Translate

terça-feira, 31 de maio de 2011

in Oesteonline
Torres Vedras


PCP promete levar aterro à Assembleia da República



Nozes Pires

A concelhia de Torres Vedras, do Partido Comunista Português, tenciona levar, à Assembleia da República, o caso do aterro de resíduos que a empresa espanhola Befesa quer construir no concelho, entre a cidade de Torres Vedras e a vila de A-dos-Cunhados.

A revelação foi feita por Nozes Pires, líder da bancada CDU na Assembleia Municipal de Torres Vedras em conferência de imprensa.

“Nós havemos de colocar na assembleia da república, agora não, porque estamos em período eleitoral, mas, no seu devido tempo, isto vai chegar à Assembleia da República através do PCP”, garantiu o membro da Assembleia Municipal de Torres Vedras.

Para já, o PCP vai propor a realização de uma Assembleia Municipal extraordinária, “dedicada exclusivamente à discussão da implementação dos aterros”.

Uma proposta que “terá dificuldade em ser aprovada, face à maioria absoluta do PS”, admite Nozes Pires.

Mas o objectivo do PCP é chegar mesmo a um referendo sobre a instalação do aterro naquele local do concelho.

“Estaremos dispostos a apresentar aí, (na assembleia extraordinária), uma proposta de referendo, ao abrigo da lei, para que a população, dessa forma extraordinária e perfeitamente legítima e democrática, possa manifestar então de vez o seu parecer relativamente à implementação dos aterros”, revelou.

A instalação do aterro de resíduos não perigosos entre a cidade de Torres Vedras e a vila de A-dos-Cunhados está a mobilizar a população local com sessões de esclarecimento e com um abaixo-assinado, contestando a localização, que reuniu duas mil assinaturas.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Tradução do conteúdo do Memorando Governo/Tróika (excertos)

Tradução do conteúdo do


MEMORANDO DE ENTENDIMENTO SOBRE AS CONDICIONALIDADES DE POLÍTICA ECONÓMICA


Nota: O idioma da versão original e oficial do Memorando em referência é o inglês. A presente  versão em português corresponde a uma tradução do documento original e é da exclusiva responsabilidade do Governo português. Em caso de eventual divergência entre a versão inglesa e a portuguesa, prevalece a versão inglesa.


17 de Maio de 2011
 
 
1.8.Reduzir custos na área de educação, tendo em vista a poupança de 195 milhões de euros,


através da racionalização da rede escolar criando agrupamentos escolares, diminuindo a necessidade

de contratação de recursos humanos, centralizando os aprovisionamentos, e reduzindo e

racionalizando as transferências para escolas privadas com contratos de associação.
1.9. Assegurar que o peso das despesas com pessoal no PIB diminua em 2012 e em 2013 [T2‐2012


para a avaliação; T2‐2013 para concluir o processo]:

i. limitar admissões de pessoal na administração pública para obter decréscimos anuais em

2012‐2014 de 1% por ano na administração central e de 2% nas administrações local e

regional. [T3‐2011]

ii. congelar salários no sector público, em termos nominais, em 2012 e 2013, e limitar

promoções.

iii. reduzir o custo orçamental global com sistemas de saúde dos trabalhadores em funções

públicas (ADSE, ADM e SAD) diminuindo a comparticipação da entidade empregadora e

ajustando o âmbito dos benefícios de saúde, com poupanças de 100 milhões de euros

em 2012.

1.10. Controlar os custos no sector da saúde, com base nas medidas detalhadas adiante no ponto

sobre “Sistema Nacional de Saúde”, obtendo poupanças de 550 milhões de euros.

1.11. Reduzir as pensões acima de 1.500 euros, de acordo com as taxas progressivas aplicadas às

remunerações do sector público a partir de Janeiro de 2011, com o objectivo de obter poupanças de,

pelo menos, 445 milhões de euros.

1.12. Suspender a aplicação das regras de indexação de pensões e congelar as mesmas, excepto para

as pensões mais reduzidas, em 2012.

1.13. Reformar as prestações de desemprego com base nas medidas adiante indicadas no ponto

sobre “Mercado de trabalho e educação”, obtendo poupanças de 150 milhões de euros a médio

prazo.

1.14. Reduzir, em pelo menos 175 milhões de euros, as transferências para as administrações local e

regional, no âmbito do contributo deste subsector para a consolidação orçamental.

domingo, 29 de maio de 2011

Documentos históricos

Manifesto dos Iguais


Gracchus Babeuf

1796

--------------------------------------------------------------------------------

Primeira Edição: ........

Fonte: Mundo do Socialismo.

Tradução:........

Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo, maio 2006.

Direitos de Reprodução: A cópia ou distribuição deste documento é livre e indefinidamente garantida nos termos da GNU Free Documentation License.

--------------------------------------------------------------------------------


Povo da França!

Durante perto de vinte séculos viveste na escravidão e foste por isso demasiado infeliz. Mas desde há seis anos que respiras afanosamente na esperança da independência, da felicidade e da igualdade.

A igualdade! - primeira promessa da natureza, primeira necessidade do homem e elemento essencial de toda a legítima associação! Povo da França, tu não ficaste mais favorecido do que as outras nações que vegetam sobre esta mísera terra! Sempre e em qualquer lado, a pobre espécie humana, vítima de antropófagos mais ou menos astutos, foi joguete de todas as ambições, pasto de todas as tiranias. Sempre e em qualquer lado se adulou os homens com belas palavras, mas nunca e em lugar nenhum obtiveram eles aquilo que, através das palavras, lhes prometeram. Desde tempos imemoriais se vem repetindo hipocritamente: os homens são iguais. Mas desde há longo tempo que a desigualdade mais vil e mais monstruosa pesa insolentemente sobre o gênero humano.

Desde a própria existência da sociedade civil, o atributo mais belo do homem vem sendo reconhecido sem oposição, mas nem uma só vez pôde ver-se convertido em realidade: a igualdade nunca foi mais do que uma bela e estéril ficção da lei. E hoje, quando essa igualdade é exigida numa voz mais forte do que nunca, a resposta é esta: "Calai-vos, miseráveis! A igualdade não é realmente mais do que uma quimera; contentai-vos com a igualdade relativa: todos sois iguais em face da lei. Que quereis mais, miseráveis?" Que mais queremos? Legisladores, governantes, proprietários ricos; é agora a vossa vez de nos escutardes.

Todos somos iguais, não é verdade? Este é um princípio incontestável, porque ninguém poderá dizer seriamente, a não ser que esteja atacado de loucura, que é noite quando se vê que ainda é dia. Pois bem, o que pretendemos é viver e morrer iguais já que como iguais nascemos: queremos a igualdade efetiva ou a morte.

Não importa qual o preço, mas havemos de conquistar essa igualdade real. Ai daqueles que se interponham entre ela e nós! Ai de quem se oponha a um juramento formulado desta forma!

A Revolução Francesa não é mais do que a vanguarda de outra revolução maior e mais solene: a última revolução.

O povo passou por cima dos corpos do rei e dos poderosos coligados contra ele; e assim acontecerá com os novos tiranos, com os novos tartufos políticos sentados no lugar dos velhos.

De que mais precisamos além da igualdade de direitos?

Temos apenas necessidade dessa igualdade, da qual resulta a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão: queremos vê-la entre nós, sob o teto das nossas casas. Estamos dispostos a tudo, a fazer tábua-rasa de tudo o mais, apenas para conservar a igualdade. Pereçam, se for necessário, todas as artes, desde que se mantenha de pé a igualdade real!

Legisladores e governantes, com tão pouco engenho como boa fé, proprietários ricos e sem coração, em vão tentais neutralizar a nossa sagrada missão dizendo: "Eles não fazem mais do que reproduzir aquela lei agrária exigida já por diversas vezes no passado".

Caluniadores, calai-vos pela vossa parte e, em silêncio de confissão, escutai as nossas pretensões, ditadas pela natureza e baseadas na justiça.

A lei agrária, ou a divisão da terra, foi aspiração momentânea de alguns soldados sem princípios, de algumas populações incitadas pelo seu instinto mais do que pela razão. Nós temos algo de mais sublime e de mais eqüitativo: o bem comum, ou a comunidade de bens! Nós reclamamos, nós queremos desfrutar coletivamente dos frutos da terra: esses frutos pertencem a todos.

Declaramos que, posteriormente, não poderemos permitir que a imensa maioria dos homens trabalhe e esteja ao serviço e ao mando de uma pequena minoria.

Há muito tempo já que menos de um milhão de indivíduos tem vindo a dispor de quanto pertence a mais de vinte milhões de semelhantes seus, de homens que são em tudo iguais a eles.
Devemos pôr termo a este grande escândalo, que os nossos netos não quererão acreditar possa ter existido! Devemos fazer desaparecer, finalmente, essas odiosas distinções de classes entre ricos e pobres, entre grandes e pequenos, entre senhores e servos, entre governantes e governados.



Que entre os homens não exista mais nenhuma diferença do que aquela que lhes é dada pela idade e pelo sexo. E, porque todos temos as mesmas necessidades e as mesmas faculdades, que exista, portanto, uma única educação para todos e um idêntico regime de alimentação. Toda a gente se sente satisfeita por dispor do sol e do mesmo ar que respira. Porque não há de acontecer o mesmo com a quantidade e a qualidade dos alimentos?
Mas é verdade que já os inimigos da ordem de coisas mais natural que imaginar se possa protestam e clamam contra nós.
Desorganizadores e facciosos, dizem-nos eles, vós só desejais que exista anarquia e massacre.

Povo da França!
Não desejamos perder tempo a responder a esses senhores, mas a ti dizemos-te: a sagrada tarefa em que estamos empenhados não tem outro objetivo que não seja pôr termo às lutas civis e à miséria pública.

Nunca foi concebido e posto em execução um plano mais vasto do que este. De vez em quando, alguns homens de talento, homens inteligentes, falaram em voz baixa e temerosa desse plano. Mas nenhum deles, claro, teve a coragem necessária para dizer toda a verdade.

Chegou a hora das grandes decisões. O mal encontra-se no seu ponto culminante, está a cobrir toda a face da terra. O caos, sob o nome de política, há já demasiados séculos que reina sobre ela. Que tudo volte, pois, a entrar na ordem exata e que cada coisa torne a ocupar o seu posto. Ao grito de igualdade, os elementos da justiça e da felicidade estão a organizar-se. Chegou o momento de fundar a República dos Iguais, este grande refúgio aberto a todos os homens. Chegaram os dias da restituição geral. Famílias sacrificadas, vinde todas sentar-vos à mesa comum posta para todos os vossos filhos.

Povo da França!

A ti estava, pois, reservada a mais esplendorosa de todas as glórias! Sim, tu serás o primeiro que oferecerá ao Mundo este comovedor espetáculo.

Os hábitos inveterados, os antigos preconceitos, farão novamente tudo para impedir a implantação da República dos Iguais. A organização da igualdade efetiva, a única que satisfaz todas as necessidades sem provocar vítimas, sem custar sacrifícios, talvez em princípio não agrade a todos. Os egoístas, os ambiciosos, rugirão de raiva. Os que conquistaram injustamente as suas possessões dirão que está a cometer-se uma injustiça em relação a eles. Os prazeres individuais, os prazeres solitários, as comodidades pessoais, serão motivo de grande pesar para os indivíduos que sempre se caracterizaram pela sua indiferença ante os sofrimentos do próximo. Os amantes do poder absoluto, os miseráveis partidários da autoridade arbitrária, baixarão pesarosos as suas soberbas cabeças perante o nível da igualdade real. A sua visão estreita dificilmente penetrará no próximo futuro da felicidade comum. Mas que podem fazer alguns milhares de descontentes contra uma massa de homens completamente satisfeitos de terem procurado durante tanto tempo uma felicidade que sempre tiveram à mão?

Logo que se verificar esta autêntica revolução, estes últimos, estupefatos, dirão uns aos outros: "Como custava tão pouco conseguir a felicidade comum! Era necessário apenas ter o desejo de alcançá-la. E por que não fizemos isso há mais tempo?" Será preciso repetir sempre uma e outra vez? Sim, sem dúvida, basta que sobre a terra um homem seja mais rico e mais poderoso do que os seus semelhantes, do que os seus iguais, para que o equilíbrio se quebre e o crime e a desgraça invadam o Mundo.

Povo da França!
Quais os sinais que nos permitem reconhecer as qualidades de uma Constituição? Aquela que se apóia integralmente sobre a igualdade é, na realidade, a única que te convém, a única que satisfaz as tuas aspirações.

As cartas aristocráticas dos anos 1791 e 1795, em vez de romper as tuas cadeias, vieram consolidá-las. A de 1793 supôs ser um grande passo no sentido da igualdade real, mas não conseguiu todavia esse objetivo e não apontou diretamente para a igualdade comum, embora consagrasse solenemente o grande princípio dessa igualdade.

Povo da França!

Abre os olhos e o coração para a plenitude da felicidade; reconhece e proclama conosco a República dos Iguais.


nota: Primeira declaração socialista e comunista do mundo.
in http://www.arquivo/ marxista na internet

sexta-feira, 27 de maio de 2011

A SÍRIA E O IMPERIALISMO DOS EUA

por Sara Flounders

Quando o imperialismo dos EUA se empenha num ataque a qualquer governo ou movimento, os movimentos políticos dos trabalhadores e dos progressistas para uma transformação precisam forçosamente de reunir o maior número de informações disponíveis e assumir uma posição.

É uma cobardia manter-se neutro e é uma traição alinhar com o polvo imperialista, que procura dominar o mundo.

Isto é o ABC dos movimentos dos trabalhadores ao longo dos 150 anos de lutas com consciência de classe. É a própria base do marxismo. Reflecte-se nas canções sindicais que lançam o desafio "De que lado é que estás?" e por intermédio dos dirigentes sindicais que explicam vezes sem conta: "Uma ofensa feita a um é uma ofensa feita a todos".

O mundo árabe está a ser abalado por uma explosão social. O imperialismo americano e todos os antigos regimes da região a ele ligados estão a tentar desesperadamente gerir e conter esta revolta de massas, que ainda está em evolução, canalizando-a de modo a não ameaçar o domínio imperialista na região.

Os EUA e os seus colaboradores também estão a tentar dividir e corroer as duas alas de resistência – as forças islâmicas e as forças nacionalistas seculares – que, em conjunto, derrubaram as ditaduras apoiadas pelos EUA no Egipto e na Tunísia. Há neste momento um esforço concertado dos EUA para virar essas mesmas forças políticas contra dois regimes na região que se têm oposto ao domínio dos EUA no passado – a Líbia e a Siria.

Tanto a Líbia como a Síria têm os seus problemas de desenvolvimento, que são exacerbados pela crise geral do capitalismo global e por décadas de compromissos que lhes foram impostos quando tentavam sobreviver num ambiente hostil de ataques permanentes – políticos, por vezes militares, e que incluíam sanções económicas.

Os bombardeamentos dos EUA/NATO sobre a Líbia clarificaram a posição do imperialismo em relação a este país. Os exploradores transnacionais estão apostados em apoderar-se totalmente das mais ricas reservas de petróleo da África e eliminar os milhares de milhões de dólares com que a Líbia estava a contribuir para o desenvolvimento de países africanos muito mais pobres.

A Síria também é um alvo do imperialismo – por causa da sua heróica defesa da resistência palestina durante décadas e da sua recusa em reconhecer a ocupação sionista. Não podemos esquecer o apoio da Síria ao Hezbollah na sua luta para acabar com a ocupação israelense do Líbano e a sua aliança estratégica com o Irão.

Embora seja difícil compreender uma grande parte da situação interna da Síria, é importante assinalar que, nesta luta em curso, apareceram nítidas declarações de apoio ao governo sírio e contra as tentativas dos EUA de desestabilização vindos de Hugo Chávez da Venezuela, do secretário geral do Hezbollah Seyyed Hassan Nasrallah do Líbano e de diversos dirigentes exilados do Hamas, a organização palestina que foi eleita pela população de Gaza. Estes líderes políticos têm sofrido campanhas de desestabilização dos EUA que utilizaram maquinações dos media empresariais, de grupos da oposição financiados a partir do exterior, de assassínios programados, de operações especiais de sabotagem e de operacionais da Internet bem treinados.

Do lado da supostamente "oposição democrática" estão reaccionários como o senador Joseph Lieberman, presidente da poderosa Comissão de Segurança Nacional do Senado, que apelou ao bombardeamento da Síria a seguir ao da Líbia. Os veementes apoiantes da oposição na Síria incluem James Woolsey, antigo director da CIA e conselheiro da campanha presidencial do senador John McCain.

A Wikileaks denuncia o papel dos EUA

Um artigo intitulado "Os EUA apoiaram secretamente grupos da oposição síria", de Craig Whitlock (Washington Post, 18 de Abril) descreveu com grande pormenor as informações contidas em telegramas diplomáticos americanos que a Wikileaks enviou a agências noticiosas de todo o mundo e publicou no seu sítio web. O artigo resume o que esses telegramas do Departamento de Estado revelam sobre o financiamento secreto de grupos políticos da oposição, incluindo a difusão de programação anti-governamental no país através de televisão por satélite.

O artigo descreve esses esforços, financiados pelos EUA, como fazendo parte de uma "campanha já antiga para derrubar Bashar al-Assad, o líder autocrático do país" que assumiu o poder durante o mandato do presidente George W. Bush e continuou com o presidente Barack Obama, apesar de Obama ter afirmado estar a reconstruir as relações com a Síria e ter enviado um embaixador para Damasco pela primeira vez em seis anos.

Segundo um telegrama de Abril de 2009 assinado pelo principal diplomata americano em Damasco na altura, as entidades sírias "consideravam obviamente quaisquer fundos americanos destinados a grupos políticos ilegais como equivalentes a um apoio à alteração do regime". O artigo do Washington Post descreve com algum pormenor as ligações entre a TV Barada da oposição, financiada pelos EUA, e o papel de Malik al-Abdeh, que está na sua direcção e distribui vídeos e protestos actualizados. Al-Abdeh também está na direcção do Movimento para a Justiça e Democracia, que é presidido pelo seu irmão, Anas Al-Abdeh. Os telegramas secretos "relatam receios persistentes entre os diplomatas americanos de que os agentes de segurança sírios tenham descoberto o rasto do dinheiro a partir de Washington".

Papel da Al Jazeera

Talvez que o desafio mais revelador e a denúncia da campanha de desestabilização na Síria tenha surgido com a demissão de Ghassan Ben Jeddo, o jornalista mais conhecido do noticiário da televisão Al Jazeera e chefe do seu escritório de Beirute. Bem Jeddo demitiu-se como forma de protesto pela cobertura preconceituosa da Al Jazeera, referindo-se sobretudo a uma "campanha de difamação contra o governo sírio" que transformou a Al Jazeera numa "agência de propaganda".

A Al Jazeera fez uma cobertura favorável do imparável levantamento popular de milhões no Egipto e na Tunísia. Mas este canal de notícias por satélite também noticiou extensivamente todas as reivindicações e acusações políticas, independentemente de serem ou não consubstanciadas, feitas pela oposição política tanto na Síria como na Líbia. Tornou-se na voz mais forte na região, seguida por milhões de visitantes, a clamar pela intervenção "humanitária" dos EUA, zonas de interdição aérea e bombardeamento da Líbia. Portanto é importante compreender a posição da Al Jazeera como uma corporação de notícias, principalmente quando ela afirma ser a voz dos oprimidos.

A Al Jazeera, que tem a sede em Qatar, nunca noticia que 94 por cento da força de trabalho no Qatar é formada por imigrantes que não têm quaisquer direitos e existem em condições de quase escravatura. A repressão brutal do movimento de massas na monarquia absoluta do Bahrein, que fica mesmo ao lado de Qatar e está hoje ocupada por tropas sauditas, também pouca cobertura recebe da Al Jazeera.

Será que esta censura existe porque as Notícias TV Al Jazeera são financiadas pelo monarca absoluto de Qatar, o emir Sheikh Hamad bin Khalifa Al Thani?

È muito importante assinalar que a Al Jazeera nunca se refere à imensa base militar americana Central Command ali mesmo em Qatar. Os aviões de controlo remoto levantam regularmente daquela base em missões secretas por toda a região. Qatar também tem enviado aviões para participar no bombardeamento dos EUA/NATO na Líbia.

Qatar trabalha em ligação estreita com o Departamento de Estado dos EUA apoiando a intervenção americana na área. Qatar foi um dos primeiros estados árabes, e o primeiro dos estados do Golfo, a estabelecer relações com Israel. Durante o bombardeamento de Gaza por Israel, em 2009, cancelou essas relações mas já propôs restabelecê-las.

O Facebook e a contra-revolução

A CIA e a National Endowment for Democracy tornaram-se especialistas na utilização duma barragem dos media sociais, tal como o Facebook, o Twitter e o Youtube para atulhar os governos visados com milhões de mensagens fabricadas, boatos falsos e imagens.

Alertas fabricados sobre lutas e divisões entre facções rivais nas forças armadas da Síria, com vista a provocar demissões, vieram a provar-se serem falsos. Por exemplo, o major general al-Rifai (Ret.) desmentiu, por não terem fundamento, notícias difundidas por televisão satélite de que estava a liderar uma divisão nas forças armadas. Acrescentou que já se tinha reformado há dez anos.

Izzat al-Rashek, da Comisão Política do Hamas, e Ali Baraka, representante do Hamas no Líbano, desmentiram publicamente afirmações de que a liderança desta organização de resistência palestina estava a mudar-se de Damasco para Qatar. Ali Baraka explicou que isso era uma invenção americana para pressionar Mahmoud Abbas da Fatah e impedir a reconciliação palestina, agudizando o conflito entre os movimentos de resistência e a Síria.

O governo sírio denunciou que franco-atiradores tinham disparado sobre manifestações, visando militares e policiais na tentativa de levar a polícia a abrir fogo sobre os manifestantes.

Boatos, publicações anónimas na Internet e notícias por televisão satélite destinadas a agudizar diferenças sectárias fazem parte da campanha de desestabilização.

Carácter duplo da Síria

Não é difícil perceber porque é que o imperialismo dos EUA e os seus peões na região, incluindo Israel e as monarquias corruptas dependentes da Jordânia, do Qatar e dos Emirados Árabes Unidos e da Arábia Saudita, querem ver uma 'mudança de regime' na Síria.

A Síria é um dos poucos estados árabes que não tem relações com Israel. Várias organizações de resistência palestina têm escritórios no exílio na Síria, incluindo a Hamas. A Síria é um estreito aliado do Irão e do Líbano.

A Síria actualmente não é um país socialista nem país revolucionário. O capitalismo, com as suas inevitáveis desigualdades, não foi derrubado. Há uma classe capitalista na Síria, muita gente dentro dela beneficiou das 'reformas' que privatizaram antigas indústrias anteriormente na posse do estado.

No entanto, o estado sírio representa forças contraditórias. Tem sido um bastião na defesa das conquistas alcançadas nas lutas anti-colonialistas e nos levantamentos das massas árabes nos anos 60 e 70. Durante esse período foram feitas muitas conquistas sociais importantes, foram nacionalizadas as principais indústrias e recursos que tinham pertencido ao capital estrangeiro e foram feitos importantes avanços nos cuidados de saúde garantidos, nos padrões de vida e na educação.

A Síria, sob o Partido Baath Socialista Árabe, é um país rigorosamente laico. Manteve a liberdade de religião para toda a gente, embora sem permitir que um grupo religioso dominasse ou fosse promovido pelo estado.

Mas o regime na Síria também tem reprimido duramente as tentativas dos movimentos de massas, com base no Líbano e na Síria, que pretendiam continuar a lutar. Justificou a repressão dos movimentos passados apontando para a sua posição precária mesmo ao lado de Israel, o impacto das duas guerras israelenses em 1967 e 1973, e a consequente ocupação israelense e anexação da importante região dos Montes Golan na Síria durante 44 anos.

Anos de sanções dos EUA e anteriores tentativas de desestabilização também tiveram um efeito cumulativo. O aparelho de estado, sempre temeroso duma intervenção externa continuada, passou a ter medo da mudança.

É essencial reconhecer este carácter duplo e não desculpar nem ignorar todos os problemas que daí decorrem.

A Síria ainda tem o fardo acrescido de albergar mais de 500 mil refugiados palestinos e seus descendentes nos últimos 63 anos. As condições destes são melhores do que em qualquer dos países vizinhos porque, ao contrário do Líbano e da Jordânia, os cuidados de saúde, o ensino e a habitação são acessíveis aos palestinos na Síria.

O impacto da guerra do Iraque

A maciça invasão americana e a destruição do Iraque vizinho, o debate Bush-Blair sobre um ataque semelhante à Síria em 2003, e as novas e duras sanções sobre a Síria aumentaram a pressão intensa.

Mas o factor mais perturbador nunca é discutido nos media: mais de um milhão e meio de iraquianos invadiram a Síria para fugir aos últimos oito anos de ocupação dos EUA.

Esta foi uma invasão brutal para um país com uma população de 18 milhões em 2006. Segundo um relatório de 2007 do gabinete do Alto Comissário para Refugiados dos EUA, a chegada diária de 2 000 iraquianos desesperados teve um impacto enorme sob todos os aspectos da vida da Síria, em especial nos serviços prestados pelo estado a todos os seus cidadãos e a todos os refugiados. A Síria tem o nível mais alto de direitos cívicos e sociais para refugiados em toda a região. Outros países vizinhos exigem uma conta bancária mínima e impedem a entrada de refugiados pobres.

A chegada inesperada destes refugiados iraquianos teve um impacto dramático nas infra-estruturas, nas escolas primárias e secundárias garantidas, nos cuidados de saúde grátis, na disponibilidade de habitações e noutras áreas da economia. Levou a um aumento de custos a todos os níveis. Os preços dos géneros alimentícios e dos bens básicos aumentaram 30 por cento, os preços do imobiliário de 40 por cento e as rendas de casa em 150 por cento.

Os refugiados iraquianos também beneficiaram dos subsídios estatais sírios na gasolina, na alimentação, na água e noutros bens essenciais fornecidos a toda a gente. Uma massa tão grande de gente desempregada levou ao abaixamento dos salários e a uma concorrência acrescida nos empregos. O impacto das dificuldades económicas globais durante este período difícil agudizou os problemas. (Middle East Institute, 10/Dezembro/2010, relatório sobre Cooperação com Refugiados)

Os EUA criaram a crise de refugiados, que provocou a deslocação de mais de 25 por cento da população iraquiana, por causa da violência sectária. No entanto, são os que aceitam o menor número de refugiados e dão menos do que o custo de um dia de guerra no Iraque para os custos de assistência das Nações Unidas. As sanções americanas na Síria aumentaram as deslocações económicas.

Tudo isto reforçou a consciência do governo sírio e da população quanto aos perigos da ocupação americana e da desestabilização interna e quanto ao banho de sangue que pode resultar da violência sectária instigada pelos EUA.

Washington afirma estar preocupado com a instabilidade na Síria. Mas o imperialismo americano enquanto sistema é obrigado a criar a instabilidade. O domínio esmagador e o poder das corporações militares e petrolíferas na economia dos EUA e os enormes lucros dos contratos militares reforçam infindavelmente o pendor para procurar soluções militares.

Todas as declarações feitas pelo governo sírio têm reconhecido a importância de fazer reformas internas importantes embora mantendo a unidade nacional num país extremamente diversificado que tem diferenças históricas na religião, nas tribos e nas regiões e contém actualmente 2 milhões de refugiados.

As diversas nacionalidades, religiões e grupos culturais na Síria têm todo o direito de fazer parte deste processo. Mas o que eles precisam sobretudo é do fim da constante e cruel intervenção dos EUA.


06/Maio/2011


O original encontra-se em http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=24659


Tradução de Margarida Ferreira.


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Casualidade, causalidade

Talvez tenha visto mal mas não me apercebi de que, como vem sendo feito na Net, algum jornal se tenha ainda interrogado sobre a sucessão de três notícias em pouco mais de dois meses que, isoladas, talvez só tivessem lugar nas páginas de Economia mas que, juntas, e com um director ou um chefe de redacção curiosos de acasos, até poderiam ter sido manchete.

A primeira, de 16 de Março, a da renúncia - dois anos antes do termo do seu mandato - de Almerindo Marques à presidência da Estradas de Portugal (para que fora nomeado em 2007 pelo então ministro Mário Lino), declarando ao DE que "no essencial, est[ava] feito o [s]eu trabalho de gestão".

A segunda, de 11 de Maio, a de uma auditoria do Tribunal de Contas à Estradas de Portugal, revelando que, com a renegociação de contratos, a dívida do Estado às concessionárias das SCUT passara de 178 milhões para 10 mil milhões de euros em rendas fixas, dos quais mais de metade (5 400 milhões) coubera ao consórcio Ascendi, liderada pela Mota-Engil e pelo Grupo Espírito Santo. Mais: que dessa renegociação resultara que o Estado receberá, este ano, 250 milhões de portagens das SCUT e pagará... 650 milhões em rendas.

E a terceira, de há poucos dias, a de que Almerindo Marques irá liderar a "Opway", construtora do Grupo Espírito Santo.

O mais certo, porém, é que tais notícias não tenham nada a ver umas com as outras, que a sua sucessão seja casual e não causal.
 
(Enviado por e-mail por um fonte identificada e segura)

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Excertos do acordo com a tróika

Privatização



17. Pretendemos acelerar o nosso programa de privatizações. O plano já existente, que se estende durante 2013, abrange os transportes (Aeroportos de Portugal, TAP e ramo de mercadorias da CP), energia (GALP, EDP e REN), comunicações (Correios de Portugal) e de seguros (Caixa Seguros), bem como uma série de empresas menores. O plano tem por meta receitas disponíveis logo no inicio de cerca de € [5,3] mil milhões até ao final do programa, apenas com alienações parciais previstas para todas as grandes empresas. No entanto, estamos comprometidos a ir ainda mais longe, levando a cabo uma completa e rápida alienação das acções do sector público na EDP e na REN, e esperamos que as condições do mercado venham a permitir a venda destas duas empresas, bem como da TAP, até ao final do 2011. Vamos identificar, no momento da segunda avaliação, mais duas grandes empresas para privatização até ao final de 2012. Um plano de privatização actualizado será preparado até Março de 2012. (sublinhado por nós)

terça-feira, 24 de maio de 2011

Sintomas

Há poucas coisas que abram tanto o apetite de um verdadeiro filósofo do que acontecimentos como os que se verificam em Espanha. E que ele desejaria que se replicassem em Portugal. Protestos em Madri, Espanha

Quando há doença dizemos que há sintomas. Os sintomas são visíveis, a doença nem sempre, ou apenas o é para os mais atentos. Os sintomas são sinais, não são cópias nem simulacros, mas podem ser símbolos. Há sintomas que realmente simbolizam algo. Uma crise, ou uma mudança de época. De paradigma, sói dizer-se em certos círculos académicos. Nietzsche escrevia diversas vezes sobre o papel de "médico» que cabia ao filósofo, isto é, não propriamente curar, mas interpretar, melhor: avisar. "Zaratustra" avisa, quando desce da Montanha. Hegel já o dissera anteriormente: os sinais que anunciam uma nova época.
Os acampados nas Puertas del Sol anunciam, avisam, simbolizam. As democracias que temos servem quem? Representam o quê? O mal está na representação ou nos representantes? Rousseau diria que está na representação, criticando Montesquieu. "Democracia directa já!", poderia ele ter escrito. Ou seja, participação do povo efectiva, contínua, vigilante. Os revolucionários de 1790 tomaram-no à letra e realizaram a República, com assembleias e comissões permanentes. Dir-se-á que somente durante as revoluções tal democracia é possível e característica. E antes delas, mesmo que elas sejam imprevisíveis?

Como os países mais fortes ficam mais fortes e os mais dependentes mais dependentes

Incumprimento da Grécia pode ser negativo para dívida de outros países


11h21m

O incumprimento da Grécia terá implicações negativas para o 'rating' do país, bem como o de outros países europeus em dificuldades, e sobre os bancos gregos, segundo um relatório do Serviço de Investidores da Moody's.

A Moddy's analisa vários cenários de falência e refere que quanto mais tempo se prolongar a incerteza sobre a Grécia maior será a tentação das autoridades gregas e da zona euro para avançar com a reestruturação da dívida, abrindo caminho para o incumprimento.

O incumprimento da Grécia pode revestir-se de várias formas, incluindo alterações nos termos e condições da dívida, "reperfilamento" selectivo" e compras "voluntárias" em larga escala, com grandes descontos.

O impacto sobre os mercados de capital europeus é difícil de prever e ainda mais de controlar, já que a bancarrota da Grécia pode ter implicações para o crédito e os 'ratings' dos emissores de dívida pública de toda a Europa.

Outros países em dificuldades, como Portugal ou a Irlanda, veriam também os seus "ratings" descer, independentemente das várias formas que a falência da Grécia pode assumir.

Assim, segundo a Moody's, os 'ratings' da dívida soberana ficariam ainda mais polarizados, com os países mais fortes a manter os 'ratings' elevados ou muito elevados e os países mais fracos a lutar para manter a sua notação de crédito.

in Jornal de Notícias, 24.5.2011

domingo, 22 de maio de 2011

Compromissos para a mudança

Combater o endividamento


Uma intervenção que responda ao problema do endividamento externo com a renegociação da dívida pública (prazos, juros e montantes)

A diversificação das fontes de financiamento

A acção convergente com outros países vítimas da especulação financeira e do Euro

A aposta na produção nacional (produzir mais para dever menos)

A redução das importações, a par do aumento das exportações e a diversificação das relações comerciais.

Combater o desemprego

Alargamento dos critérios de acesso, aumentando o número de trabalhadores abrangidos e prolongamento do período de atribuição do subsídio de desemprego, essencial para as situações de desemprego de longa duração;

Alteração dos aspectos negativos do Código do Trabalho (designadamente o restabelecimento do efectivo direito à contratação colectiva)

Alteração da legislação laboral da Administração Pública designadamente com a reposição do vínculo de nomeação público e alteração do Sistema de Avaliação e Desempenho.

A fiscalização rigorosa do recurso ao lay-off combatendo a violação dos direitos dos trabalhadores, com a sobrecarga da Segurança Social e a redução dos salários;

Combater a precariedade

Adopção de um Programa Nacional de combate à precariedade e ao trabalho clandestino, que ataque este flagelo social, com vista à sua erradicação.

Conversão automática dos falsos recibos verdes em contratos de trabalho, nas situações em que correspondam a trabalho permanente, atribuindo o ónus da prova à entidade empregadora

Aumento imediato do Salário Mínimo Nacional (SMN) para 500 €, valor que devia já vigorar desde Janeiro, e a sua actualização para pelo menos 600 euros até 2013

Aumento real do conjunto das pensões e reformas garantindo o aumento de 25 euros para as de valor igual ou inferior ao salário mínimo nacional;


Maior produção, defender a soberania nacional

 
Intervir no sentido de uma profunda revisão das políticas económica e monetária da UE que vise a adopção de um Programa para o Progresso Social e para o Emprego.

Estabelecimento de um regime de preços máximos de energia, reduzindo a respectiva factura – electricidade, gás e combustíveis – para famílias e empresas

Fiscalização efectiva das práticas comerciais da grande distribuição, combatendo os abusos que arruínam os pequenos e médios produtores.

Garantia de um rendimento mínimo nas explorações agrícolas familiares e unidades de pesca artesanal, pela criação de adequado seguro às suas actividades, combate à especulação do custo dos factores de produção – adubos, sementes, fito-fármacos, combustíveis – e defesa de preços justos à produção, com apoios aos pequenos agricultores e à agricultura familiar.

Garantir a produção nacional de material ferroviário (em particular material circulante) nomeadamente com a mobilização de incentivos em torno de investimento em curso na ferrovia.

Estabelecimento de valores referência das taxas de juro, margens (spreads) e comissões da Caixa Geral de Depósitos para um funcionamento adequado do mercado de crédito e proibição de alteração unilateral dos contratos.

Promoção do consumo de produtos locais, designadamente em instituições públicas.

Garantir uma intervenção do sector bancário público que apoie o investimento nas micro, pequenas e médias empresas e nas autarquias

Defender e afirmar direitos sociais

Tabelamento do preço no primeiro arrendamento do imóvel, combatendo a especulação e garantindo preços mais acessíveis para a população.

Revogação das normas penalizadoras do valor das pensões (factor de sustentabilidade e fórmula de actualização anual), que constituem um factor de aumento real da idade da reforma e de penalização do seu valor

Salvaguarda do direito à reforma aos 65 anos e possibilidade da sua antecipação sem penalizações para carreiras contributivas de 40 anos.

Diversificação do financiamento da segurança social com base na riqueza criada, combate à fraude e evasão, cobrança de dívidas.

Proceder ao tratamento dos atendimentos sociais relativos a situações de carência económica e social realizados pelas diversas entidades, visando o apuramento estatístico desta realidade e a adopção de medidas de carácter excepcional que permita dar resposta a estas situações.

Reposição do abono de família retirado ou diminuído a centenas de milhares de crianças e jovens com as recentes alterações.

Pagamento a 100% da remuneração nas licenças de maternidade, paternidade e adopção para os trabalhadores da Administração Pública e sector privado e atribuição de um subsídio de nascimento ou adopção nos primeiros doze meses.

Uma mais justa política fiscal

Redução gradual e eliminação do pagamento especial por conta (PEC) para as micro e pequenas empresas redução acrescida dos prazos de reembolso do IVA e introdução do “IVA de caixa” nas transacções com o Estado.

Taxação de todas as mais valias bolsistas, das transacções financeiras e bolsistas e dos bens de luxo.

Imposição da taxa efectiva de IRC de 25% ao sector financeiro, banca e seguros e agravamento de 20% (para 30%) na taxa aplicada aos lucros empresariais superiores a 50 milhões de euros.

Renegociação e fim das Parcerias Público Privado.


Valorizar a Escola Pública


Aprovação de um novo estatuto da carreira docente, alteração do modelo de avaliação dos professores dando-lhe carácter formativo, no sentido da melhoria da qualidade pedagógica em vez da limitação na progressão da carreira.

Correcção já no próximo ano lectivo das injustiças e desemprego docente causado pelo modelo de organização aplicado pelo Governo /PS e pelo processo da chamada “reestruturação da rede escolar“

Distribuição gratuita dos manuais escolares para todo o ensino obrigatório, já a partir do próximo ano lectivo.

Nova Lei do Financiamento do Ensino Superior, que garanta um adequado financiamento das instituições, para as funções de ensino e de investigação.

Defender o direito à saúde e o SNS

Programa para garantir o acesso à consulta no próprio dia nos Cuidados Primários de Saúde, incluindo medidas especiais para a formação e contratação de médicos de medicina geral e familiar.

Instituição da prescrição por DCI/princípio activo, garantindo a disponibilidade dos medicamentos mais baratos na farmácia e impedindo a cartelização em qualquer área do processo.

Criar o Laboratório Nacional do Medicamento e incrementar a produção nacional

Reposição dos níveis de comparticipação dos medicamentos drasticamente reduzidos nos últimos anos.

Suspensão dos encerramentos de unidades de saúde e reabertura das unidades injustificadamente encerradas.

Critérios justos no sistema de transportes de doentes, garantindo o efectivo acesso a consultas e tratamentos a toda a população, e a igualdade dos custos de deslocação decorrentes da distância a percorrer até à unidade de saúde de referência, em especial aos mais carenciados e às populações mais isoladas

Criação do Defensor Público e alargamento dos critérios de atribuição do apoio judiciário e gratuitidade do acesso dos trabalhadores à justiça laboral.


Combater a corrupção e defender as populações
Combate determinado à corrupção e ao enriquecimento ilícito, criminalizando-o e dando meios e autonomia ao Ministério Público e à Policia Judiciária para cumprir esse objectivo.

Reforço dos efectivos e meios para um policiamento de proximidade e uma política de segurança com mais prevenção.

Consagração na lei da natureza civil de todas as forças e serviços de segurança.

Revogação do actual Regulamento Disciplinar Militar.

Regresso imediato dos contingentes militares no estrangeiro.

Combater a imigração ilegal e rever a lei da imigração num sentido favorável à legalização de imigrantes e suas famílias; ratificar a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos dos Imigrantes e das suas Famílias.

Garantir a existência de uma rede consular moderna, qualificada e de proximidade, que responda às necessidades dos portugueses a residir no estrangeiro, e ao enorme aumento da emigração; promover a expansão e qualificação do ensino da Língua e Cultura Portuguesas; fomentar o investimento dos emigrantes em sectores produtivos em Portugal, potenciando a captação das suas poupanças.

sábado, 21 de maio de 2011

György Lukács



1885 - 1971

"A confusão mental nem sempre é o caos. Pode denotar as contradições internas da actualidade, mas a longo prazo conduzirá à sua resolução. Por isso a minha ética tendeu no sentido da praxis, da acção, e portanto da política. E isso levou, por seu lado, à economia. (...) Só a revolução russa abiu realmente uma porta para o futuro; a queda do czarismo trouxe-lhe um brilho, e com o colapso do capitalismo tal apareceu à vista desarmada. Nesse tempo o nosso conhecimento dos factos e dos principios que lhes estavam subjacentes era dos menores e menos credíveis. Apesar disso vimos, finalmente! Finalmente! uma forma de a humanidade escapar à guerra e ao capitalismo."

1967 Prefácio a Max Ernstman.


Filósofo e político Húngaro de origem judaica, ingressou no Partido Comunista Húngaro em 1918. Foi Comissário do Povo durante o efémero governo de Bela Kun, e tornou-se, no pós 2ª guerra, uma espécie de porta voz do Marxismo intelectual, sobretudo após a discussão pública que o opôs a K. Jaspers e outros filósofos ocidentais nos Encontros Internacionais de Genebra, de 1946. Ministro da Educação do Governo de Imre Nagy, foi deportado para a Roménia após a invasão da Hungria por tropas soviéticas em 1956.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Gilles Lipovetsky


Gilles Lipovetsky (Millau, 24 de setembro de 1944) é um filósofo francês, professor de filosofia da Universidade de Grenoble, teórico da Hipermodernidade, autor dos livros A Era do Vazio, O luxo eterno, O império do efêmero, Cultura-mundo, entre outros.





------------Entrevista (excerto)------------------------------------------------------------------------------
Para você, a sociedade hiperindividualista coexiste com um mal-estar da existência. Há o estresse, a depressão, preocupações diversas com o trabalho, a família. Existe hoje um imperativo da felicidade, quase como uma tirania?



Há hoje a tirania do corpo, da beleza e da juventude. Não há mais a tirania da moda. Tirania da felicidade me incomoda como expressão, pois, apesar de tudo, a felicidade é uma aspiração dos homens, reforçada pela modernidade. O ideal da felicidade não é apenas tirânico, pois permite as coisas avançarem. Em nome da felicidade as pessoas mudaram seu modo de vida. Antes, não se divorciava. A felicidade não vinha em primeiro lugar, mas a família. Hoje as pessoas se divorciam se estão infelizes no casamento, têm o direito de refazer suas vidas. Nem tudo é tirânico na aspiração à felicidade. Mas o paradoxo de nossa época de hiperconsumo é o de que todos os sinais de felicidade estão em aberto. Em breve, a grande maioria das pessoas viverá até os 100 anos de idade; as mulheres podem controlar sua fecundidade e ocupam novos espaços; o nível de vida aumenta; a sexualidade é livre. Há sinais positivos em relação à saúde, à sexualidade, às liberdades. Mas o que vemos é que isso não se acompanha de uma joie de vivre manifesta. Há um paradoxo enorme: a sociedade tem os sinais de felicidade, mas tudo se passa como se isso não fosse sentido. Há a depressão, a ansiedade, a infelicidade pessoal. Estudos feitos por ingleses e americanos mostram nossa surpreendente situação. Toda a civilização moderna leva ao crescimento, ao aumento do poder aquisitivo. A grande questão teórica é: a riqueza e o bem-estar material trazem mais felicidade?


Fernando Eichenberg


De Paris, França

21  de Abril 2008



in Terra Magazine


Terra Magazine

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Os alemães

“Não se trata só de não contrair dívidas. Em países como a Grécia, Espanha e Portugal, as pessoas não devem poder ir para a reforma mais cedo do que na Alemanha”, afirmou a chanceler num comício partidário na terça-feira à noite, em Meschede (na Renânia).


“Todos temos de fazer um esforço, isso é importante, não podemos ter a mesmo moeda, e uns terem muitas férias e outros poucas”, advertiu Merkel.

Na Alemanha, a lei impõe que as empresas concedam aos trabalhadores um mínimo de 20 dias de férias por ano.

No entanto, mercê de acordos colectivos, este período é mais alargado em muitas empresas, quer do sector privado, quer do sector público, chegando a ultrapassar os 30 dias úteis.

Quanto à entrada na idade da reforma na Alemanha, passará gradualmente dos 65 para os 67 anos, entre 2012 e 2029.

Em Portugal, os trabalhadores podem reformar-se aos 65 anos, e o primeiro-ministro, José Sócrates, afirmou repetidamente que não será necessário aumentar esta idade, devido às medidas de sustentabilidade implementadas na segurança social.

O comissário europeu dos Assuntos Financeiros, Oli Rehn, considerou hoje o empréstimo de 78 mil milhões de euros a Portugal “também necessário para proteger a retoma económica na Alemanha e as poupanças dos alemães”.
in «Público» de hoje, on-line

SARAMAGO: ENTREVISTA. EL PREMIO NOBEL EXPLICA DONDE ESTÁ EL VERDADERO PODER

segunda-feira, 16 de maio de 2011

O controlo da Internet

por Ignacio Ramonet

Depois da primeira Cimeira Mundial da Sociedade da Informação que teve lugar em Genebra em Dezembro de 2003 [1] , cujo tema central foi "a fractura digital", pedida pela ONU e organizada pela União Internacional de Telecomunicações (UIT), Tunes receberá de 16 a 18 de Novembro a segunda cimeira mundial com uma preocupação central: como instalar um controlo mais democrático na Internet?

A rede Internet é uma invenção estadunidense do tempo da Guerra Fria. O Pentágono, então, procurava instalar um sistema de comunicação indestrutível, que pudesse resistir a um ataque atómico, e que permitisse aos responsáveis políticos e militares que sobrevivessem retomar o contacto entre eles para lançar o contra-ataque. O ainda estudante da Universidade de Los Angeles, Vinton Cerf, imaginou e implementou com uma equipa de investigadores financiados com fundos públicos os protocolos e as ferramentas de um modo novo, revolucionário, de comunicação. No entanto, apenas estava reservado a uma pequena minoria de universitários, militares e iniciados.

Mais tarde, em 1989, os físicos Tim Berners-Lee e Robert Cailliau, investigadores do Centro Europeu para a Investigação Nuclear (CERN) de Genebra, puseram a funcionar um sistema de hipertexto e inventaram a World Wide Web, que favorecia a difusão das informações e o acesso do grande público à Internet que, por isso, teve a sua formidável e fulgurante expansão.

Actualmente, e desde 1988, a rede mundial é administrada pela Internet Corporation for Assigned Names and Numbers (ICANN), um organização de direito privado sem fins lucrativos, submetida à lei californiana e colocada sob o controlo do Departamento de Comércio dos Estados Unidos. A ICANN é a grande controladora da rede. Baseia-se num dispositivo técnico constituído por 13 poderosos computadores, denominados "servidores raiz", instalados nos Estados Unidos (quatro na Califórnia e seis próximos de Washington), na Europa (Estocolmo e Londres) e no Japão (Tóquio).

A principal função da ICANN é coordenar nomes de domínio (Domain Name System, DNS) que ajudam os usuários a navegar pela Internet. Cada computador ligado à Internet possui um endereço único chamado "endereço IP" (endereço de Protocolo Internet). No princípio, estes endereços IP eram séries de números difíceis de memorizar, mas o DNS permite utilizar letras e palavras mais familiares (o "nome de domínio"), ao invés de números Por exemplo, em vez de escrever uma série de números, escreve-se http://www.monde-diplomatique.fr . O DNS converte o nome de domínio na série de números que corresponde à direcção IP, o que permite ligar o seu computador com o local desejado. O DNS permite também o bom funcionamento do correio electrónico. Tudo isto à escala planetária e a uma velocidade ultra-rápida.

De acordo com os seus próprios princípios, a missão da ICANN é "preservar a estabilidade operativa da Internet, promover a concorrência, garantir uma representação global das comunicações na Internet e elaborar uma política correspondente à sua missão, de acordo com um procedimento consensual [2] .

Precisamente de há uns tempos a esta parte já não há consenso. O domínio dos Estados Unidos sobre a rede mundial é cada vez mais contestado. No passado mês de Setembro em Genebra, por ocasião de uma negociação privada entre os EUA e a União Europeia, antes da cimeira de Tunes, os 25 Estados da União foram unânimes em reclamar uma reforma da governação da Internet, aproveitando o termo do contrato que vincula a ICANN com o Ministério do Comércio dos Estados Unidos. A reunião saldou-se por um fracasso, dado que Washington recusou qualquer mudança.

Por exemplo o Brasil, a China, a Índia e o Irão encontram-se nas mesmas posições da Europa perante os Estados Unidos, mas nem sempre pelas mesmas razões. Inclusivamente, alguns ameaçam criar o seu próprio organismo nacional de gestão da rede, o que levaria a uma fragmentação desastrosa da Internet.

O desacordo tem uma dimensão geopolítica. Num mundo cada vez mais globalizado, onde a comunicação se converteu na matéria-prima estratégica, onde explode a economia do imaterial, as redes de comunicação cumprem uma função fundamental. O controlo da Internet concede ao poder que o exerce uma vantagem estratégica decisiva. Tal como no século XIX, o controlo das vias de navegação planetárias permitiu à Inglaterra dominar o mundo.

A hegemonia dos Estados Unidos sobre a Internet confere teoricamente aos Estados Unidos o poder de limitar o acesso a todos os sítios da Rede em qualquer país. Pode bloquear o envio de todas as mensagens electrónicas do planeta. Até ao momento nunca o fez. Mas tem a possibilidade de o fazer. E esta simples eventualidade é motivo de extrema inquietação para muitos países [3] . De modo que chegou o momento de reclamar que a ICANN deixe de depender de Washington e se converta, finalmente, num organismo independente sob a supervisão das Nações Unidas.

[1] Veja-se Ignacio Ramonet "El nuevo orden internet", Le Monde diplomatique, edição espanhola, Janeiro de 2004

[2] Veja-se www.icann.org e www.icannwatch.org

(3) Veja-se The Guardian, Londres, 11/Outubro/2005.

O original encontra-se em

http://www.mondiplo.com/isum/Direct.jsp?ISUM_Shortcut=MONDIPLO_EDITORIAL

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

sábado, 14 de maio de 2011

Manuel António Pina - Prémio Camões


O Medo

Ninguém me roubará algumas coisas,


nem acerca de elas saberei transigir;

um pequeno morto morre eternamente

em qualquer sítio de tudo isto.



É a sua morte que eu vivo eternamente

quem quer que eu seja e ele seja.

As minhas palavras voltam eternamente a essa morte

como, imóvel, ao coração de um fruto.



Serei capaz

de não ter medo de nada,

nem de algumas palavras juntas?



Manuel António Pina, in "Nenhum Sítio"

quarta-feira, 11 de maio de 2011

A Grécia pensa sair do euro?

A verdadeira agenda por trás da notícia da Der Spiegel de que a Grécia pensa sair do euro


por Yanis Varoufakis [*]

A notícia da revista Spiegel de que "Atenas considera retirar-se da eurozona" não é exactamente falsa – apenas económica com a verdade.

Sim, poucas semanas ou meses atrás o governo grego encomendou (como devia) vários estudos secretos das repercussões de vários cenários envolvendo diferentes formas de reestruturação da dívida, incluindo um cenário desesperado com a hipótese de uma improvável saída da eurozona. A questão real é: por que a Der Spiegel optou por isolar este cenário e centrar-se sobre ele muito embora os seus jornalistas soubessem muito bem que a Grécia nunca proporá uma saída real do euro?

É minha opinião meditada que a Der Spiegel, após consulta prévia com certos círculos dentro do governo alemão (em particular o Ministério das Finanças), estava a tentar enviar uma mensagem – não à chanceler alemã como também ao primeiro-ministro grego. Qual é esta mensagem? Que há coisas muito piores do que uma reestruturação da dívida, sendo a pior um desmantelamento passo-a-passo do euro que principiará quando um país como a Grécia é forçado a uma situação impossível. E que continuar a viver em negação, e espalhar mentiras flagrantes acerca da sustentabilidade do rumo actual, não será mais tolerado.



Negação



Vamos começar com a citação do dia da versão Internet da Der Spiegel:

«Os problemas económicos da Grécia são maciços, com protestos contra o governo efectuados quase diariamente. Agora o primeiro-ministro George Papandreu aparentemente sente que não tem outra opção: SPIEGEL ONLINE obteve informação de fontes do governo alemão conhecedoras da situação em Atenas indicando que o governo Papandreu está a considerar o abandono do euro e a reintrodução da sua própria divisa.
Alarmada pelas intenções de Atenas, a Comissão Europeia convocou uma reunião de crise no Luxemburgo na sexta-feira à noite. A reunião está a ter lugar no Château de Senningen, um local utilizado pelo governo do Luxemburgo para reuniões oficiais. Além da possível saída da Grécia da união monetária, uma reestruturação rápida da dívida do país também faz parte da agenda.»


Que o governo grego esteja a considera uma saída heróica da eurozona é falso: se bem que a saída é um dos muitos cenários que estudou, ele nunca foi um dos que contemplasse seguir. Contudo, o governo grego pode negar a notícia da Spiegel até o dia de são nunca mas ninguém o acreditará. É o preço que se pagar por não ter prestado atenção à moral da [fábula] O rapaz que gritava lobo. Pior ainda, ao acusar, bastante implausivelmente, a Der Spiegel de passar manteiga no pão dos especuladores, o grego está a sacrificar, em vão, os últimos restos de credibilidade que tem. Triste, muito triste. Pois toda a gente sabe que a Der Spiegel tem peixes muito maiores para fritar do que prestar-se aos jogos dos especuladores. Na verdade, a Der Spiegel faz parte da rede institucional da autoridade e poder político da Alemanha. Assim, porque haveria uma tal instituição de ser económica com a verdade desta maneira e neste momento?

A mensagem

O artigo da Spiegel foi pretendido como um disparo que disparasse campainhas de alarme muito retardadas. Tencionava criar uma pequena tempestade de pânico como meio de recordar à sra. Merkel que a crise até agora é semelhante a um chá da tarde em comparação com o que se seguirá se ela continuar a viver em mentiras.
Quem enviou esta mensagem? A Der Spiegel nunca actuaria por si mesma, sem coordenação com poderosos círculos políticos alemães. Minhas fontes contam-me que estes círculos estão localizados principalmente dentro do Ministério das Finanças e, em menor medida, em um ou dois dos maiores bancos da Alemanha. Em associação com a Der Spiegel eles têm estado a enviar mensagens enfadonhas com linhas semelhantes desde há algum tempo, nomeadamente que a dívida grega não é sustentável sob a presente composição política (ver relato do FT Alphaville daquela série de mensagens enviadas utilizando a Der Spiegel como seu principal transmissor).
Tendo perdido a paciência, uma vez que os seus sinais foram amplamente ignorados, pessoas do Ministério das Finanças alemão decidiram recorrer às armas grandes do sinal de ontem. Eles tomaram uma verdade parcial (de que o primeiro-ministro grego examinou os custos potenciais de uma saída grega do euro), ampliaram-na ao omitir a menção a todos os outros cenários que foram considerados e, pronto, foi desencadeada uma pequena tempestade sobre a liderança da Europa. Todo o que fizeram então foi observar o pânico efectuar o seu milagre. Qual milagre? Concentrar as mentes da sra. Merkel, do sr. Papandreu e de ministros variados na importância de viver, pelo menos dessa vez, com verdade.

Mais precisamente, a mensagem enviada pelo artigo incendiário da Der Spiegel era que a política de novos empréstimos caros a estados insolventes, combinada com austeridade selvagem num tempo de recessão profunda, não funciona e não funcionará. Que chegou o tempo da reestruturação da dívida para periferia sob tensão da eurozona, assim como o tempo para uma resolução racional da crise bancária da Europa. Para conduzir ao seu argumento, os círculos dentro da Alemanha que perceberam que a Spiegel publicou este artigo vivamente esclarecedor, em benefício da sra. Merkel e do sr. Papandreu, perceberam também que há algo muito, muito pior do que uma reestruturação da dívida: o começo de uma eliminação sucessiva de países da eurozona que provocará níveis impressionantes de especulação nos mercados monetários quanto ao que vem a seguir e quando.

Ao causar um moderado pânico prematuro nesta linha, eles enviaram a mensagem rematada de que o tempo das mentiras está ultrapassado, de que mais liquidez para estados insolventes e bancos em bancarrota tornarão as coisas piores, de que é tempo de ter na Europa o debate que devíamos ter tido há mais de um ano atrás.

A ideia central

Um ano atrás a Grécia estava falida e foi induzida a um programa estilo FMI cujo rigor foi agravado pela condição do país como membro de uma união monetária que efectivamente excluía, por definição, a desvalorização (e todos os efeitos estabilizadores automáticos decorrentes). As múltiplas crises que se verificaram dentro do sector estatal, da economia real e do sector bancário foram "obstruídas" com o lançamento de mais empréstimos caros dentro destes sectores insolventes. O artigo da Spiegel marca um ponto de viragem: Alguns poderosos decisores políticos alemães parecem não mais estarem dispostos a continuar nesse beco sem saída. Sem dúvida escolheram um meio estranho de declarar a sua decisão. Contudo, apesar da maneira covarde como tornaram pública a sua nova convicção, um novo capítulo está a começar para a Europa. Ele não será necessariamente bem escrito ou nos fará felizes ao lê-lo. Mas pelo menos abre a perspectiva de uma fuga a uma mentira sombria que proporcionou miséria em massa e que é a garantia de submergir a ideia de uma Europa Unida num mar de discórdia, xenofobia e rancor generalizado.

[*] Professor de Teoria Económica e Director do Departamento de Política Económica da Faculdade de Ciências Económicas da Universidade de Atenas. Seus livros incluem: The Global Minotaur: The True Origins of the Financial Crisis and the Future of the World Economy (Zed Books, 2011); (com S. Hargreaves-Heap) Game Theory: A Critical Text (Routledge, 2004); Foundations of Economics: A Beginner's Companion (Routledge, 1998); e Rational Conflict (Blackwell Publishers, 1991).

O original encontra-se em http://mrzine.monthlyreview.org/2011/varoufakis070511.html

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

sábado, 7 de maio de 2011

Matrix

Sobre as "ideias dominantes"

Alguns exemplos:
1. O tema do Amor é tão insistentemente cantado pelos artistas do espectáculo que exercem uma influência que não é de subestimar na exigência que os indivíduos exercem sobre o conteúdo das relações inter-subjectivas, ajudando a compreender as experiências antes do casamento, cada vez mais precoces e menos censuráveis. Os próprios casamentos (compromissos) tendem a apoiar-se nessa expectativa. Realizando-se sobre essa base tão fluida e volátil, os casamentos desmoronam-se com mais facilidade, tanto mais que as separações e divórcios são admitidos pela sociedade. Um facto está na proporção directa do outro. Noutros tempos passados o Amor era uma invenção dos poetas e trovadores, na realidade a censura era dura e os casamentos faziam-se por trocas e contratos. O marqueting apropriou-se dessas expectativas e contribui para aumentá-las.
2. O tema dos "direitos humanos" compõe uma das estratégias principais das propagandas políticas. No entanto, exprime uma formidável conquista civlizacional. Sendo que a sua origem se encontra já no Iluminismo e na Revolução Francesa, a sua disseminação é uma forte característica do pós-guerra e, sobretudo, dos anos sessenta até hoje. Foi utilizada como arma de "guerra" na "Guerra Fria", contudo é um instrumento actualmente poderosamente eficaz na propaganda dos regimes capitalistas, grosso modo pelo imperialismo (refiro-me em particular ao Império, isto é, aos EUA), contra regimes que deseja abater, começando por desacreditá-los, justificando a seguir o ataque em forma. A Opinião Pública é sensível a esse tema, portanto uma "ideia dominante" converte-se numa estratégia das classes sociais dominantes.

Matrix VIP

«Pois é, o capitalismo democrático dá-nos a ilusão de que temos poder, mas não temos, somos mais manipulados do que alguma vez o fomos. Os media não são o 5º Poder mas o 1º Poder. É através deles que pensamos, agimos, reagimos e actuamos... Se não temos um qualquer suporte (filosófico, cultural, religioso, espiritual) ficamos completamente vulneráveis à mercê daquilo que nos oferecem...»
(Enviado por e-mail, sem autor)

Pois é. Intelectuais de direita e esquerda têm declarado sistematicamente ao longo dos tempos a morte das "ideologias", ou porque assim o desejam ou porque julgam constatar um "facto". Ora, os "factos" são sempre construções nossas, ainda que possam conter uma certa dose de objectividade. O mais acertado é suspeitar que quanto mais o dizem mais o facto é criado, instilado. Suspeito, portanto, que muitos dos indivíduos, jovens ou menos jovens, que ora  nisso acreditam, foram influenciados pelo que vão lendo (a própria escolha do que se lê é já suspeita). Quer designemos a mentalidade dominante de "ideologia" (conjunto de percepções sociais) ou com outro nome qualquer, ela existe; existe uma "cognição social" colectiva e não exclusivamente individual, composta de "opiniões" mais ou menos esquemáticas e estereotipadas, nas quais assumem especial relevância as "ideias dominantes". Quais as fontes emissoras destas mensagens? Os meios de comunicação em primeiro lugar, as escolas, as famílias, os eventos culturais e recreativos. Trata-se, portanto, de compreender quem se apropria dos meios de comunicação, que interesses satisfazem essas "ideias dominantes" e porque se tornam elas dominantes. Esse é trabalho da Filosofia, mas também (ou devia ser) da Sociologia, Psicologia Social, etc. Não é coutada exlusiva dos académicos, os cidadãos podem alcançar a mesma compreensão distanciada e objectiva através da interpretação da Informação (ruidosa), suspeitando e aplicando critérios racionais.
Daí que para contradizer (ou denunciar) as mentiras e meias-verdades dominantes, é indispensável criar outras fontes de informação alternativas, uma espécie de contra-poder. No "capitalismo democrático" existe espaço para tal ( o capitalismo utiliza em seu proveito os regimes democráticos, por isso tem que admitir a oposição). Nestes espaços germina a mudança. Leve o tempo que levar.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

GONZALO ROJAS MORREU!

Poeta chileno, um dos melhores da actualidade.

El poeta maldice a su cadáver









Fuiste la libertad de salvarte o perderte.


Viste el mundo sin ver lo que era el mundo.


¿Por qué fué deformada en tus pupilas


la luz fundamental? ¿Perdiste la razón


antes de resolverse la raíz de tu origen?



Maldita sea tu naturaleza


que sopló por tu boca la hermosura


de la imaginación. Maldita sea


la belleza que hablaba por tu boca.


Maldito el yacimiento de todas tus palabras.



¿Por qué estás disfrazado bajo el vidrio,


como un libro sellado para siempre,


letra inútil, fatídica escritura?


¿Por qué tras de tus ojos ya no está el fuego eterno,


máscara del gusano?




Esta es tu boca. -¿Dónde están tus besos?


Esta es tu lengua. -¿Dónde tu palabra?


Estas, tus piernas. -¿Dónde están tus pasos?


Este tu pelo. -¿Dónde tu lujuria?


Este, tu cuerpo. ¿Dónde tu persona?


Estas, tus manos. -¿Dónde está tu fuerza?


Todo esto fuiste tú. -¿Dónde estás tú?


Dime: ¿dónde hubo un hombre?



Ya no puedes llorar como los árboles


cuando el viento trastorna sus sentidos.


Ya no eres animal, ni adivino del mundo.


Te estás secando poco a poco. Estás


quemando tus acciones, hasta ser


polvo del torbellino.

Programa de Agressão sem precedentes ao povo e ao país

Quarta 4 de Maio de 2011

Desmentindo a operação montada por PS, PSD e CDS, as medidas previstas são a maior agressão aos direitos do povo e aos interesses do país desde os tempos do fascismo. Trata-se de um programa ilegítimo de intervenção externa, construído para favorecer os grupos económicos e financeiros nacionais e estrangeiros, que aprofunda e desenvolve tudo o que foi rejeitado no PEC IV. Um ataque sem precedentes à soberania e independência, só possível pelo papel de abdicação dos interesses nacionais que PS, PSD e CDS estão a assumir.

Uma intervenção que, a concretizar-se, contribuiria para o agravamento da recessão económica, do desemprego e da pobreza – decorrente da quebra no investimento público, da redução dos salários e das pensões, do ataque às pequenas empresas – bem como para o agravamento da dependência externa. Uma intervenção e uma ingerência que o povo português não pode aceitar e que agravaria, a ser aplicada, todos os problemas nacionais, incluindo as condições para o pagamento da dívida externa.

Eis uma síntese de algumas das muitas medidas previstas.

Agravamento da exploração

- Facilitação e embaratecimento dos despedimentos, reduzindo a indemnização paga pelo patronato de 30 para 10 dias (por ano de trabalho) e alargando as possibilidades de despedimento por “justa causa”;

- Redução da duração máxima do subsídio de desemprego para um máximo de 18 meses e limitação do seu montante a 2,5 IAS, com redução sistemática do seu valor após seis meses;

- Flexibilização do horário de trabalho por via do “banco de horas”, redução do valor pago pelas horas extraordinárias;

- Ataque à contratação colectiva e ao papel dos sindicatos na negociação

Ataque aos rendimentos de trabalhadores e reformados

- Congelamento do salário mínimo nacional e desvalorização geral dos salários por via da alteração da legislação de trabalho e do subsídio de desemprego;

- Diminuição real de todas as pensões e reformas durante três anos, incluindo as pensões mínimas, e corte das de valor superior a 1500 euros;

- Aumento do IVA, designadamente nas taxas de bens e serviços essenciais, e de outros impostos indirectos;

- Aumento do IRS por via da redução/eliminação de deduções ficais (saúde, educação, habitação), incluindo o agravamento da tributação das reformas e pensões e introdução do pagamento de imposto sobre rendimentos de apoios sociais;

- Eliminação das isenções de IMI nos primeiros anos após a compra da casa, a par do aumento dos valores matriciais de referência e das taxas aplicadas;

- Aumento dos preços de energia eléctrica e do gás, por via da sua liberalização e do agravamento do IVA;

- Aumento do valor das rendas e facilitação dos despejos;

- Continuação dos cortes nas prestações sociais;

- Agravamento significativo das taxas moderadoras, diminuição das comparticipações dos medicamentos;

Ataque aos trabalhadores e às funções do Estado

- Cortes significativos na saúde, educação, justiça, administração local e regional;

- Encerramento e concentração de serviços (hospitais, centros de saúde, escolas, tribunais, finanças e outros serviços da administração central e regional);

- Congelamento durante três anos dos salários dos trabalhadores da administração pública; redução de dezenas de milhares de postos de trabalho na administração pública;

- Eliminação de freguesias e municípios em número significativo, afastando vastas zonas do território e largas camadas da população de serviços essenciais;

Privatizações

- Privatizações – aceleração da entrega de empresas e participações estratégicas ao capital privado;

- Já em 2011 privatização da participação do Estado na EDP, da REN e da TAP;

- Alienação dos direitos especiais do Estado (“golden shares”) em empresas estratégicas como a PT;

- Privatização da Caixa Geral de Depósitos no seu ramo segurador (mais de 30% da actividade financeira do grupo), bem como de outros sectores de actividade, designadamente no estrangeiro;

- Extensão do processo de privatizações às empresas municipais e regionais;

- Ofensiva contra o sector público de transportes de passageiros e mercadorias, designadamente com a privatização da ANA, CP Carga, Linhas ferroviárias suburbanas, gestão portuária, etc.;

- Venda generalizada de património público;

- Transferência para o sector privado, por via do encerramento e degradação de serviços públicos, de vastas áreas de intervenção até aqui asseguradas pelo Estado;

Mais apoios à banca e grupos económicos

- Banca e grupos económicos isentos de qualquer medida de penalização;

- Transferências de 12 mil milhões de euros para a banca, acrescida de garantias estatais no valor de 35 mil milhões de euros;

- Consumação da assunção pelo Estado dos prejuízos da gestão fraudulenta do BPN, através da sua privatização até Julho de 2011, sem preço mínimo e liberta de qualquer ónus para o comprador;

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Entrevista ao filósofo marxista Jean Salem

Entrevista com Jean Salem




Em direcção a que amanhãs?

Nicolas Dutent

04.Mai.11 :: Outros autoresNesta importante entrevista, Jean Salem faz uma reflexão de largo horizonte sobre as dificuldades e também as potencialidades do tempo presente, sobre a herança política, ideológica e filosófica que transporta. “Desesperado e determinado”, nas suas próprias palavras, Jean Salem é um dos indispensáveis no combate pela saída dos “anos de chumbo” que vêm pesando, em tantos lugares, sobre o movimento comunista.







Jean Salem é um filósofo francês, nascido a 16 de Novembro de 1952, professor de filosofia na Universidade de Paris 1 Panthéon Sorbonne e director do Centro de História dos Sistemas de Pensamento Moderno desde 1998. É filho do jornalista Henri Alleg.


http://www.marxau21.fr/


© Olivier Roller

Um comunista, em meu entender, parece-se um pouco com Diógenes que, tendo-lhe alguém perguntado: « Porque entras sempre no teatro pela porta das traseiras? » respondeu: « porque todos entram pelo outro lado».

Jean Salem, enquanto filósofo e observador crítico da sua época, parece-lhe ainda possível inflectir o curso da mundialização?

Todos estão de acordo num mesmo diagnóstico: em falar duma época de crise. E mesmo duma crise de civilização. A situação geral não se afigura nada entusiasmante, de facto. Um dos cenários mais plausíveis para o futuro próximo reside num ataque que o Império (que entendo como sendo a administração americana) poderia empreender contra o Irão e - porque não? - contra a China. Ao contrário do que se passou na época da crise de 1929, os povos não têm sequer uma esperança para a qual dirigir o olhar. Aquela época era a do primeiro impulso da União Soviética e de um movimento comunista mundial. E quando a catástrofe aconteceu, foi em Estalinegrado, cidade um tanto esquecida a meu ver, que a sorte das armas mudou de rumo. No bom sentido. Ao contrário, não se alude sequer hoje em dia, nos manuais de economia destinados aos jovens estudantes franceses, à possibilidade duma economia planificada. E no entanto, é difícil negar que outra economia que não a economia capitalista existiu efectivamente, com os seus insucessos e os seus êxitos, durante perto de 70 anos. É, aliás, toda a história do movimento operário, e não só a do «socialismo real», que fizeram provisoriamente passar ao rol do esquecimento. Este estado de coisas poderia incitar a um pessimismo absoluto, se resistências crescentemente massivas não vierem a eclodir por todo o mundo. O que falta cruelmente a estas resistências, são, nomeadamente na velha Europa, organizações sólidas, resolutas, comunistas, que não pensassem que pudéssemos ter vergonha do passado! A propósito, posso afirmar que inevitavelmente, em virtude da lei dita dos vasos comunicantes, se imporá uma revisão de todas as asneiras que foram ditas sobre o socialismo real. Constato por outro lado, com alegria, que os jovens - a quem o presente sistema não oferece mais que a precariedade, o desemprego e a guerra generalizada - não passam o tempo (ao contrário do que fazem ainda grande número de sexagenários) a dar literalmente tiros no pé: dito doutra forma, não confessam arrependimento, na volta de cada frase e antes de marcarem cada palavra com um dedo no ar, a respeito dos comprovados crimes de Estaline e do suposto horror do passado soviético no seu conjunto. De facto a «esquerda», em grande parte, virou à direita. Nos países ocidentais, o sistema mediático contribuiu para formatar duradouramente os cérebros, para aniquilar toda a faculdade de análise por pouco autónoma ou por pouco rebelde que seja, no que resta do cidadão. Tentei mostrar isso no meu ensaio intitulado Rideau de fer sur le Boul’Mich, que as edições Delga reeditaram recentemente. Em França, um destes numerosos países onde a abstenção progride cada dia que passa nas cabeças como nas urnas, jornalistas a soldo e sabichões debatem até ao infinito o tema das quotas de popularidade totalmente forjadas deste ou daquele manequim pretensamente «socialista». E puderam divertir o planeta inteiro, durante cerca de dois anos (2007-2008), a propósito da magna questão que consistia em saber se seria um homem de raça negra (Obama) ou antes uma mulher de raça branca (Hillary Clinton) que tomaria o lugar do sinistro Bush para assinar as ordens dos bombardeamentos aéreos visando afegãos, paquistaneses e agora os habitantes do Iémen (1) . Depois disto, alguns, mesmo nas nossas fileiras, falam amavelmente de «democracia», como se esta palavra pudesse designar exactamente as mesmas coisas para os que rejeitam o capitalismo e para os seus melhores promotores. Então, veja, estou simultaneamente desesperado e determinado. Desesperado pela falta cruel de perspectiva para as nossas lutas, e determinado porque confortado por mil sucessos mais ou menos locais. Assim, acolher centenas de pessoas na Sorbonne no quadro dum seminário dedicado a Marx, prova pelo menos que saímos dos anos de chumbo. A uma escala muito mais vasta, podemos constatar que 3 dos 12 milhões de habitantes que conta um país como Portugal se mobilizaram em 24 de Novembro passado, a fim de participar numa greve de protesto contra uma política que entende fazer pagar às populações as especulações a que se dedicam banqueiros, negociantes e outra gente bem. Podemos regozijar-nos, enfim, com o renascer das lutas – aqui em França, mas também na Grécia, na Espanha, em Itália, mesmo na Grã-Bretanha, etc. Eis o que é encorajador.

Vimos, precisamente com a crise financeira que atingiu duramente e sem dúvida duradouramente o nosso país, uma retoma do interesse por Marx a fim de pensar os problemas colocados na modernidade. Que sentido dá a esta reviravolta ?



Na Feira do Livro de Francfort, no ano passado, falou-se muito do grande sucesso de livraria dum certo… Karl Marx. Em França, deve ter notado que as Edições Gallimard reeditaram O Capital, na tradução de M. Rubel. Enorme sucesso de livraria, igualmente! Neste mundo em que a « cultura » é completamente dominada pela vulgaridade estúpida que as grandes cadeias de televisão destilam ou por passatempos frequentemente pouco « sociais », creio ser evidente que uma concepção geral do mundo, descrevendo o capitalismo tal como era no século XIX, um capitalismo cujos efeitos lembram cada vez mais furiosamente aquilo em que nossa sociedade se tornou, - creio que tal concepção é inevitavelmente interesante, atractiva, estimulante. A revolução não nascerá certamente apenas do estudo dos livros nem dum fórum de discussão. Mas a atração pela teoria poderá preceder de muito perto a necessidade de uma organização séria, estruturada, em que cada um não dirá o que lhe venha à cabeça diante da primeira cámara de TV que apareça, mas onde todos adoptariam como consigna o dar forma, dar seguimento, dar vida, às decisões e às palavras de ordem previamente decididas. Em resumo, o ABC, quereria dizer que a verdadeira «esquerda» precisa de se dotar muito rápidamente duma disciplina ao menos comparável à que pode reinar no mais débil dos partidos de direita ! – Muitos são os que consideram hoje em dia que não existe ainda um apoio à altura da sua cólera, da sua determinação, da sua vontade de ruptura - pacificamente, se puderem; pela força, se tiver de ser, como diziam os cartistas ingleses, no século XIX. Um tal apoio não parece verdadeiramente existir, nem nas direcções sindicais nem, na actual nebulosa que designam (com uma constância cada vez menos credível) a « esquerda» francesa.

Se então nos perguntarmos: para onde vai o marxismo? Seria tentado a dizer que o seu futuro filosófico está assegurado?

Direi mesmo que quando lia o Manifesto do Partido Comunista, aos 15 anos, me colocava algumas questões que hoje já não se põem! De tal maneira este livrinho é actual! Hoje em dia têm a ousadia, como sabe, de falar nos «trinta gloriosos», como sendo uma evidência, quando estes trinta anos de inegável expansão económica não foram, evidentemente, «gloriosos» (do ponto de vista económico) para todos! Nem para o planeta globalmente considerado, nem para os mais pobres no próprio seio das metrópoles do capitalismo. Acresce ainda que a ideia duma concorrência entre operários, por exemplo, num país de quase pleno emprego, dotado de sindicatos poderosos, como era a França dos anos 1970, me parecia bastante obscura. Agora, em período de desemprego e de recessão, todos sabem bem de que falavam os autores do Manifesto ao usarem esta expressão: ela significa que em tempo de crise, se tu não estás contente, dez outros poderão ocupar o teu lugar! Outro exemplo: a ideia que uma pauperização absoluta da classe operária fosse possível durante um longo período fazia rir os menos maldosos na época do automóvel para todos e do electrodoméstico para tudo. Mas actualmente, o amanhã parece vir a ser bem mais duro para os filhos do que foram os « trinta gloriosos » para os pais. E a ideia catastrofista do jovem Marx e do jovem Engels, segundo a qual a nossa sociedade tende para a constituição de dois polos, com um punhado de milionários num e, no polo oposto, inumeráveis legiões de pobres, já não pode fazer encolher os ombros a ninguém.

Concorda então com a frase de J. Derrida “será sempre um erro não ler e reler e discutir Marx. […] Não haverá futuro sem isso. Não sem Marx, não haverá futuro sem Marx.” ?

Certamente. Eu, como outros, escrevi a Derrida dizendo-lhe o quanto fiquei sensibilizado pelo facto de ele ter publicado um livro intitulado Espectros de Marx. Mandei-lhe a minha própria edição dos Manuscritos de 1844, assinando: « Um amigo dos espectros ». Devo dizer que naquela altura (1993) uma «extrema esquerda» perfeitamente desvairada uivava com os lobos e regozijava-se sem o menor disfarce com a destruição duma União Soviética correntemente apresentada como uma segunda Alemanha nazi. Por isso, não estava nada na moda pretender evocar a sombra desse grande morto. Bem poucos, na Universidade francesa, num contexto que Eric Hobsbawm caracterizou como sendo o de «anti-marxismo raivoso», teriam então ousado declarar-se amigos dum tal espectro.

O PCF festeja este fim-de-semana os seus 90 anos de existência. Que retém da acção e do papel do Partido Comunista Francês na história do nosso país no século XX?

Retenho duas coisas. Primeiro, já não temos um ar totalmente marciano, e atrai-se mesmo certa simpatia, se dissermos que é de lá que vimos, que nem sempre «comemos o nosso chapéu», e que não vendemos o nosso compromisso de juventude por um prato de lentilhas social-democratas (veja Bernard-Henri Lévy e outros marquesitos) ou por uma ligação à ideologia «neo-con» (veja Kouchner e os seus émulos). Segundo: uma história gloriosa. Quer se reescreva ou não a história, que a maquilhem ou que a falsifiquem, que se afadiguem a dar relevo a este ou àquele possível erro ou que se critique certa decisão contestável, é certo que o único Partido que, enquanto partido, se opôs com a constância dum metrónomo à injustiça, aos negocistas, aos gangsters da Finança e aos vendedores de armas, ao nazismo, ao racismo, às guerras coloniais e aos compromissos com o sistema, foi, pelo menos até 1975, o Partido Comunista Francês.

Em quê, exactamente, para si e para alguns dos seus camaradas, filosofar pode ser entendido como um acto de resistência?


Podemos filosofar ao serviço dos poderosos ou dos bem-pensantes. A coisa pode também ser praticada nos limbos, e pretendermos não nos movimentarmos senão num universo irreal e desencarnado. Em suma, existe uma certa filosofia espiritualista que pode não incomodar ninguém. Mas se quiser que eu seja «federador» e confraternal a toda a força, reconhecerei portanto isto de boa vontade: no nosso tempo é, sem dúvida, uma maneira de resistir, mesmo tímida, e de se opor à barbárie que vai chegando, ter a preocupação da cultura e pensar que a cultura vale por si mesma, de ser uma certeza que se falará ainda de Aristóteles e de Demócrito daqui a milhares de anos, enquanto os nomes de Sarkozy e de Berlusconi já nada dirão a ninguém. Porque o simples facto de colocar as mãos sobre os quadris e de dizer o que me dizia o reitor da Universidade de… Moscovo, em 2005 - «não podemos de forma alguma construir um país apenas com estudantes em Direito e estudantes em business ! » -, é suficiente para assinalar que as pessoas entendem opor-se ao desastre cultural que ameaça. Os homens, de resto, não poderiam suportar indefinidamente que tudo: a vida, a saúde, o humor, as artes, a beleza, até o amor e o conhecimento… que tudo isso venha depois das sacro-santas « leis » do mercado, dos golpes de bolsa, da publicidade e do marketing !

Entrevista realizada por Nicolas Dutent para a Revue du Projet

(1) Esta entrevista data de Janeiro deste ano, antes do início da agressão à Líbia, a mais recente agressão imperialista a um Estado soberano (NT).

in www. O Diário. info.

Viagem à Polónia

Viagem à Polónia
Auschwitz: nele pereceram 4 milhôes de judeus. Depois dos nazis os genocídios continuaram por outras formas.

Viagem à Polónia

Viagem à Polónia
Auschwitz, Campo de extermínio. Memória do Mal Absoluto.