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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Ponto de vista sobre a Síria

Pelo Socialismo


Questões político-ideológicas com atualidade

http://www.pelosocialismo.net

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Publicado em: http://www.initiative-communiste.fr/wordpress/?p=10427#more-10427

Tradução do francês de TAM

Colocado em linha em: 2012/02/06


Claude Beaulieu

[de regresso da Síria, Claude Beaulieu, do

Comité Valmy, testemunha]

Que se passa na Síria ? Algumas semanas depois da nossa visita a este país, os

franceses, nesta matéria como noutras, estão mais do que nunca dominados por uma

desinformação generalizada.

Uma permanente lavagem aos cérebros em imersão no pensamento único

ambiente, o jacto contínuo de mentiras e a falsificação da realidade síria, impostos

metodicamente ao povo da França pelos média da oligarquia no poder, tornam

impraticável, para a maioria dos cidadãos manipulados como nós somos, a

investigação crítica e o discernimento da verdade a respeito da situação política

complexa que se desenvolve neste país.

A trágica agressão, mediaticamente orquestrada, que atingiu recentemente o povo

líbio, demonstrou que, mesmo para alguns militantes que se reclamam de uma

cultura progressista e anti-imperialista, é fácil ser atingido pelos efeitos da

impregnação ideológica dominante e não resistir à pressão político-mediática da

frente americano-ocidental. A este propósito, o caso do NPA, que não é único, à

«esquerda da esquerda» em França, na sua divagação ideológica, é edificante. (1)

Desde 1945, os émulos de Goebbels realizaram imensos progressos na fabricação de

opiniões públicas, graças, em particular, ao seu domínio sobre os modernos meios de

comunicação e de propaganda.

A guerra ideológica contra os povos que o seu inimigo comum estadunidense e os

seus vassalos conduzem é desigual. Ela exige, pois, permanentemente, dos militantes

e das organizações anti-imperialistas, uma vigilância rigorosa e uma forte

mobilização, em primeiro lugar, nesta batalha de ideias. Torna urgente a reflexão

anti-imperialista individual e coletiva. A concertação e o debate militantes, assim

como a elaboração de esforços multiformes de frente unida numa escala

internacional, para fazer frente à guerra imperialista hoje permanente e que tende a

generalizar-se, tornaram-se indispensáveis e urgentes.

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A visita à Síria e ao Líbano onde, em meados de novembro, tive ocasião de

acompanhar um grupo de jornalistas, foi muito rica em visitas a zonas sensíveis e em

possibilidades de apreciar a realidade política no local, a partir de encontros diversos

e do contributo de testemunhos preciosos. Esta experiência, se confirmou e reforçou

a minha apreciação prévia da situação na Síria, foi entretanto extremamente útil por

diferentes razões, a principal das quais foi ter-me permitido apreciar, ainda mais

concretamente, o nível sideral alcançado nos nossos dias pela estupro ideológico e

político-mediático dos povos em geral e do nosso povo francês em particular.

Reagindo à sua derrota no Iraque e àquela que se desenha no Afeganistão, Obama,

sempre obcecado pela perseguição quimérica de uma «nova aurora da liderança

americana», tal como os seus apaniguados, os verdadeiros detentores do poder na

oligarquia americano-ocidental, estão à procura de alternativas políticas susceptíveis,

segundo eles, de eternizar a sua ditadura mundializada, cujo futuro se adivinha

incerto. Escolheram especialmente desestruturar os estados-nação, que surgem como

a armadura das resistências e dos combates populares contra o imperialismo.

Esta estratégia geopolítica – que também se desenvolve entre nós em França, contra

a soberania nacional e popular, através da euroditadura atlantista e com

objetivos regionalistas, etnicista e supranacional – é paralelamente concretizada

contra os povos árabe-muçulmanos no relançamento das guerras de remodelação do

Grande Médio Oriente, já previsto pela administração de George W. Bush.

Existe um paralelismo evidente entre os objetivos supranacionais eurotransatlânticos

e a política de remodelação ocidentalista, que pretende desmembrar a Síria e outros

países árabes ou muçulmanos. Nos dois casos, o objetivo de domínio pretendido

implica a destruição das nações, muito particularmente no caso da Síria e no da

França.

No caso da Síria, trata-se de destruir uma nação que representa um obstáculo da

maior importância para os objetivos do imperialismo e da sua componente sionista. A

unidade nacional da Síria está profundamente enraizada numa história milenar

caraterizada, particularmente, por um hábito ancestral de vida em comum e de uma

aptidão para a coexistência fraterna entre sensibilidades religiosas. Segundo o

jornalista americano Webster Tarpley, que participava no nosso grupo, a sociedade

síria é a mais tolerante do Médio-Oriente.

Na sua maioria, os Sírios são patriotas convictos – independentemente das

suas pertenças religiosas – incluindo, ao que parece, os sunitas maioritariamente

favoráveis à unidade nacional. A minoria cristã está particularmente mobilizada

contra a guerra civil que poderia traduzir-se para si numa depuração confessional, a

exemplo do que aconteceu no Iraque.

É a riqueza desta realidade nacional específica, forjada num longo período histórico e

o patriotismo exemplar do povo sírio que daí decorre e que se torna percetível

concreta e permanentemente nos Sírios, que permitem um otimismo razoável em

relação ao futuro. Se o povo-nação da Síria não foi ainda manifestamente socorrido,

estou pessoalmente convencido de que, apoiando-se nas suas próprias forças

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nacionais, culturais, progressistas e nas escolhas laicas, rejeitando o comunitarismo

confessional, triunfará no fim sobre os seus inimigos exteriores, assim como sobre os

seus agentes dos esquadrões da morte, infiltrados ou recrutados no interior. Poderá

também contar, no seu combate, com o apoio de numerosos amigos e aliados nos

estados que estão a ser conduzidos para o bloqueio da ameaça estadunidense e

ocidentalista, assim como com os povos do mundo, entre os quais a tomada de

consciência anti-imperialista progride.

Na oposição ao governo de Bachar el-Assad encontra-se logicamente uma

componente nacional, que recusa a guerra civil, a intervenção militar estrangeira e se

pronuncia a favor da independência e da soberania da Síria. É assim, por exemplo,

que Haytham Manaa, presidente da Coordenação nacional, que agrupa uma

tendência da oposição interna síria, acaba de se demarcar do Conselho nacional sírio,

vassalo da NATO. Afirmou a um jornal libanês, a propósito da Síria: «Nunca a

entregaremos à NATO, nunca ficará nas mãos dessa gente!». Existe, pois, na Síria

uma oposição que reivindica legitimamente mais liberdades democráticas. Mas que

não tem as mãos sujas de sangue e não está globalmente implicada nesta política

criminosa armada e organizada, dirigida e teleguiada do estrangeiro.

Quanto aos comunistas sírios, eles estão também no campo dos patriotas. Ao mesmo

tempo que combatem por reformas democráticas, pela recusa das privatizações e das

diretivas neoliberais do FMI, opõem-se à ingerência imperialista e aos elementos

favoráveis à guerra civil. O Partido Comunista Sírio (unificado) apelou a «juntar

forças para defender a pátria e levar a cabo as reformas necessárias».

Dois grupos distintos chegados em meados de novembro de 2011, por iniciativa de

cristãos estimulados por Agnès–Mariam de la Croix, religiosa patriota e militante

admirável da causa dos cristãos do oriente, viveram praticamente juntos esta estada

na Síria. O primeiro reunia alguns jornalistas, belgas na sua maioria, que tinham

manifestamente como missão impossível consolidar, através das suas reportagens, o

ponto de vista ocidentalista das suas redações. O segundo grupo era composto por

militantes anti-imperialistas comprometidos com a resistência à desinformação e a

busca de uma alternativa de comunicação ideologicamente rebelde à alienação

ideológica dominante. Os dois grupos beneficiaram dos contactos e do excelente

conhecimento da situação na Síria e no Líbano do militante anti-imperialista Thierry

Meyssan e da Réseau Voltaire.

A observação essencial que o nosso grupo anti-imperialista retirou desta experiência

excecional é que os dirigentes estadunidenses e os seus vassalos mais servis (como os

Juppé e Sarkozy, utilizados, de novo, com o seu alter ego, o emir do Qatar, como as

primeiras lanças da máfia americano-ocidental) não conseguiram até aqui

desencadear uma guerra civil na Síria, apesar dos seus esforços encarniçados e de

todos os milhões que eles distribuem em abundância para o conseguir.

Sublinhamos o caráter antidemocrático da desinformação praticada em

grande escala pelos média do sistema americano-ocidental e a sua utilização

metódica da mentira, incluindo a manipulação de imagens ou o travestimento do

conteúdo real de certas reportagens televisivas: não é invulgar a exibição de vídeos de

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manifestações de massas favoráveis a Assad e apresentá-las fraudulentamente como

sendo de facto da oposição. É da mesma forma metódica que se sobreavalia a

importância das manifestações da oposição síria.

O que nós pudemos observar no local em novembro era totalmente contrário à

propaganda mediática ocidental, que martelava no tema da guerra civil, nas

manifestações de massas da oposição, na sua repressão sangrenta, que teria

provocado milhares de mortos. Vimos claramente uma importante manifestação de

massas em Damasco, mas era a favor de Bachar el-Assad e abertamente hostil ao

islamismo radical e à desintegração da Síria laica em comunidades religiosas

antagónicas.

O que vimos claramente é que, se naquela época não houvesse nem manifestações de

massas significativas da oposição, nem massacre de populações indefesas, nem

guerra civil, certas forças ter-se-iam aplicado com a melhor vontade a provocá-la, na

base interconfessional, procurando suscitar confrontos entre as diferentes

comunidades religiosas que, no dia-a-dia, convivem pacificamente. Estas forças

externas e internas, entre as quais estão os Irmãos Muçulmanos, têm estado

arredadas até agora, graças à maturidade do povo sírio e à sua vontade maioritária de

unidade nacional.

Em Homs e Baniyas, especialmente, pudemos dar conta, através de testemunhos

diretos de civis, cujos entes próximos foram vítimas de raptos, e de militares feridos

pelos atiradores furtivos ou em emboscadas, como são duras e cruéis as provas por

que o povo sírio tem tido de passar. Mais de 1100 militares foram também

assassinados e a maior parte dos mortos, segundo o governo sírio, não pertencia à

oposição.

A este respeito é necessário sublinhar que o número de mortos apontado pelos

média do sistema e da ONU, parcialmente sob controlo da NATO, é

incontrolável e não tem fundamento real. A informação é fornecida de modo

arbitrário por um chamado Observatório sírio dos direitos do homem (Osdh). Este,

com sede em Londres, é um escritório controlado pelos Irmãos Muçulmanos. Esta

organização está, pública e notoriamente, em contacto direto com o Ministério dos

Negócios Estrangeiros britânico. Além disso, o Osdh é financiado pelo National

Endowment for Democracy, organização que retira, ela própria, os seus recursos do

Congresso dos Estados Unidos. Isto confirma, pois, a pertinência da observação de

um dos nossos interlocutores, a propósito do aparecimento de um islamismo

atlântico que não é, como vemos, apenas uma especialidade turca.

A população síria é alvo de ataques assassinos muito duros resultantes da

aplicação de uma estratégia de tensão destinada a desestabilizar o país. Alternada ou

paralelamente, sobretudo nas cidades sensíveis, são cometidos assassinatos

seleccionados por gangues, nos bairros onde dominam as diferentes sensibilidades

religiosas. O povo resiste e, em geral, não se deixa manipular. Um dos nossos

interlocutores dizia-nos que, segundo ele, os sírios estavam dispostos a sofrer

sacrifícios incríveis e horrendos. Estes assassinatos e agora os atentados à bomba,

como os de Damasco, são principalmente obra de bandos armados vindos do

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exterior, infiltrados a partir de diferentes fronteiras da Síria. Estes grupos terroristas

são compostos por extremistas muçulmanos árabes, oriundos de diversos países, mas

também aí se encontram Pashtunes. Estes esquadrões da morte, a troco de dinheiro,

recrutam também assassinos no local (em particular no lumpenproletariado e

especialmente entre antigos traficantes de droga) que são pagos por cada assassinato

realizado.

Este movimento radical não foi capaz, apesar da ajuda externa,

especialmente dos turcos, de realizar o seu objetivo: criar pelo menos

uma base perto de uma fronteira, como ponto de apoio no interior da Síria.

Causa desgastes humanos e materiais consideráveis, mas situa-se agora, claramente,

numa perspetiva de marginalização provavelmente irreversível.

Em 6 de janeiro de 2012, o chamado Conselho Nacional Sírio deu mais um

passo na traição nacional, lançando um apelo à intervenção estrangeira na Síria,

em primeiro lugar à francesa, a fim de criar zonas de penetração ditas de segurança,

ou zonas tampão. O CNS apela a uma intervenção militar internacional que

começaria por uma campanha de raides aéreos preventivos, como na Líbia. Para o

CNS poderiam ser levados a cabo por aviões franceses, britânicos, turcos ou qataris.

O CNS colocou-se assim em estado de total vassalagem ao serviço dos objetivos da

NATO.

Os atentados cegos à bomba, que indicam o recurso a massacres semelhantes aos

do Iraque, não são um sinal de força e também não deveriam melhorar a imagem

desta fração do Islão, que se colocou ao serviço da estratégia geopolítica americanoocidental.

Muito pelo contrário, o radicalismo extremista em curso poderia ter como

consequência acelerar o diálogo já iniciado entre os sírios, assim como a aplicação de

reformas democráticas e sociais que eles possam desejar e que não devem relevar-se,

em princípio, na Síria como em qualquer outro país, senão da soberania nacional e

popular (soberania popular e independência de que a França hoje está privada por

causa da euroditadura).

A violência extremista, que muda de dimensão em função da estratégia da tensão e do

nível de terror pretendido, deveria também ser suscetível de estimular ainda mais a

reflexão patriótica do povo sírio e favorecer a vasta unidade popular maioritária que

se desenha.

Em julho de 2011, o parlamento sírio legalizou a existência de partidos da oposição

que não deverão assentar em bases religiosas ou tribais, terem origem num partido

ou numa organização não síria e serem obrigados a respeitar, em particular, a

Declaração Universal dos Direitos do Homem. De resto, foram libertados numerosos

prisioneiros, como exigiam especialmente os comunistas, e no domingo, 15 de

janeiro, foi anunciada uma amnistia geral.

No seu discurso de 10 de janeiro, Bachar el-Assad proclamou diversas reformas,

entre as quais a elaboração de uma nova constituição, que determinará a passagem

efetiva ao multipartidarismo e consagrará o princípio da soberania popular. Este

projeto de constituição será submetido a um referendo, imediatamente seguido de

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eleições legislativas.

Estas mudanças da maior importância, em gestação ou já em aplicação, poderiam ser

aproveitadas pelo conjunto dos verdadeiros patriotas sírios, qualquer que seja o seu

posicionamento individual ou colectivo em relação ao governo ou à oposição não

violenta, para a procura comum de uma via de unidade nacional e de progresso

democrático e social. Esta convergência patriótica é potencialmente maioritária e

capaz de evitar, ao mesmo tempo, ao país a guerra civil e a agressão imperialista.

(1) França : O Novo Partido Anticapitalista apoia uma intervenção imperialista na

Síria.

Artigo publicado por Dragan MIRIANOVIC, em 18 de janeiro de 2012.

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