Lukács e o papel da arte na dinâmica de autoconstrução humana
Longe de constituir um corpo normativo, cujo objetivo seria o de identificar a “verdadeira obra de arte”, o que o leitor tem diante de si é um conjunto de reflexões de extraordinária riqueza que Lukács articula a partir de filósofos e historiadores da arte, assim como – é claro – de obras específicas pertencentes à literatura, às artes plásticas, à música, à dança, à arquitetura e até mesmo à jardinagem.
Por Ester Vaisman
O lançamento do primeiro volume de A peculiaridade do estético vem agregar à já afamada Biblioteca Lukács a obra que representa o ponto culminante dos escritos de György Lukács publicados em vida. Traduzido diretamente do alemão para o português por Nélio Schneider e com revisão técnica de Ronaldo Vielmi Fortes, o volume traz ainda a apresentação elaborada por José Paulo Netto, que se debruça sobre o itinerário do filósofo húngaro até a publicação de sua “grande estética”, como a obra é também conhecida.
Publicado inicialmente em 1963, o livro se destaca por sua originalidade e pela riqueza na análise do fenômeno artístico, diferenciando-se não somente dos tratamentos clássicos do tema, mas também daquelas abordagens do campo marxista que tentaram desvelar apenas o seu significado histórico-social.
A abordagem lukacsiana, ao tomar a vida cotidiana como âmbito em que se dá a gênese da produção artística, indaga sobre o papel da arte na dinâmica de autoconstrução humana, identificando, no processo de antropomorfização que lhe é característico, o meio pelo qual a peculiaridade da obra de arte vem à tona: sempre como uma refiguração da realidade objetiva, seu resultado é uma figura particular capaz de evocar os mais variados sentimentos no momento em que é recebida e experienciada.
O leitor interessado encontrará nos quatro capítulos que compõem o volume, assim como nos demais a serem publicados, uma argumentação profunda, lúcida e criteriosa que evidencia o papel da criação artística: a elevação da subjetividade, concebida sempre em contato múltiplo e aprofundado com o mundo objetivo e suas determinações. Tal modo de tematizar a relação subjetividade-objetividade na criação artística revela os traços mais significativos do enraizamento de Lukács no pensamento de Marx.
Longe de constituir um corpo normativo, cujo objetivo seria o de identificar a “verdadeira obra de arte”, o que o leitor tem diante de si é um conjunto de reflexões de extraordinária riqueza que Lukács articula a partir de filósofos e historiadores da arte, assim como – é claro – de obras específicas pertencentes à literatura, às artes plásticas, à música, à dança, à arquitetura e até mesmo à jardinagem.
O primeiro volume da Estética, monumental obra de György Lukács publicada
em 1963, é leitura imprescindível para a compreensão do pensamento
lukacsiano sobre o fenômeno artístico. A edição brasileira será dividida
em quatro volumes (a original foi publicada em dois) e será entregue
anualmente ao leitor. Estética: a peculiaridade do estético – Volume 1 traz
reflexões de Lukács sobre a experiência estética, o papel da arte, da
ciência, da cultura e da política na sociedade: “Há características que
singularizam o empreendimento lukacsiano realizado na Estética – e uma
delas, de evidência inquestionável, consiste em que esse empreendimento
constitui a formulação mais desenvolvida de uma estética sistemática
produzida no interior da tradição marxista”, escreve José Paulo Netto na
apresentação da obra.
Direcionadas para o conhecimento da
peculiaridade do estético, este texto aborda âmbitos da vida humana como
a religião, a ciência, a ética, a psicologia e outras formas de
inter-relacionamento no âmbito de ser e estar no mundo. Sessenta anos
depois da sua publicação em alemão, o leitor brasileiro terá contato com
a primeira edição da obra em português, com tradução direta do idioma
original feita por Nélio Schneider, revisão técnica de Ronaldo Vielmi Fortes, apresentação de José Paulo Netto e orelha de Ester Vaisman.
“A Estética permanece o monumento mais expressivo dos textos publicados por Lukács durante sua vida.”
NICOLAS TERTULIAN
“Este é um
empreendimento gigantesco para a clarificação dos dois principais
âmbitos relacionados com a arte: o do processo que a gera – e nela
determina a sua própria natureza, o seu específico ser-para-si estético –
e o das funções que ela cumpre na vida social humana.”
GUIDO OLDRINI
“Em Lukács, a
teorização relativa à arte esteve sempre ligada à prática da crítica
concreta de obras de arte. Essa sistematização estética não foi obra de
um filósofo que se debruçou aleatoriamente sobre obras de arte e se
dedicou, com diligência e zelo, a teorizar sobre elas ou a partir delas.
A Estética resultou de análises críticas de obras de arte
significativas do acervo cultural da humanidade, que se articularam numa
incessante pesquisa que conjugou o trato crítico dessas obras com
elaborações estético-filosóficas.”
JOSÉ PAULO NETTO
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