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Publicado por "Rebelión", em 2011/08/24: http://www.rebelion.org/noticia.php?id=134533
Tradução do castelhano de MF
Colocado em linha em: 2011/09/11
Somália, um desastre humano anunciado
Edmundo Fayanas Escuer
Este país tem uma extensão de 638 000 km2, sendo um território muito árido e seco.
Tem uma população de quase dez milhões de habitantes, com um rendimento per
capita de 460 dólares anuais. Cerca de 70% dos seus habitantes não têm acesso a
água potável. A desnutrição afecta 17% das crianças e há mais de 400 000 deslocados
internos. Com a actual seca todo este desastre humano disparou. A pesca artesanal é
uma das poucas actividades económicas que permitem à população sobreviver neste
caos somali.
Foi um protectorado britânico e italiano até aos anos sessenta e viveu nos seus
últimos cinquenta anos em conflitos armados contínuos, propiciados pelos diferentes
senhores da guerra.
A Somália está situada no corno de África, ocupando uma posição estratégica de
grande valor, pois está muito perto do estreito de Bab el Mandeb, passagem
fundamental para o comércio mundial, sobretudo para o petrolífero. Além disso, liga
a Arábia Saudita e o mar Vermelho ao golfo de Aden.
Na Somália não se nasce somali, faz-se parte de um clã. Há cinco grandes clãs.
Os hawiya representam 25% da população e ocupam a parte norte e centro, zonas
do sudoeste da Etiópia e do norte do Quénia.
Os ishaak abrangem 23% da população e ocupam a antiga colónia da Somália
britânica, conhecida como Somalilândia. Este grupo actua como um Estado dentro do
Estado, ainda que não seja reconhecido internacionalmente.
Os darod representam 20%, estando situados em Puntland, local onde a lenda situa
o antigo reino de Shaba, e num pedaço da Somalilândia.
O clã dos rahanwein, que apenas abarca 18%, situa-se no centro e sul do país, nas
proximidades de Djibouti e ainda num pedaço da Somalilândia.
O último clã é o mais pequeno, o dos digil, que representam 3%, juntamente com os
bantúes, que são os descendentes dos escravos libertos durante o colonialismo
italiano, a quem chamam loona aaraan, que traduzido significa «ninguém está a
chorar por eles».
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Em 1993, os Estados Unidos intervêm na Somália sob missão da ONU, com a
desculpa da ajuda humanitária, mas procurando unicamente defender os interesses
das multinacionais petrolíferas norte-americanas (Chevron, Mobil, Amoco…),
instaladas no país desde 1952. A missão «Restaurar a esperança» traduz-se pelo
confronto entre as tropas norte-americanas e os senhores da guerra. Em Outubro de
1993 deu-se a batalha de Mogadíscio, que se saldou pela saída das tropas norteamericanas,
sem terem conseguido nenhum dos objectivos propostos, deixando a
Somália submetida aos senhores da guerra.
Depois da queda do ditador Said Barre, em 1991, centenas de navios de pesca de todo
o mundo viram a possibilidade de pescar livremente nos ricos bancos de pesca
somalis e zonas próximas sem qualquer tipo de controlo (nem de redes, nem de
espécies, nem de custo económico para os armadores), o que propiciou o seu
enriquecimento, em detrimento dos interesses da Somália, saltando sobre os acordos
internacionais sobre águas jurisdicionais dos países. Quem são então os piratas?
Que diriam e fariam os norte-americanos se isto se passasse nas suas
costas?
Abdirahman Ibbi, vice-ministro da pesca do governo somali de transição, considera
que há cerca de 220 pesqueiros estrangeiros pescando nas suas águas e acrescenta:
«a frota pesqueira espanhola também está a pescar ilegalmente nos nossos bancos
de pesca».
Não bastando o escândalo da pesca em águas somalis, as grandes potências usam as
suas águas e o seu território como lixeira de substâncias que os seus países não
querem. Isto tornou-se claro no rescaldo do tsunami de 2005, no Oceano Índico. O
enviado das Nações Unidas na Somália comentou: «A Somália está a ser utilizada
como lixeira de resíduos perigosos desde o começo dos anos noventa e continua a
sê-lo com a guerra civil iniciada nesse país. O lixo é de géneros muito diversos. Há
resíduos radioactivos de urânio e metais pesados, como cádmio e mercúrio. Há
também lixo industrial, resíduos de hospitais, lixo de substâncias químicas e tudo o
que se possa imaginar».
A zona de Puntland, situada no noroeste do país – que foi uma antiga colónia italiana
e se declarou autónoma da Somália em 1998 –, converteu-se num santuário dos
piratas, apoiados maioritariamente pela sua população. Agora os piratas não só
atacam os pesqueiros mas também qualquer tipo de navio.
Depois da sua saída, os norte-americanos financiaram estes senhores da guerra
laicos, que fizeram uma aliança contra os islamitas. O catedrático de história pela
Universidade de Harvard, Niall Ferguson escreve no The Angeles Times: «pelo
menos durante a guerra fria podia dar-se de barato que o nosso filho da puta (o
nosso dirigente anticomunista) imporia uma modalidade brutal de ordem. Agora,
em plena guerra contra o terrorismo, os Estados Unidos preferem um país dividido
entre múltiplos filhos da puta a um país governado pela lei da sharia. Contudo,
quanto mais a política externa de Washington promover a anarquia em vez da
ordem, mais forte será o atractivo dos movimentos islamitas». Isto reforçou o
prestígio dos islamitas, que derrotam em Junho de 2006 os senhores da guerra,
unificando a capital pela primeira vez desde 2001. O seu avanço para o sul fez temer
um contágio ao Quénia e à Tanzânia.
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Os Tribunais Islâmicos triunfantes puseram ordem no país, o que lhes granjeou
simpatia nos comerciantes e permitiu às ONG voltar a trabalhar.
Os norte-americanos empurraram um dos países mais pobres do mundo, a Etiópia, a
invadir a Somália. Com o apoio norte-americano, derrotaram rapidamente os
Tribunais Islâmicos que tinham conseguido pacificar o país desde 1991. Este
movimento islâmico era uma solução caseira para uma anarquia interminável, devida
em grande parte às intervenções estrangeiras, com origem no passado colonial.
O Pentágono impulsionou a intervenção da Etiópia cristã através de um programa de
ajuda militar desde 2002 e pôs ao seu serviço os meios de reconhecimento aéreo e de
escuta via satélite para a ofensiva somali.
Por que intervém a Etiópia na Somália?
Além de satisfazer os Estados Unidos, procura que a Somália continue instável de
forma a impedi-la de se tornar num país forte que possa reclamar a soberania sobre o
Ogaden, região etíope que se encontra habitada pelo clã dos Hawiya e que provocou
uma guerra entre os dois países (1977-1978).
Enquanto tudo isto sucede, os Estados Unidos, a União Europeia e a comunidade
internacional olham para o lado e permanecem indiferentes à grande dor e miséria
existentes na Somália e calam-se perante os desastres ambientais que provocam.
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