Sair da atual solução "é a última coisa que o PCP pode fazer"
O
pior que o PCP podia agora fazer era recuar no apoio ao PS. "O PCP
seria responsabilizado pela rutura de uma solução que torna o país um
pouco mais feliz", argumenta renovador Carlos Brito
A
partir de Alcoutim, onde vive a sua reforma, o comunista renovador
Carlos Brito - foi suspenso do PCP em 2002 por um ano e depois manteve
ele próprio essa situação - explica os resultados dos seus antigos
camaradas mais por fatores locais e avisa que o pior que o PCP podia
agora fazer era recuar no apoio ao PS. "O PCP seria responsabilizado
pela rutura de uma solução que torna o país um pouco mais feliz",
argumenta.
Como olha para estes resultados, para as perdas significativas que o PCP teve nestas eleições?
Creio
que falando-se de perdas e derrotas, há que sublinhar que a grande
derrota nestas eleições é a do PSD, e que pode modificar todo o quadro
político português, derrota tão grande que põe em questão a própria
liderança do partido, se não no imediato, pelo menos no próximo
congresso. Não fugindo à sua pergunta, creio que as derrotas do PCP se
devem em larga medida - não estou a dizer em exclusivo - a fatores
locais. E saliento entre esses fatores as listas de independentes de
cidadãos eleitores, que ditam a derrota em Peniche e em vários concelhos
do Alentejo. Sendo que estas candidaturas independentes em muitos casos
são animadas e promovidas por dissidentes do PCP ou por
ex-simpatizantes do PCP com os quais o partido, por quaisquer razões do
sectarismo que continua a haver nas suas fileiras, não foi capaz de
dialogar suficientemente.
Segundo
aspeto: creio que particularmente nas grandes cidades, nos grandes
centros urbanos, há erros de gestão por parte do PCP nas condições dos
anos da austeridade. Naturalmente foram anos muito duros na gestão
autárquica e creio que, nalguns concelhos, não foram bem definidas as
prioridades e as pessoas sentiram-se um bocado tocadas em questões
importantes, designadamente nos transportes. Foram transferidas para aí
algumas das dificuldades orçamentais que as autarquias estavam a
experimentar.
Isto não são derrotas
definitivas: ao longo destes anos têm havido autarquias de grandes
cidades que o PCP perde e mais adiante vem recuperar. O caso de Évora é
exemplar, no coração do Alentejo. Isso também vai acontecer. No caso de
Almada as diferenças são mínimas: tanto o PCP, a CDU, como o PS elegem
quatro vereadores. Vai ser complicado de gerir. Não é uma humilhação.
Pelo contrário, o PCP tem uma grande vitória na cidade de Setúbal, que é
uma das grandes capitais de distrito do nosso país, e tem uma grande,
grande vitória. Há estes fatores que temos de considerar.
A culpa não é do apoio ao PS...
Quanto
a mim, não é a abertura que o PCP fez depois das legislativas de 2015 e
que proporcionou a existência do atual governo com as características
que tem, a chamada geringonça, não é essa a causa das derrotas do PCP. O
que considero é que a abertura foi insuficiente. Ao fazê-la, o PCP
tinha que abrir muito mais para a sociedade.
E não poderá ter implicações na relação do PCP com o PS?
Já
lá iremos. O que acho é que o PCP devia ter feito muito mais para
dialogar com a sociedade, inclusive com os numerosos comunistas que
deixaram o partido ou que o partido deixou neste percurso. Em muitos
casos, são pessoas altamente influentes e se o PCP mantivesse o diálogo
com eles, não só teria impedido e inviabilizado algumas listas de
cidadãos que andam por aí a afetar o eleitorado do PCP, como teria
adquirido o apoio de pessoas que têm influência. O pior que o PCP
poderia agora fazer era arrepender-se da abertura e dos acordos que fez
nos finais de 2015, que deram sustentação ao atual Governo. Era o pior
que podia fazer. É a última coisa que o PCP pode fazer. O PCP tem que se
colocar dentro desta solução em que participa com as forças todas, sem
vergonha de lá estar, afirmando a sua identidade, tomando posições
reivindicativas já no Orçamento do Estado, naturalmente fazendo-o com
ponderação e muito cuidado, mas também com muita audácia. O PCP não deve
recuar. A recuar, o PCP seria responsabilizado pela rutura de uma
solução que torna o país um pouco mais feliz, um pouco mais esperançoso.
in DN
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