cidadãos. Na junta imposta pelos EUA com a ajuda de alguns governos da UE, incluindo a Suécia (ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Carl Bildt), figuraram notórios líderes políticos neo-nazis. A operação militar especial russa (SMO) é uma iniciativa destinada a neutralizar as forças nazis.
  2. Em numerosos documentos de 1990 em diante (ver "Arquivo de Segurança Nacional", na secção Referências, em baixo), os líderes governamentais da NATO deram claramente garantias à Rússia de que a NATO não se expandiria para leste.
  3. As sanções que os EUA - seguidos subservientemente pelos governos da UE - impõem à Rússia sob o pretexto da operação militar russa, são claramente concebidas para fortalecer as suas próprias economias. Existem razões económicas para que as potências ocidentais não tenham prosseguido, e em última análise se tenham oposto, a negociações com a Rússia que poderiam ter evitado o SMO.

II

Numa análise séria deste conflito, há que ter em conta as seguintes questões. Trata-se de factos que merecem apenas a atenção dos meios de comunicação social ocidentais. Como acontece atualmente na Suécia, são praticamente ocultados:

1. O resultado político do golpe de Estado na Ucrânia em 2014 foi engendrado pelos EUA (ver transcrição de uma cassete divulgada pela BBC, sobre a troca de impressões entre a Secretária de Estado Adjunta Victoria Nuland e o Embaixador dos EUA na Ucrânia, Geoffrey Pyatt),[1] com a colaboração de representantes dos governos da UE, com destaque para o Ministro dos Negócios Estrangeiros sueco Carl Bildt.[2]

Aliás, foi nessa altura – já em 2014 – que Carl Bildt previu que nunca haveria conversações positivas com a Rússia sobre a questão da Ucrânia [3]. O diálogo não estava em cima da mesa, mas o plano de enredar da Rússia numa guerra já estava aparentemente a emergir.

2. A limpeza étnica contra a população de etnia russa do Donbass – chamada de "sub-humana" pelo então primeiro-ministro ucraniano Yatsenyuk – [4] teve início logo após o golpe. Entretanto, Carl Bildt manteve conversações oficiais com o governo ucraniano nascido do putsch, nas quais participou o líder do Svoboda. Trata-se de um partido político fundado em 1991 como Partido Social-Nacional da Ucrânia [5] e cujo emblema é partilhado pelo regimento militar neonazi "Azov", da Guarda Nacional da Ucrânia [6]. Os EUA, bem como militares suecos e de outros países da NATO, têm participado desde sempre – inclusive em fevereiro de 2022 – na formação da Guarda Nacional [7]. As formações neonazis acima referidas não são as únicas a operar na Ucrânia. Por exemplo, outra grande agremiação é a extrema-direita pró-nazi. [8]

Uma outra ilustração da ideologia neofascista pró-ativa das elites políticas ucranianas pode ser encontrada num relatório da Reuters (17 de março de 2015), que cita "O Parlamento ucraniano, a Rada Suprema, aprovou no mês passado um projeto de lei que homenageia as organizações envolvidas na limpeza étnica em massa durante a Segunda Guerra Mundial". [9]

3. A ONU estimou [10] que cerca de 14 000 vítimas mortais (mais de 3 000 civis) ocorreram durante a chamada "ATO" – a operação "antiterrorista" levada a cabo pelo regime de Poroshenko contra as populações do Donbass. Este, e nenhum outro, foi o número real de mortes na Ucrânia no momento em que a Rússia decidiu iniciar as operações militares no país, com o objetivo – como foi declarado – de desnazificar as forças ucranianas pertinentes que a Rússia considerava responsáveis pelos assassinatos das populações de etnia russa em Donbass. Em vez disso, os governos ocidentais e os seus meios de comunicação social fazem a contagem das mortes na "guerra da Ucrânia", que começou apenas em 24 de fevereiro de 2022.

4. A importância do golpe de Estado de Maidan, em fevereiro de 2014, na Ucrânia - especialmente no que diz respeito à monitorização dos direitos humanos – com a limpeza étnica que se seguiu e os crimes documentados contra os direitos humanos das populações do Donbass. Por exemplo, os "Três massacres num mês" [11] referiam-se aos acontecimentos sangrentos de Mariupol [12] [13] e Odessa [14][14] em maio de 2014 e aos bombardeamentos aéreos contra os civis de Lugansk em junho de 2014 [14]. Em julho de 2014, o Departamento de Estado dos EUA chegou ao ponto de apoiar publicamente "o direito total da Ucrânia" de bombardear por via aérea a população de etnia russa em Donbass [16].

III

Desde o golpe de Estado de fevereiro de 2014, imediatamente a seguir, a SWEDHR tem registado a forma como a NATO e os seus parceiros têm travado uma guerra por procuração na Ucrânia, sacrificando vidas de ucranianos em nome do seu expansionismo geopolítico e dos seus interesses económicos globais. Ao denunciar esses crimes relacionados com a limpeza étnica e os ultrajes aos direitos humanos na Ucrânia, vimos também a necessidade de preencher a lacuna que a Amnistia Internacional e a HRW haviam deixado – de acordo com uma rotina bem conhecida de proteção dos interesses da NATO – em silêncio.

Concordámos, numa fase inicial, com a independência das repúblicas do Donbass, tal como decidido pelas suas principais populações étnicas. Foram precisamente as violações generalizadas dos direitos humanos documentadas contra a população do Donbass pelas forças ucranianas e nazis [ver acima] que conduziram à nossa posição.

Informação, guerra e direitos humanos

A SWEDHR defende a transparência da informação. No contexto da propaganda ocidental, das notícias falsas [17] e das informações arbitrariamente seleccionadas sobre a Ucrânia, denunciamos também a censura e a supressão da liberdade de expressão pelos meios de comunicação social e pelos governos dos EUA e da UE, em clara violação da Carta dos Direitos Humanos da ONU. Estas autoridades adoptaram um tipo de censura extraordinária como se os seus países, as suas tropas, estivessem a participar diretamente na guerra. O que, paradoxalmente, é algo que negam veementemente.

Estas proibições, acompanhadas da perseguição de vozes independentes, retratam o sistema de "democracia" da UE como navegando de novo em águas perigosas, em direção aos tempos sombrios dos sistemas totalitários de meados dos anos 30 na Europa.

A Rússia também cortou a liberdade de informação, e de forma ainda mais drástica no que respeita ao seu público interno. Todas as limitações à liberdade de radiodifusão/publicação são condenáveis, seja onde for. No entanto, uma diferença em relação às actuais limitações da liberdade de expressão no Ocidente é que, por exemplo, nos países da UE, as opiniões diferentes não constituem atualmente uma ameaça à segurança nacional desses países. As opiniões divergentes, como as da SWEDHR, apenas mostram a inconsistência das acções dos que estão no poder. Mas não constituem uma ameaça, por exemplo, para a segurança nacional da Suécia.

Quando as potências ocidentais – apesar de "não estarem em guerra" – fecham a emissão ou anulam o acesso em linha a sítios noticiosos russos ou chineses, estão a violar os direitos dos seus cidadãos de selecionar e receber informações dos canais que têm o direito de escolher, de acordo com a carta dos direitos humanos da ONU. Obviamente, esta flagrante violação dos direitos humanos básicos dos nossos cidadãos não é objeto de qualquer problema por parte dos meios de comunicação social deste país – que se autoproclamam "defensores" dos princípios democráticos e do "Estado de direito".

Em vez disso, a Rússia está abertamente em guerra. Se algum dos países e "parceiros" da NATO, como a Suécia, decidiu entrar na guerra com base num casus bellis decorrente de provocações ostensivas (ver armas para a Ucrânia, abaixo), inexoravelmente os seus governos também ditarão estados de emergência com medidas tão drásticas como as da Rússia, ou talvez ainda mais. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Suécia, mesmo considerando-se um país "neutro", não beligerante, deteve sem julgamento vozes oposicionistas de esquerda como "comunistas", "anarquistas" e confinou-os em campos de concentração chamados "campos de internamento". [18]

As notícias falsas são também a omissão de informações importantes. Por exemplo, e do ponto de vista da justiça e da objetividade da informação, é inaceitável que os meios de comunicação social ocidentais ocultem ou branqueiem propositadamente [19] a existência das formações militares pró-nazis que aqui mencionámos.

Armas defensivas para a Ucrânia? Não é de todo o caso

Nós, os povos europeus, estamos a assistir a uma verdadeira corrida entre os países da UE pertencentes à NATO para fornecer à Ucrânia armamento "defensivo". No meio dessa competição, vemos os governos e as elites militares da Suécia e da Finlândia – supostamente não alinhados e "neutros" – a defender e, finalmente, a fornecer armas à Ucrânia.

Primeiro, afirmaram que se tratava de armas de defesa. Não era nada disso. Da Finlândia, as armas enviadas e as respectivas munições são designadas precisamente por "armas de assalto". Os lançadores anti-tanque fornecidos pela Suécia são, por definição, armas de ataque. Não se trata, como o comum das pessoas é levado a pensar, de um armamento destinado a defender-se caso um tanque decida atacar. Isso simplesmente não acontece em combate. Pela simples razão de que todos os soldados sabem que, se o tanque disparar, o soldado e a "peça anti-tanque" que transporta são imediatamente destruídos. Na realidade, estas armas devem ser utilizadas logo que um tanque inimigo seja avistado à distância. São verdadeiras armas de ataque destinadas a destruir tanques e carros blindados e a matar as suas tripulações. São utilizadas mesmo para destruir veículos de transporte de tropas com soldados no seu interior.

No entanto, o principal argumento para a nossa crítica às elites pró-NATO no poder não se baseia nestas questões técnico-militares. É, antes, um facto político – exatamente relacionado com a questão, ou mantra, da "segurança nacional" que se repete constantemente na narrativa das personalidades políticas e militares suecas belicistas.

A Rússia disse que, se os governos da NATO e da UE não considerassem as suas exigências de garantias de que a NATO não se expandiria mais com a inclusão da Ucrânia, responderia militar e tecnicamente. Foi o que aconteceu.

A Rússia também afirmou recentemente que, se os países da UE, por exemplo, interferissem nas suas "operações militares" na Ucrânia, nomeadamente enviando armas e afins, a Rússia consideraria esses países em estado beligerante contra as suas forças armadas. E assim foi.

A Rússia anunciou que, tendo em conta a situação atual (não na Ucrânia, mas relativamente à posição da NATO e dos "parceiros"), colocaria o seu poderio nuclear em estado de alerta. E assim foi.

Ao mesmo tempo, incongruentemente, os políticos da UE e os seus media acusam o presidente da Rússia de "barbárie". Além disso, os pseudo-diagnósticos psiquiátricos do tipo "homem louco", "totalmente louco", "desequilibrado" também estão muito difundidos nos meios de comunicação desses países, nomeadamente na Suécia – que fica a apenas algumas centenas de quilómetros dos mísseis russos Iskander, em Kaliningrado.

Assim, a nossa pergunta é:   porque é que a Suécia e alguns outros países da Europa estão a tentar tão desesperadamente provocar uma resposta militar da Rússia? Sobretudo se essa decisão for tomada por um homem "fora de si"?

Quem é que, de facto, está fora de si?

IV

Em suma, o mundo está a testemunhar como o Ocidente corporativo e os seus fantoches políticos na liderança da UE criaram este confronto com a Rússia   a) com o objetivo de aumentar os seus orçamentos militares (por exemplo, Alemanha, Suécia, etc), o que significa um aumento drástico dos lucros da sua indústria de armamento.  b) para substituir o petróleo russo canalizado para a Europa por empresas produtoras de petróleo dos EUA, [20] [20] bem como outros "actores internacionais" também em associação financeira com o Ocidente corporativo.

Na minha análise, que a SWEDHR está disposta a debater com qualquer outra ONG, a atual guerra na Ucrânia teria sido perfeitamente evitada se a NATO e os "parceiros" tivessem demonstrado uma abertura mínima necessária às preocupações de segurança da Rússia.

É um facto histórico, comprovado em 30 documentos diferentes de 1990 em diante [21], que os líderes governamentais da NATO, incluindo os presidentes dos EUA, o secretário de Estado dos EUA, o secretário-geral da NATO, os governos do Reino Unido e da França e, em particular, a Alemanha, deram garantias sucessivas de que a NATO não se expandiria para leste. Neste sentido, consideramos bastante legítima a preocupação da Rússia com a atual expansão da NATO – agora com as admissões da Suécia e da Finlândia como "opção NATO" e a iminente incorporação da Ucrânia.

Atualmente, depois de a Rússia ter iniciado operações militares na Ucrânia para além de Donbass, os EUA (não a UE) estão a assinalar que a incorporação da Ucrânia na NATO pode esperar pelo menos 5-6 anos. Mas isso não foi admitido na mesa de negociações. Foi sempre um não direto à proposta da Rússia. A NATO e a UE recusaram-se a dar qualquer tipo de garantia. As potências ocidentais sabiam que a sua recusa obstinada iria custar uma guerra na Ucrânia – anunciaram-no a toda a hora durante as negociações. Queriam a guerra e conseguiram-na, pensando que uma Rússia exausta no pós-guerra está exatamente nos planos geopolíticos do Ocidente – leia-se, aumentar o domínio do mercado global.

O que os incultos, os negadores da história ou simplesmente as elites russofóbicas europeias ignorantes no poder esqueceram irresponsavelmente é que a Rússia possui a capacidade nuclear absolutamente mais eficaz do mundo. Não só em número de ogivas nucleares, mas também em termos de armas de lançamento. Um exemplo são os imparáveis mísseis de geração hiper-sónica.

A SWEDHR foi fundada em 2014, precisamente contra o pano de fundo dos acontecimentos referidos na presente declaração. Precisamente, foram os horrendos, e literalmente, os sangrentos ataques aos direitos humanos e às vidas humanas das pessoas em Donbass uma razão potente que motivou o início do nosso empreendimento de denúncia da SWEDHR, destinado a melhorar a dignidade humana. [22] [23]

As provocações do Ocidente colocaram a humanidade à beira da destruição total. A SWEDHR apela a que se resista ao exército de criadores de notícias falsas dos media corporativos ocidentais, que atualmente instigam o aprofundamento do conflito na Ucrânia. Em vez disso, aumentemos os apelos à paz.

Nesse sentido, consideramos que o melhor contributo para a paz é uma solução diplomática negociada que vise o estatuto de neutralidade e de não-alinhamento da Ucrânia. O mesmo se aplica à Suécia.

Nota: Uma versão ampliada deste texto foi publicada pela primeira vez em The Indicter em 9 de março de 2022 com o título "Swedish Doctors for Human Rights -Analysis of the Ukraine situation, its causes and possible solution".

[1] BBC, "Crise na Ucrânia: Transcript of leaked Nuland-Pyatt call", 7 Feb 2014 https://www.bbc.com/news/world-europe-26079957
[2] M Ferrada de Noli, "Uma "diplomacia" sueca de extrema-direita? Or Bildt's Solo Support To Ukraine Nationalists?", 6 Mar 2014 https://professorsblogg.com/2014/03/06/bildtsukraineextrem/
[3] M Ferrada de Noli, "Carl Bildt na televisão sueca: "Ahead, we don't know if there are possibilities for a political solution with Russia", 8 Dec 2014 https://professorsblogg.com/2014/12/08/carl-bildt-are-there-possibilities-for-a-political-solution-on-russia/
[4] CNN, 15 de junho de 2014, "Primer Minister wows Ukraine will wipe the killers"
[5] Artigo da Wikipédia https://en.wikipedia.org/wiki/Social-National_Party_of_Ukraine
[6] Artigo da Wikipédia https://en.wikipedia.org/wiki/Azov_Battalion
[7] M Ferrada de Noli, 20 de fevereiro de 2022 https://twitter.com/ProfessorsBlogg/status/1495404412805779463
[8] Artigo da Wikipédia https://en.wikipedia.org/wiki/Right_Sector
[9] Reuters, " Vladimir Putin chama fascista à Ucrânia e a nova lei do país ajuda a defender a sua posição" https://www.reuters.com/article/idUS208024656920150514
[10] Nações Unidas. Direitos Humanos. Conflict-related civilian casualties in Ukraine [Vítimas civis relacionadas com o conflito na Ucrânia], 8 de outubro de 2021 https://ukraine.un.org/sites/default/files/2021-10/Conflict-related%20civilian%20casualties%20as%20of%2030%20September%202021%20%28rev%208%20Oct%202021%29%20EN.pdf
[11] M Ferrada de Noli, "Ucrânia Fascista: Três massacres em apenas um mês". 3 de junho de 2014 https://professorsblogg.com/2014/06/03/ukraine-fascists-3-genocides-per-month/
[12] M Ferrada de Noli, ""The Ukraine Army's slaughter of Mariupol civilians 9 May 2014: unarmed civilians shot at & killed at close range", 9 de maio de 2014 https://professorsblogg.com/2014/05/10/ukraine-armys-slaughter-of-mariupol-civilians-9-may-2014/
[13] M Ferrada de Noli, "Soldados ucranianos disparam contra a multidão em Mariupol 2014. Causa contributiva para a independência do Donbass?", 2 de março de 2022 https://www.youtube.com/watch?v=_iIEJGsg-hc
[14] M Ferrada de Noli, "The Odessa massacre of 2 May 2014. Provas actualizadas", 15 de maio de 2014 https://professorsblogg.com/2014/05/15/odessa-massacre-firebombs-thrown-by-pro-junta-actvists-burn-alive-43/
[15] M Ferrada de Noli, "The Ukraine Junta's Air Force massacre of unarmed civilians in Luhansk, 2 June 2014", 3 Jun 2014 https://professorsblogg.com/2014/06/03/what-responsibility-does-sweden-have-in-the-massacres-of-civilians-perpetrated-by-ukraine-junta/
[16] M Ferrada de Noli, "U.S. State Department publicly endorsing the every right of Ukraine's to aerial-bombing the ethnic Russian population in Donbass", 8 Jul 2014 https://professorsblogg.com/2014/07/08/the-us-state-department-publicly-endorses-ukraines-every-right-to-aereal-bombing-the-ethnic-russian-population-in-donbass/
[17] As notícias falsas têm sido abundantes na narrativa dos media ocidentais. Um exemplo é a notícia veiculada pelos meios de comunicação social suecos de que a Turquia tinha parado os navios da marinha russa no Mar Negro. https://twitter.com/ProfessorsBlogg/status/1497653614638252032
[18] "Campos de internamento na Suécia durante a Segunda Guerra Mundial" https://military-history.fandom.com/wiki/Internment_camps_in_Sweden_during_World_War_II
[19] O Conselho do Atlântico vai ao ponto de defender o Batalhão Azov contra as acusações de terrorismo formuladas até por personalidades políticas dos EUA. "Why Azov should not be designated a foreign terrorist organization", 24 de fevereiro de 2020. https://www.atlanticcouncil.org/blogs/ukrainealert/why-azov-should-not-be-designated-a-foreign-terrorist-organization/
[20] M. Ferrada de Noli, "What the Ukraine Crisis is All About" . Blogue dos Professores, 11 de junho de 2014 https://professorsblogg.com/2014/06/11/what-the-ukraine-crisis-is-all-about-u-s-b-2-stealth-strategic-bombers-now-landing-in-europe/
[21] Arquivo de Segurança Nacional, "NATO Expansion: What Gorbachev Heard", 12 dez 2017 https://nsarchive.gwu.edu/briefing-book/russia-programs/2017-12-12/nato-expansion-what-gorbachev-heard-western-leaders-early
[22] Escrevemos no nosso manifesto de fundação: "Começaremos com um compromisso sobre os efeitos dos crimes de guerra na população civil de Gaza e do Leste da Ucrânia". https://swedhr.org/swedish-professors-doctors-for-human-rights/swedhr-manifest/
[23] M Ferrada de Noli, "War Crimes in Ukraine", 25 de janeiro de 2015 https://professorsblogg.com/2015/01/25/war-crimes-in-ukraine/

29/Janeiro/2024

[*] Professor Emérito, fundador dos Médicos Suecos para os Direitos Humanos (SWEDHR)

O original encontra-se em theindicter.com/origins-of-the-russian-military-special-operation-in-ukraine/

Este artigo encontra-se em resistir.info

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