Pelo Socialismo
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Publicado em 2012/11/26 em: http://www.aporrea.org/internacionales/a154906.html
Tradução do castelhano de PAT
Colocado em linha em: 2014/08/18
Já pouca Palestina resta. Passo a passo,
Israel está a apagá-la do mapa1
Eduardo Galeano*
Para se justificar, o terrorismo de Estado fabrica terroristas: semeia ódio e colhe
tempestades. Tudo indica que esta carnificina de Gaza, que segundo os seus autores
quer acabar com os terroristas, conseguirá multiplicá-los.
Desde 1948, os palestinos vivem condenados à humilhação perpétua. Não podem
nem respirar sem permissão. Perderam a sua pátria, as suas terras, a sua água, a sua
liberdade, o seu tudo. Nem sequer têm o direito de eleger os seus governantes.
Quando votam em quem não devem votar, são castigados. Gaza está a ser castigada.
Converteu-se numa armadilha sem saída, desde que o Hamas ganhou limpidamente
as eleições no ano de 2006. Algo de semelhante havia ocorrido em 1932, quando o
Partido Comunista ganhou as eleições de El Salvador.
Banhados em sangue, os salvadorenhos expiaram a sua má conduta e, desde então,
viveram submetidos a ditaduras militares. A democracia é um luxo que nem todos
merecem. São filhos da impotência os foguetes caseiros que os militantes do Hamas,
encurralados em Gaza, disparam com desajeitada pontaria sobre as terras que foram
palestinas e que a ocupação israelita usurpou. E o desespero, à beira da loucura
suicida, é a mãe das bravatas que negam o direito à existência de Israel, gritos sem
nenhuma eficácia, enquanto a muito eficaz guerra de extermínio está a negar, há
vários anos, o direito à existência da Palestina. Já pouca Palestina resta. Passo a
passo, Israel está a apagá-la do mapa.
Os colonos invadem e, depois deles, os soldados vão corrigindo a fronteira. As balas
consagram o despojo, em legítima defesa. Não há guerra agressiva que não afirme ser
guerra defensiva. Hitler invadiu a Polónia para evitar que a Polónia invadisse a
Alemanha. Bush invadiu o Iraque para evitar que o Iraque invadisse o mundo. Em
cada uma das suas guerras defensivas, Israel engoliu outro pedaço da Palestina, e os
almoços continuam. Isso justifica-se pelos títulos de propriedade concedidos pela
Bíblia, pelos dois mil anos de perseguição que o povo judeu sofreu e pelo pânico
gerado pelos palestinos, à espreita. Israel é o país que nunca cumpre as
recomendações e resoluções da Organização das Nações Unidas, que nunca acata as
sentenças dos tribunais internacionais, que zomba das leis internacionais, e é
também o único país que legalizou a tortura de prisioneiros.
Quem lhe deu o direito de negar todos os direitos? De onde vem a impunidade com
que Israel está a executar a matança de Gaza?
O governo espanhol não poderia bombardear impunemente o País Basco para acabar
com a ETA, nem o governo britânico poderia arrasar a Irlanda para liquidar o IRA.
Será que a tragédia do Holocausto implica uma apólice de eterna impunidade? Ou
essa luz verde vem da potência que mais manda e que tem em Israel o mais
incondicional dos seus vassalos?
O exército israelita, o mais moderno e sofisticado do mundo, sabe quem mata. Não
mata por engano. Mata por horror. Às vítimas civis chamam danos colaterais,
segundo o dicionário de outras guerras imperiais.
Em Gaza, em cada dez danos colaterais, três são crianças. E são milhares os
mutilados, vítimas da tecnologia de esquartejamento humano, que a indústria militar
está a ensaiar com sucesso nesta operação de limpeza étnica. E, como sempre, é
sempre o mesmo: em Gaza, cem a um. Por cada cem palestinos mortos, um israelita.
Gente perigosa, adverte o outro bombardeamento, a cargo dos média de manipulação
de massas, que nos convidam a acreditar que uma vida israelita vale tanto como cem
vidas palestinas. E esses média também nos convidam a acreditar que são
humanitárias as duzentas bombas atómicas de Israel, e que uma potência nuclear
chamada Irão foi quem aniquilou Hiroshima e Nagasaki.
Existe a chamada comunidade internacional? É algo mais do que um clube de
negociantes, banqueiros e guerreiros? É algo mais do que o nome artístico que os
Estados Unidos atribuem a si próprios quando fazem teatro?
Perante a tragédia de Gaza, a hipocrisia mundial brilha mais uma vez. Como sempre,
a indiferença, os discursos vazios, as declarações ocas, as declamações altissonantes,
as posturas ambíguas prestam homenagem à sagrada impunidade. Perante a tragédia
de Gaza, os países árabes lavam as mãos. Como sempre. E, como sempre, os países
europeus esfregam as mãos.
A velha Europa, tão capaz de beleza e de perversidade, derrama uma ou outra
lágrima, enquanto secretamente celebra este golpe de mestre. Porque a caça aos
judeus foi sempre um costume europeu, mas, desde há meio século, essa dívida
histórica está a ser cobrada aos palestinos, que também são semitas e nunca foram
nem são antissemitas. Eles estão a pagar, em sangue vivo e sonante, uma conta
alheia.
(Este artigo é dedicado aos meus amigos judeus assassinados pelas ditaduras
militares latino-americanas que Israel assessorou).3
*Eduardo Germán María Hughes Galeano, conhecido como Eduardo Galeano, é um
jornalista e escritor uruguaio, célebre por ter escrito “As veias abertas da América”. Ganhou
o prémio Stig Dagerman. É considerado um dos mais destacados escritores da literatura
latino-americana.
1
Note-se que este artigo foi escrito há quase 2 anos. – [NE]
1 comentário:
Um genocídio consentido
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