Ouvi com muito interesse o último debate do programa «Plano inclinado» da SICN. O convidado era,desta vez, Carvalho da Silva, secretário-geral da CGTP. Foi dos melhores debates, senão o melhor. E porquê? Porque nunca, ou mui poucas vezes, o contraditório foi tão visível. Normalmente quem lá vai como convidado fica ou intimidado com as constantes diatribes catastrofistas do Dr. Medina Carreira, ou fica sem argumentos, porque, no fundo, concorda com ele. Concorda, sobretudo, com as soluções que o próprio propõe ou insinua (insinua mais do que propõe). O outro comentador residente, Dr. João Duque (creio ser este o nome), professor universitário de economia, sendo mais moderado nas intervenções, goza daquele halo (como se diz em Psicologia Social) que converte aquilo que ele diz em «verdades» mais convincentes. Mas, afinal, é apenas um efeito das "impressões" e das "expectativas": o que ele diz e pensa é, provavelmente, mais ultra-liberal do que do próprio fogoso Medina Carreira. Para ambos ser-se «pragmático» (leia-se «realista», não utópico), de que se gabam de resto, é aceitar-se o mundo tal qual ele é (leia-se: o sistema capitalista regido pelo ultra-liberalismo). A globalização (a economia mundial) e a pertença à UE, impõem condições que não possibilitam outra saída senão "adaptar-se"; porém, seguindo-se a lógica do raciocínio deles nem a "adaptação" é possível, o que resta é realmente a submissão. Deduz-se, então, que estarão de acordo com as políticas deste governo; mas não (pelo menos da parte de Medina Carreirra). Em que ficamos? É que pretendem mais destas políticas: mais ultra-liberalismo, menos intervenção do estado. Por exemplo: ambos não se cansam de repetir que o Estado gasta quase tudo em despesas sociais (Saúde, Ensino, etc.). Logo, conlui-se necessariamente que o Estado, para não «bater contra a parede» (MC), deve reduzi-las ao mínimo (ou eliminá-las). Então, quem abocanharia esses serviços? Necessariamente o sector privado. Defende o actual PSD outra coisa? Não. Deste modo, por detrás das diatribes catastrofistas (sempre escoradas na doutrina monetarista neo-liberal) perfila-se com mais ou menos astúcia o pensamento dos dois partidos alternantes, do PSD em primeiro lugar (Sócrates pensa o mesmo mas fá-lo mais gradualmente por motivos eleitorais). O congelamento dos salários foi defendido por ambos (e até o seu abaixamento) e a culpa da pouca competitividade (para as exportações) dever-se-ia à produtividade baixa dos trabalhadores portugueses (portanto, também os salários demasiado altos). Todas estas teses são por demais repetidos pela propaganda capitalista (são as teses, velhas de séculos, do grande e médio patronato lusitano).
Carvalho da Silva insistiu na necessidade urgente de uma outra distribuição da riqueza. Os interlocutores acham que isso é «romantismo» e «moralismo», seja como for consideram que isso leva muito tempo a conseguir-se, o que significa: «Deixe lá isso, e tratemos do que interessa». Já ouvimos dizer ao Dr. Medina Carreira que uma profunda reforma da educação pode ser muito necessária mas leva «décadas», portanto, «Falemos do que interessa». E falar do que interessa para eles não é o dinheiro que o Estado injectou na banca para a «salvar», em vez de de transformá-lo em investimento produtivo e social. Falar do que interessa para eles é «poupar», nos salários e nas prestações sociais, é claro; não é taxar os lucros especulativos, aumentar o imposto aos bancos ou impô-lo aos off-shores.
Para MC os sindicatos portugueses são «demasiado reivindicativos» (referia-se à CGTP, com certeza, pois que a UGT faz o que pode para apoiar os governos). O que seria, nessa óptica, um sindicalismo não reivindicativo?? Provavelmente um sindicalismo corporativo. Apre! Tivemo-lo quase sessenta anos...
2 comentários:
Espantada com o formato da janela de comentários: espero que seja funcional!
Relativamente ao debate, a nálise aue aqui é feita espelha realmente a parcialidade do programa . Acho que João Duque está mais em papel decorativo do que outra coisa. Medina Carreira , seria bom que apresentasse soluções.
Gostei da posição de Cravalho da Silva. Mas seria bom não se deixar irritar, para não dar o flanco.
Uma semana boa.
Uma boa semana também para ti, São.
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