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quarta-feira, 2 de julho de 2014

Sociólogo falecido em 2009 foi um dos grandes cientistas sociais do século XX

Alejandro Nadal
A crise financeira e económica que estalou em 2007-08 não se pode entender sem uma análise histórica do capitalismo ao longo do século XX. Essa referência é proporcionada por Giovanni Arrighi, economista italiano e professor da Universidade Johns Hopkins, falecido recentemente na cidade de Baltimore. A sua obra O Longo Século XX é um extraordinário edifício intelectual que abarca 500 anos de uma história cujas personagens centrais são os ciclos de acumulação de capital. Trata-se de leitura obrigatória para entender não só a crise actual, mas o ponto de inflexão do capitalismo mundial.
A inovação analítica de Arrighi consiste em examinar comparativamente as características dos sucessivos ciclos de acumulação ao longo de cinco séculos de história económica. No seu percurso, identifica quatro etapas fundamentais. A primeira é o ciclo genovês, que vai do século XV até princípios do século XVII. Segue-se o ciclo holandês, que decorre até finais do século XVIII. Vem depois a etapa britânica, que domina o século XIX, e sucede-lhe o ciclo estadunidense, que se consolida no século XX. Cada etapa é a expressão da tendência geral para a expansão do mercado capitalista.
Na cada ciclo ergue-se um centro hegemónico de acumulação que organiza as relações políticas, económicas, comerciais e financeiras (à escala mundial) em função das suas necessidades. Ao longo deste processo, o capital mostra uma grande capacidade de adaptação e de flexibilidade, deslocando-se continuamente para os espaços mais rentáveis. E, quando os ganhos decaem, seja porque a concorrência intercapitalista se intensifica, ou porque o acesso a certos recursos naturais se torna difícil, ou porque é impossível encontrar mercados para dar saída às mercadorias, o capital procura o refúgio da liquidez.
Em outros termos, quando se reduz a rentabilidade nos sectores reais da economia, o capital adopta preferencialmente a forma de capital financeiro. É a lição de história nesta vista panorâmica da história do capitalismo. No primeiro ciclo, Amsterdão abandona o comércio em meados do século XVIII e converte-se no banqueiro da Europa. Mais tarde, no final do século XIX, Londres converte-se no centro financeiro, abandonando o que Braudel designou como «a fantástica aventura da Revolução Industrial».
O último ciclo de acumulación de capital, dominado pelos Estados Unidos, é a história do “longo século XX” que começa com a Grande Depressão de 1873-1896 e a expansão financeira de finais do século XIX. Nesse lapso de tempo, as estruturas do regime de acumulação organizado em torno do Império britânico foram eliminadas ao mesmo tempo que se assentavam as bases de um novo sistema hegemónico. Evidentemente, este processo de mudança não foi levado a cabo sem convulsões. E, a partir desta perspectiva, as duas guerras mundiais não são mais que uma só (uma nova guerra de 30 anos) que vai de 1914 a 1945. Os contendentes foram os aspirantes a ocupar o centro de um novo sistema hegemónico de concentração de capital.
A expansão material das décadas de 1950 a 1970 corresponde à época dourada do sistema hegemónico estadunidense. Nessas décadas, a taxa de crescimento das economias capitalistas é superior a tudo o que foi experimentado no resto do século XX. O capitalismo made in USA impõe-se como padrão de organização do “sistema-mundo-capitalista”. Mas os antigos pretendentes a ser centros de um sistema hegemónico, o Japão e a Alemanha, ressurgem como competidores económicos e acabam por socavar as bases da hegemonia estadunidense. O período que arranca em 1970 está marcado pela expansão do sector financeiro. E, a partir desse momento, a “financiarização” da economia capitalista é a pauta central, enquanto são destruídas as bases que tinham favorecido a acumulação no período dourado. O fortalecimento do sector financeiro conduz à liberalização financeira à escala mundial e ao assentar das bases da actual crise.
Duas lições importantes se desprendem do trabalho de Arrighi. Primeira: o Estado não é o inimigo do capitalismo (ao invés, este só triunfa quando as redes de poder se subordinam aos ditames das redes da acumulação capitalista). Segunda: o mercado e o capitalismo não são equivalentes. A circulação monetária, que é a essência do capital, é inimiga mortal do mercado (utiliza-o e destrói-o). Aqui nota-se o forte contraste entre o trabalhador intelectual e a mediocridade de uma parte muito importante do establishment académico.
Em Arrighi observamos uma história do capitalismo mais definida por períodos de crise e destruição, que pelos plácidos interlúdios de construção de novas bases de expansão. O longo século XX é um excelente exemplo, com as suas guerras devastadoras e a sucessão interminável de crise financeiras. O epílogo é uma questão em aberto: poderá a China ser o novo centro hegemónico de acumulação capitalista?
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in Controvérsiablog

1 comentário:

Mar Arável disse...

Tudo se move

até o vento

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