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terça-feira, 31 de outubro de 2023

Estranhas palavras- Utopias e distopias

 

ESTRANHAS PALAVRAS-3-

AS DISTOPIAS

 

Thomas More inaugurou a expressão “UTOPIA” em 1516 com o seu celebérrimo livrinho homónimo. U-topos, não-lugar, lugar puramente imaginário e tudo o que lá se passaria. As distopias expressam o contrário : não é o bom que reina , mas o mau que virá. Nas narrativas utópicas (novelas, doutrinas) parte-se dos males presentes para uma sociedade alternativa completamente oposta (perfeita ou progressivamente muito melhor). Por vezes apresentam-se como o  puro otimismo, ou esperança salvífica que pode surgir do mal absoluto (o Fim do Mundo), sendo este até, em certas narrativas, absolutamente necessário para que brote o Bem absoluto (eterno) ; ou nas narrativas utópicas mais reconhecidas (em T. More, Campanella, Cabet, etc.) imagina-se uma alternativa aos males do presente sem necessidade de um “Juízo Final”. Ora, nas distopias ficcionadas, o futuro é tão feio e mau que angustia o leitor ou espectador, sendo que o que virá é a soma das consequências das realidades do que é ; o presente contém já a tendência, possibilidade, senão mesmo inevitabilidade desse futuro. A meu ver a primeira ficção distópica foi escrita por Mary Shelley (1797-1851), “Frankenstein”, na qual avisa da ameaça das tecnologias; em seguida, relevo a novela “A Máquina do Tempo”, do famoso escritor britânico H. G. Wells (1895), pioneiro da literatura de ficção científica (FC), género que recebeu um impulso na década de cinquenta do século passado com o horror do holocausto nuclear e vem alcançando novamente sucessivos sucessos no cinema norte-americano. A distopia, na forma de novelas, não começou com “Mil Novecentos e Oitenta e Quatro”, de George Orwell (1949), como se diz, livro que tem sido largamente utilizado como arma ideológica.

   Não cabe aqui exemplificar as distopias com a multiplicidade de livros (alguns já nobelizados ou que o mereciam) publicados seja em coleções de FC ( Philip K. Dick) seja como literatura do primeiro género (A Estrada, de Cornac McCarty), desde a segunda metade do século vinte, com temas distópicos.

  Karl Marx não foi um utopista, como sabem todos os que o leram realmente. As utopias socialistas da sua época (muito populares em França no século dezoito, do Iluminismo e da Revolução Francesa, transbordando para a primeira metade do século posterior, algumas das quais foram experimentadas) foram criticadas por esse pensador, não pela imaginação livre que a literatura se permite, mas pelos efeitos políticos mais negativos que positivos e pela sua conceção de que utopia significa mesmo “o impossível”. Evidentemente que distópicos também não são os seus textos, muito embora a sociedade capitalista tivesse sido por ele escalpelizada em “O Capital” em todos seus malefícios arreigados nas suas estruturas económicas e sociais (culturais, políticas, psicológicas). E não podem sê-lo porque os seus estudos científicos haviam sido precisamente dedicados à finalidade de demonstrar que o capitalismo criara “ o seu coveiro”. As classes sociais dos trabalhadores, os povos grosso modo, aproveitarão os progressos que eles mesmos, no capitalismo, criaram em condições de submissão assalariada, para planificarem a produção e associarem-se pelas formas que entenderem.

  Como a sua influência tem sido imensa, escritores (e cineastas) inspirados pelas suas teses, têm investigados a vida nas sociedades contemporâneas à luz dos conceitos negativos de “Alienação” ou “Estranhamento”, “Feiticismo da Mercadoria”, e outros, para se compreender sentires objetivos e coletivos de infelicidade e doença mental, de “consumismo”, de “submissão voluntária” , “autofagia do capitalismo”, dominação da natureza. Assiste-se a uma notória prevalecência do pessimismo na cultura norte-americana (as distopias!) que, sendo ainda hegemónica, é transmitida aos europeus. A meu ver, dos terríevis males a que assistimos, emergem respostas que prefiguram uma nova época. Será isto expressão (outra estranha palavra!) da DIALÉTICA?

  ..........NOZES PIRES----01/10/2023

   

   

   

 

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