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quarta-feira, 24 de agosto de 2011

BUDA

Buda
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre


Esta página ou secção não cita nenhuma fonte ou referência, o que compromete sua credibilidade (desde Dezembro de 2008).
Nota: Para o líder espiritual, fundador do budismo, veja Siddhartha Gautama.
Buda (sânscrito-devanagari: बुद्ध, transliterado Buddha, que significa Desperto, Iluminado, do radical Budh-, "despertar") é um título dado na filosofia budista àqueles que despertaram plenamente para a verdadeira natureza dos fenômenos e se puseram a divulgar tal redescoberta aos demais seres. "A verdadeira natureza dos fenômenos", aqui, quer dizer o entendimento de que todos os fenômenos são impermanentes, insatisfatórios e impessoais. Tornando-se consciente dessas características da realidade, seria possível viver de maneira plena, livre dos condicionamentos mentais que causam a insatisfação, o descontentamento, o sofrimento.

Do ponto de vista da doutrina budista clássica, a palavra "Buda" denota não apenas um mestre religioso que viveu em uma época em particular, mas toda uma categoria de seres iluminados que alcançaram tal realização espiritual. Pode-se fazer uma analogia com a designação "Presidente da República" que refere-se não apenas a um homem, mas a todos aqueles que sucessivamente ocuparam o cargo. As escrituras budistas tradicionais mencionam pelo menos 24 Budas que surgiram no passado, em épocas diferentes.

O budismo reconhece três tipos de Buda, dentre os quais o termo Buda é normalmente reservado para o primeiro tipo, o Samyaksam-buddha (Pali: Samma-Sambuddha). A realização do Nirvana é exatamente a mesma, mas um Samyaksam-buddha expressa mais qualidades e capacidades que as outras duas.

Atualmente, as referências ao Buda referem-se em geral a Siddhartha Gautama, mestre religioso e fundador do Budismo no século VI antes de Cristo. Ele seria, portanto, o último Buda de uma linhagem de antecessores cuja história perdeu-se no tempo. Conta a história que ele atingiu a iluminação durante uma meditação sob a árvore Bodhi, quando mudou seu nome para Buda, que quer dizer "iluminado"

Existe uma passagem nas escrituras [Anguttara Nikaya (II, 37)] - a qual é freqüentemente interpretada de maneira superficial - na qual o Buda nega ser alguma forma de ser sobrenatural, mas esclarece:

"Brâmane, assim como uma flor de lótus azul, vermelha ou branca nasce nas águas, cresce e mantém-se sobre as águas intocada por elas; eu também, que nasci no mundo e nele cresci, transcendi o mundo e vivo intocado por este. Lembre-se de mim como aquele que é desperto."

Com isso ele rejeitava qualquer possibilidade de ser tomado como um Deus, mas reafirmava a característica transcendente da sua vivência espiritual e do caminho de libertação que oferecia para os demais seres. Nesse sentido, o Buda exerceu um papel importante de democratização da religião que, até então, estava sujeita ao arbítrio da casta dos brâmanes.

Para Sidarta Gautama não há intermediário entre a humanidade e o divino; deuses distantes também estão sujeitos ao carma em seus paraísos impermanentes. O Buda é apenas um exemplo, guia e mestre para os seres sencientes que devem trilhar o caminho por si próprios.

Dentre as religiões mundiais, a maioria das quais proclama a existência de um Deus criador, o budismo é considerado incomum por ser uma religião não-teísta. Para o Buda, a chave para a libertação é a pureza mental e a compreensão correta, e por esse motivo ele rejeitou a noção de que se conquista a salvação implorando para uma deidade distante.

De acordo com o Buda Gautama, a felicidade Desperta do Nirvana que ele atingiu está ao alcance de todos os seres, porém na visão ortodoxa é necessário ter nascido como um ser humano. No Tipitaka - as escrituras budistas mais antigas - fala-se dos numerosos Budas do passado e suas vidas, bem como sobre o próximo Bodhissatva, que é chamado Maitreya.

Budas são freqüentemente representados em estátuas. Algumas formas comuns incluem:

Buda sentado, como na escultura da Dinastia Tang acima

Buda deitado

Buda em pé

Hotei, o "Buda fofo e sorridente", geralmente visto na China, que no senso estrito não é uma estátua do próprio Buda.

A maior parte das representações do Buda contém certas marcas que simbolizam sua iluminação. Essas marcas variam de acordo com a região, mas três se destacam:

Uma protuberância no topo da cabeça (simbolizando uma grande acuidade mental)

Longos lóbulos auriculares (simbolizando uma grande percepção)

Um terceiro olho (simbolizando, também, grande percepção)

 Buda, o Nono Avatar de Vixnu. De acordo com a tradição vixnuísta (os adoradores de Vixnu), o Buda é considerado o nono avatar de Vixnu. A encarnação de Vixnu é mais antiga, nascida em Gaya (Índia) e que data do terceiro milênio após o desaparecimento de Críxena, há mais de 5 mil anos. Segundo as escrituras seguidas pelos vixnuístas (Bhagavata Purana, Vishnu Purana), essa encarnação surgiu para eliminar a matança de animais durante os sacrifícios védicos e não ensinava a doutrina advaita como a do sábio Gautama, pregada por Sidarta, seguidor da linha filosófica de Gautama (daí o nome Sidarta Gautama) e que deu origem ao atual budismo.



segunda-feira, 22 de agosto de 2011

E agora?

Kadhafi perdeu a guerra. Resistiu tanto quanto pôde - e foi muito - e não seria vencido se a NATO não interviesse. Aliás, nem sequer teria evoluido qualquer rebelião se não fosse a intervenção militar da NATO, as armas e os dólares que escorreram para as mãos dos insurrectos (muitos dos quais vieram da Tunísia). Um motim transformou-se numa guerra de ocupação. Tenha Kadhafi todos os defeitos que possa ter, o que lhe deu a riqueza ditou-lhe a derrota: o petróleo. Sem este seria ainda mais um chefe autoritário igual a muitos outros que enxameiam o Médio oriente e o Magrebe e que por lá permanecem com o apoio do Ocidente, isto é, do Império e dos imperialismos, desta União Europeia dos novos colonialismos. De há uns anos para cá o regime de Kadhafi abrira as portas ao neo-liberalismo e às corporações mundiais, convertido num aliado e amigo daqueles que agora o depuseram. Deixara há muito de ser o inimigo número um dos EUA (lembremos os ataques aéreos contra a Líbia). Porque razão agora que se submetera o escolheram como alvo? Porque depois dos sustos que as revoluções populares na Tunísia e no Egipto provocaram, o norte de Àfrica (do Egipto a Marrocos) cai sob o controlo do Império. No Médio oriente falta a Síria, cuji destino já está traçado. A seguir, virá o Irão. E a opinião pública mundial fica subitamente esquecida (se alguma vez soube) das enormes transformações progressistas realizadas por esses regimes nacionalistas que agora caem. Quando se convertem em alvos da cobiça pelo petróleo (quer o possuam, quer sejam rotas de passagem dele), entram na listas dos inimigos a abater, sob qualquer pretexto, sob qualquer aldrabice que se invente.

Advertência

Os textos que decido colocar no meu blogue não constituem a única verdade nem reflectem a minha verdade toda. Não aprecio verdades únicas. O que estimo, cultivo e partilho é a pedagogia da lucidez, a alternativa, a perspectiva plural e, às vezes, a contra-informação - contra a informação manipulada e controlada. Durante décadas, geração após geração, temos sido manipulados, numa palavra: enganados.
Além do mais este blogue não pretende ser senão a espuma...das palavras.

50 anos de construção do Muro

Pelo Socialismo


Questões político-ideológicas com atualidade

http://www.pelosocialismo.net

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Publicado em: http://elpravda.blogspot.com/2011/08/50-anos-de-la-construccion-del-muro-de.html

Tradução do castelhano de TAM

Colocado em linha em: 2011/08/22

50 anos da construção do

Muro de Defesa Antifascista

Pravda (Estado espanhol) – Sábado, 13 de agosto de 2011

Em 13 de agosto de 1961, há já meio século, em consequência das medidas

aventureiras e das provocações da República Federal da Alemanha e dos seus aliados,

iniciou-se a construção do Muro de Contenção Antifascista, mais conhecido no

Estado espanhol como “Muro de Berlim”, depois de semanas de conversações na

República Democrática Alemã (RDA) e no campo socialista.

Correram rios de tinta sobre a dita separação. Frequentemente, alguns intelectuais e

os grandes meios de comunicação, fazendo alarde do seu servilismo em relação às

classes dominantes, criticaram ferozmente a construção do Muro, ignorando

completamente – além das inúmeras falsificações socioeconómicas – o contexto, isto

é, os movimentos realizados pela RFA nos meses anteriores e a agudização da

chamada guerra-fria.

O mínimo que podemos fazer é assinalar também a sua enorme hipocrisia, depois de

lhes ter caído a máscara ao fim de tantos anos (e, depois, para que as novas gerações

fiquem bem ensinadas, como nestes dias), enquanto muitos países que eles apoiam

(ou os seus estados-fantoches) levantavam muros sem que se ouvisse uma voz: os

quase 750 Km do muro israelita, os 1123 Km de muro norteamericano na sua

fronteira com o México, causando milhares de vítimas (calcula-se que mais de 6 000

pessoas), os milhares de quilómetros de muros e minas antipessoais construídos

pela monarquia totalitária de Marrocos no Sahara ocupado, as valas de Ceuta e

Melilla que causaram a morte a aproximadamente 4 000 pessoas, o muro

brasileiro no Rio de Janeiro para isolar as favelas, o muro eslovaco em

Ostravany para isolar a população cigana, etc.

Assim, pois, devemos assinalar os motivos da construção do Muro de Berlim para

uma maior compreensão do que aconteceu naquele famoso dia. Para isso, citaremos

abundantemente o Professor Heinz Heitzer na sua obra “RDA: Compêndio

histórico”, no capítulo “As Medidas de segurança tomadas em 13 de Agosto de 1961”,

assim como o camarada Herich Honecker nas suas “Notas da Prisão” para

terminar este escrito:

2

“O Governo da RFA rompeu as relações diplomáticas com a Jugoslávia, em

1957, e com Cuba, em 1960, porque estes países tinham estabelecido missões

diplomáticas na RDA, e vice-versa. Recusou a proposta da RDA de organizar

uma conferência alemã; recusou também as propostas apresentadas em

1958/59 pela União Soviética, no sentido de conceder a Berlim Ocidental o

estatuto de cidade livre e desmilitarizada e de preparar um tratado de paz com a

Alemanha. Além disso, o Governo da RFA insinuou aos seus aliados na NATO que

também se deveriam opor a estas ofertas. Ao mesmo tempo, políticos dirigentes da

CDU/CSU esforçaram-se febrilmente a equipar o exército federal com armas

nucleares.

[...] Com o propósito de preparar o “Dia X”, dia destinado a derrubar o

poder dos operários e camponeses, os monopólios e o Governo da RFA

intensificaram a guerra económica contra a RDA. No outono de 1960, o Governo da

RFA cancelou os acordos comerciais com a RDA e instigou outros

Estados a boicotar a Feira de Leipzig. Apesar de, em dezembro, o governo da

RFA ter tido de renunciar ao cancelamento, e apesar de a sugestão de boicote não

ter dado resultado, surgiram graves problemas para a economia nacional da RDA,

que estava sujeita a importantes importações procedentes da RFA. Houve que

fazer-se modificações do plano e introduzir alterações na produção, uma vez que

teve de contar com outro embargo comercial. A União Soviética e outros

países membros do CAME forneceram à RDA importantes mercadorias, matériasprimas

e alimentos em quantidades superiores às dos correspondentes convénios.

Desenvolveu-se um movimento orientado para libertar a economia da RDA de

perturbações: operários, técnicos e cientistas da RDA fabricaram, em prazos muito

curtos, produtos que dantes se importavam da RFA.”

A chantagem económica foi acompanhada pela calúnia anticomunista

veiculada por numerosos meios de comunicação na RFA e Berlim Ocidental. A

infâmia era parecida em muitos pormenores com as atrocidades fascistas divulgadas

contra a Checoslováquia e a Polónia, pouco antes de terem sido vítimas do assalto nos

anos 1938 e 1939. Esta falácia tinha o propósito de criar confusão e nervosismo nos

cidadãos da RDA, e fazer crer a nível mundial que na RDA se estaria a aproximar um

“levantamento popular”, que os países ocidentais tinham de apoiar por todos os

meios ao seu alcance.

Tanto assim foi que um jornal simpatizante da CDU escreveu “que o mundo

livre tinha de preparar-se para aplicar todos os meios da guerra-fria,

da guerra de nervos e da guerra com armas... Isto não inclui só as forças

armadas tradicionais e o seu armamento, mas também socavar, instigar a

resistência interna, as atividades clandestinas, a desagregação da ordem, a

sabotagem, a perturbação dos transportes e da economia, a desobediência, a

rebelião, a revolução”.

Com o objetivo publicamente proclamado de sangrar a RDA, intensificaram o

suborno de cidadãos da RDA, sobretudo de especialistas e jovens; estenderam a

rede das organizações criminosas, promovidas pelo Estado alemão ocidental,

dedicadas a este tráfico de pessoas. Berlim Ocidental com a sua fronteira aberta para

a RDA desempenhou o papel de canal de fuga.

3

Tudo isto ligado à preparação direta de uma agressão militar contra a

RDA. Nas manobras do Estado-maior e das tropas do exército federal, realizadas em

1960/61, ensaiaram-se algumas variantes da “guerra relâmpago” e da “guerra

limitada” contra a RDA e outros Estados socialistas. Alguns políticos e comentadores

deixaram entrever que, para o exército federal, poderia dar-se uma situação em que

tivesse de liquidar o “conflito interno” através de uma “ação policial local”. Esse

conflito poderia surgir como consequência de choques nas fronteiras de Berlim

Ocidental. […]

Em julho de 1961, o “Conselho de investigação de problemas da reunificação da

Alemanha” apresentou, em Bona, um plano detalhado para o “Dia X”. Este plano

considerava incorporar a RDA na RFA, repartir entre os monopólios da

RFA as empresas de propriedade do povo e os bancos, dissolver as

cooperativas agrícolas e entregar as terras e os bens de raiz sobretudo

entre os grandes proprietários agrícolas e os latifundiários. Na segunda

metade de julho, Franz Jossef Strauss – então Ministro da Defesa da RFA e chefe do

exército federal, e um dos políticos imperialistas mais belicosos de sempre – fez uma

visita aos EUA para se assegurar do seu apoio. No princípio de agosto foi

proclamado o estado de alerta para as unidades da NATO estacionadas na

Europa ocidental.

[…] No verão de 1961, as tensões surgidas tinham chegado a tal ponto que se tornou

imprescindível tomar medidas severas, orientadas para preservar a paz e proteger o

socialismo.

De 3 a 5 de agosto de 1961, os primeiros secretários dos partidos comunistas e

operários dos Estados membros do Pacto de Varsóvia discutiram em Moscovo as

medidas previstas pela RDA e a URSS. Esta reunião propôs à Assembleia do Povo, ao

Governo e a todos os trabalhadores da RDA “introduzir na fronteira com Berlim

Ocidental um sistema que fechasse, de maneira infalível, o caminho às atividades

subversivas contra os países do campo socialista, e garantisse uma vigilância

segura e um controlo eficiente em volta de todo o território de Berlim Ocidental,

incluindo a sua fronteira com Berlim democrático”.

Em 11 de agosto de 1961, a Assembleia do Povo, sob proposta do CC do PSUA

[Partido Socialista Unificado da Alemanha - NT], encarregou o Conselho de Ministros

de dar todos os passos necessários para esse fim. Na noite de 12 para 13 de agosto de

1961, tomaram-se as medidas acordadas, com rapidez, precisão e com surpresa

absoluta dos serviços secretos do imperialismo.

As medidas de segurança de 13 de agosto de 1961 foram uma ação política conjunta

dos Estados membros do Pacto de Varsóvia, para travar os círculos agressivos do

imperialismo da RFA e dos restantes Estados membros da NATO e para proteger a

paz na Europa. Estas medidas limitaram as atividades subversivas diretas do

imperialismo e da RFA e infligiram-lhe uma rotunda derrota. Fracassou por completo

a sua estratégia de anexar a RDA com um ataque frontal. Os próprios políticos e

historiadores burgueses tiveram de admitir que o 13 de agosto de 1961 deu início à

decadência da era Adenauer, na RFA. Um jornal burguês escreveu naquela

data que este dia demonstrou que tinha fracassado a política governamental da RFA “de pretender a reunificação através do armamento e da força”.

O camarada Erich Honecker, chefe de Estado da RDA entre os anos de 1976 e

1989, também escreveu umas breves reflexões sobre aqueles anos na sua obra “Notas

da prisão”, enquanto estava preso em Berlim em 1992-1993:

“Os sistemas de armamento do Pacto de Varsóvia e da NATO estavam amplamente

instalados no centro da Europa. Esta acumulação maciça de forças militares

requeria uma atenção permanente. Uma coincidência de acasos infelizes

teria podido, de facto, fazer estalar um conflito cuja dimensão poderia

ter sido a da Terceira Guerra Mundial. Para nos convencermos, basta

consultar os documentos oficiais da NATO e do Pacto de Varsóvia referentes a esta

questão.

No decurso dos últimos 35 anos, o perigo de um apocalipse nuclear pairou

demasiadas vezes sobre a Europa. Um tal conflito teria posto seriamente em causa

as possibilidades de sobrevivência da humanidade sobre a Terra.

Uma política ativa de razão e de boa vontade da parte da RDA

contribuiu para conjurar este perigo. Os cidadãos da RDA e, igualmente, os

da RFA, devem os dias que viveram em paz à ação deste primeiro país no seio da

aliança de Varsóvia.”

sábado, 20 de agosto de 2011

José Barata-Moura (Filósofo)

José Barata-Moura
Origem: Wikipédia


José Adriano Rodrigues Barata-Moura (Lisboa, 26 de Junho de 1948) é um filósofo e cantor português.

Fez os estudos pré-universitários em França e obteve na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, a licenciatura (1970) e o doutoramento (1980) em Filosofia. Reitor da Universidade de Lisboa, entre 1998 e 2006, é professor catedrático da respectiva Faculdade de Letras, desde 1986, onde foi também presidente do Conselho Directivo, de 1981 a 1982. Membro de várias sociedades científicas, foi presidente da Internationale Gesellschaft für dialektische Philosophie, de 1996 a 2000. É membro do Conselho de Administração do Portal Universia Portugal, desde 2002. Foi eleito membro correspondente da Academia das Ciências de Lisboa (Classe de Letras), em 2008.

Barata-Moura deu-se a conhecer também como cantor de intervenção. Em 1970 cantou pela primeira vez na televisão, no programa Zip-Zip, apresentando a música Ballade du Bidonville, cuja tradução foi interdita pela censura. Popularizou-se como cantor infantil, sendo autor de músicas célebres como Joana come a papa, Olha a bola Manel e o Fungágá da Bicharada.

É militante do Partido Comunista Português, tendo sido mandatário nacional da candidatura presidencial de Francisco Lopes, em 2011.



Livros Publicados

Kant e o conceito de Filosofia, Lisboa, Sampedro, 1972.

Da redução das causas em Aristóteles, Lisboa, FUL, 1973.

Estética da canção política, Lisboa, Horizonte, 1977.

Totalidade e contradição, Lisboa, Horizonte, 1977.

Ideologia e Prática, Lisboa, Caminho, 1978.

EPISTEME. Perspectivas gregas sobre o saber. Heraclito-Platão-Aristóteles, Lisboa, ed. de autor (distrib. Cosmos), 1979.

Para uma crítica da "Filosofia dos valores", Lisboa, Horizonte, 1982.

Da representação à "práxis", Lisboa, Caminho, 1986.

Ontologias da "práxis", e idealismos, Lisboa, Caminho, 1986.

A "realização da razão" - um programa hegeliano?, Lisboa, Caminho, 1990.

Marx e a crítica da "Escola Histórica do Direito", Lisboa, Caminho, 1994.

Prática, Lisboa, Colibri, 1994.

Materialismo e subjectividade, Lisboa, Avante, 1998.

Estudos de Filosofia Portuguesa, Lisboa, Caminho, 1999.

O Outro Kant, Lisboa, Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2007.

Estudos sobre a Ontologia de Hegel. Ser, Verdade, Contradição, Edições «Avante!», Lisboa, 2010.

Sobre Lénine e a Filosofia. A Reivindicação de uma Ontologia Materialista Dialéctica com Projecto, Edições «Avante!», Lisboa, 2010.

Discografia(incompleta)

Vamos Brincar à Caridadezinha, LP, 1977

Balada do Bidonville, Single

Olha a Bola Manel, EP

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Onde está a verdade e a mentira?


http://www.pelosocialismo.net

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Publicado em: http://www.workers.org/2011/world/tiananmen_0707/

Tradução do inglês de TAM

Colocado em linha em: 2011/08/15

A WikiLeaks confirma


O “massacre” da Praça Tiananmen foi uma mistificação

Deirdre Griswold1

Publicado em 29 de junho de 2011, às 14.53h

Quantas vezes nos disseram que os EUA são uma sociedade “aberta” e que os média

são “livres”?

Normalmente estas exigências são feitas quando se critica outros países por não

serem “abertos”, especialmente os países que não seguem a agenda de Washington.

Quando se vive nos Estados Unidos e se depende dos supostamente “livres” e

“abertos” meios de comunicação comerciais para obter informação, acreditar-se-á

sem dúvida que o governo chinês massacrou “centenas, talvez milhares” de

estudantes na Praça Tiananmen, no dia 4 de Julho de 1989. A frase foi repetida

dezenas ou centenas de vezes pelos média deste país.

Mas isso é um logro. Mais, o governo dos EUA sabe que isso é um logro. E todos os

mais importantes meios de comunicação sabem que é um logro. Mas recusam-se a

corrigir o registo, por causa da hostilidade primária da classe dirigente imperialista

dos EUA em relação à China.

Em que é que baseamos esta afirmação? Em várias fontes.

A mais recente é a publicação pela WikiLeaks de telegramas enviados da Embaixada

dos EUA em Pequim para o Departamento de Estado, em junho de 1989, alguns dias

depois dos acontecimentos na China.

A segunda é uma declaração do chefe de redacção do New York Times em Pequim,

declaração que não voltou a ser referida por esse jornal.

E a terceira é o relato do que aconteceu feito pelo próprio governo chinês, que

corrobora as duas primeiras.

Um único jornal ocidental importante publicou os telegramas da WikiLeaks. Foi o

Telegraph of London, em 4 de junho deste ano, exactamente 22 anos depois de o

2

governo chinês ter chamado as tropas em Pequim.

Dois telegramas datados de 7 de julho de 1989 – mais de um mês depois do conflito –

relatavam o seguinte:

“Um diplomata chileno transmite um testemunho presencial dos soldados a entrar

na Praça Tiananmen: Ele observou a entrada dos militares na praça e não viu

nenhumas armas de destruição em massa serem utilizadas contra a multidão,

apesar de se ter ouvido alguns tiros. Ele disse que a maioria das tropas que

entraram na praça estava de facto armada apenas com material antimotim –

bastões e tacos de madeira; estavam apoiados por soldados armados.”

Um telegrama posterior dizia: “Um diplomata chileno transmite um testemunho

presencial dos soldados a entrar na Praça Tiananmen: Apesar de se ouvir tiros, ele

diz que para além de algumas agressões a estudantes, não houve fogo

indiscriminado sobre a multidão de estudantes no monumento.”

Deve-se recordar que o Chile, naquela altura, era governado pelo General Augusto

Pinochet, que tinha chegado ao poder através de um violento golpe antissocialista de

direita, apoiado pelos EUA, no qual foram mortas milhares de pessoas de esquerda,

incluindo o Presidente Salvador Allende. O referido “diplomata chileno” não seria

certamente amigo da China.

Nem um único jornal, televisão ou rádio nos EUA abordou ou comentou estes

telegramas divulgados pela WikiLeaks, nem o artigo do Telegraph sobre eles. Foi

como se caíssem num poço sem fundo.

Isso aconteceu porque os média aqui não acreditam que o documento é credível?

Dificilmente.

Eles sabiam a verdade em 1989

O New York Times sabe que é credível. O seu próprio redactor-chefe em Pequim na

altura, Nicholas Kristof, confirmou-o num extenso artigo intitulado “China hoje:

como ganharam os homens da linha dura”, publicado no magazine do Sunday

Times, em 12 de novembro de 1989, cinco meses depois do alegado massacre na

praça

Mesmo no fim deste longo artigo, que pretendia dar uma visão do debate na direção

do Partido Comunista Chinês, Kristof afirmava perentoriamente: “Baseado nas

minhas observações nas ruas, nem a versão oficial nem muitas das versões

estrangeiras são absolutamente corretas. Não há massacre na Praça Tiananmen,

por exemplo, apesar de haver muitas mortes noutros lugares.”

Apesar do artigo de Kristof ser duramente crítico em relação à China, a sua afirmação

de que “não houve massacre na Praça Tiananmen” desencadeou imediatamente um

coro de protestos dos inimigos da China nos EUA, como se viu pela coluna das cartas

do leitor do Times.

3

Houve conflitos em Pequim? Absolutamente. Mas não houve massacre de estudantes

desarmados na praça. Isso foi uma invenção do ocidente, com o objectivo de

demonizar o governo chinês e ganhar a simpatia pública para uma contrarrevolução.

A viragem para uma economia de mercado no tempo de Deng Xiaoping tinha

alienado muitos trabalhadores. Havia também um elemento contrarrevolucionário a

tentar tirar partido do descontentamento popular para restaurar completamente o

capitalismo.

Os imperialistas tinham esperança em que os conflitos em Pequim derrubassem o

Partido Comunista e destruíssem a economia planificada – à semelhança do que

aconteceria dois anos mais tarde na União Soviética. Queriam “abrir” a China não à

realidade, mas à pilhagem da propriedade do povo pelos bancos e corporações

imperialistas.

Depois de muitas hesitações no topo, o exército foi chamado e o levantamento

esmagado. A China não colapsou como a União Soviética; a sua economia não

implodiu nem o nível de vida baixou. Muito pelo contrário. Os salários e as condições

sociais têm estado a melhorar, ao mesmo tempo que os trabalhadores noutros países

estão a ser puxados para trás por uma severa crise económica capitalista.

Apesar das profundas concessões ao capitalismo, estrangeiras e nacionais, a China

continua a ter uma economia planificada baseada numa forte infraestrutura estatal.

1 Deirdre Griswold foi candidata a presidente dos Estados Unidos, nas eleições de 1980, em representação do

Workers World Party [Partido Mundial dos Trabalhadores], partido de ideologia comunista nos EUA [NT]

terça-feira, 16 de agosto de 2011

«Karl Marx, o visionário. "O capitalismo pode destruir-se", diz Roubini»

No início do século, Nouriel Roubini recebeu a alcunha de Dr. Doom, devido às previsões catastróficas que fazia para a economia mundial. A crise no imobiliário confirmou-se, tal como Roubini tinha alertado e o economista turco de origem judaica e naturalizado norte-americano passou a ser considerado como uma das vozes a ser ouvida.


Agora, em entrevista ao "Wall Street Journal", Roubini afirma que "os mercados não estão a fazer nada, não estão a ajudar a crise. Os riscos deixaram-nos nervosos e as empresas acabam por não contratar pessoas, porque dizem que não há tanta procura, mas chegámos a um paradoxo. Se não se contratam trabalhadores, não há verbas dos salários, não há confiança dos consumidores e não há consumo, logo não há a tal procura". O economista explica ainda que "nos últimos dois ou três anos estivemos ainda pior, porque tivemos uma redistribuição de rendimentos do trabalho para o capital, dos salários para os lucros e os desequilíbrios entre rendimentos e riqueza aumentaram. Karl Marx estava certo, em algum ponto, o capitalismo pode destruir-se a si próprio, porque não se pode continuar a transferir rendimentos dos salários para os lucros sem ter menor capacidade de trabalho e uma menor procura".

Ainda assim, Roubini não considera que a economia dos Estados Unidos esteja perto desse ponto, apesar de todo o risco que enfrenta. Mas não deixa de referir que as possibilidades de EUA, Europa e Japão entrarem numa segunda recessão conjunta são de 50%, o que pode colocar parte do sistema financeiro em insolvência.

Ontem, o multimilionário norte-americano Warren Buffett escreveu um artigo de opinião no "New York Times", em que enviou um recado a Barack Obama. Buffett entende que a partilha de sacrifícios pedidos à população é injusta para as classes mais pobres e não se dá ao trabalho de medir palavras: "Parem de mimar os super-ricos", defende. Para revelar que a austeridade o tem mimado: " Verifiquei junto dos meus amigos milionários para saber que sacrifícios lhes foram pedidos, mas também eles ficaram intactos. No último ano, a minha conta fiscal foi de 6 938 744 dólares, apenas 17,4% dos meus rendimentos tributáveis, o que é uma percentagem menor do que a que foi paga pelas outras 20 pessoas do meu escritório. As suas taxas de impostos estavam entre 33% e 41%", explica.

hoje, Jornal I

Entrevista con Immanuel Wallerstein, académico e investigador en la Universidad de Yale

16-08-2011




"Se vienen años de incertidumbre y caos mundial"


Sally Burch

Alainet

El destacado académico de las ciencias sociales, Immanuel Wallerstein, es uno de los más connotados exponentes del pensamiento crítico contemporáneo, y durante su reciente visita a Ecuador ALAI conversó con él sobre la actual crisis de deuda que golpea duramente a Estados Unidos y sus consecuencias para los países emergentes y América Latina.

El investigador principal de la Universidad de Yale considera que el dólar ha entrado en un proceso grave e irreversible de pérdida de valor como moneda de reserva mundial, subrayando que era “el último poder serio que mantenía Estados Unidos”.

Wallerstein piensa que las diferentes medidas de emergencia que se están implementando en su país simplemente están retrasando la bancarrota mundial. “Los daños son hechos concretos, la situación de los Estados Unidos es grave y no es recuperable”, recalca.

Estima que el desenlace ocurrirá dentro de dos o tres años, con resultados caóticos para el sistema mundial porque “no habrá una moneda de reserva internacional” y tampoco existen condiciones para que otra moneda pueda ocupar ese rol. Entonces con el fin del dólar como reserva mundial “van a existir cinco, seis o siete monedas importantes, una situación caótica porque habrá fluctuaciones enormes continuas”.

“Ni los gobiernos ni las firmas transnacionales, ni los mega-bancos, ni los individuos sabrán qué hacer. Una incertidumbre enorme paralizará el mundo, especialmente a los inversionistas”, advierte el académico estadounidense.

Mientras esto ocurre en un nivel macro de la economía estadounidense, paralelamente también en un plano más local se vienen produciendo serios problemas económicos. “Comunidades urbanas pequeñas están entrando a la bancarrota y por ejemplo no pueden pagar las jubilaciones”, indica el científico social.

El investigador considera que en su país la clase media es la más afectada porque de un día a otro las familias pierden posición y los trabajadores que perdieron su empleo no pueden hallar otro puesto, especialmente las personas entre 40 y 60 años, llegando incluso a perder sus casas. Es una situación que actualmente no tiene solución y no se observa posibilidad de encontrar una válvula de escape.

Además, Wallerstein señala que “la situación en Estados Unidos va a empeorar porque se va a eliminar la posibilidad que el gobierno sostenga gastos necesarios en este momento, creándose una situación peor que la actual. La fantasía del Tea Party está llevando a Estados Unidos y por consecuencia a todo el mundo en dirección de un crac”.

Teniendo en cuenta estas consideraciones el pronóstico del teórico estadounidense para los próximos años es bastante pesimista. “Yo veo guerras civiles en múltiples países del norte, sobre todo en Estados Unidos donde la situación es mucho peor que en Europa occidental, aunque allá también hay posibilidades de guerra porque hay un límite hasta el cual la gente ordinaria acepta la degradación de sus posibilidades”.

China y países emergentes

Ante la crisis de Estados Unidos y Europa los países emergentes por el momento parecen vivir bien, sin embargo, desde el punto de vista de Wallerstein, esconden una falsa realidad porque todos estamos en una misma canasta.

Teniendo en cuenta que China es el principal tenedor de bonos estadounidenses, ese país afronta una disyuntiva muy delicada. Wallerstein considera que si por un lado “deja de comprar bonos de Estados Unidos va a perder la oportunidad de colocar productos chinos en ese mercado, un problema muy serio para la China. Al mismo tiempo, cuando el dólar pierda su posición relativa a las otras monedas sus bonos no van a valer mucho”.

Entonces, China se está arriesgando a perder enormemente tanto si se retira o si continúa en el mercado de bonos estadounidenses. Frente a esta situación considera que “lo más probable es que la China se vaya retirando poco a poco”. Justamente el problema está en determinar cuándo es el momento perfecto para detener las inversiones, lo cual es imposible de señalar porque si lo supiéramos seríamos todos ricos, agrega el investigador.

Además de este serio problema que afronta China, explica que el país asiático atraviesa por una situación muy frágil desde el punto de vista de su economía interna, “porque los bancos chinos están en la misma situación que los bancos estadounidenses hace dos o tres años”. Asimismo, la inflación limita posibilidades a China y a otros países emergentes como, por ejemplo, a Brasil.

En este contexto considera que los países emergentes, y en el caso de Suramérica la Unasur, deberán hallar los mecanismos de un “proteccionismo a corto plazo a fin de minimizar los daños que serán para todo el mundo. No habrá países que escaparán de los daños pero serán más grandes para unos que para otros”.

Preguntado sobre la construcción de una nueva arquitectura financiera regional, con iniciativas como el Banco del Sur o de una moneda regional como el Sucre, el académico valoró positivamente esas posibilidades para los pueblos de América del Sur. “La creación eventual de una moneda verdadera común será un elemento de fuerza económica en esta situación”. En ese sentido citó como ejemplo que a pesar de las dificultades en Europa con el euro, la decisión de salvaguardar la moneda común “va a permitirles una posición política importante”.

Finalmente, como un mensaje para América Latina invitó a continuar con la reflexión sobre la necesidad de garantizar alimentos suficientes para su pueblo, agua para su pueblo, energía para su pueblo, como cuestiones mínimas y esenciales que deben hacer todos los gobiernos del Sur.

Fuente: http://alainet.org/active/48721



domingo, 14 de agosto de 2011

Artigo de Noam Chomsky (excerto)

Constitui um tema generalizado que os Estados Unidos - que há apenas alguns anos era visto como um colosso que percorreria o mundo com um poder sem paralelo e um atractivo sem igual (…) - estão em decadência, enfrentando actualmente a perspectiva de uma deterioração definitiva, assinala Giacomo Chiozza, no número actual de Political Science Quarterly.


A crença neste tema está, efectivamente, muito difundida. Em com certa razão, se bem que seja necessário fazer algumas precisões. Para começar, a decadência tem sido constante desde o ponto culminante do poderio dos EUA logo após a Segunda Guerra Mundial, e o notável triunfalismo dos anos 90, depois da Guerra do Golfo, foi basicamente um auto engano.


Wall Street recebe regularmente generosos presentes. O Comité de Atribuições da Câmara de Representantes cortou o orçamento da Comissão de Títulos e Bolsa, a principal barreira contra a fraude financeira. E é pouco provável que sobreviva intacta a Agência de Protecção ao Consumidor.


O Congresso brande outras armas na sua batalha contra as gerações futuras. Apoiada pela oposição republicana à protecção ambiental, a importante companhia de electricidade American Electric Power arquivou o principal esforço do país para captar o dióxido de carbono de uma unidade que actualmente consome carvão, o que significou um forte golpe nas campanhas para reduzir as emissões causadoras do aquecimento global, informou o The New York Times.

Esses golpes auto-aplicados, ainda que sejam cada vez mais potentes, não são uma inovação recente. Datam dos anos 70, quando a política económica nacional sofreu importantes transformações que puseram fim ao que se costuma chamar “época de ouro” do capitalismo de Estado.

Dois importantes elementos desse processo foram a financeirização (o deslocamento das prioridades de investimento da produção industrial para as finanças, os seguros e os bens imobiliários) e a externalização da produção. O triunfo ideológico das doutrinas de livre mercado, muito selectivo como sempre, desferiu mais alguns golpes, que se traduziram em desregulação, regras de administração corporativa que condicionavam as enormes recompensas aos CEO’s com os benefícios de curto prazo e outras decisões políticas similares.

A concentração resultante da riqueza produz maior poder político, acelerando um círculo vicioso que concentrou uma riqueza extraordinária em 1% da população, basicamente CEO’s de grandes corporações, gerentes de fundos de garantia e similares, enquanto a maioria das receitas reais praticamente estancou.

Ao mesmo tempo, o custo das eleições disparou para as nuvens, fazendo com que os dois partidos tivessem que escavar mais fundo os bolsos das corporações. O que restava de democracia política foi solapado ainda mais quando ambos partidos recorreram ao leilão de postos directivos no Congresso, como apontou o economista Thomas Ferguson, no The Financial Times.

Os principais partidos políticos adoptaram uma prática das grandes empresas retalhistas, como Walmart, Best Buy e Target, escreve Ferguson. Caso único nas legislaturas do mundo desenvolvido, os partidos estado-unidenses no Congresso colocam preço em postos-chave no processo legislativo. Os legisladores que conseguem mais fundos para o partido são os que indicam os nomes para esses postos.

O resultado, segundo Ferguson, é que os debates se baseiam fortemente na repetição interminável de um punhado de consignas, aprovadas pelos blocos de investidores e grupos de interesse nacionais, dos quais depende a obtenção de recursos. E o país que se dane.

Antes do crack de 2007, do qual foram responsáveis em grande medida, as instituições financeiras posteriores à época de ouro tinham obtido um surpreendente poder económico, multiplicando por mais de três a sua participação nos lucros corporativos. Depois do crack, numerosos economistas começaram a investigar a sua função em termos puramente económicos. Robert Solow, prémio Nobel de Economia, concluiu que o seu efeito poderia ser negativo. O seu êxito contribui com muito pouco ou nada para a eficiência da economia real, enquanto os seus desastres transferem a riqueza dos contribuintes ricos para o sector financeiro.

Ao triturar os restos da democracia política, as instituições financeiras estão lançando as bases para fazer avançar ainda mais este processo letal…enquanto as suas vítimas parecem dispostas a sofrer em silêncio.

(*) Professor emérito de linguística e filosofia do Instituto Tecnológico de Massachusetts. Seu livro mais recente é 9-11: Tenth Anniversary.

in ODiário.info

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Uma Frente De Luta

Os comentários a outros comentários exprimem não a Opinião Pública mas as opiniões públicas. Felizmente não existe uma única Opinião Pública. A Internet demonstra este facto. É ela um meio extraordinário que permite e estimula a participação civil e cívica, a discussão, a informação, a pluralidade. Neste sentido amplo é uma contra-informação relativamente às televisões (também à imprensa escrita). É, como se tem verificado, um poderoso meio de convocação. À letra: chamam-se e unem-se as vozes. Este século, este início de um novo milénio, demonstra a força e as potencialidades ainda latentes deste meio de contra-poder. Lembremos as revoltas e revoluções desde o Médio Oriente a outras partes do Mundo. Não esqueçamos de incluir a Europa. Os tiranos temem-na e os governos europeus também. Imagine-se só a sua utilidade se existisse no Portugal da ditadura fascista.


Por tudo isto é de prever que os mandantes deste mundo conspirem para travar, limitar e controlar este meio (as redes sociais, incluindo os blogues e outros dispositivos). Se pudessem, silenciavam-no (é tudo uma questão de poder). Contudo, tiram proveito desses dispositivos (a publicidade, as empresas na bolsa). “Eles” debatem-se com as suas contradições. As redes sociais são, em muitos casos, poderosas empresas e um dos negócios mais lucrativos, tanto mais quanto se interligam com os telemóveis e outras novíssimas tecnologias. Uma boa parte da riqueza de alguns países assenta na invenção, produção e exportação dessas tecnologias, num progresso técnico constante cujos limites não prevemos.

O capitalismo é mesmo assim: contraditório. E sempre foi. Karl Marx entendeu muito bem isso já na primeira metade do século XIX. Então explicou que o capitalismo é um modo de produção simultaneamente positivo e negativo. O que para ele era necessário, por consequência, era que as contradições se agudizassem (quanto mais de desenvolvia), sendo para isso indispensável que a consciência social –pública - não mais suportasse –ou acreditasse – na sociedade movida exclusivamente pelo lucro privado.

Por ora, a internet mostra ser um factor formidável (embora limitado e relativo) de fortalecimento dessa consciência. Defender sem cedências este factor –ou meio – é, hoje, uma importante frente da luta democrática mundial.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Estudar a história é muito difícil, fazê-la é ainda mais.

Vemos e ouvimos as notícias: a repetida série de imagens - curtos filmes em vídeo, alguns dos quais já estão no youtub- dos jovens amotinados de Inglaterra e, logo de seguida, a reportagem da sopa dos pobres em Setúbal, distrito sempre flagelado. Entre um acontecimento e outro existe alguma relação? Uma gigantesca vaga de destruição, violência e assaltos; uma fila de pobres resignados à sua má sorte não pensam em nada mais senão no que lhes vai calhar de refeição este dia. No primeiro caso o futuro é uma miragem, no segundo é um nada. Nos primeiros é a revolta na sua expressão mais esvaziada de utopia; no segundo, a estricta sobrevivência por um dia, cada um velando por si. A fogueira das revoltas começa sempre por um rastilho, que não é causa, mas efeito de causas mais antigas e mais fundas. Há revoltas assim que desencadearam revoluções que mudaram o mundo, como a Revolução Francesa na noite de 1789. Há revoltas que obrigaram a mudanças no comportamento das polícias, como sucedeu nos EUA, também num verão ardente, há uns anos atrás. Há revoltas que mudaram os costumes, como a dos estudantes da Sorbonne em 1968. E há revoltas que não conduzem a nada, excepto um reforço dos aparelhos da repressão, à ostracização dos jovens "vagabundos", "vândalos" sem causa (um dia mais tarde talvez venham a ser nomeados "Rebeldes sem causa", à maneira de Hollywood). Os amotinados ingleses, ao que diz a polícia e a imprensa faz eco, são de várias categorias sociais -empregados e desempregados, miúdos e pais de família- e o motivo da revolta foi o roubo sem consequências, isto é, consumidores sem consumo que aproveitaram para consumir.
Vândalos, terroristas, enraivecidos, desordeiros, são classificativos que se aplicam desde há séculos sempre que há revoltas. Quem os aplica? E qual a diferença entre os infensivos pedintes da sopa dos pobres e os "enraivecidos" das cidades inglesas?

Na espuma

Talvez valha a pena sumariar alguns acontecimentos verificados nos tempos mais recentes e conjecturar se existe alguma articulação entre eles:
- As sucessivas manifestações populares e greves gerais na Grécia.
- As demonstrações maciças dos "indignados" na Espanha.
- Os chamados "motins" nas grandes metrópoles inglesas.
- O temor e o tremor provocado pela dívida dos EUA
-A crise financeira que se alastra para a Itália e França
- A crise económica que, dos EUA à Europa, vai agravando-se
- As medidas de austeridade aplicadas como receita uniforme pela UE
- Os índices que demonnstram o fosso cada vez maior entre ricos e pobres, o aumento exponencial da pobreza, dos desempregados, dos empregos precários, dos cortes nos serviços sociais dos Estados.
- O poder absoluto do capital financeiro e os lucros fabulosos dos especuladores e do capital improdutivo.
- As guerras sem fim no Iraque e no Afeganistão, a invasão da Líbia, a intromissão estrangeira no Egipto, a ingerência nos assuntos inernos da Síria, a política de Israel de potência ocupante dos territórios da Palestina com a tolerãncia amiga dos EUA, os mesmos que se mostram firmes defensores da democracia.

Seria interessante, porventura, somar, não subtrair, e ver o que resulta.
Bastaria não continuar a pensar conforme nos ensinam a pensar os grandes meios de comunicação social, porta-vozes de outros poderes. Em vez de olharmos para cada acontecimento separadamente, fragmentando-os, impedindo qualquer raciocínio, ou, na menos má das hipóteses, explicando através do recurso a "efeitos de uma conjuntura", talvez valha a pena recorrer à hipótese de uma crise sistémica. Não se perde nada em tentar. 

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

DOMENICO LOSURDO (FILOSOFIA)

Domenico Losurdo (Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre)


Domenico Losurdo (Sannicandro di Bari, 1941) é um filósofo marxista italiano que leciona na Universidade de Urbino, na Itália. Estudou em Tubinga (Alemanha) e em Urbino. Doutorou-se com uma tese sobre Karl Rosenkranz.

Obras
Autocensura e Compromesso nel Pensiero Politico di Kant. 1984.

La Comunità, la Morte, l'Occidente: Heidegger e l'Ideologia della Gerra. Torino, 1991.

Hegel e la Libertà dei Moderni. Roma, 1992.

Il Revisionismo Storico. Problemi e Miti. 1996.

Hegel e la Germania. 1997.

Antonio Gramsci dal Liberalismo al "Comunismo Critico". 1997.

Hegel, Marx e a Tradição Liberal. Liberdade, Igualdade, Estado. Editora Unesp, 1998.

L’Ipocondria dell’Impolitico. La Critica di Hegel Ieri e Oggi. 2001.

Nietzsche, il Rebelle Aristocratico. Torino, 2002.

Democracia e Bonapartismo. Editora UNESP, 2004. (No sítio da editora.)

Fuga da História? A Revolução Russa e a Revolução Chinesa Vistas de Hoje. Editora Revan, 2004.

Contra-História do Liberalismo. Aparecida, SP: Idéias & Letras, 2006, trad. Giovanni Semerano. Publicado em italiano em 2005 como Controstoria del Liberalismo.
Professor Domenico Losurdo


Com o início da Guerra Fria, e depois com o Relatório Kruschov, Stalin converteu-se num 'monstro', talvez comparável apenas a Hitler. Daria prova de falta de visão quem quisesse identificar nessa mudança o momento da revelação definitiva e última da identidade do líder soviético, deixando de lado com desenvoltura os conflitos e os interesses nas origens da mudança. O contraste radical entre as diversas imagens de Stalin deveria levar o historiador não mais a absolutizar uma dessas imagens, mas a problematizar todas. Neste volume, Domenico Losurdo faz isso, ao analisar as tragédias do século XX, fazendo comparações em todas as áreas e desconstruindo e contextualizando muitas das acusações feitas a Stalin.

Stalin - História crítica de uma lenda negra (2010)

LOSURDO, DOMENICO - REVAN

Domenico Losurdo: Revolucionário e marxista criador

O filósofo e historiador italiano Domenico Losurdo esteve em Portugal em Junho a convite da revista web odiario.info para apresentar os seus livros Stálin, estória e critica de uma lenda negra e Fuga da Historia (*).



Por Miguel Urbano Rodrigues em O Diário.info



Losurdo, que é professor catedrático da Universidade de Urbino, dedicou atenção especial a desmontar a falsificação da Historia montada no Ocidente para satanizar Stálin.

Para o autor de Fuga da História a reimplantação do capitalismo na Rússia após a desagregação da União Soviética foi uma tragédia para a humanidade. Mas essa conclusão não é para ele incompatível com a convicção de que o fim da URSS foi o desfecho de uma soma de fatores inseparáveis da incapacidade da concretização do projeto socialista concebido por Lênin, com base na teoria de Marx.



Não conheço trabalho comparável pela originalidade e rigor ao que desenvolveu para demonstrar o desafio da transição na URSS do capitalismo para o socialismo.



Lênin tinha consciência de que a tomada do poder na Rússia fora uma tarefa muito mais fácil do que o desafio da construção do socialismo. O Partido não dispunha de uma teoria para a transição do capitalismo para o socialismo. E pagou um preço altíssimo por essa carência. Ela está na origem dos conflitos devastadores que Losurdo define como «as três guerras civis» na sociedade a que ele chama pós-capitalista. Essa simples expressão tornou o autor de Fuga da História alvo de muitas críticas. Domenico poderia ter utilizado a expressão pré socialista. Mas não o fez porque o socialismo real se distanciou para ele do socialismo, tal como o concebe na fidelidade ao projeto de Marx. Não cabe nestas linhas recordar as situações históricas que na Rússia, arruinada e hostilizada pelo imperialismo, tornaram inevitáveis decisões em defesa da Revolução – desde o comunismo de guerra à NEP – que conduziram a uma gradual redução do papel dos sovietes, a um apagamento dos sindicatos e a uma hipertrofia do Partido e à sua posterior burocratização. São conhecidas as consequências dessas opções.



O Relatório Secreto de Khruchov ao 20º Congresso do PCUS representou uma preciosa ajuda aos sovietólogos ocidentais que faziam da denúncia do stalinismo instrumento fundamental da luta contra o comunismo, para muitos irmão gêmeo do fascismo.



A grande maioria dos livros sobre Stálin deforma o homem e a sua época. Para uns é um herói; para outros um ser demoníaco.



Losurdo chama a atenção para o primarismo e falta de imaginação das campanhas que visam destruir a imagem de Stálin, comparando-o a Hitler. É absurdo negar-lhe qualquer mérito e apresentar como um ditador feroz e irresponsável um homem que durante três décadas exerceu um enorme poder num país que derrotou a Alemanha nazista e se transformou na segunda potência mundial.



Para desmontar a argumentação dos autores que satanizam Stálin, Losurdo recorre exclusivamente a fontes ocidentais, a destacados historiadores, filósofos, sociólogos, economistas, políticos, militares, amplamente conhecidos pelas suas posições anticomunistas. Cita concretamente opiniões de Roosevelt, De Gaulle, Benes, Hannah Arendt , Eisenhower, De Gasperi, Golda Meir, John Foster Dulles, elogiosas para Stálin, como homem, estadista e estrategista.



Losurdo não é mais um divulgador do marxismo entre muitos. É um criador. Tal como os materialistas gregos, não desconhece que o objetivo supremo do homem na aventura da vida é a procura da felicidade possível. E sabe também que em poucas épocas terá sido tão difícil como hoje perseguir essa meta. Não é de estranhar que o filósofo, nessa ânsia de compreender para ensinar, tenha escrito sobre autores tão diferentes como Nietzsche, Hegel, Marx e Lênin.



Mas Domenico tem os pés bem fincados na terra. A teoria e a prática são para ele complementares . Consciente dessa interação, o historiador está, como intelectual revolucionário, permanentemente envolvido na solidariedade com as grandes causas da humanidade e na luta dos povos contra o imperialismo. Os seus artigos correm mundo na crítica às guerras de agressão imperiais contra os povos da Palestina, do Iraque, do Afeganistão, da Líbia e outros, na denúncia da participação do golpe dos EUA nas Honduras, na solidariedade com as FARC colombianas e com o povo iraniano. É reconfortante que neste mundo em crise de civilização haja pensadores revolucionários como Domenico Losurdo. Vai completar 70 anos e preparam-lhe merecidas homenagens em diferentes países.



*Ambos publicados no Brasil pela Editora Revan, do Rio de Janeiro









sábado, 6 de agosto de 2011

Teses sobre a crise do capitalismo

Teses sobre a crise do capitalismo e a conjuntura mundial

por Alberto Anaya Gutiérrez,

Virgilio Maltos Long e

Rodolfo Solís Parga [*]


Esta comunicação tem o propósito de expor um conjunto de elementos que permitam analisar a crise sistémica e cíclica que o capitalismo atravessa, assim como os perfis e traços característicos da actual conjuntura mundial, e estabelecer as perspectivas que se apresentam às lutas dos povos e das forças de esquerda e centro-esquerda, no difícil processo que leve a construir uma nova sociedade. Pomos à vossa consideração as seguintes teses.

1. A etapa actual caracteriza-se pela combinação de uma crise sistémica com uma crise cíclica do capitalismo, e pelo fracasso do modelo neoliberal e da globalização como estratégias para as superar. Em vez disso, recrudesceram estas crises e os seus efeitos económicos, sociais, políticos e culturais na maior parte do mundo. Nestas condições, têm vindo a configurar-se vigorosos movimentos populares e frentes políticas e eleitorais, que por necessidade estão aproximando e combinando posições, programas e formas de luta diversos, que se expressam fundamentalmente em dois grandes blocos: as correntes exclusivamente anti-neoliberais e anti-globalização, por um lado e as correntes anti-capitalistas e revolucionárias, por outro.

2. O capitalismo é um sistema económico, social e político que pela sua própria natureza se desenvolve através de crises periódicas, tanto estruturais ou sistémicas como cíclicas. A história dos passados três séculos do capitalismo regista pelo menos três crises estruturais:

A que na segunda metade do século XVIII marcou o desenvolvimento da primeira Revolução Industrial, e a que estiveram vinculados significativos processos socio-políticos como a Revolução da Independência dos Estados Unidos, a Revolução Francesa, o movimento ludista na Grã Bretanha e as Revoluções independentistas na América Latina e no Caribe, entre os mais relevantes.

A de meados do século XIX que propiciou as Revoluções de 1848-1849 em vários países da Europa, e nas quais apareceu pela primeira vez o proletariado como classe propriamente dita, embora ainda subordinada ao programa da burguesia liberal. Este processo desembocou na transformação do sistema capitalista e a sua entrada na fase imperialista, caracterizada pela fusão do capital industrial com o capital bancário, donde surgiu o capital financeiro.

A chamada “Grande Crise” de 1929-1933 em que esteve seriamente em causa a sobrevivência do próprio sistema capitalista, e à qual estiveram associadas a derrota da classe operária europeia pelos regimes fascistas da Itália, da Alemanha e de Espanha, a Segunda Guerra Mundial, e a subsequente divisão do planeta em dois grandes blocos e a “Guerra Fria”, assim como o triunfo das Revoluções na China, no Vietname e na Coreia do Norte, e os processos de Independência da Índia e dos países africanos.
E a mais recente crise sistémica que teve início em 1974-1975, que abriu caminho ao modelo neoliberal e à sua forma de globalização, como estratégias para superar esta crise, mas na qual, no entanto, nos encontramos mergulhados, dado o fracasso de tais estratégias.

3. A história do capitalismo regista, ainda assim, numerosas crises cíclicas de longa duração como as seguintes: 1819-1821, 1847-1848 (que coincidiu com a crise sistémica nesses anos), 1871-1873 (a que esteve ligada a Comuna de Paris; que, por outro lado, inaugurou a fase imperialista clássica; e enquadrou o desenvolvimento da Segunda Revolução Científico-Técnica das últimas duas décadas do século XIX), 1902-1903 (a que estiveram ligadas a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Russa), 1929-1933 (que coincidiu com a crise sistémica desses anos), e 1974-1975. No quadro destes ciclos de 20 - 25 anos e dos seus momentos de crise, tiveram lugar as chamadas crises cíclicas de menor prazo, de 5, 7 ou 10 anos. Estas crises de períodos mais curtos, também coincidiram em diversas ocasiões com os outros dois tipos de crise descritos atrás.

4. No termo da Segunda Guerra Mundial, vários factores confluíram para que tivesse lugar a chamada “expansão do pós-guerra”, etapa que se estendeu de 1947 a 1973 e que também foi conhecida como os “30 anos dourados” do capitalismo. Entre estes factores destacam-se os seguintes:

O novo quadro institucional traçado e acordado em Bretton Woods, New Hampshire, Estados Unidos em 1944, e que regeria as relações, dinâmica e operações do sistema capitalista internacional: ONU, FMI, BIRD (Banco Mundial) e GATT (agora OMC).

A reconstrução da Europa por meio do Plano Marshall, e do Japão com um plano específico.

A introdução nos processos produtivos, e que geraram novos ramos da economia, das primeiras inovações que caracterizariam a Terceira Revolução Científico - Técnica, a qual desabrochou plenamente a partir dos anos oitenta: micro - electrónica, cibernética, informática, aeroespacial, energia nuclear, robótica, comunicação por satélite, biotecnologia e engenharia genética. Esta introdução promoveu um processo de recuperação e aprofundamento dos processos de acumulação de capital nos países industrializados, preponderantemente nos Estados Unidos, que os levaram a converter-se na primeira potência económica, tecnológica e militar do mundo.

A aplicação generalizada de políticas keynesianas que promoveram o surgimento da “economia mista” e o Estado de bem-estar, por meio do intervencionismo económico estatal, de políticas monetárias expansionistas e políticas fiscais deficitárias. As políticas keynesianas chegaram a traduzir-se num “keynesianismo de guerra” em vários conflitos regionais como na China, Coreia do Norte e Vietname, entre outros.

A industrialização de numerosos países do que se denominou nesses anos o “Terceiro Mundo”, pela via dos investimentos externos das empresas multinacionais, e mediante o modelo de substituição de importações (modelo preferentemente adoptado por vários países da América Latina). Estos factores ampliaram e fortaleceram os mercados internos dos países do “Terceiro Mundo”, redundaram em importantes desenvolvimentos da sua infra-estrutura básica, na sua modernização e na elevação do nível de vida dos sectores populares e das classes médias, além de ampliar, fortalecer e acelerar os seus processos de acumulação de capital.

5. Neste período de mais de duas décadas, as taxas de crescimento económico dos países industrializados foram de entre 3 e 5%, sobressaindo o “milagre japonês” com uma taxa média de 7%. Em numerosos países da América Latina, o crescimento apresentou taxas de entre 3, 4 e mesmo 5%, destacando-se o México com uma taxa ligeiramente superior a 6% anuais. Durante a maior parte de todos estes anos, e salvo breves períodos, a inflação não foi muito alta; mas nos finais dos anos sessenta e princípios dos setenta começou a representar um factor de incerteza e de desaceleração da acumulação de capital.

6. Em 1968 e nos anos imediatamente posteriores, assistiu-se à última vaga de ascensão e ofensiva contra o domínio do capital das massas estudantis, dos sectores populares e da classe operária em numerosos países do mundo. As reivindicações iam desde a melhoria dos salários e das condições de trabalho e de vida, ao mal-estar cultural dos jovens. Nestes mesmos anos, emergiu com mais força o questionamento de dentro e de fora do chamado “socialismo real”, e foram-se agudizando as contradições que levaram ao derrube do bloco Leste - europeu e da URSS entre 1989 e 1991. O capital, as classes dominantes e as estruturas e instituições do poder político e ideológico tomaram nota, e prepararam-se para dar impulso a uma contra-ofensiva. O momento propício foi a crise de 1974-1975.

7. A crise capitalista internacional de 1974-1975 cancelou abruptamente essa prolongada fase de expansão económica, pôs de lado as políticas keynesianas e propiciou as condições para a contra-ofensiva do capital hegemonizada pelos sectores neoliberais das classes dominantes. Esta contra-ofensiva teve como antecedentes imediatos a experimentação da corrente monetarista dos “Chicago Boys”, a quem foi encomendado o delineamento e a condução da política económica do Chile depois do sangrento golpe de Estado contra Salvador Allende, de Pinochet.

8. A contra-ofensiva capitalista adoptou a forma do modelo neoliberal e da globalização por si comandada, que inicialmente se experimentaram nos últimos anos da década de setenta e nos primeiros da de oitenta nos países capitalistas mais industrializados, especialmente na Grã-Bretanha, sob o governo de Margaret Tatcher e nos Estados Unidos sob o primeiro governo de Ronald Reagan. A partir de então e até aos nossos dias, o neoliberalismo e a globalização expandiram-se por todo o mundo e têm-se mantido como eixos orientadores da economia, da vida social, da política, das relações internacionais e da cultura na maioria dos países de todos os continentes.

9. O neoliberalismo e a globalização constituíram os instrumentos primordiais da contra-ofensiva do capital, fundamentalmente da fracção que submeteu a economia mundial aos seus interesses e desígnios: o capital financeiro, particularmente o capital especulativo. Com estes instrumentos procurou-se alcançar os seguintes objectivos:

Derrotar a classe operária e os sectores populares que se lançaram à ofensiva no final dos anos sessenta e princípios dos setenta.







Desmantelar as estruturas, instituições e benefícios económicos e sociais derivados da “economia mista” e do Estado de bem-estar.

Reestruturar a economia capitalista internacional em favor dos interesses do capital financeiro especulativo, das grandes corporações transnacionais e das potências capitalistas, sobretudo dos Estados Unidos.

Estabelecer o livre fluxo de investimentos e de comércio de bens e serviços, por meio de esquemas que favoreciam claramente as potências capitalistas, em detrimento dos países periféricos.

A privatização do património nacional.

Impor políticas fiscais regressivas para converter de facto os países atrasados e dependentes em verdadeiros paraísos fiscais para o capital, especialmente para o capital financeiro especulativo.
Apropriar-se dos recursos naturais estratégicos como os energéticos, a água, a biodiversidade, e facilitar a exploração da força de trabalho a nível global.

A formação de mega-blocos económicos, para repartir entre si estes recursos, os territórios, a exploração da força de trabalho e os recursos financeiros da periferia capitalista; assim como para fazer alianças estratégicas para controlar os mercados globais, regionais e no interior dos diversos países. Isto levou-nos a uma nova redefinição geoeconómica e geopolítica, que tem como propósito a nova partilha do mundo. Neste processo de redefinição do planeta inscreve-se o plano imperialista estadunidense da ALCA, e agora o plano alternativo para estabelecer tratados comerciais bilaterais dos Estados Unidos com cada um dos países da América Latina e do Caribe.

Acabar com o nacionalismo e a soberania, e submeter os Estados nacionais à lógica da globalização financeira, eliminando o seu papel regulador e a sua obrigação de procurar o bem-estar da sociedade.

Promover o individualismo egoísta e a ausência do compromisso social e político das pessoas, como traços dominantes da cultura neoliberal.

Para efeitos da manipulação ideológica, os neoliberais prometeram que depois dos ajustes estruturais e da estabilização das economias, se recuperaria o crescimento económico e o bem-estar social, se criariam mais empregos, aumentariam os salários reais, melhorariam as condições e a qualidade de vida da população, e tudo isso seria levado a cabo sobre “bases económicas sãs”, que permitiriam um desenvolvimento sustentado a longo prazo.

10. A imposição do neoliberalismo e da globalização foi facilitada pelo derrube do bloco Leste - europeu e da URSS, que se traduziu no surgimento dum mundo unipolar com condições que propiciaram o restabelecimento da hegemonia económica e político-militar dos Estados Unidos. Foi neste contexto que se forjou a nova política imperialista com pretensões imperiais dos Estados Unidos, adoptada por George Bush filho, sob a estratégia de “guerra preventiva contra o terrorismo”, a partir de 11 de Setembro de 2001.

11. O arranque das potencialidades da Terceira Revolução Científico-Técnica na década de oitenta, permitiu pôr de pé a globalização financeira, da produção e da circulação de bens e serviços. A disponibilidade destas tecnologias tornou possível a implementação da globalização neoliberal. Este processo confunde-se com a inevitabilidade da dita globalização. Agora que a globalização evidencia o seu fracasso, na magnitude da pobreza e dos desastres económicos e ecológicos do mundo, tornou-se evidente que se tratava de uma estratégia para superar a crise cíclica e sistémica do capitalismo, e ao mesmo tempo uma estratégia para relançar o domínio imperialista dos Estado Unidos sobre o resto do planeta.

12. Na realidade, o modelo neoliberal fracassou nas metrópoles capitalistas e foi abandonado há mais de uma década. No entanto, o neoliberalismo e a globalização foram mantidos ferreamente pelas potências capitalistas, principalmente pelos Estados Unidos, como instrumentos centrais de dominação sobre o resto do mundo. Neste sentido, são mantidas como estratégias para fazer sair o sistema capitalista da sua crise sistémica e cíclica depois de quase três décadas de expansão (1947-1973), à custa da maioria dos países e dos povos do mundo. Foram estratégias de saque dos seus recursos e de exploração das suas populações, que redundaram na concentração da riqueza nas mãos de uns quantos e na pobreza e na miséria de três quartas partes da população mundial. Foram estratégias de retrocesso das conquistas económicas, sociais e culturais na maior parte do planeta. Em matéria de alimentação, saúde, educação e direitos humanos mais elementares, estas estratégias representaram retrocessos variáveis, mas que em média nos remetem a condições próprias dos anos cinquenta e sessenta; ou seja, um retrocesso de meio século.

13. O neoliberalismo e a globalização, em lugar de fazer sair o capitalismo da sua crise sistémica e cíclica, fizeram recrudescer os problemas económicos, sociais, políticos, ecológicos e culturais do planeta. O que temos vindo a sofrer nas décadas recentes é a combinação de uma nova crise cíclica com uma crise sistémica, que ameaça levar o mundo a uma situação semelhante à da “Grande Crise” de 1929-1933.

14. A década de oitenta foi para os países capitalistas desenvolvidos um período de crescimento baixo e irregular. O único país desenvolvido que mostrou um crescimento elevado e de longo prazo nesses anos foi o Japão, que no entanto, entrou numa crise histórica do seu “modelo de economia aberta”, que até à data ainda não terminou. Mas, para os países atrasados e dependentes, os anos oitenta foram o que se convencionou chamar uma “década perdida”.

15. Em aparente contraste, a década de noventa foi de recuperação da economia mundial que registou uma taxa média anual de entre 3 e 3.5%, em que a economia dos Estados Unidos desempenhou o papel de locomotiva, com um crescimento médio entre 3.5 e 4%. Paralelamente, algumas nações da Europa ocidental, como Inglaterra, Alemanha e França, tiveram um período de crescimento de 2 a 3%. Por outro lado, no Japão o crescimento foi nulo, tendo inclusive alguns anos com crescimento negativo. Não obstante esta situação, para muitos dos países periféricos o crescimento foi variável e instável, com uma marcada tendência para a recessão, que praticamente converteu essa década de noventa noutra década perdida. Nesta situação se encontrou ao longo dos anos noventa a maioria dos países da América Latina e do Caribe, de África e vários países da Ásia.

16. No quadro desta aparente recuperação da economia mundial dos anos noventa, e como expressão da crise sistémica que assinalamos, tiveram lugar as crises financeiras da Grécia e da Turquia em 1992, do México em 1994-1995, dos “Tigres Asiáticos” e outras economias do Sudeste Asiático em 1997-1998, da Rússia e do Brasil em 1998-1999, e a recente crise da Argentina de 2001-2002.

17. No ano 2000, os Estados Unidos entraram em recessão, rebentou a bolha financeira especulativa associada aos ramos de alta tecnologia, que levou à quebra de várias grandes corporações transnacionais desse país, e que finalmente se traduziu num processo recessivo que se expandiu pela maior parte do sistema capitalista mundial. Insistimos em que esta nova crise cíclica se desenvolve no contexto de uma grave crise sistémica.

18. Face à combinação da crise cíclica e sistémica do capitalismo mundial, ressaltam as experiências dos países que decidiram manter-se na rota da construção socialista, embora adoptando reformas económicas estruturais para se inserirem em condições favoráveis na economia mundial globalizada, mantendo o controle do Estado sobre os processos de mudança económica e social. Estes países são: a China que durante as últimas duas décadas cresceu a uma média de 9%; o Vietname, que quase no mesmo lapso de tempo cresceu entre 6 e 7%; Cuba, que depois do inevitável “período especial” devido à queda da URSS, cresceu desde 1994 até à data a uma taxa média de 3.2%; e a Coreia do Norte, que também sofreu uma séria crise de meados dos anos noventa até 2002, no período recente está a recuperar o crescimento económico. Isto prova suficientemente a falsidade da tese do FMI e do Banco Mundial, de que só mediante as suas “receitas” era possível reestruturar as economias e retomar a senda do crescimento para gerar bem-estar social. Prova, pelo contrário, que o neoliberalismo, a globalização e as receitas do FMI não passaram de estratégias para fazer sair o sistema capitalista da sua crise sistémica e cíclica; para redefinir o domínio do planeta pelo capital financeiro especulativo e as grandes transnacionais; e para relançar a hegemonia económica e político-militar do imperialismo estadunidense e seus aliados.

19. Trouxemos aqui elementos para mostrar que nas duas décadas passadas, o capitalismo se viu afectado por uma grave situação. No entanto, nos anos mais recentes foi posta em evidência a combinação das crises cíclica e sistémica, que mantém o mundo na estagnação económica e sem solução visível a curto prazo. A economia dos Estados Unidos, que foi a “locomotiva” do crescimento, a partir de 2000 entrou em recessão. As suas taxas de crescimento foram, em 2001, 0.3%; em 2002, 2.4%; e 3% em 2003, mas sem que estes valores tenham sido acompanhados de investimentos produtivos nem da criação de empregos. Na União Europeia, a Alemanha registou baixas taxas de crescimento: em 2001, 0.8%; em 2002, 0.2%; e em 2003, 1%. Em França, as taxas foram de 2.1% em 2001, 1.2% em 2002 e 0.5 em 2003. A Grã-Bretanha registou as seguintes taxas: 2.1% em 2001, 1.9% em 2002 e 1.7% em 2003. Devido a esta situação, o desemprego tornou-se crónico na União Europeia, com uma taxa média entre 10 e 12% nos últimos anos. Por seu lado, o Japão apresentou este desempenho: 0.4% em 2001, 0.2% em 2002 e 1,1% em 2003.

20. Neste contexto recessivo dos países capitalistas mais desenvolvidos, a situação dos países periféricos viu-se gravemente afectada, e as políticas neoliberais acresceram os seus problemas. Para mencionar só alguns exemplos na região latino-americana e caribenha, a Argentina registou os seguintes valores: -4.4% em 2001, -10.9% em 2002, e 6.2% em 2003; o Brasil: 1.4%, 1.5% e 2%, respectivamente; o Chile: 3.1%, 2.1% e 3.2%, respectivamente; México: -0.2%, 0.7% e 1.3%, respectivamente; República Dominicana: 3.2%, 4.1% e –3%, respectivamente; e a Guatemala: 2.3%, 2.2% e 2.4%, respectivamente. A este panorama há que acrescentar que a região da América Latina e o Caribe é a que mostra a pior distribuição do rendimento em todo o mundo: um punhado de multimilionários face a 250 milhões de pobres (50% da população total).

21. A maioria das economias da Ásia tem uma participação marginal na economia mundial. As suas elevadas taxas médias de crescimento obedecem principalmente ao comportamento das economias da China (7.5% em 2001, 8% em 2002 e 9.1% em 2003), do Vietname (5%, 5.8% e 6%, respectivamente), da Índia (4.2%, 4.7% e 5.6%, respectivamente), da Coreia do Sul (3.1%, 6.2% e 2.5%, respectivamente), e do Paquistão (2.7%, 4.4% e 5.4%, respectivamente). Deve, naturalmente, ter-se presente que esta região do mundo se converterá numa grande potência económica nas próximas décadas.

22. Neste quadro de crise cíclica e sistémica combinadas, tem-se vindo a generalizar uma crise de credibilidade e incerteza entre os povos do mundo, principalmente nos países periféricos, atrasados e “emergentes”. Esta confluência de crise económica e crise social e política, traduziu-se em insurreições sociais (pacíficas e violentas), insurreições eleitorais e abruptas mudanças na direcção governamental de vários países. Estes processos combinaram criativamente velhos e novos sujeitos sociais e políticos, assim como questões programáticas de longa data, mas ainda válidas, com novas reivindicações e formas diversas de luta. Tudo isto se reflectiu na configuração e nas acções de amplos movimentos de massas e frentes político-eleitorais. Aí estão os casos da Venezuela, do Equador, do Brasil, da Bolívia, da Argentina, do Uruguai, da Colômbia e de El Salvador, para mencionar apenas alguns.

23. Como noutros períodos da história, a combinação de crise sistémica e cíclica do capitalismo gerou condições para o surgimento de vigorosos movimentos populares e políticos alternativos à dominação capitalista. Estes processos têm vindo a expressar-se na conjuntura actual sob duas formas gerais sem que sejam mutuamente exclusivas, e pouco a pouco procuram convergências e formas de participação frentistas amplas: por um lado, as correntes que só estão contra a globalização neoliberal; e por outro, as correntes abertamente anti-capitalistas e revolucionárias. Consideramos que esta convergência deve impulsionar-se e fortalecer-se por parte de todas as organizações sociais e políticas, para que juntos construamos um poderoso movimento popular e político que derrote o neoliberalismo e a globalização capitalista, e represente uma alternativa para os povos do mundo.

24. No quadro desta combinação de crise cíclica e sistémica, perante o fracasso do neoliberalismo e da globalização para as superar, e perante o desastre mundial que tudo isto provocou, ao poder do capital e ao imperialismo só resta o uso unilateral da força. Isto reflecte-se nas suas pretensões imperiais dos últimos anos, sob a máscara da “guerra preventiva contra o terrorismo”. Isso é o que nos mostraram as tragédias do Afeganistão, do Iraque, da Palestina e do Haiti, e as ameaças delirantes a outros países por parte do governo dos Estados Unidos.

25. O sistema capitalista e em particular a grande potência imperial, busca uma reestruturação, na actual conjuntura mediante o “keynesianismo de guerra” orientado para as agressões imperialistas ao Afeganistão, ao Iraque e as ameaças sobre o que esse governo delirante chama “o eixo do mal” (Coreia do Norte, Irão, Cuba, Venezuela e Líbia), e retomando os velhos esquemas imperialistas do colonialismo. No entanto, o “keynesianismo de guerra” fracassou até agora, como estratégia extrema para tirar o capitalismo das suas crises cíclica e sistémica combinadas.

26. Para nós, a saída é o socialismo. Esta é a única e verdadeira solução para os problemas do capitalismo, que na etapa actual se tornaram dramáticos para a humanidade.

27. É urgente que aceleremos a construção desse poderoso movimento social e político de esquerda e centro-esquerda a nível internacional e em cada um dos nossos países. É urgente que configuremos já uma plataforma programática básica como alternativa ao modelo neoliberal e à sua globalização. É urgente que ampliemos e reforcemos a solidariedade internacional entre os nossos povos e organizações sociais e políticas. É urgente que alcancemos acordos básicos em todos estes pontos, para contar com os instrumentos fundamentais que nos permitam tornar realidade a construção de uma nova sociedade.

[*] Comunicação apresentada no VIII Seminário “Os partidos políticos e uma nova sociedade”, promovido pelo Partido do Trabalho, realizado na Cidade do México, 5-7 de Março de 2004. Tradução de Carlos Coutinho.

O original pode ser encontrado em http://www.cubasocialista.cu/texto/viiiseminario/csviiis13.htm

Esta comunicação encontra-se em http://resistir.info .

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Pós-modernidade: sim ou não.

CHEVITARESE, L. (2001): “As ‘Razões’ da Pós-modernidade”. In: Analógos. Anais da I SAF-PUC. RJ:


Booklink. (ISBN 85-88319-07-1)

As “razões” da pós-modernidade

Sem os punhos de ferro da modernidade,

a pós-modernidade precisa de nervos de

aço1.

Apresentação

Frederic Jameson considera os anos 60 como o início da pós-modernidade,

entendida por ele como lógica cultural do capitalismo tardio. Mas apenas a partir da

década de 70 o debate em torno do tema torna-se mais inflamado. As raízes da

discussão encontram-se na crise cultural que se faz sentir, principalmente, a partir do

pós-guerra. O desencanto que se instala na cultura é acompanhado da crise de conceitos

fundamentais ao pensamento moderno, tais como “Verdade”, “Razão”, “Legitimidade”,

“Universalidade”, “Sujeito”, “Progresso”, etc. O efeito da desilusão dos sonhos

alimentados na modernidade se faz presente nas três esferas axiológicas por ela mesma

diferenciadas: a estética, a ética e a ciência. Tal efeito, apresenta-se nos mais diversos

campos de produção cultural, tais como a literatura, a arte, a filosofia, a arquitetura, a

economia, a moral, etc.

Surgem questões que se tornam alvo de intenso debate na atualidade: estaríamos,

nessa “crise cultural”, vivendo uma crise da modernidade? Seria a crise o anúncio de

um obituário, que nos convidaria a falar em “pós-modernidade”, como superação ou

ruptura com a modernidade? Poderia a noção de “pós-modernidade” servir para

caracterizar a cultura contemporânea?

1 BAUMAN, Zygmunt: Modernidade e Ambivalência. RJ. Jorge Zahar Editor. 1999. Pág. 259.

Em 1979, Jean-François Lyotard publica La Condition Postmoderne, no qual

apresenta o problema da legitimação do conhecimento na cultura contemporânea. Para

Lyotard, “o pós-moderno, enquanto condição da cultura nesta era [pós-industrial],

caracteriza-se exatamente pela incredulidade perante o metadiscurso filosóficometafísico,

com suas pretensões atemporais e universalizantes”2. Por outro lado,

Habermas prefere compreender a modernidade como um “projeto inacabado”,

sugerindo que “deveríamos aprender com os desacertos que acompanham o projeto”3.

Será que “dizer que somos pós-modernos dá um pouco a impressão de que deixamos de

ser contemporâneos de nós mesmos”4? Mas se ainda reivindicarmos nossa “condição

moderna”, como tratar de todas as mudanças que marcam a cultura contemporânea, e

que a tornaram tão estranha a certas noções fundamentais à modernidade?

O que pretendo, aqui, é investigar brevemente a aplicação do conceito de “pósmodernidade”

à cultura contemporânea e as possíveis “razões” dessa aplicação.

Articula-se, logo de início, uma problemática: se a pós-modernidade, como o próprio

termo sugere, caracteriza-se em primeira instância como uma reação (ou rejeição) à

modernidade, seria ela o triunfo do irracionalismo, ou a pós-modernidade pressupõe, em

última análise, algum conceito de “razão”, para além de seu relativismo epistêmico mais

superficial? Caso a resposta seja positiva, quais são “As ‘razões’ da pós-modernidade”?

A Modernidade e o Desencanto na Cultura

2 LYOTARD, Jean-François: O pós-moderno. RJ. Olympio Editora. 1986. Introdução, viii.

3 HABERMAS, J.: “Modernidade – um projeto inacabado”. In: ARANTES, O. & ARANTES, P.: Um

ponto cego no projeto moderno de Jürgen Habermas. SP. Brasiliense. 1992. Pág. 118.

4 ROUANET, S. P.: As razões do iluminismo. SP. Companhia das Letras. 1987. Pág. 229.

O termo “pós-modernidade” encontra-se ligado à significação de

“modernidade”, até por que não faria sentido ser “pós” alguma coisa que não se sabe o

que é. O “pós-moderno” representa alguma espécie de reação ou afastamento do

“moderno” 5. Contudo, não basta apenas a análise do conceito de modernidade, pois o

próprio prefixo “pós” articula problemáticas situadas em diversas áreas. Krishan Kumar

chama à atenção que o prefixo “pós”, de “pós-modernidade”, é ambíguo: pode significar

um novo estado de coisas, no sentido do que vem depois; ou pode ser usado como o

post de post-mortem, sugerindo fim, término6.

Será então necessário ressaltar primeiro as perspectivas fundamentais da própria

“modernidade”, para então estabelecermos em que sentido podemos falar de uma

“posterioridade” na “pós-modernidade”.

No início do século XX, Max Weber já caracterizava o advento da modernidade

como um processo crescente de “racionalização intelectualista”, intimamente ligado ao

progresso científico, que leva ao “desencantamento do mundo”7. Vejamos o que

Habermas nos diz, comentando Weber:

Max Weber caracterizou a modernidade cultural, mostrando que

a razão substancial expressa em imagens de mundo religiosas e

metafísicas se divide em três momentos, os quais apenas

formalmente (mediante a forma de fundamentação

argumentativa) ainda podem ser mantidos juntos. Uma vez que

as imagens de mundo se desagregam e os problemas legados se

cindem entre os pontos de vista específicos da verdade, da

justeza normativa, da autenticidade ou do belo, podendo ser

tratados, respectivamente como questão de conhecimento, como

questão de justiça e como questão de gosto, ocorre nos tempos

5 Cf. HARVEY, David: Condição pós-moderna. SP. Edições Loyola. 1992. Pág. 19.

6 Cf. KUMAR, Krishan: Da sociedade pós-industrial à pós-moderna. RJ. Jorge Zahar Editor. 1997. Pág.

79.

7 Cf., p.ex., WEBER, Ciência e Política. Duas vocações. SP. Cultrix, 1968. Págs. 30 / 31.

modernos uma diferenciação de esferas de valor: ciência, moral

e arte.8

O conjunto de idéias e perspectivas que caracterizam a modernidade parece

constituir um grande sonho que a humanidade elaborou para si mesma9, ou ainda um

audacioso projeto da Razão como libertadora. O Discurso iluminista de emancipação

pela revolução, ou pelo saber, sustenta essa confiança na capacidade da Razão10.

Habermas chama a atenção para o que ele denomina projeto da modernidade, e que tem

sido amplamente discutido na atualidade, como demonstra David Harvey:

Embora o termo “moderno” tenha uma história bem mais

antiga, o que Habermas chama de projeto da modernidade

entrou em foco durante o século XVIII. Esse projeto equivalia a

um extraordinário esforço intelectual dos pensadores iluministas

“para desenvolver a ciência objetiva, a moralidade e a lei

universais e a arte autônoma nos termos da própria lógica

interna destas”. A idéia era usar o acúmulo de conhecimento

gerado por muitas pessoas trabalhando livre e criativamente em

busca da emancipação humana e do enriquecimento da vida

diária.11

A aplicação ampla da racionalidade na organização social prometia a segurança

de uma sociedade estável, democrática, igualitária (incluindo o fim de estados

teocráticos, de perseguições sociais produzidas pela superstição, de abusos de poder por

parte dos governantes, etc). A possibilidade de domínio científico representava o aceno

de uma ambicionada segurança, que nos afastaria dos infortúnios ligados a

imprevisibilidade do mundo natural (desde condições climáticas e de relevo, a doenças

físicas e mentais): a natureza deveria submeter-se ao poder da Razão humana.

8 HABERMAS, J.: “Modernidade – um projeto inacabado”. In: ARANTES, O. & ARANTES, P., op. cit.,

1992. Págs. 109 / 110.

9 Bauman, p.ex., denominou “sonho da razão legislativa”. Cf. BAUMAN, op.cit., 1999. Pág. 29.

10 Cf. CASSIRER, Ernest: A Filosofia do Iluminismo. SP. Editora da Unicamp. 1994. Pág. 21.

11 HARVEY, op.cit., 1992. Pág. 23, meu grifo.

Estes foram sonhos demasiadamente caros para a humanidade, pelos quais se

permitiu a hipervalorização do conhecimento objetivo e científico. O que Ken Wilber,

p.ex., prefere chamar de desastre da modernidade: “uma patologia, que logo permitiu

que uma poderosa ciência monológica colonizasse e dominasse as outras esferas (a

estético-expressiva e a religiosa-moral)”12.

Naturalmente, o investimento cultural na racionalidade universal e na ciência

(que nos protegeriam do caos e da aleatoriedade) exigiu uma restrição da liberdade

individual. Harvey observa que “há a suspeita de que o projeto do Iluminismo estava

fadado a voltar-se contra si mesmo e transformar a busca de emancipação humana num

sistema de opressão universal em nome da libertação humana”13.

A expectativa quanto aos frutos da ciência foi dolorosamente interrompida por

eventos que marcaram profundamente a sociedade atual. O principal deles foi, sem

dúvida, a catástrofe da Segunda Guerra Mundial e a insuportável lembrança de

acontecimentos como Auschwitz e Hiroshima: “cortada ao meio pela guerra fria, cética

em relação à construção ‘comunitária’ que lhe propõem tecnocratas e políticos, a

Europa dos anos 50 deixou de acreditar no futuro”14.

A ciência perdeu boa parte da aura de autoridade que um dia

possuiu. De certa forma, isso provavelmente é resultado da

desilusão com os benefícios que, associados à tecnologia, ela

alega ter trazido para a humanidade. Duas guerras mundiais, a

invenção de armas de guerra terrivelmente destrutivas, a crise

ecológica global e outros desenvolvimentos do presente século

poderiam esfriar o ardor até dos mais otimistas defensores do

progresso por meio da investigação científica desenfreada15.

12 WILBER, The Marriage of Sense and Soul: integrating science and religion. New York. Random

House. 1998. Pág. 55, meus grifos.

13 HARVEY, op.cit., 1992. Pág. 23.

14 DELACAMPAGNE, C.: História da Filosofia no Século XX. RJ. Jorge Zahar Editor. 1995. Pág. 233.

15 GIDDENS, A. : “A vida em uma sociedade pós-industrial”. In: BECK, Ulrich, GIDDENS, Anthony &

LASH, Scott: Modernização Reflexiva. SP. UNESP. 1997. Pág. 109.

Já não parece claro que a investigação científica possa “garantir” o que quer que seja.

Além disso, a dúvida sobre os “benefícios” trazidos pela tecnologia torna-se cada vez

mais cotidiana, doméstica, principalmente à medida em que se intensifica a dependência

a esta mesma tecnologia crescente (incluindo, p.ex., a dependência cada vez maior de

aparelhos eletrodomésticos, automóveis, computadores, etc – sem os quais, para muitos,

tornou-se “impossível” viver).

Na medida em que as expectativas criadas não se puderam realizar efetivamente,

surgiram a frustração, o relativismo e o niilismo16. Mas a própria exigência de

radicalidade crítica da modernidade já trazia consigo a “armadilha da dúvida”:

(...) as sementes de niilismo estavam no pensamento

iluminista desde o início. Se a esfera da razão está inteiramente

desagrilhoada, nenhum conhecimento pode se basear em um

fundamento inquestionado, por que mesmo as noções mais

firmemente apoiadas só podem ser vistas como válidas “em

princípio” ou até “ulterior consideração”. De outro modo elas

reincidiriam no dogma e se separariam da própria esfera da

razão que determina qual validez está em primeiro lugar.17

Esta é uma tese que considero particularmente importante: o Desencanto na

Cultura, entendido como perda de horizontes, sensação de caos, incerteza e relatividade,

é algo que desde o início da modernidade encontrava-se embrionário, implícito nas

próprias exigências críticas da Razão – o que gostaria de chamar de “a outra face da

moeda iluminista”. Mas se não há mais otimismo quanto aos rumos da cultura moderna,

esse desencanto vem acompanhado da rejeição a tudo que é tido como opressivo, da

desconfiança a todo discurso que pretenda dizer ‘o que são as coisas’, ‘o que devemos

fazer’, ‘como sentir’. É a dúvida quanto às possibilidades de fundamentação racional, a

16 Diversos teóricos demonstraram a relação entre o niilismo e a pós-modernidade. Ver, p.ex.,

VATTIMO, Gianni: O Fim da Modernidade: niilismo e hermenêutica na cultura pós-moderna. Lisboa.

Editorial Presença. 1987.

17 GIDDENS, As consequências da modernidade. SP. Unesp. 1991. Pág. 54, meu grifo.

suspeita quanto às narrativas globalizantes, que caminha lado a lado do clamor por

liberdade. A pós-modernidade configura-se como uma reação cultural, representa uma

ampla perda de confiança no potencial universal do projeto iluminista18.

O Ataque à Ciência e o Irracionalismo pós-moderno

Lyotard inicia sua tentativa de desmascarar a pretensão de legitimidade da

ciência, pela evidência de que não se pode prescindir do recurso a outra narrativa (nãocientífica)

para responder a pergunta: como provar a prova? As duas principais

narrativas às quais recorre a ciência moderna são as de emancipação filosófica e política

produzidas pelo iluminismo. Elas se diferenciam das narrativas pré-modernas, que se

centravam na tentativa de retornar, redescobrir e reviver uma verdade originária, pois

são essencialmente teleológicas, visam a um determinado objetivo final, e dependem de

uma idéia de progresso temporal. Segundo Lyotard, o descrédito em relação a tais

narrativas de grande envergadura (grands récits), de caráter totalizante, e a falência das

pretensões de legitimação através delas estão no fundamento da condição pós-moderna:

“simplificando ao extremo, considera-se ‘pós-moderna’ a incredulidade em relação aos

metarrelatos”19.

Segundo Bauman, a dúvida que problematiza o conhecimento, e que se torna

mais evidente na condição pós-moderna, é aquela que “desafia o direito de a ciência

validar e invalidar, legitimar e deslegitimar – em suma, de traçar a linha divisória entre

conhecimento e ignorância”20. A condição pós-moderna nos faz encarar o “demônio da

improcedência da certeza”, que em sua forma mais assustadora suscita a suspeita de que

18 Cf., p.ex., FEATHERSTONE, Cultura de consumo e Pós-modernismo. SP. Studio Nobel. SESC. 1995.

Pág. 66.

19 Idem. Introdução, pág. xvi.

20 BAUMAN, op.cit., 1999. Pág. 257.

a ciência pudesse ser apenas uma forma de mitologia sofisticada, “apenas uma versão

dentre muitas”21. Todavia, o “enfrentamento” da incerteza pode ser vivido como

desqualificação total da ciência e sua igualação a outras formas de saber , ou como

consciência da incerteza e da ambivalência pós-modernas, que exige uma nova relação

com a questão da legitimação e da certeza do conhecimento. De qualquer modo, o

Ataque à Ciência pode ser compreendido como um advento da reação cultural que

acompanha a perda de confiança na objetividade da Razão.

A ansiedade pós-moderna pela plenificação da liberdade reflete a profunda

descrença cultural em um “caminho seguro” para a felicidade. Por outro lado, ao mesmo

tempo em que se intensifica o sentimento de liberdade (nas palavras de Dostoievsky:

“se Deus está morto, tudo é permitido”), cresce a insegurança em relação ao que fazer,

i.e., a capacidade de decidir “corretamente” no exercício da liberdade. A permissividade

total mostra-se culturalmente tão assustadora quanto uma cruel limitação: “poder tudo”

é tão angustiante quanto “não poder nada”.

É inteiramente diferente viver com a consciência pós-moderna

de que não há nenhuma saída certa para a incerteza; de que a

fuga à contingência é tão contingente quanto a condição da qual

se busca fugir. O desconforto que tal consciência produz é a

fonte de mal-estares especificamente pós-modernos22.

A condição pós-moderna nos traz a consciência da incerteza e da ambivalência.

Respostas em suspenso. Mal-estar diante de um mundo caótico. “A cultura já não pode

mais proporcionar uma explicação adequada do mundo que nos permita construir ou

ordenar nossas vidas”23. É por isso que Giddens afirma que “não há nada de misterioso

21 Idem. Pág. 258.

22 BAUMAN, op.cit., 1999. Pág. 250.

23 FEATHERSTONE, Mike: O Desmanche da Cultura. SP. Studio Nobel. SESC. 1997. Pág. 15.

no surgimento do fundamentalismo no mundo moderno tardio”24. Adotar uma única

resposta é evitar a experiência angustiante da dúvida radical, cujo fascínio advém da

promessa de livrar os convertidos das agonias da escolha individual. O

fundamentalismo25, é um exemplo de ausência crítica, ou irracionalismo pós-moderno,

uma forma de usar a liberdade para tentar fugir dela.

Baudrillard, por sua vez, afirma que a única coisa que dá sentido às massas é o

espetáculo26. O fascínio pelo espetacular torna-se cada vez mais evidente na condição

pós-moderna, o que não pode ser dissociado do desenvolvimento da tecnologia de

informação e de transformações econômicas que fazem, p.ex., Jameson tomar a pósmodernidade

como “lógica cultural do capitalismo tardio”.

Muitos teóricos têm caracterizado a cultura atual como sociedade de consumo, o

que corresponde a aceitar que o mapeamento deste mundo simulacional das mercadorias

é um dos eixos centrais para a compreensão da cultura. Se outrora o consumo era apenas

uma conseqüência da produção de mercadorias, “hoje é preciso produzir os

consumidores, é preciso produzir a própria demanda, e essa produção é infinitamente

mais custosa do que a de mercadorias”27. O consumo de produtos e serviços está

mergulhado no sonho que envolve cada signo-mercadoria. Campbell, p.ex., desenvolve

uma análise do consumo, identificando suas relações com o romantismo, com o sonho,

com a busca imaginária de realização: “a atividade essencial do consumo não é a

24 GIDDENS,: “A vida em uma sociedade pós-tradicional”. In: BECK, GIDDENS & LASH, op.cit.,

1997. Pág. 123.

25 “O fundamentalismo é um remédio radical contra esse veneno da sociedade de consumo conduzida

pelo mercado e pós-moderna – a liberdade contaminada pelo risco (um remédio que cura a infecção

amputando o orgão infeccionado – abolindo a liberdade como tal, na medida em que não há liberdade

livre de riscos)”. BAUMAN, O mal-estar da pós-modernidade. RJ. Jorge Zahar Editor. 1998. Pág. 228.

26 Cf. BAUDRILLARD, À sombra das maiorias silenciosas. SP. Editora Brasiliense. 1993. Pág. 14.

27 BAUDRILLARD, op.cit., 1993. Págs. 26/27.

seleção, a aquisição ou o uso real dos produtos, mas a procura imaginária do prazer a

que se presta a imagem do produto”28.

A preocupação com o estilo de vida passa a ser um indicativo fundamental.

Baudrillard ressalta que “o lúdico do consumo tomou progressivamente o lugar do

trágico da identidade”29. Esta tendência de irracionalismo pós-moderno afirma: “dizme

o que consomes e dir-te-ei quem és”. (E não é pequeno hoje em dia o número de

pessoas que tenta “resolver” – ou pelo menos adiar – suas crises de identidade pessoal

ou social entregando-se compulsivamente ao consumo).

Apreciamos a diversidade de “sentidos” como imagens que se deslocam numa

tela de vídeo. Para Baudrillard, vivemos em uma cultura na qual “a televisão é o

mundo”: somos submetidos a uma torrente interminável de imagens, a um

bombardeamento de signos sem profundidade ou fragmentados, que constituem um

convite ao fascínio estético e à recusa de juízos morais. “Por toda parte já vivemos

numa alucinação ‘estética’ da realidade”30.

Todavia, se a estetização da realidade é uma “tendência cultural dominante”31,

não há mais autonomia nas esferas culturais, que surgem mergulhadas num turbilhão de

imagens ou “intensidades multifrênicas” (para usar um termo de Jameson). Tem-se,

então, a colonização pela estética das demais esferas da cultura: “as diferentes esferas

culturais – a estética, a ética, a teórica – perdem sua autonomia, por exemplo, o reino

estético começa a colonizar as esferas teórica e moral-política”32.

28 CAMPBELL, C.: The Romantic Ethic and the Spirit of Modern Consumerism. Oxford. Blackwell.

1987. Apud FEATHERSTONE, op. cit., 1997. Pág. 45.

29 BAUDRILLARD, A Sociedade de Consumo. Lisboa. Edições 70. 1981. Pág. 240, meu grifo.

30 BAUDRILLARD, J.: Simulations. New York. Semiotext. 1983. Pág.148. Apud FEATHERSTONE,

op.cit., 1995. Pág. 102.

31 Cf. JAMESON, Frederic: Espaço e Imagem: teorias do pós-modernos e outros ensaios. RJ. Editora da

UFRJ. 1994. Pág. 136.

As “razões”da pós-modernidade

A pós-modernidade pode ser caracterizada como uma reação da cultura ao modo

como se desenvolveram historicamente os ideais da modernidade, associada à perda de

otimismo e confiança no potencial universal do projeto moderno. Em especial,

configura-se como uma rejeição à tentativa de colonização pela ciência das demais

esferas da culturais, o que vem acompanhado do clamor pela liberdade e

heterogeneidade, que haviam sido suprimidas pela esperança de objetividade da Razão.

Enquanto reação cultural, a pós-modernidade traz consigo fortes tendências ao

irracionalismo, o que pode ser exemplificado, tanto pelo fundamentalismo

contemporâneo, como pela sociedade de consumo, que convivem em um universo

cultural de colonização pela estética da ciência e da ética.

Estaríamos, então, vivendo uma crise da modernidade, ou seria melhor concebêla

como uma crise na modernidade? Não haveria um equívoco em rejeitar por completo

o projeto moderno, em função do que teria sido seu desastre inicial, i.e, o

agigantamento dos sonhos iluministas e a tentativa de colonização pela ciência? Tentar

“demitir-se” da modernidade não seria, na verdade, aprofundar seus “descaminhos”?

Não é possível lutar contra a modernidade repressiva senão

usando os instrumentos de emancipação que nos foram

oferecidos pela própria modernidade (...) Demitir-se da

modernidade é a melhor forma de deixar intata a modernidade

repressiva33.

Se aceitarmos que está interditada a possibilidade de abrir mão totalmente de certos

pressupostos básicos da modernidade, como a própria idéia de crítica, isto implica que,

se há crise, é na modernidade. Conforme Bauman nos indica,

32 KUMAR, op.cit., 1997. Pág. 128.

33 ROUANET, op.cit., 1987. Pág. 26.

a pós-modernidade é a modernidade que atinge a

maioridade, a modernidade olhando-se a distância e não de

dentro, fazendo um inventário completo de ganhos e perdas,

psicanalizando-se, descobrindo as intenções que jamais

explicitara, descobrindo que elas são mutuamente incongruentes

e se cancelam. A pós-modernidade é a modernidade chegando a

um acordo com a sua própria impossibilidade, uma

modernidade que se automonitora, que conscientemente

descarta o que outrora fazia inconscientemente.34

Bauman (que utiliza o termo para caracterizar a cultura contemporânea) procura deixar

claro que a “pós-modernidade” é a condição atual da modernidade. Giddens, por outro

lado, prefere a noção de “modernidade tardia” ou “modernidade radicalizada”, como

mais adequada para referir-se à cultura em que vivemos:

A ruptura com as concepções providenciais de história, a

dissolução da aceitação de fundamentos, junto com a

emergência do pensamento contrafatual orientado para o futuro

e o “esvaziamento” do progresso pela mudança contínua, são

tão diferentes das perspectivas centrais do Iluminismo que

chegam a justificar a concepção de que ocorreram transições de

longo alcance. Referir-se a estas, no entanto, como pósmodernidade,

é um equívoco que impede uma compreensão

mais precisa de sua natureza e implicações. As disjunções que

tomaram lugar devem, ao contrário, ser vistas como resultantes

da auto-elucidação do pensamento moderno, conforme os

remanescentes da tradição e das perspectivas providenciais são

descartados. Nós não nos deslocamos para além da

modernidade, porém, estamos vivendo precisamente através de

uma fase de sua radicalização35

Ora, poderiam os homens modernos, na medida em que se assumem radicalmente

enquanto tais, deixar de realizar uma grave crítica à própria modernidade? Segundo

Bauman, “os mais brilhantes e mais fiéis filhos da modernidade não podiam expressar

34 BAUMAN, op.cit., 1999. Pág. 288, meu grifo.

35 GIDDENS, op.cit., 1991. Pág. 56/57, meu grifo.

sua lealdade filial senão se tornando os seus coveiros”36. Ou ainda: como não esperar

que tentassem ser “pós-modernos”?

Sendo assim, o “pós” de “pós-modernidade” não pode denotar, de fato, ruptura

ou esgotamento da modernidade, não pode significar seu obituário, mas, ao contrário,

revela uma crise na modernidade (portanto, jamais uma crise da modernidade), revela,

digamos, um modo de “experimentar” a modernidade.

Isto significa, por outro lado, que podemos tomar o conceito de “pósmodernidade”,

enquanto tentativa de caracterização da cultura contemporânea, como

sintoma da crise na modernidade. Em outras palavras, ele seria “autêntico em sua

inadequação” 37 à caracterização de uma época de crise, uma época de transição. Ou

simplesmente, como Jameson argumenta, não podemos não usá-lo – ainda que para

tanto sejamos obrigados, todas as vezes, a enfrentar as contradições internas, e a

inconsistência de representação implícita ao termo 38. Sustento, portanto, que vivemos

em uma cultura pós-moderna.

A pós-modernidade não abandona os imperativos de racionalidade crítica, ao

contrário, leva a crítica às mais profundas conseqüências, questionando os conceitos e

pressupostos da modernidade. E há boas “razões”39 para isso, que se revelam pela

própria crise na cultura moderna. As “razões” da pós-modernidade são “razões” para

que se reavaliem os “desacertos do projeto”, para que sejam revistas as noções mais

fundamentais da modernidade, incluindo o próprio conceito de “Razão”; são “razões”

para que se mantenha a autonomia das esferas culturais, evitando reducionismos

36 BAUMAN, op.cit., 1998. Pág. 98.

37 Cf. SANTOS, Boaventura de Souza: Pela Mão de Alice: O social e o político na pós-modernidade. SP.

Cortez. 1997. Pág. 77.

38 Cf. JAMESON, op.cit., 1996. Pág. 25.

39 Entendo por “razões”, aqui, neste contexto, as justificativas críticas de revisão da modernidade – o

fundamento da reação cultural que vivemos – , que se têm tornado cada vez mais evidentes a partir da

crise na modernidade. Por outro lado, também uso “razões”, em “razões da Pós-modernidade ”, no

sentido mais fraco, de “razões” (ou justificativas), para o uso do termo “pós-modernidade”.

de qualquer espécie – seja do cientificismo, ou, na condição pós-moderna, do

esteticismo. A cultura pós-moderna não tem mais “Razão”, tem “razões”.

A sombra do irracionalismo paira na pós-modernidade, penetrando nos mais

diversos aspectos do “modo de vida global” que é a cultura. Segundo Jameson, a

“completa estetização da realidade” é tendência cultural dominante no universo pósmoderno.

Ainda que possamos delinear as “razões” da pós-modernidade como

“razões” críticas para a revisão dos descaminhos da modernidade, na cultura

contemporânea a opção do irracionalismo permanece sempre à disposição. Talvez

como a tentação capital do “demônio da improcedência da certeza”.

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