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segunda-feira, 31 de dezembro de 2012
Documentos sobre a História
Pelo Socialismo
Questões político-ideológicas com atualidade
http://www.pelosocialismo.net
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Publicado em: http://www.hist-socialismo.com/docs/Porque_se_desmoronou_a_RDA.pdf
Tradução do alemão por PG, revisão e edição por CN, 16.10.2012
Colocado em linha em: 2012/11/04
Porque se desmoronou a RDA?1
Kurt Gossweiler
1993
No dia 7 de Outubro deste ano a RDA teria feito 44 anos.
No dia 3 de Outubro deste ano [1993], os actuais vencedores da História festejaram o 3.º aniversário da vitoriosa anexação da RDA, chamada «adesão».
Por esta razão houve, nos media, comentários dos vencedores e dos vencidos sobre a queda da RDA.
Porém, os comentários que mais me irritaram não foram os dos triunfantes vencedores, mas sim os de membros do meu partido, o PDS, como o seguinte:
Reiner Oschmann: «O socialismo ferrugento, apoiado por nós, nem era defensável, nem valia a pena ser defendido.»2
Para me recompor deste género de declarações de concordância com a derrota, desenterrei um velho artigo escrito por Clodomiro Almeyda, presidente do Partido Socialista do Chile, que procurou e encontrou asilo na RDA, fugindo ao fascismo de Pinochet, sobre o dia da introdução do DM,3 em 2 de Julho de 1990, na então ainda formalmente existente RDA:
«Na noite de 1 para 2 de Julho morreu de facto a República Democrática Alemã. (…) Para nós, chilenos, que vivemos muitos anos na RDA, onde fomos recebidos com hospitalidade generosa e solidária, desapareceu nesta noite a nossa segunda Pátria, foi-nos retirado algo que amávamos e que já fazia parte de nós. Desapareceu uma sociedade que – não obstante as suas deformações, deficiências e fraquezas, que conhecíamos e lamentávamos – na sua essência era uma sociedade democrática e que aspirava à igualdade.»4
Definido o tema – Porque se desmoronou a RDA? –, quero colocar a questão desde o início: Estará o fim da RDA, na verdade, correctamente caracterizado com o termo «colapso»?
1 Contribuição, até agora não publicada, para a homenagem ao 65.º aniversário de Dieter Frielinghaus, em 14 de Novembro de 1993. [In: K. Gossweiler, Contra o Revisionismo, Verlag zur Förderung der wissenschaftlichen Weltanschauung, Munique. 2.ª ed., 2004, pp. 387-398. (N.T.)]
2 Neues Deustchland, Editorial, 7.10.1993.
3 Deutsche Mark, moeda da RFA. (N.T.)
4 UZ, jornal do DKP (Partido Comunista Alemão), Essen, 28.9.1990.
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Hanfried Müller, teólogo marxista cultíssimo e editor da revista Weißenseer Blätter, conhecida muito para além de Berlim-Brandeburgo e talvez até famosa, publicou aí há algum tempo um artigo intitulado: «Colapso, contra-revolução ou ambos?», o qual foi também publicado no Neues Deutschland, numa versão reduzida.5
Aí diz: «A palavra “colapso” desperta, em primeiro lugar, o pensamento para razões internas: o colapso de um inválido ou a implosão de um edifício caindo sobre si próprio. Se alguém for assassinado, não se fala de um “colapso”.
Diferentemente da palavra “colapso”, a palavra “contra-revolução” contém a ideia de luta e inimigo, sim, de luta de classes e inimigo de classe (…)
Se alguém é derrotado numa contra-revolução, não encontra justamente a própria culpa no facto de ter exercido o poder, mas sim em o ter perdido.»
E H.M. responde assim à sua pergunta do título: «Trata-se manifestamente de ambos: o socialismo sucumbiu numa contra-revolução.»
Considero esta resposta correcta, apesar de provocar, talvez, protestos e levantar a questão: Onde estava então a contra-revolução?
Mas se queremos manter a interrogação, então temos de perguntar: Porque não resistiu a RDA à contra-revolução?
Contudo, na minha opinião, esta especificação ainda não é suficiente.
Afinal a RDA, desde o primeiro dia da sua existência, esteve sempre sob o fogo do inimigo de classe imperialista, esteve sempre exposta às investidas da contra-revolução e, na verdade, muito mais fortes e claras do que em 1989 – sem sucumbir.
É preciso então perguntar ainda com maior precisão: Porque não continuou a resistir à contra-revolução, depois de 40 anos de luta de defesa bem sucedida?
Os ataques da contra-revolução tornaram-se muito mais fortes – ou a força interna de resistência afrouxou demasiadamente? Ou aconteceram ambas as coisas?
Neste ponto, alguém atento poderia objectar: mas sem a protecção da União Soviética e do seu exército, a RDA nunca podia ter resistido à pressão económica e militar da superior RFA.
Isto é naturalmente correcto. Mais ainda, é não só válido para a RDA como para todos os Estados europeus socialistas do CAME.6 A objecção aponta para o facto muito importante e decisivo de que é impossível analisar o desenvolvimento de cada país socialista só pelo seu desenvolvimento interno, pelas suas próprias relações económicas e políticas.
Não foi só a RDA que se desmoronou, foi também a Polónia socialista, a Hungria socialista, a Checoslováquia socialista, etc. e principalmente a União Soviética socialista, a muralha de defesa de todos estes países.
Com isto deve também ser claro que a pergunta – Porque sucumbiu a RDA? – tem de ser alargada para a questão: Porque sucumbiu o socialismo na Europa e na União Soviética?
Porque venceu a contra-revolução em todos os países socialistas europeus?
5 Weißenseer Blätter 4/1992; Neues Deutschlan de 26/27.9.1992.
6 Conselho de Assistência Mútua Económica. (N. Ed.)
3
O colapso da RDA não é um acontecimento singular, mas sim um aspecto de um acontecimento colectivo e só pode ser compreendido e explicado enquanto tal.
Vejamos alguns chavões dos anticomunistas de todos os matizes, nomeadamente: o sistema económico socialista é incapaz de funcionar e sobreviver porque se baseia na eliminação da regulação através do mercado, e o sistema político do socialismo, o stalinismo – porque é uma ditadura criminosa, uma burocracia ossificada – não podia terminar de outra forma sem ser na catástrofe.
Estes chavões anticomunistas foram assumidos durante muito tempo pelo movimento comunista como declarações indiscutivelmente correctas, porque aparentemente eram confirmados pelo colapso do socialismo europeu.
Um breve olhar sobre os destinos do movimento comunista deverá revelar a insustentabilidade de uma tal opinião primitiva e simplista.
Nós, comunistas da geração mais velha, sabemos por testemunho próprio que o caminho do movimento comunista se ergueu de profundas derrotas e cruéis perseguições às alturas das maiores vitórias históricas; os comunistas de todas as gerações hoje vivas sofreram conjuntamente a experiência dolorosa da queda profunda da altura da vitória, supostamente já impossível de anular, numa nova derrota inaudita. A frase de Karl Liebknecht, «Nós comunistas estamos habituados a ser lançados do cume para as profundezas,7 ganhou uma nova actualidade, em que custa a acreditar.
A vitória da Revolução de Outubro na Rússia marcou indelevelmente o século XX. No centro dos acontecimentos históricos deste século esteve, desde 1917, a luta entre capitalismo e socialismo e esta luta – contrariamente às aparências e à opinião dos desalentados – não está de forma nenhuma terminada.
A Alemanha pertence aos países em que as irradiações da vitória de Outubro mais se fizeram sentir. Rosa Luxemburgo exprimiu este facto assim: «Nunca nos devemos esquecer, quando vêm com as difamações contra os bolcheviques russos, de lhes responder: onde aprendestes o ABC da vossa revolução de hoje? Fostes buscá-lo aos russos: aos sovietes de operários e soldados!»8
A ideia do socialismo tinha penetrado tão fortemente nas mentes e nos corações dos trabalhadores na Alemanha, que, em 1919-20, até a burguesia alemã se muniu com uma falsificação socialista chamada «Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães» (NSDAP), criação de todas as forças anti-socialistas e contra-revolucionárias alemãs.
A irradiação da atracção da construção do socialismo na União Soviética foi especialmente forte nos anos da crise económica mundial, que foram simultaneamente anos do êxito, considerado impossível, do primeiro plano quinquenal na União Soviética.
Num livro publicado em 1931, com o título O Fim do Capitalismo, de Ferdinand Fried, um autor burguês, afirma-se que é necessário também na Alemanha passar da economia não planificada para a planificada já que: «A Rússia [com o plano quinquenal] passa por uma época de enormes investimentos, enquanto as fábricas
7 Karl Liebknecht, Discursos Escolhidos, Cartas e Artigos, Berlim, 1952, p. 530.
8 Rosa Luxemburgo, Eu fui, Eu sou, Eu serei!, Berlim, 1958, p. 105.
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do resto do mundo se degradam por falta de actividade e o trigo tem de servir de combustível.»9
No jornal social-democrata Vorwärts, de 23 de Outubro de 1932, podia ler-se sob o título «Objectivo e caminho do socialismo»: «O mais valioso da experiência russa é a comprovada possibilidade de execução da economia planificada.»
Dois meses antes, em 28 de Agosto de 1932, um tal J. P. Mayer escrevia no mesmo jornal: «A longo prazo não há nenhum meio capitalista para dominar a crise. O movimento socialista entra assim no estádio da realização. O socialismo torna-se na questão de maior importância do presente, uma ordem actual de vida.»
A convicção da superioridade do socialismo em construção na União Soviética perante o capitalismo abalado pela crise era tão forte no movimento organizado do operariado alemão que até o chefe social-democrata de direita teve de a levar em conta numa campanha de massas designada «Socialismo é Tarefa do Presente!» – mas naturalmente não de forma séria.
E então quando, entre 1941 e 1945, a União Soviética e o seu Exército Vermelho deram provas de ser a força mais poderosa da coligação anti-Hitler, desferindo perante os olhos de um mundo espantado golpes decisivos sobre o inimigo fascista da humanidade – e isto depois de pesadas derrotas iniciais – aí, nenhum outro país ou povo do planeta desfrutava de maior simpatia junto das pessoas simples que o país e o povo soviéticos. Mesmo Churchill usou o entusiasmo das pessoas pela União Soviética e os seus dirigentes para aumentar a sua própria popularidade, chamando Stáline de seu amigo – «my friend Joe».
Facto é que a história mundial não conhece um segundo exemplo de um Estado e de uma ordem social que tenha suportado tão longamente uma carga permanente e passado tão duro e inimaginável exame como a União Soviética até à vitória sobre o fascismo; mas também [não conhece] um segundo exemplo de realização tão triunfal do mais difícil exame.
Quem nessa época tivesse afirmado que este Estado e esta ordem social não podiam funcionar nem sobreviver seria olhado exactamente como alguém que afirmasse em dia luminoso que era noite profunda.
E depois também, durante uma série de décadas, o movimento comunista e os países socialistas mantiveram-se como uma força que, como nunca, deu um impulso aos movimentos de emancipação da humanidade; pense-se só no seu papel decisivo na destruição do vergonhoso sistema colonial ou na vitória do povo vietnamita sobre a mais forte potência imperialista, os EUA.
E depois – esta decadência aparentemente súbita, este fim inglório!
Esta profunda queda do cume atingido em 1945 até ao poço sem fundo dos últimos anos levanta questões inexplicáveis, perante as quais, em muitos lugares, surge um sentimento de impotência.
Mas a recordação de um outro exemplo de um colapso inesperado na história do movimento operário internacional e alemão, a recordação do colapso da II Internacional, talvez ajude a chegar mais próximo da solução do enigma.
O Partido Social-Democrata Alemão, partido dirigente da II Internacional, tinha-se batido admiravelmente contra a Lei Anti-Socialista10 de Bismarck e alcançado uma vitória brilhante sobre o «chanceler de ferro».
9 Ferdinand Fried, O Fim do Capitalismo, Jena, 1931, p. 260.
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Logo em 1912, no seu Congresso em Basileia, a Internacional Socialista sublinhou a sua determinação de lutar contra a eclosão da iminente guerra imperialista e, caso ainda assim rebentasse, fazer tudo para a transformar em guerra civil.
Mas quando em 1914 a guerra imperialista se tornou um facto, todas as direcções dos partidos da Internacional – com a excepção dos bolcheviques e da esquerda búlgara (tesniaki)11 – passaram-se com armas e bagagens para o campo dos «defensores da pátria» e, juntamente com os imperialistas dos respectivos países, incitaram os proletários contra os das «potências inimigas».
O que em 1914 pareceu uma derrocada «súbita», foi o resultado final de uma longa e insidiosa decomposição dos partidos socialistas, que já Marx e Engels tinham combatido na sua famosa carta circular, de Setembro de 1879, dirigida a Bebel e Wilhelm Liebknecht e outros:
«Desde há quase 40 anos que pusemos em evidência a luta de classes como poder motor próximo da história e, especialmente, a luta de classes entre a burguesia e proletariado, como a grande alavanca do revolucionarismo social moderno; é impossível, portanto, acompanharmos com pessoas que querem riscar esta luta de classes do movimento.»12
Esta carta dirigia-se contra as tentativas de Eduard Bernstein, entre outros, de tornar o SPD aceitável para a burguesia liberal, através da substituição do postulado da luta de classes pela prédica da conciliação de classes, ou seja, através da revisão dos princípios ideológicos do partido.
Todos sabemos que foi o revisionismo que provocou a decomposição da II Internacional e que transformou a antiga social-democracia proletária e revolucionária no «partido burguês dos trabalhadores», no «partido só reformas» oportunista que, por fim, na Revolução de Novembro [1918], se confirmou como
10 A Lei Anti-Socialista foi aprovada no Parlamento alemão em 18 de Outubro de 1879, sob a vigência do chanceler imperial Otto von Bismarck. O diploma, oficialmente designado Lei Contra o Perigo Público das Tentativas Sociais-Democratas (Gesetz gegen die gemeingefährlichen Bestrebungen der Sozialdemokratie), proibiu todas as organizações socialistas e a sua imprensa, o que obrigou os militantes a trabalharem na clandestinidade. Na legalidade apenas se manteve a representação parlamentar social-democrata. Todavia, a interdição não impediu a crescente popularidade dos socialistas, que continuaram a eleger os seus candidatos como independentes. Foi neste período que Bismarck decidiu introduzir o seguro de saúde, o seguro de desemprego e o seguro de acidentes, procurando reconciliar os trabalhadores com o Estado e esvaziar os partidos operários. Apesar disso, em 1890, após a resignação do chanceler, o Partido Operário Socialista da Alemanha (SAPD) é legalizado e concorre às eleições com a designação de Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD). A Lei Anti-Socialista acabou por ser revogada e nos anos seguintes o SPD continuou a crescer até se tornar o maior partido do Reichstag em 1912. (N. Ed.)
11 Os «tesniaki» foram uma espécie de bolcheviques búlgaros que, tal como a fracção dirigida por Lénine, romperam a ala reformista do Partido Operário Social-Democrata Búlgaro, constituindo, em 1903, um novo partido que manteve o nome, acrescido entre parênteses das palavras «socialistas estritos» (тесни социалисти – tesni socialisti), donde o acrónimo de «tesniaki» (тесняки). (N. Ed.)
12 Karl Marx e Friedrich Engels, Obras Escolhidas em três tomos, ed. Avante!, Lisboa, 1985, tomo III, p. 103. (N. Ed.)
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defesa da contra-revolução burguesa, carniceiro dos operários e soldados revolucionários, com um Noske13 como «cão de fila».
O revisionismo, cujo núcleo político-ideológico é a substituição da luta de classes pela conciliação de classes e a substituição do internacionalismo proletário pelo nacionalismo burguês, envenena e desagrega o movimento operário revolucionário, se não for expulso definitiva e atempadamente do seu seio.
Esta experiência conduziu os sociais-democratas revolucionários à cisão com a social-democracia oportunista, no final da I Guerra Mundial, e à fundação de partidos comunistas e da Internacional Comunista.
É natural questionar se o colapso do movimento comunista e dos Estados socialistas, 70 anos depois, não se baseia num desenvolvimento idêntico ao do colapso da II Internacional.
A tese da incapacidade funcional e de vida do socialismo pressupõe, não o declarando, que o sistema dominante na URSS ou o modelo de Socialismo de 1917 a 1990, do início ao fim, se manteve, no fundamental, igual.
Na verdade, a União Soviética de 1985 a 1990 tem tão pouco em comum com a de 1917 ou 1945, como o SPD da época de Marx e Engels com o SPD de Wels, Ebert e Scheidemann.
A perspectiva de Gorbatchov e Chevardnádze está tão longe da de Lénine como a perspectiva de Bernstein e Kaustky da de Marx e Engels.
Contudo, reconhecer isto logo em 1985 era muito difícil. Mas quando Chevardnádze e Gorbatchov declararam na ONU que entendiam a política da coexistência pacífica, não como uma forma particular da luta de classes, mas sim como «princípio universal das relações entre estados», e quando anunciaram que queriam «desideologizar as relações internacionais» (discurso de Chevardnádze na 43ª Assembleia da ONU, Setembro de 1988), já quase não era possível deixar de ver a passagem do marxismo-leninismo para o revisionismo conciliador de classes. A aprovação da Guerra do Golfo norte-americana foi só a consequência prática e a comprovação desta passagem.
Desde que o socialismo na União Soviética e ela própria foram liquidados, Gorbatchov e os seus pares deixaram de ter vergonha em mostrar a sua maneira de pensar anticomunista e em se congratularem com o seu papel activo na destruição do Poder soviético. Na sua famosa entrevista à Spiegel, Gorbatchov, sincero, declarou que as suas «simpatias políticas pertencem à social-democracia» e a um «estado social do género do da Alemanha Federal».14
Para completar, seja citada ainda aqui uma declaração de Willy Brandt a um seu amigo íntimo, em que transmitiu as suas impressões sobre uma conversa com Gorbatchov, depois de regressar de uma visita a Moscovo em Maio de 1985 (!): «Já vi muita coisa na minha vida», disse Brandt, «mas ainda não tinha visto um anticomunista na direcção do Krémlin».15 Repare-se na data – Maio de 1985 –, um
13 Gustav Noske (1868-1946). Entrou para o SPD em 1884. Deputado ao Reichstag de 1906 a 1918. Especialista em assuntos militares e coloniais. Teve um papel decisivo na repressão sangrenta da «Revolta dos Marinheiros» em Kiel, durante a Revolução de Novembro de 1918 e nas insurreições de Janeiro de 1919. (N.T.)
14 Spiegel 3/1993, p. 124.
15 L’Humanité de 10.10.1992
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mês depois de Gorbatchov assumir o cargo de secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética!
Não será isto importante e elucidativo também para responder à pergunta «Quais as causas da destruição da RDA?»
Além disso, isto esclarece uma particularidade, de que raras pessoas desconfiaram, mesmo entre os comunistas, nomeadamente o facto de os cabecilhas das potências imperialistas, desde que Gorbatchov assumiu do cargo de secretário-geral, manifestarem uma estima invulgar, deixando transparecer uma preocupação suspeita sempre que a sua posição na direcção do Partido e do Estado parecia ameaçada. Ao mesmo tempo que prometia fingidamente ao seu povo e a nós comunistas de todo o mundo reconduzir de novo a União Soviética ao caminho leninista e arrancar a URSS da estagnação para a vanguarda da civilização, aos políticos imperialistas, Gorbatchov dizia a verdade sobre as suas opiniões e desígnios.
Nessa altura, em meados dos anos 80, admirei-me muito quando Willy Brandt, numa reunião da Internacional Socialista, de que era seu presidente, fez a observação, como se fosse evidente, de que no centro da política mundial já não estava o conflito Leste-Oeste, mas que em seu lugar apareceria o conflito Norte-Sul.
Hoje sei qual a origem da sua espantosa previsão. Com tais líderes como Gorbatchov na direcção do PCUS, os Bush, Thatcher, Kohl e Brandt estavam sempre mais bem informados sobre as intenções e próximos passos de Moscovo do que nós, o povo simples, enganado e atraiçoado, e do que aqueles líderes dos países socialistas que se mantiveram comunistas e procuraram combater as influências e tendências revisionistas que sopravam de Moscovo.
Portanto, quando nos questionamos sobre as causas do desmoronamento do socialismo, e com isso também da RDA, não podemos ignorar o facto de que, a partir de um determinado momento – o mais tardar em 1985 –, o comando do navio do socialismo na União Soviética já não estava nas mãos dos comunistas, mas tinha sido transferido para os anticomunistas.
Isto torna explicável muito do que de ininteligível aconteceu. Mas simultaneamente suscita uma nova questão não menos difícil de responder: como afinal foi possível uma tal transferência? Não posso aqui ocupar-me desta questão. Mas se nos lembrarmos das circunstâncias em que, na altura, foi possível e levada por diante a degeneração da social-democracia revolucionária num partido de trabalhadores burguês e oportunista, então isso pode ajudar-nos a colocar-nos no rasto das causas da degeneração do movimento comunista.
Hoje, como no passado, a ideologia da conciliação de classes é a ideologia de gente que não confia em que o movimento dos trabalhadores e o socialismo possam derrotar o capitalismo com as suas próprias forças, ou seja, consideram o capitalismo como a ordem social superior a longo prazo. A possibilidade da vitória do revisionismo num partido socialista ou mesmo comunista existe pelo menos enquanto o capitalismo for economicamente superior ao socialismo. Por isso, a luta implacável contra o revisionismo é uma condição fundamental para a resistência do socialismo contra um imperialismo superior economicamente. Lá onde esta luta é posta de lado, ou que seja apenas enfraquecida e conduzida inconsequentemente, o revisionismo obtém a possibilidade de conquistar o partido por dentro. Tal conquista significa que o partido comunista fica nas mãos de anticomunistas e é transformado num instrumento de descredibilização do partido e de
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desmantelamento do socialismo. Foi exactamente isto que se passou em alguns partidos comunistas, em primeiro lugar, no PCUS, o partido comunista dirigente.
Durante muito tempo, foi possível ridicularizar e excluir constatações deste género, rotulando-as de «teoria primitiva da conspiração».
Mas desde que Gorbatchov e os seus cúmplices começaram a vangloriar-se publicamente de terem aberto o caminho à restauração da «liberdade» ocidental nos então países socialistas, é altura de os comunistas olharem com lucidez para as consequências deste acontecimento monstruoso e rejeitarem versões históricas que têm a marca dos anticomunistas revisionistas.
Ao invés de pretenderem revelar ao povo toda a verdade, como foi declarado, as «revelações» históricas tiveram sobretudo o propósito de apresentar o passado socialista do país às novas gerações, que não viveram este passado, nas cores mais sombrias e repugnantes, para que ninguém tivesse a ideia de encarar como alternativa a reconstituição do poder soviético – por muito mau que o presente se apresentasse.
A rejeição da falsificação histórica anticomunista da era de Gorbatchov e agora de Éltsine não significa que se deva fazer uma leitura unilateral da história do período de Stáline. Mas, pelo menos para os comunistas, é urgente que se torne claro que o anti-stalinismo dos revisionistas anticomunistas é completamente hipócrita. Alegam condenar Stáline por omissões e crimes. Na verdade, condenam-no a partir da mesma posição e pelos mesmos «crimes» que os imperialistas o condenam, isto é, do ponto de vista do anticomunismo e pelo crime de ter mantido a União Soviética fora da sua área de poder.
Presenciamos hoje algo muito idêntico na RFA em relação à RDA. Esta é caluniada de «Estado injusto», não porque pelo facto de que também havia injustiças entre nós, mas porque tínhamos abolido a injustiça da ordem capitalista. Não nos acusam pelo facto de termos praticado um socialismo imperfeito, mas porque éramos socialistas, ou seja, ousámos desapossar o capital.
Resumindo: independentemente da quantidade de erros e da sua dimensão que a RDA e a direcção do Estado e o Partido cometeram – e certamente não houve poucos e entre eles grandes asneiras – não foram os próprios erros que lhe ditaram a sentença de morte. Todos os países socialistas europeus estavam unidos com a União Soviética para o que desse e viesse; com a sua derrocada, a queda de todos eles era inevitável.
Os próprios erros têm, no entanto, de ser rigorosamente examinados e as suas causas e consequências analisadas e interpretadas, no interesse da segunda República Democrática Alemã Unificada, que chegará um dia, assim a Humanidade sobreviva às devastações do capitalismo num planeta ainda habitável.
André Müller escreveu, no UZ (28.09.90), o seguinte necrológio do enterro da RDA em 3 de Outubro de 1990: «Uma República Democrática Alemã regressará. (…) Olhai em volta. Levantai a cabeça de novo! Vede como o capital se comporta, livre de qualquer consideração, vede como é a sua enaltecida democracia. (…) Não, a ideia da RDA não se deixará enterrar e se não sei como tudo continuará, (…) sei, porém, que neste 3 de Outubro de 1990 não há nenhuma razão para não nos reerguermos.» Isto ainda é mais válido em Outubro de 1993.
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