Nogueira
(José Félix Henriques).
f. 23 de Janeiro de 1853.
Jornalista
e escritor.
N.
em Dois Portos a 15 de Janeiro de 1825, fal. em Lisboa em 23 de Janeiro de 1853.
Era filho de Félix Henriques Nogueira e de D. Maria do Espírito Santo Henriques
Nogueira.
Possuidor
de meios de fortuna que bastavam para lho assegurar uma existência independente,
entregou-se com fervor ao estudo, e todo se dedicou à defesa das ideias, que no
seu espírito acendera a revolução francesa de 1878, e que nunca renegou. A
França sempre exerceu uma grande influência no espírito português, como em geral
no espírito europeu. Em 1878 foram todos em Portugal mais ou menos republicanos,
e até um pouco socialistas. Depois esses republicanos e esses socialistas foram
tranquilamente deputados históricos e deputados regeneradores. José Félix
Henriques Nogueira ficou sempre fiel a esses princípios.
Aspirou
à fundação da república em Portugal e em Espanha, e desejou ardente e
sinceramente a organização da república federal ibérica. Trabalhou pela causa da
associação, e aconselhou vivamente a fundação dum centro eleitoral operário. Nas
eleições de 1851 apresentou a sua candidatura de deputado pelo círculo de
Alenquer, e tinha a sua eleição bem figurada. Nessa ocasião lançou-se
ardentemente na luta, publicando no Eco dos operários, de 11 de Outubro
de 1851 uma Carta ao centro eleitoral
operário, e a 22 desse mês e ano escreveu e
publicou em folheto separado uma Carta
programa aos membros do colégio
eleitoral de Alenquer, e a 5 de Novembro seguinte na Revolução de
Setembro um artigo intitulado Interesses agrícolas em que expunha as suas ideias sobre o
futuro e o desenvolvimento da agricultura portuguesa, que ele sobretudo se
propunha defender na câmara. Vencido, contudo, em segunda votação, protestou
energicamente num artigo intitulado Ao
país, exposição sobre a eleição de
Alenquer, que saiu na Revolução de Setembro de 27 de Novembro do
referido ano de 1851. Ficando fora do parlamento, Henriques Nogueira
consagrou-se ao acabamento da publicação dum dos seus livros mais notáveis,
Estudos sobre a Reforma em Portugal, obra em 2 volumes, que foi muito bem
recebida no público, e a seu respeito escreveu António Feliciano de Castilho um
artigo extremamente laudatório intitulado Boa Nova, que veio publicado no
Almanaque democrático para 1852. Foi fundador deste almanaque
Henriques Nogueira, o qual saiu quatro anos seguidos, de 1852 a 1855. Teve
colaboradores, mas era ele o seu principal redactor. Ali escreveu artigos acerca
de Ledru-Rollin, Mazzini, Kossuth, Raspail, Roberto Blum, Ricardo Cobden, Victor
Hugo, Guilherme Pope, David d'Angers e Daniel Manin. Estudou ali também as
questões do futuro da Península, da Ibéria, da Associação local, da organização
o municipal e da administração central. Um dos seus maiores pensamentos era o
da federação ibérica. O ilustre democrata sonhava a fragmentação da Espanha em
pequenas repúblicas, e a entrada depois de Portugal nessa federação devaneada
por ele.
Diz
um dos seus biógrafos: "O entusiasta sonhador não via que preparava assim o
caminho para a Ibéria sempre odiada, e justamente odiada pelos portugueses, que
nestes povos latinos de tradições centralistas a república federal é apenas a
transição para o cesarismo. Aceitar, mesmo nessas condições, a ligação com a
Espanha é trair a causa da pátria. A separação de séculos, as barreiras
invencíveis que se tem levantado entre os dois países peninsulares, faria sempre
com que Portugal ficasse isolado no meio dessa confederação de repúblicas de
interesses e de simpatias muito diferentes das nossas. Na federação democrática,
da mesma forma que na monarquia seriamos sempre nós as vítimas. Pois no tempo
dos Filipes não era também a nossa união com a Espanha até certo ponto federal?
Não conservávamos a nossa autonomia administrativa, os nossos foros e
privilégios? Não éramos, não fomos sempre governados, como se estipulara nas
cortes de Tomar, ou por príncipes da casa real ou por vice-reis portugueses? E
contudo, esses sessenta anos foram, e foram justamente, considerados na história
sessenta anos de cativeiro."
Em
1851, contudo, a Ibéria, debaixo desta nova forma, chegou a ter partidários
dedicados. Foi o tempo em que se
fundou a Revista Peninsular, onde Henriques Nogueira colaborou, em
que Latino Coelho escreveu o prólogo do livro de D. Sinibaldo de Mas. O
sentimento público, porém, revoltou-se contra estas tendências, e esses sonhos
democráticos ibéricos desfizeram-se completamente. Em 1852 Henriques Nogueira
tornou a apresentar a sua candidatura para deputado, desta vez pelo círculo de
Torres Vedras. A 22 de Novembro desse ano publicou um folheto, ou alocução programa intitulada
Aos eleitores do círculo de Torres Vedras.
Novamente ficou
vencido, e então muito desanimado, resolveu ir
viajar, e em 1853 percorreu a Espanha, Franca, Bélgica, Alemanha é a Inglaterra.
Começou a publicar as Recordações da sua
viagem no 1.° vol. do Arquivo
Pitoresco (1858), chegando ao capitulo X, ficando a maior parte inédita,
porque a morte do autor veio interromper a publicação.
Voltando
da sua viagem, fundou em 1854 o jornal Progresso, em que largamente escreveu
como redactor principal. O jornal era político, mas Henriques Nogueira dedicou
mais a sua atenção às questões económicas do país, e substituiu o Almanaque democrático, que então
publicava, por outro com o titulo de Almanaque do cultivador, que principiou
em 1858, saindo o 2.° e ultimo em 1858. Nesses almanaques publicou Henriques
Nogueira apreciáveis artigos, entre os quais se contam as Sinopses histórico agrícola e bibliográfico agrícola de Portugal, Interesses agrícolas e os Bancos Municipais, Uma visita a
Tiptree-Hall e Dois dias em
Grignon. Trabalhador incansável e sempre dedicado à defesa das ideias que
sustentava, Henriques Nogueira andava reunindo elementos vastíssimos para uma
obra que ia empreender, intitulada Ibéria
histórica, que devia ser a história dos vestígios e memórias que nos restam
em factos e escritos acerca da ideia da união de Portugal com a Espanha, debaixo
do princípio político ou económico. Ao mesmo tempo escrevia o Catecismo democrático, que deixou
manuscrito.
Lidava
nesta azafama sinceramente, no meio das simpatias e da estima de todos, mesmo
dos adversários intransigentes das suas ideias, quando faleceu repentinamente,
na idade de 33 anos, causando a sua morte a mais dolorosa surpresa, não só aos
seus amigos, mas a toda a Lisboa. A imprensa da capital mostrou o mais vivo
sentimento por tão inesperada morte, e um ano depois prestou-se à sua memória
uma imponente homenagem. Sua mãe e seu tio mandaram construir no cemitério dos
Prazeres, defronte do jazigo de Silvestre Pinheiro Ferreira, um túmulo para onde
fossem trasladados os restos mortais do ilustre jornalista, realizando-se a
trasladação no dia 21 de Janeiro de 1859. Muitos amigos do finado encarregaram o
escultor Manuel Maria Bordalo Pinheiro de fazer um busto do finado, que foi
posto no túmulo, onde se gravou a seguinte dedicatória:
A
José Félix Henriques Nogueira, que tanto amou a pátria e em mais de oito anos de
estudos políticos não visou nas suas viagens e multiplicados escritos senão a
faze-la prosperar; por benigno consentimento de sua mãe, tomando parte neste
testemunho de saudade, lhe consagram o busto que adorna este túmulo, alguns dos
seus amigos, colaboradores e correligionários. Apóstolo fervoroso da liberdade,
igualdade e fraternidade, foi estrénuo defensor da doutrina democrática e da
ideia da federação política das Espanhas. O futuro julgará suas opiniões e as de
muitos que lhe sobrevivem.
Por
ocasião da sua morte, publicaram sentidos artigos os seguintes jornais Opinião, de Janeiro de 1858; Revolução de Setembro, no dia 26; Correio da Europa, no dia 31, etc. Da
trasladação também publicaram artigos, nos respectivos dias, A Opinião, Revolução de Setembro, Futuro, Jornal do Comércio e Português. Também publicaram artigos
biográficos: A Revista Peninsular,
vol. II, pág. 381 a 384; Ilustração
Luso-Brasileira, vol. II, págs. 30 e 31. Henriques Nogueira deixou trabalhos
literários e políticos no Panorama,
Eco dos Operários, Jornal da Associação Industrial
Portuense, Revista Peninsular, Scalabitano, etc.
Além
dos livros já citados, escreveu: O
Município no século XIX, Lisboa, 1856; a maior parte desta obra tinha saído
no jornal Progresso, de 1855, e dela
falara elogiosamente a Ibéria, jornal
político de Madrid; a 24 de Março de 1856; Ericeira, no vol. III da 2.ª série do Panorama, pág. 335, com uma gravura; Revista histórico política de Portugal,
por J. A. dos Santos e Silva, crítica literária na Revolução de Setembro, 12 de Agosto
1852; Necessidade da instrução primária,
e vantagens do método Castilho, dito de leitura repentina; no Jornal da Associação Industrial
Portuense, de 15 de Dezembro de 1852; Método Castilho, para o ensino rápido e
aprazível do ler impresso, manuscrito e numeração, e do escrever, crítica
literária na Revolução de Setembro,
de 6 de Julho de 1853; Os novos
franciscanos, esboceto político, publicado no Scalabitano de 23 de Abril de 1857; Instrução primária, fragmento no mesmo
jornal de 21 de Junho do mesmo ano.
Muitos
anos depois, em 1880, prestou-se uma levantada homenagem à memória de Henriques
Nogueira; uma associação democrática e de instrução, fundada nesse ano, tornava
o nome de Club Henriques Nogueira. O
célebre jornal de caricaturas o António
Maria, esquecendo-se por um momento da sua índole galhofeira, recordou com
respeito a memoria do ilustre escritor, e como se o nome de Bordalo Pinheiro
tivesse de andar associado sempre a estas homenagens, assim como foi o seu pai,
Manuel Maria Bordalo Pinheiro, que cinzelou o busto que se colocou sobre o
túmulo, foi o filho Rafael Bordalo Pinheiro quem desenhou numa das páginas do
António Maria esse mesmo busto, fazendo-lhe quase uma apoteose. Lê-se no
Dicionário Popular, dirigido por
Pinheiro Chagas, vol. VIII, pág. 439: “Bem sabemos que foi principalmente o
espírito partidário que presidiu a esta homenagem, mas se o partido republicano
vê apenas em Henriques Nogueira um dos precursores do movimento republicano
federal do nosso país, a pátria, esquecendo o que podiam ter de ofensivo para o
sentimento nacional algumas das suas ideias, vem nesse homem o apóstolo dedicado
da instrução popular, do princípio da associação, o campeão dos interesses
agrícolas do país e do desenvolvimento da vida municipal.”
Transcrito por Manuel Amaral
| ||
Edição electrónica © 2000-2010 Manuel Amaral |
Translate
domingo, 30 de setembro de 2012
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário