Por Makis Papadopoulos*, via Revista Comunista Internacional, traduzido por Diego Souza Carvalho.
* Membro do Comitê Central do KKE e responsável pelo Comitê Ideológico do KKE.
Passou-se um século desde a confrontação teórica histórica entre Lênin e Kautsky sobre a definição que determina o conteúdo sócio-econômico do imperialismo, assim como a teoria do “ultraimperialismo”. É bem sabido que Lênin travou uma polêmica feroz contra a posição de Kautsky sobre o imperialismo, que o identificou como a política que os países industriais desenvolvidos preferem para prevalecer sobre os países agrícolas mais débeis. Em geral, criticou a separação da política imperialista de sua base econômica, do domínio do capital monopolista. Ademais, é bem sabido que Lênin criticou a posição oportunista que o desenvolvimento da economia capitalista a nível internacional conduz ao ultraimperialismo, a uma grande interdependência dos interesses das classes burguesas dos diversos países. Esta posição oportunista implicaria inevitavelmente na resolução pacífica de suas diferenças, na firmação de acordos imperialistas que conduziriam à formação de uma economia unificada, pacífica, organizada, mundial e capitalista. A história do século XX, a eclosão de duas grandes guerras imperialistas e de outras mais pequenas, confirmaram que é correta a abordagem teórica leninista. Porém, como veremos, a percepção oportunista segue sendo forte, o que sublinha a atualidade deste debate histórico concreto nas condições atuais.
A atualidade da crítica de Lênin à teoria de Kautsky
Nas fileiras do movimento comunista internacional segue sendo forte uma série de posições e análises oportunistas que, em essência, entendem o imperialismo principalmente como uma política exterior, uma invasão externa e a dominação de um Estado burguês forte sobre outro Estado mais fraco. Estas análises geralmente apresentam os ataques e as intervenções militares imperialistas existentes dos Estados capitalistas mais fortes, a entrada de monopólios estrangeiros mais fortes para explorar e controlar o mercado de um país ou de uma região mais ampla, de maneira separada do conteúdo sócio-econômico do imperialismo, como a última e superior fase do capitalismo.
Estes pontos de vista restringem o movimento operário a condenar de maneira superficial as intervenções imperialistas e, ao mesmo tempo, promovem de maneira errônea a possibilidade de aliança social da classe operária com forças burguesas, com o objetivo de superar o atraso do desenvolvimento capitalista e alcançar essencialmente sua independência nacional. Desta forma, o objetivo de melhorar a posição de um país capitalista no sistema imperialista, um objetivo que leva à colaboração de classes, se apresenta como “antiimperialista”, como um objetivo de luta radical contra a dependência imperialista.
Por isso é de particular importância apresentar a posição leninista sobre o imperialismo como a época reacionária do capitalismo que está em decadência e morre, com características unificadas para todos os Estados do sistema imperialista internacional, se serão mais fracos ou mais fortes em um dado momento.
Estas características unificadas tem a ver com o domínio dos monopólios, das empresas acionistas poderosas e a agudização do antagonismo capitalista, a formação do capital financeiro, o aumento da importância da exportação de capital em relação com a exportação de mercadorias, a luta por uma nova repartição de mercados e territórios entre os Estados imperialistas e os grupos monopolistas internacionais.
O predomínio dos monopólios, das empresas acionistas poderosas, conduz ao distanciamento e a separação da propriedade capitalista da gestão e organização da produção capitalista que constitui a base econômica para a intensificação do papel parasitário da burguesia em cada Estado capitalista. Parasitas perigosos se beneficiam diariamente da compra e venda de ações de empresas capitalistas, sem nenhuma outra relação com as ditas empresas.
O parasitismo, a agudização da contradição básica entre o caráter social da produção e da apropriação capitalista de seus resultados, caracterizam todos os Estados capitalistas, independentemente da posição que ocupam no sistema imperialista internacional.
Ao mesmo tempo, o fortalecimento da tendência de exportação de capitais acelera o desenvolvimento do capitalismo nos países destinatários e contribui, aliado à velocidade de avanços tecnológicos, à rápida mudança na correlação de forças entre os Estados no sistema imperialista internacional, conforme a lei do desenvolvimento desigual.
Lênin enfatizou em sua obra que no princípio do século XX um pequeno grupo de Estados tinha uma posição de liderança no mercado mundial graças aos trustes, cartéis, às relações interestatais entre os Estados credores e os Estados devedores. Enfatizou o crescimento da força que alcançam as partes específicas que desempenham o papel de credor, usurário, rentista em relação com os Estados devedores. Ademais, deu enfoque no grupo de Estados fortes com colônias naquele momento. Seguindo o método leninistas, devemos estudar as atuais mudanças nas posições dos Estados no sistema imperialista internacional. Atualmente, cerca de 200 Estados adquiriram sua independência política. Devido ao impacto da lei do desenvolvimento desigual, as relações desiguais entre os Estados capitalistas são inerentes ao sistema imperialista e a mudança na correlação de forças entre os Estados é contínuo. Portanto, os comunistas não podem ter como objetivo de luta salvaguardar relações de igualdade entre os Estados burgueses no terreno capitalista.
No atual sistema imperialista formou-se uma situação de interdependência desigual entre o conjunto dos Estados capitalistas. Fortes Estados credores do século XX se transformaram hoje em Estados devedores (veja por exemplo a grande dívida estatal da UE, da França, Itália) enquanto que a China atualmente é um Estado credor. A mudança na correlação de forças entre a Grã-Bretanha e a Índia, do século XX ao século XXI, é o exemplo mais indicativo.
De maneira similar, hoje o tema da formação de uma “aristocracia operária” não está limitado a um punhado de Estados capitalistas fortes. A ampliação e aprofundamento das relações de produção capitalistas no sistema imperialista contemporâneo tem permitido o surgimento da “aristocracia operária” na maioria dos Estados capitalistas. Assim, a divisão da unidade da classe operária e a penetração das visões pequeno-burgueses no movimento operário adquiriram um caráter geral.
Nesse contexto, os comunistas devem examinar o desenvolvimento das alianças imperialistas, as relações interestatais desiguais, as dependências militares, políticas e militares, assim como a agudização das intervenções imperialistas, a expansão das guerras locais e o perigo de uma nova guerra imperialista generalizada.
De outro modo, qualquer previsão será pouco sólida já que não será baseada na relação entre a economia e a política. De outro modo, existe o perigo de o movimento comunista, em vez de se utilizar das contradições interimperialistas para a derrubada revolucionária da burguesia, acabe servindo aos interesses de um dos centros imperialistas rivais.
Por isso a crítica leninista da teoria do “ultraimperialismo” é importante e atual. Uma série de análises teóricas e políticas contemporâneas, em essência, reafirmam novamente o cerne do ponto de vista oportunista de Kautsky (por exemplo globalização, império), invocando certas tendências contemporâneas existentes.
O crescimento da força das empresas com estrutura acionista multinacional, a maior taxa de crescimento do comércio mundial, a ampliação das interdependências entre os Estados capitalistas se destacam como as características contemporâneas de uma nova fase histórica do capitalismo, em relação com o período do imperialismo.
Na
realidade, todos estes fenômenos refletem a tendência geral de
internacionalização da produção, das inversões, do movimento do capital
no quadro do mercado capitalista mundial. Contudo, esta tendência não
pode refutar o impacto da lei do desenvolvimento desigual, tampouco pode
anular o feito de que a parte básica da reprodução do capital social se
realiza no quadro da economia capitalista com base no Estado nacional.
No quadro deste movimento objetivo e contraditório da economia
capitalista estão se acentuando as contradições interimperialistas. (...)
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