A história por contar
Agostinho Lopes
Acabou de aparecer nas livrarias, em Dezembro, o livro de Ribeiro Cardoso, «O 25 de Novembro e os media estatizados», com o subtítulo, «Uma história por contar». Fica assim o ano de 2017 marcado pela publicação de dois livros, o referido, e o «Quando Portugal ardeu», de Miguel Carvalho, que são importantes contributos para combater a amnésia sobre o que foi o PREC e o 25 de Novembro. E, fundamentalmente, para ajudar a desmontar as mistificações monstruosas que sobre esses acontecimentos a historiografia «oficiosa» foi tecendo, com muita ajuda da academia e total e activa cumplicidade dos media dominantes. Casos como o da Renascença, o do República ou dos «saneados» do Diário de Notícias por José Saramago! Porque, como alguns textos a propósito das «comemorações» de algumas datas demonstram, há os que continuam convencidos que a mentira repetida acabará por ser a verdade!
Bem-haja o jornalista Ribeiro Cardoso por nos vir recordar de forma viva e impressiva, fundamentada e suportada por muitos depoimentos dos que directamente participaram, ou melhor, sofreram na pele a arbitrariedade, ilegitimidade das decisões então tomadas pelo poder político de direita, PS, PSD e CDS, no pós 25 de Novembro. Tratou-se «de 152 suspensões e despedimentos de trabalhadores da comunicação estatizada sem processo disciplinar e sem direito a defesa no 25 de Novembro.» Que ao fim de vários anos foram absolvidos pelos tribunais, mas já sem remédio para carreiras profissionais arruinadas e dezenas de vidas pessoais e familiares destruídas.
Não me surpreende, assim, o silêncio que a generalidade da comunicação social dominante tem feito sobre o Livro desde que ele foi apresentado, em fins de Novembro. Um silêncio de rachar pedras!
E a leitura do Livro acabou por me levar alguma resposta a outras preocupações sobre a comunicação social que temos. Será que o domínio absoluto de um pensamento quase único, unidireccional, pejado de ignorância e falta de rigor, de sistemática ausência de real investigação jornalística, de repetição de chavões e empestado de preconceitos, tem alguma coisa a ver com a prática liquidação da cultura de resistência, rebeldia, empenhamento social e cívico, coragem profissional de toda uma geração profissional saneada pelo 25 de Novembro? Mesmo sabendo que uma parte deles, felizmente, ainda anda por aí, a remar contra a maré. (Mesmo sabendo, que é também o resultado da quase total eliminação da comunicação social pública, pela sua entrega aos media do capital privado, ditos «independentes»).
Eu tenho de perceber, por exemplo, como é que esta comunicação social foi capaz de alinhar, a propósito da revisão da Lei do Financiamento dos Partidos, na espantosa concentração de mentiras, exibição de ignorância e má-fé ao serviço da exploração mais rasteira de populismo e demagogia, em nome da defesa da transparência do regime democrático.
Eu tenho de perceber por exemplo, porque é que esta comunicação social, que andou meses e anos a massacrar-nos com textos e notícias sobre a calamidade de um tal Corbyn à frente do Partido Trabalhista e das suas mirabolantes e pré-históricas propostas, para quem o mínimo que se previa eram as setes pragas do Egito, para o Partido e a nação, e que desde as últimas eleições no Reino de Sua Magestade, aparentemente, o fez desaparecer. Será que o Sr Corbyn faleceu e nós não demos por tal!? Será que o Labour mudou de líder? Será porque, segundo parece, as sondagens dão aos trabalhistas quase 10 pontos percentuais de vantagem?!
Eu tenho de perceber por exemplo, a razão da duplicidade, mistificação e mentira mediáticas na abordagem das guerras da Síria e do Médio Oriente. Porque é que o filme de Alepo é a preto, e o de Mossul é a branco, ou mesmo a azul. Aliás, a batalha de Alepo chegou ao fim, sem que os jornalistas e comentadores do Público, Expresso e outros media, ditos de referência, enxergassem um único daesh em Alepo. Porque é que os fundamentalistas islâmicos eram guerrilheiros contra os soviéticos e são talibãs contra os EUA. Porque é que o Assad é um ditador e um bandido e os patrocinadores do terrorismo de Estado, como Bush (bem substituído por Trump) e Blair…são democratas respeitados!
Eu tenho de perceber muitas outras coisas… mas acho que tudo está claro. Muito claro.
Este artigo encontra-se em: FOICEBOOK http://bit.ly/2CVTbYw
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