Há uma Psicologia materialista?
Temos vindo a expor neste blogue algumas informações que julgamos relevantes sobre as concepções materialistas na Filosofia. Traçámos um excurso breve do desenvolvimento destas concepções desde o seu aparecimento há milhares de anos na Índia, na China, na Grécia, até ao século XIX; ficou este ainda incompleto pois que tencionamos expor as ideias de Karl Marx e F.Engels com um rigor e concisão que exige algum trabalho.
Neste post queremos colocar a seguinte questão: é o Materialismo uma concepção exclusivamente filosófica, isto é, confina-se a esta disciplina do saber, ou é transversal a todas as ciências? Os cientistas enquanto exercem essa actividade (uma ciência particular) criam noções com efeitos filosóficos? Com mais clareza: existe uma Psicologia, Sociologia, História, etc, materialistas? Uma Física materialista?
Tentaremos responder gradualmente a estas questões. Hoje apenas colocamos algumas contribuições de outros, entre as mais notáveis na nossa opinião. Se não nos for possível tirar conclusões, que outros as tirem.
1. É possível e desejável introduzir-se ou defender-se uma linha materialista na Física? O especialista –epistemólogo- argentino Mario Bunge julga que sim, criticando o idealismo que parece vigorar nos Discípulos da Escola de Copenhague (alguns afirmam que as micropartículas – os quanta – não são senão criações úteis do espírito), assim como o empirismo no modo como se interpreta a experimentação ( o papel da Razão é negligenciado , isto é, das teorias). Aquilo que convencionalmente se designa por «realismo» é nele um realismo crítico que o aproxima claramente de algumas teses centrais do materialismo. O seu livro «Filosofia da Física» (Ed. 70) é um valioso contributo para, a partir de uma visão crítica, se estabelecer uma filosofia materialista da Física.
2. É possível e desejável uma Psicologia materialista? Sem qualquer dúvida para uma plêiade de eminentes psicólogos: I. Pavlov (1850-1936) que, em nossa opinião, lançou as bases de uma Psicologia científica e materialista (Teoria dos reflexos simples e dos reflexos condicionados), com amplo e oficial apoio na ora extinta URSS; o estudo directo dos processos nervosos que constituem o substrato material dos fenómenos psíquicos, não mais se deixou de fazer, embora com altos e baixos, em todo o mundo: a psicologia behaviorista (comportamentalista) iniciada por J. Watson deve a Pavlov muito mais do que aquilo que evitava assumir; a neurologia germânica, francesa (a Escola de P. Changeux), norte-americana (com destaque para o nosso compatriota A. Damásio, o qual fornece sólidas bases para uma psicologia materialista, ainda que ele não seja marxista de modo nenhum; veja-se, no entanto, a sua crítica ao dualismo que remonta a Descartes e a sua «descoberta» entusiástica da filosofia de Espinosa (o qual é, na minha opinião, uma «arma de guerra» do materialismo, independentemente das intenções do próprio). Devemos referir obrigatoriamente os nomes de eminentes psicólogos como: os russos S.L. Rubinstein (o livro «O ser e a consciência» é um monumento), A.R. Luria, A.N. Leontiev; o marxista francês Henry Wallon, pioneiro dos estudos experimentais do desenvolvimento do pensamento nas crianças, e o psicólogo suíço de renome mundial, Jean Piaget que, apesar das suas tergiversações e da sua cerrada crítica à filosofia, é um nome incontornável na Psicologia do Desenvolvimento, a linha mais acertada pela qual a mais recente psicologia enveredou. A Psicologia científica materialista deve muitíssimo ao russo L.S.Vigotsky (1896-1934) que fundou a Psicologia do Desenvolvimento, crítico do excesso de «fisiologia» nas explicações sobre o psiquismo, realçando o papel activo dos seres humanos na criação e na mudança do seu ambiente, actividade essa que dá origem a novas formas de consciência (Luria, Leontiev e Rubinstein, seguiram-lhe os passos, repondo nessas bases a «reflexologia» pavloviana).
3. Na Sociologia é de reter a escola de Frankfurt (T. Adorno em particular)e o imenso contributo de Pierre Bourdieu. Na Psicologia Social novamente a Escola de Frankfurt, os estudos pioneiros sobre a psicologia de massas; o francês Moscovici (Homens Domésticos, Homens Selvagens, e A Sociedade Contranatura); o biólogo ou etólogo K. Lorenz, o qual demonstrou o papel do ambiente e das culturas na estruturação das reacções aprendidas e das inatas. De resto, basta consultar um manual de Psicologia (A ou B) escolar para nos certificarmos como está ausente uma filosofia idealista e mística ( a «alma» há muito que foi jogada no sótão das velharias). Uma psicologia materialista não reduz os fenómenos psíquicos aos processos fisiológicos, nem, pelo contrário, os reduz aos processos sociológicos. As mediações dialécticas constituem um dispositivo fundamental de um pensamento materialista.
2 comentários:
um exemplo de bom aproveitamento da net...
irei lendo. e aprendendo...
abraços
Obrigad, amigo. Não me servi da net, mas servir-me-ei sempre que dela necessitar. Ainda estou muito agarrado aos livros...
Enviar um comentário