A Ética utilitarista pensa o ato moral através da soma de prazeres ou bens que se podem alcançar, ou a diferença entre essa soma e a soma dos desprazeres ou desvantagens.
A Ética kantiana pensa o ato moral sem relação alguma com sensações, interesses ou consequências; o dever é incondicional e só assim tem valor o ato.
O defeito da primeira conceção é que desvaloriza e banaliza o ato moral e tende a admitir como morais (dotados de valor) o interesse egoísta; conceção boa para o individualismo que é o núcleo do liberalismo.
O defeito da segunda é que apesar de ser ou querer ser universalista, ao contrário da anterior, o dever que universaliza e a todos obriga é abstrato, é de pouca ou nenhuma utilidade prática.
Torna-se necessária uma ética que concilie o particular com o universal. Somente a Dialética (na versão hegeliano-marxiana) possibilita. É necessário, assim, recorrer a um conjunto de categorias instrumentais: contradições antagónicas ou não antagónicas, processo (movimento produzido pelas contradições), corpos-matéria-natureza, relações e interações. Eis algumas, porventura as principais.
Sem corpos não havia necessidade de moral alguma. Esta materialidade conjuga-se no plural e dispõe de linguagem e autoconsciência.
Sem as situações concretas, os contextos sociais, as relações e os corpos sensíveis, sem indivíduos singulares inseridos em sociedades (ou grupos anteriores às sociedades organizadas agrárias), sem recolha de bens (alimentos, vestuário) arrancados à natureza ou bens produzidos por trabalho, não era necessária moral alguma.
A moral (as primeiras formas de moralidade, isto é, de regras, deveres, proibições, repressões, prestígios) é anterior às sociedades, isto é, às formações económico-sociais (agrárias, artesanais, comerciais e mais tarde industriais). Portanto, é anterior às classes sociais, aos Estados, à propriedade privada, ao monopólio da violência pelo poder centralizado e legitimado. Portanto, a origem da moral não foi a repressão (como pensou Theodor Adorno), mas a sobrevivência da família clânica recoletora, e os seus ritos sobre a doença e a morte, o respeito pela natureza e os primeiros mitos que explicavam a ligação entre os ascendentes e os descendentes. Passou a ser fundamentalmente repressão quando, gradualmente e não de supetão, se organizaram aldeias-cidades com territórios e propriedades que se disputavam.
Por conseguinte, um ato é moral ou não de acordo com determinados valores (coisas, pessoas, às quais é atribuído valor dentro de uma determinada hierarquia de importância). Estes valores são universais e particulares. No segundo caso quando constituem , ou constituíram no passado distante, regras tradicionais (sujeitas sempre a alterações com sucede com as interpretações que as seitas fazem dos seus livros sagrados) ligadas às experiências concretas, às práticas de uma etnia ou de uma nação. No primeiro caso quando o mundo se converteu numa "aldeia global", gradualmente. E, gradualmente, determinados valores (alguns dos quais sempre existiram) tornaram-se por consenso (por acordos jurídicos ou outros consentimentos) são atualmente deveres e direitos universais.
Falta torná-los reais. Dotados de condições ou meios que possibilitem a sua concretização (aplicação universal de direitos e sanções sobre os indivíduos que não cumprem os deveres universais correlativos aos direitos).
Por isso, a Justiça é um direito e um dever. Contudo, é passível de interpretações diversas, algumas até díspares, dependente da definição e carente de meios. É assim que tem sucedido no decurso da vida das formações económico-sociais diversas, já extintas ou existentes.
Por conseguinte, não é possível uma moral universal, nem realista pensar que algumas regras jurídicas possam institui-la. A moral de mandamentos universais (universalizantes) é meramente instrumental para fins políticos particulares.
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