Há poucas coisas que abram tanto o apetite de um verdadeiro filósofo do que acontecimentos como os que se verificam em Espanha. E que ele desejaria que se replicassem em Portugal.
Quando há doença dizemos que há sintomas. Os sintomas são visíveis, a doença nem sempre, ou apenas o é para os mais atentos. Os sintomas são sinais, não são cópias nem simulacros, mas podem ser símbolos. Há sintomas que realmente simbolizam algo. Uma crise, ou uma mudança de época. De paradigma, sói dizer-se em certos círculos académicos. Nietzsche escrevia diversas vezes sobre o papel de "médico» que cabia ao filósofo, isto é, não propriamente curar, mas interpretar, melhor: avisar. "Zaratustra" avisa, quando desce da Montanha. Hegel já o dissera anteriormente: os sinais que anunciam uma nova época.
Os acampados nas Puertas del Sol anunciam, avisam, simbolizam. As democracias que temos servem quem? Representam o quê? O mal está na representação ou nos representantes? Rousseau diria que está na representação, criticando Montesquieu. "Democracia directa já!", poderia ele ter escrito. Ou seja, participação do povo efectiva, contínua, vigilante. Os revolucionários de 1790 tomaram-no à letra e realizaram a República, com assembleias e comissões permanentes. Dir-se-á que somente durante as revoluções tal democracia é possível e característica. E antes delas, mesmo que elas sejam imprevisíveis?
1 comentário:
Viva caro professor!
Confesso que nunca fui muito dado a filosofia, tecnicamente falando. Contudo, do pouco que sei de Zaratustra, este voltou a refugiar-se na caverna da montanha; avisou mas ninguém ouviu, ou quis! Na minha opinião, a juventude é reactiva e pouco reflexiva. Se "puertas del sol" forem à semelhança da "geração à rasca", está dado o "siga para bingo" da "corte palaciana".
Quanto aos "médicos", há uma anedota que reza assim: "Um dia um doente foi ao médico por causa de umas febres. O médico ia-lhe receitando fármacos disfarçando os sintomas. Um dia, numa ida ao mesmo médico, atendeu-lhe o filho que também era médico. Ao examinar o doente, o médico filho, retirou-lhe uma carraça atrás da orelha, e o doente recuperou a sua saúde. O médico filho confrontou o médico pai, e este observou: - Eu sabia, retiraste-lhe a carraça? Então agora vai-te alimentar da carraça!!!
Por isso, à sua pergunta, receio que não. Não porque só quem conhece o mal pode dar valor ao bem.
Um abraço
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