Para onde vai a África (2), por António Abreu
Na
primeira parte deste artigo afirmámos que, no conjunto e, no caso de
alguns países, individualmente, a África é uma grande exportadora de
recursos naturais, com valores do PIB significativos, sem que as
populações disso beneficiem, correndo o risco de verem esses recursos
esgotados pela voracidade da exploração. Continuamos uma ronda por
regiões e países, procurando reportarmo-nos a 2017 sempre que possível.
África Central
São nove os países agrupados na região da África Central: República Centro-Africana, República do Congo, República Democrática do Congo (RD do Congo), República do Chade, Guiné Equatorial, República de S. Tomé e Príncipe, Gabão, República dos Camarões e República de Angola.
Esta região preenche a parte equatorial do continente, limitada pelo Atlântico a oeste e por altas escarpas montanhosas e grandes falhas a leste. No resto do território, encontram-se, alternadamente, planaltos e planícies atravessados por rios caudalosos. O clima de calor e humidade nos países da extremidade norte é condição para a existência de florestas equatoriais. O clima tropical predomina na extremidade sul da África Ocidental, tendo como ecossistema as savanas.
A população dessa região é menos densa, sendo os países mais populosos a RD do Congo e Angola. Inclui centenas de grupos étnicos diferentes com o mesmo tronco comum – os bantos. Esta é uma classificação baseada na semelhança linguística, sem que a palavra banto se refira a um povo ou etnia.
A agricultura da África Central é semelhante à agricultura da África Ocidental. A importância da exploração mineral é maior na RD do Congo e em Angola, onde existem jazidas de cobre, cobalto, manganésio e ferro. A extracção vegetal, nomeadamente de madeira, é explorada pela economia regional. Como na quase totalidade do continente, há poucas indústrias, mas os lençóis petrolíferos na faixa litoral e o grande potencial hidroeléctrico desses países permitem o crescimento económico.
Entre Janeiro e Agosto de
2017 as importações de petróleo bruto pela China subiram 12%
relativamente ao mesmo período de 2016, passando para 281,05 milhões de
toneladas. As de minério de ferro cresceram 6,7%, alcançando 713,98
milhões de toneladas, e as de cobre diminuíram 13%, sendo equivalentes a
3,01 milhões de toneladas.
O acordo alcançado entre os países produtores de petróleo para reduzir a produção e fazer aumentar os preços obrigou Angola a cortar 78 mil barris de crude por dia com efeitos desde 1 de Janeiro de 2017, para um limite de 1,673 milhões de barris diários, com efeitos graves sobre a economia angolana, muito dependente do petróleo.
O quinto maior produtor de petróleo no continente só recentemente iniciou a recuperação de uma longa guerra civil apoiada por potências estrangeiras, subsequente à guerra de libertação nacional, guerra civil em que grupos como a UNITA e a FNLA saquearam recursos preciosos, como diamantes e marfim, para venda no estrangeiro em troca de armamento. Perto de um milhão de angolanos perderam a vida e 40% da população foi deslocada.
Apenas uma pequena fracção das receitas geradas pela petrolífera nacional tem sido efectivamente aplicada no desenvolvimento do país e em benefício do seu povo, situação que o novo presidente angolano quer rever. Foi já com João Lourenço que a ENI assinou um contrato de exploração das jazidas do norte de Cabinda.
Tropas de meia dúzia de países estrangeiros estacionam na RD do Congo, apoiando diferentes facções que lutam pelo controlo de ricas jazidas de ouro, diamantes, cobre, cobalto e coltan (o país possui as maiores reservas mundiais). Uma autêntica guerra civil, na RDC mas sobretudo pela posse das minas, foi travada com o apoio dessas forças. Em 2008 a ONU apresentou estimativas desconcertantes sobre este conflito: mais de 4 milhões de pessoas mortas na disputa do chamado «ouro azul».
Esses exércitos fazem-se pagar: estima-se que já tenham sido facturados ao exército do Ruanda (país que não tem exploração de coltan e cujo comércio resulta, em larga escala, de operações de contrabando) mais de 250 milhões de dólares deste minério fundamental para a produção de toda a tecnologia relacionada com equipamentos electrónicos.
À rapina dos exércitos soma-se a dos grandes grupos económicos: os fornecedores de dezasseis multinacionais, entre as quais a Apple, a Microsoft e a Sony, sobre-exploram homens, mulheres e crianças na extracção de cobalto usado no fabrico de baterias recarregáveis de lítio.
Aquele que é um dos países mais ricos do planeta e o sétimo produtor de petróleo em África carrega uma pesada dívida externa e encontra-se quase no final da escala do índice de desenvolvimento humano.
Em Dezembro de 2017 as Forças de Defesa do Povo de Uganda (UPDF) entraram novamente em território congolês para operações contra as Forças Democráticas Aliadas (ADF), desta vez com o acordo do governo da RDC, que aprovou a operação destinada a deter a guerrilha islâmica.
Continua a questão de saber se a situação de segurança na RDC é favorável à realização de eleições nacionais. Não será fácil matar as feridas nesta antiga colónia belga, abertas desde o golpe da CIA e dos serviços secretos ingleses que levou ao assassinato do primeiro primeiro-ministro Patrice Lumumba em 1961 e às posteriores ingerências estrangeiras.
O multipartidarismo foi introduzido em 1991 mas o Partido Democrático da Guiné Equatorial (PDGE) governa o país há quase 40 anos e venceu por esmagadora maioria, em Dezembro de 2017, as eleições legislativas, senatoriais e municipais.
O país recebe anualmente quinhentos milhões de dólares em rendas do petróleo, o que lhe conferia em 2007 o quarto lugar na escala mundial em receita per capita, apesar de se encontrar no fim da escala do índice de desenvolvimento humano.
A República Centro-Africana é vítima há anos de uma guerra, com uma intervenção militar francesa (2013-2016) e a presença de uma força de paz da ONU, a Minusca, com 12 500 «capacetes azuis». Confrontam-se milícias armadas, a pretexto de diferenças étnicas e religiosas. O secretário-geral da ONU procura uma mediação entre as partes que leve à deposição das armas e ao diálogo para construir uma solução de segurança e desenvolvimento.
Alguns relativamente novos produtores de petróleo, como o Sudão e o Chade, constituem oportunidades para a voracidade das petrolíferas. Cartum está cheia de arranha-céus e outras expressões de riqueza mas a carência de recursos básicos revelam como a equidade e a reconciliação continuam longe de ser alcançadas pela população no Darfur.
A União Europeia e os EUA impuseram sanções com o argumento de pressionar o governo a promover as condições para a paz e avançaram com tropas e bases estrangeiras na região, para supostamente apaziguarem o conflito. Do outro lado da permeável fronteira, o governo do Chade aplica boa parte das receitas do petróleo na aquisição de armamento em vez de desenvolver as infraestruturas mais básicas do país.
Mesmo ao lado, no Burundi, a pequena ex-colónia alemã e belga resistiu a tentativas de interesses externos para derrubar a administração do presidente Pierre Nkurunziza, que está no seu terceiro mandato. Embora Bujumbura se tenha livrado do Tribunal Penal Internacional (TPI) a instituição baseada nos Países Baixos afirma que continuará a perseguir os dirigentes do Burundi a propósito de alegadas violações de direitos humanos.
Os auto-proclamados grupos de defesa dos direitos humanos e a União Europeia (UE) continuam a reafirmar a necessidade de o TPI tomar medidas contra governos e organizações rebeldes, enquanto os crimes de guerra configurando genocídios infligidos a povos de África, Médio Oriente, Ásia e América Latina pelos estados imperialistas ocidentais, com um papel destacado dos EUA, são rotineiramente ignorados por essas instituições e, em muitos casos, pelos investigadores da Amnistia Internacional e da Human Rights Watch.
África Oriental e Centro-Oriental
A África Oriental e Centro-Oriental vai da bacia hidrográfica do rio Congo até as águas do mar Vermelho e do oceano Índico: Eritreia, Etiópia, Djibuti, Somália, Quênia, Tanzânia, Uganda, Ruanda, Burundi, Seychelles, Moçambique, Somália e Tanzânia; mas inclui países do interior, como o Zimbabwe, a Zâmbia e o Malawi.
A diversidade da paisagem da África Oriental é muito grande. No meio de quantidade menor de planícies e planaltos, os maciços montanhosos e as grandes falhas geográficas originaram grande quantidade de vulcões e lagos. O clima predominante é o tropical, com mais baixas temperaturas devido à altitude. A vegetação é formada por florestas equatoriais, savanas, estepes e formações características de áreas desérticas.
As etnias não têm homogeneidade: na península da Somália, que os geógrafos conhecem como o «Corno de África», há predominância do grupo étnico banto, enquanto em outras áreas são encontrados muitos camitas, árabes, indianos e europeus. O contingente de habitantes da zona rural é numericamente maior do que a população das cidades. As cidades mais populosas da África Oriental são Nairobi, Mogadíscio e Adis-Abeba.
Os contactos entre os povos não se limitavam às regiões costeiras, uma vez que era no interior do continente que se encontrava a maior parte dos recursos que faziam parte de um alargado comércio: primeiro, o ouro, depois o marfim e, finalmente, os escravos. Por isso, a «região» incluiu sempre países como a fértil Etiópia, o rico Zimbabwe e o imenso Congo.
Com a colonização europeia a África Oriental passou a ser administrada fundamentalmente pelo governo britânico, embora com bolsas de dominação para os países que participaram na Conferência de Berlim de 1885: Portugal manteve Moçambique (África Oriental Portuguesa); a Alemanha o Tanganica (que, com outros países, veio a originar a Tanzânia); e a Bélgica o Congo Belga (hoje República Democrática do Congo) e também o Ruanda e o Burundi, após a derrota alemã na Primeira Guerra Mundial.
Na África Oriental de hoje a economia tem como base a agricultura orientada para a exportação, como o café e o algodão. Há escassez de recursos minerais, limitados a jazidas menores de ouro, platina, cobre, estanho e tungsténio. Ainda não foi atingida decisivamente pela industrialização.
Já quanto à África Centro-Oriental, ela é uma das regiões de maior pobreza e onde ocorrem mais conflitos. Os seus povos sofreram crises de seca e fome (Somália e Etiópia) e conflitos entre etnias. Morreram 800 mil hutus e tutsis no Ruanda e no Burundi.
A nação africana de Madagáscar, ao largo da costa do subcontinente, foi atingida por pragas de pneumonia e bubónica, na pior ocorrência dessas doenças mortais registada nos últimos tempos1. Apesar de nenhum caso novo ter sido relatado desde meados de Novembro de 2017, existem especulações sobre a possibilidade de ocorrer outro surto em 2018. Tais epidemias são um resultado directo do subdesenvolvimento da infraestrutura de saúde do país.
Os mesmos problemas são enfrentados nos estados membros da União Africana (UA) em todo o continente. A epidemia da doença do vírus do Ébola (EVD), desde o final de 2013 até aos primeiros meses de 2015, em vários estados da África Ocidental – com maior gravidade na Guiné, Serra Leoa e Libéria – foi detida com a assistência da comunidade internacional, incluindo a da República de Cuba: esta enviou centenas de profissionais de saúde que desempenharam um papel crítico na crise.
Ao longo da costa do oceano Índico encontra-se a antiga colónia portuguesa de Moçambique. O país nasceu em 1975, como resultado de uma prolongada guerra revolucionária liderada pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
O novo Moçambique foi co-fundador da Conferência de Coordenação do Desenvolvimento da África Austral (SADCC), entidade precursora da actual Comunidade de Desenvolvimento da África Austral Contemporânea (SADC), fundada em 1992 em Windhoek, República da Namíbia. A SADC tem agora 16 Estados-membros, com a União das Comores, a sua mais recente afiliada. Como resultado do legado da prática da escravatura e do colonialismo portugueses, Moçambique enfrentou enormes desafios socio-económicos na sua independência.
Outras complicações surgiram quando o treino da Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO) foi assumido pelo regime da Rodésia (agora Zimbabwe). Após a libertação do Zimbabwe (Abril de 1980) o regime racista de apartheid que governava a República da África do Sul também utilizou a RENAMO num esforço para destruir Moçambique como um Estado-nação independente. O declínio do apartheid obrigou a RENAMO a assinar um acordo de cessar-fogo com o governo da FRELIMO em 1992. Desde então, com a RENAMO como partido de oposição, ocorreram crises periódicas de violência provocadas pela organização, embora sejam hoje menos frequentes.
Embora Moçambique tenha sido citado pelo seu crescimento económico na última década, os problemas recentes, que envolvem a descida dos preços das commodities e as dificuldades no sector financeiro, dificultaram a capacidade do país se desenvolver. Um artigo publicado pela World Finance, do passado 22 de Dezembro, salientou que «o empréstimo do governo, mais alto do que o esperado, despertou a confiança nas perspectivas económicas de Moçambique, com o investimento directo estrangeiro a cair 20% no ano passado. Há, no entanto, sinais de melhoria. A descoberta de 20 mil milhões de barris de gás natural em 2011 promete transformar a economia, mas ainda há muitos desafios que devem ser superados se a economia do país se continuar a desenvolver».
A descoberta de recursos de gás natural e petróleo em Moçambique, bem como ao longo do oceano Índico, nos estados africanos do leste (Tanzânia, Quénia e Somália), ilustram as perspectivas de um vasto desenvolvimento económico. No entanto, com o controle dos preços da energia nas mãos dos países imperialistas, a existência desses recursos não se traduz necessariamente em maior independência e soberania.
Um caso bizarro ocorreu com a República da Zâmbia. Esta anunciou em Dezembro de 2017 que acolheria a convocação de uma Cimeira Israel-África. A Zâmbia mantém uma embaixada em Israel que inclui um adido militar. Essa declaração surgiu depois de uma tentativa de ser o Togo a albergar essa cimeira, em virtude da contestação interna do regime. No voto de 21 de Dezembro da Assembleia Geral da ONU contra a declaração do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de transferir a embaixada americana de Telavive para Jerusalém, reconhecendo esta como capital de Israel, a Zâmbia não esteve presente e o Togo votou a favor da atitude dos EUA. Benjamin Netanyahu ainda se deslocou à República do Quénia durante a cerimónia de início do segundo mandato do presidente Uhuru Kenyatta, para procurar ajuda de outros membros da União Africana a esse processo.
A atitude da Zâmbia ilustra as fraquezas dos estados africanos em relação à manutenção de sua longa solidariedade com o povo palestiniano e outras nações oprimidas a nível mundial. A realização dessa Cimeira poderia ser um revés colossal para o papel da África nos assuntos mundiais. Enquanto o continente permanecer dividido sob o domínio do capital imperialista, esses desafios continuarão. A África é potencialmente rica em minerais, energia, energia hidroeléctrica e agricultura, que só beneficiará os trabalhadores, agricultores e jovens quando a verdadeira independência e soberania nacional for alcançada.
Ao longo dos últimos quatro anos, a inundação dos mercados mundiais de petróleo e gás natural com os recursos energéticos produzidos nos EUA tiveram um impacto profundamente negativo nos países da África, como Nigéria e Angola. Isso implicará certamente, a necessidade de criar mercados alternativos e fontes de financiamento separadas das instituições bancárias baseadas nos EUA e na EU. Com toda a probabilidade esse parece ser um pré-requisito para o crescimento e desenvolvimento genuínos no continente
A Etiópia tem no Djibuti, cuja economia abastece, uma saída natural para as suas exportações, que aumentarão com a potassa que será produzida em fábricas a instalar pela China.
Dos muitos acordos que o Djibuti tem com diversos países, os de maior envergadura são, de longe, com os chineses, com quem assinaram acordos para catorze mega-projectos no valor global de 8,9 mil milhões de dólares.
Num raio de menos de 30 km encontram-se a base dos EUA, (onde estão sediadas as suas operações clandestinas no Corno de África e no Iémen), a do Japão (a sua primeira-base no estrangeiro no pós-guerra), os campos e bases franceses, (resto da presença colonial daquela que aí foi potência estrangeira dominante) e a única base da Itália no estrangeiro. A Alemanha também está presente, mas sem este tipo de estruturas.
Obras de envergadura no porto, realizadas por americanos e chineses, coexistem com bases militares de ambos os países que farão deste entreposto milenar uma nova realidade geo-estratégica. É neste território, equivalente ao que vai do Algarve a Coimbra, que Pequim está a instalar a sua base militar mais afastada do Mar da China. Outros países ambicionam o mesmo: a Arábia Saudita assinou em 2017 um acordo com Djibuti para a instalação de uma base militar; a Rússia viu negada tal pretensão mas procura que aos seus navios seja permitido acostar no cais controlado pela China.
Estão projectados seis portos, entre os quais: um para exportar a potassa da Etiópia, outro para o gás natural do Ogaden (na região etíope, a ser explorado pela China) e outro gerido por italianos para a exportação de dromedários do Corno de África para a península Arábica. Provável é ainda a construção turística, com possibilidade de acostagem por grandes paquetes.
Os EUA tentaram, em Abril de 2015, através do Secretário de Estado John Kerry, deter as instalações militares chinesas no Djibuti. Sem êxito. Dias depois o presidente do país anunciou os acordos com Pequim que as incluíam.
As reservas de minério sustentam a economia da África Meridional. Os principais produtos do extracção mineral da África do Sul são: o ouro, o diamantes, o crómio e o manganésio – da Zâmbia provêm o cobre e o cobalto. Na agricultura a produção é de clima mediterrânico como vinhas, oliveiras e frutas, além de alimentos de clima tropical como cana-de-açúcar, café, e tabaco e algodão. A pecuária, extensiva, é exclusivamente de gado bovino.
No território da África do Sul a concentração das indústrias está localizada nas regiões metropolitanas de Joanesburgo, Cidade do Cabo e Durban. Na África do Sul o apartheid vigorou até 1994, tendo 15,5% da população (os brancos) mantido a segregação racial a todos os níveis. A brutal concentração de rendimentos e riqueza, consolidada a partir da instituição do apartheid não desapareceu completamente com o seu fim.
Aquela que é uma das maiores economias do continente enfrenta uma persistente crise, com um fraco crescimento e uma taxa de desemprego elevada. Vinte e três anos depois da derrota do regime racista e da chegada ao poder do ANC, persistem no país a pobreza e profundas desigualdades sociais, apesar dos avanços económicos e sociais alcançados. Sectores económicos fundamentais, como a indústria mineira, continuam a ser explorados por multinacionais sediadas no estrangeiro e a terra pertence, em grande medida, ao capital «branco», pese embora o esforço de eliminação das caracterizações políticas e económicas na base da cor da pele.
O novo presidente do ANC, Cyril Ramaphosa, antigo dirigente sindical mineiro, assumiu importantes compromissos aquando da sua eleição. Desde logo trabalhar para garantir a vitória, nas eleições gerais de 2019, da aliança progressista formada pelo ANC, pelo Partido Comunista Sul-africano (SACP) e pela central sindical COSATU. Mas também transformar radicalmente a economia, criar mais empregos, fazer aceder a maioria da população às riquezas do país, lutar contra a corrupção, a pobreza, as desigualdades e a repartição assimétrica dos recursos naturais, salientando-se a necessidade de uma reforma agrária e do confisco de terras usurpadas aos seus legítimos donos – o que exigirá uma alteração constitucional.
A Namíbia, que proclamou a sua independência em 1990, fez parte da África do Sul durante 70 anos. Depois da colonização alemã, a Namíbia foi classificada como colónia da África do Sul, depois da Primeira Guerra Mundial. O primeiro governante que a população da Namíbia elegeu após a proclamação da independência foi Sam Nujoma, que dirigiu o movimento guerrilheiro de libertação nacional durante cerca de 30 anos.
Notas finais
Ao longo dos últimos quatro anos, as consequências da inundação dos mercados mundiais de petróleo e gás natural com os recursos energéticos produzidos nos EUA tiveram um impacto profundamente negativo nos países da África, como Nigéria e Angola. Por isso, a necessidade de criar mercados alternativos e fontes de financiamento separadas das instituições bancárias baseadas no ocidente com toda a probabilidade, é um pré-requisito para o crescimento e desenvolvimento genuínos no continente.
Essa falta de independência real reflecte, como referimos atrás, a posição da República da Zâmbia, que anunciou em Dezembro de 2017 ir acolher a convocação de uma Cimeira Israel-África.
Para Abayomi Azikiwe, editor da agência Pan-African News Wire, embora se tenha verificado um crescimento económico no continente na última década, a reversão desse processo em quatro anos comprova que a dependência do investimento directo estrangeiro, sem planeamento estratégico de natureza socialista, que beneficie a maioria das populações dos países da UA, só pode dar origem a ciclos periódicos de crises da dívida, estagnação e recessão económica. Esta tem sido a situação nos principais estados africanos desde a Nigéria à África do Sul, de Angola ao Egipto.
Ao longo do ano que passou, diversos relatórios afirmavam que tanto a África do Sul como a Nigéria emergiram da recessão com mínimos de crescimento em dois trimestres. No entanto, esta recuperação limitada está subordinada ao ligeiro aumento dos preços das commodities e à extensão do crédito das instituições financeiras do Ocidente.
A integração dos estados da UA nos planos geográfico, económico e político é a única solução real para o crescimento e o desenvolvimento sustentáveis – defende Abayomi Azikiwe. A mesma deve ser acompanhada pela retirada das forças do Pentágono, presentes no continente através do Comando de África dos Estados Unidos (AFRICOM), e sua substituição por um Alto Comando Africano como fora previsto na década de 1960 pelo ex-Presidente da Primeira República do Gana, Kwame Nkrumah.
A África deve recuperar a visão dos primeiros líderes da independência revolucionária, que procuraram construir o continente como uma força importante nos assuntos mundiais. Isso pode ser feito sob a direcção de uma nova geração de líderes empenhados em libertar o continente e os seus povos do legado dos séculos de escravidão, colonialismo e neocolonialismo – conclui Abayomi Azikiwe.
África Central
São nove os países agrupados na região da África Central: República Centro-Africana, República do Congo, República Democrática do Congo (RD do Congo), República do Chade, Guiné Equatorial, República de S. Tomé e Príncipe, Gabão, República dos Camarões e República de Angola.
Esta região preenche a parte equatorial do continente, limitada pelo Atlântico a oeste e por altas escarpas montanhosas e grandes falhas a leste. No resto do território, encontram-se, alternadamente, planaltos e planícies atravessados por rios caudalosos. O clima de calor e humidade nos países da extremidade norte é condição para a existência de florestas equatoriais. O clima tropical predomina na extremidade sul da África Ocidental, tendo como ecossistema as savanas.
A população dessa região é menos densa, sendo os países mais populosos a RD do Congo e Angola. Inclui centenas de grupos étnicos diferentes com o mesmo tronco comum – os bantos. Esta é uma classificação baseada na semelhança linguística, sem que a palavra banto se refira a um povo ou etnia.
A agricultura da África Central é semelhante à agricultura da África Ocidental. A importância da exploração mineral é maior na RD do Congo e em Angola, onde existem jazidas de cobre, cobalto, manganésio e ferro. A extracção vegetal, nomeadamente de madeira, é explorada pela economia regional. Como na quase totalidade do continente, há poucas indústrias, mas os lençóis petrolíferos na faixa litoral e o grande potencial hidroeléctrico desses países permitem o crescimento económico.
Angola e o ouro negro
Em Fevereiro de 2017, segundo relatórios da Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP), Angola continuava a ser o principal produtor de petróleo em África, mantendo-se à frente da Nigéria, que já suplantara em 2016:2015 | 2016 | Var. | Var.% | |
---|---|---|---|---|
Angola | 1,753 | 1,730 | -0,023 | -1,3% |
Nigéria | 1,861 | 1,577 | -0,284 | -15,3% |
O acordo alcançado entre os países produtores de petróleo para reduzir a produção e fazer aumentar os preços obrigou Angola a cortar 78 mil barris de crude por dia com efeitos desde 1 de Janeiro de 2017, para um limite de 1,673 milhões de barris diários, com efeitos graves sobre a economia angolana, muito dependente do petróleo.
O quinto maior produtor de petróleo no continente só recentemente iniciou a recuperação de uma longa guerra civil apoiada por potências estrangeiras, subsequente à guerra de libertação nacional, guerra civil em que grupos como a UNITA e a FNLA saquearam recursos preciosos, como diamantes e marfim, para venda no estrangeiro em troca de armamento. Perto de um milhão de angolanos perderam a vida e 40% da população foi deslocada.
Apenas uma pequena fracção das receitas geradas pela petrolífera nacional tem sido efectivamente aplicada no desenvolvimento do país e em benefício do seu povo, situação que o novo presidente angolano quer rever. Foi já com João Lourenço que a ENI assinou um contrato de exploração das jazidas do norte de Cabinda.
O Congo, tão rico e tão cobiçado
A República Democrática do Congo – onde o presidente Joseph Kabila tem vindo a ser pressionado pelo Ocidente para realizar eleições multipartidárias naquele que é um dos maiores estados de África – é um estado rico em minerais, mas caracterizado por instabilidade política e social, fruto de conflitos étnicos, territoriais e políticos. A luta na região central de Kasai, conduzida por opositores ao actual governo, criou um problema de refugiados na vizinha República de Angola.Tropas de meia dúzia de países estrangeiros estacionam na RD do Congo, apoiando diferentes facções que lutam pelo controlo de ricas jazidas de ouro, diamantes, cobre, cobalto e coltan (o país possui as maiores reservas mundiais). Uma autêntica guerra civil, na RDC mas sobretudo pela posse das minas, foi travada com o apoio dessas forças. Em 2008 a ONU apresentou estimativas desconcertantes sobre este conflito: mais de 4 milhões de pessoas mortas na disputa do chamado «ouro azul».
Esses exércitos fazem-se pagar: estima-se que já tenham sido facturados ao exército do Ruanda (país que não tem exploração de coltan e cujo comércio resulta, em larga escala, de operações de contrabando) mais de 250 milhões de dólares deste minério fundamental para a produção de toda a tecnologia relacionada com equipamentos electrónicos.
À rapina dos exércitos soma-se a dos grandes grupos económicos: os fornecedores de dezasseis multinacionais, entre as quais a Apple, a Microsoft e a Sony, sobre-exploram homens, mulheres e crianças na extracção de cobalto usado no fabrico de baterias recarregáveis de lítio.
Aquele que é um dos países mais ricos do planeta e o sétimo produtor de petróleo em África carrega uma pesada dívida externa e encontra-se quase no final da escala do índice de desenvolvimento humano.
Em Dezembro de 2017 as Forças de Defesa do Povo de Uganda (UPDF) entraram novamente em território congolês para operações contra as Forças Democráticas Aliadas (ADF), desta vez com o acordo do governo da RDC, que aprovou a operação destinada a deter a guerrilha islâmica.
Continua a questão de saber se a situação de segurança na RDC é favorável à realização de eleições nacionais. Não será fácil matar as feridas nesta antiga colónia belga, abertas desde o golpe da CIA e dos serviços secretos ingleses que levou ao assassinato do primeiro primeiro-ministro Patrice Lumumba em 1961 e às posteriores ingerências estrangeiras.
Outros países, os mesmos problemas: Guiné-Equatorial, Sudão, Chade e República Centro-Africana
Na Guiné Equatorial um terço da população foi ou aniquilada ou forçada ao exílio pelo regime do presidente Teodoro Obiang Nguema, de 74 anos, no poder desde 1979.O multipartidarismo foi introduzido em 1991 mas o Partido Democrático da Guiné Equatorial (PDGE) governa o país há quase 40 anos e venceu por esmagadora maioria, em Dezembro de 2017, as eleições legislativas, senatoriais e municipais.
O país recebe anualmente quinhentos milhões de dólares em rendas do petróleo, o que lhe conferia em 2007 o quarto lugar na escala mundial em receita per capita, apesar de se encontrar no fim da escala do índice de desenvolvimento humano.
A República Centro-Africana é vítima há anos de uma guerra, com uma intervenção militar francesa (2013-2016) e a presença de uma força de paz da ONU, a Minusca, com 12 500 «capacetes azuis». Confrontam-se milícias armadas, a pretexto de diferenças étnicas e religiosas. O secretário-geral da ONU procura uma mediação entre as partes que leve à deposição das armas e ao diálogo para construir uma solução de segurança e desenvolvimento.
Alguns relativamente novos produtores de petróleo, como o Sudão e o Chade, constituem oportunidades para a voracidade das petrolíferas. Cartum está cheia de arranha-céus e outras expressões de riqueza mas a carência de recursos básicos revelam como a equidade e a reconciliação continuam longe de ser alcançadas pela população no Darfur.
A União Europeia e os EUA impuseram sanções com o argumento de pressionar o governo a promover as condições para a paz e avançaram com tropas e bases estrangeiras na região, para supostamente apaziguarem o conflito. Do outro lado da permeável fronteira, o governo do Chade aplica boa parte das receitas do petróleo na aquisição de armamento em vez de desenvolver as infraestruturas mais básicas do país.
Mesmo ao lado, no Burundi, a pequena ex-colónia alemã e belga resistiu a tentativas de interesses externos para derrubar a administração do presidente Pierre Nkurunziza, que está no seu terceiro mandato. Embora Bujumbura se tenha livrado do Tribunal Penal Internacional (TPI) a instituição baseada nos Países Baixos afirma que continuará a perseguir os dirigentes do Burundi a propósito de alegadas violações de direitos humanos.
Os auto-proclamados grupos de defesa dos direitos humanos e a União Europeia (UE) continuam a reafirmar a necessidade de o TPI tomar medidas contra governos e organizações rebeldes, enquanto os crimes de guerra configurando genocídios infligidos a povos de África, Médio Oriente, Ásia e América Latina pelos estados imperialistas ocidentais, com um papel destacado dos EUA, são rotineiramente ignorados por essas instituições e, em muitos casos, pelos investigadores da Amnistia Internacional e da Human Rights Watch.
África Oriental e Centro-Oriental
A África Oriental e Centro-Oriental vai da bacia hidrográfica do rio Congo até as águas do mar Vermelho e do oceano Índico: Eritreia, Etiópia, Djibuti, Somália, Quênia, Tanzânia, Uganda, Ruanda, Burundi, Seychelles, Moçambique, Somália e Tanzânia; mas inclui países do interior, como o Zimbabwe, a Zâmbia e o Malawi.
A diversidade da paisagem da África Oriental é muito grande. No meio de quantidade menor de planícies e planaltos, os maciços montanhosos e as grandes falhas geográficas originaram grande quantidade de vulcões e lagos. O clima predominante é o tropical, com mais baixas temperaturas devido à altitude. A vegetação é formada por florestas equatoriais, savanas, estepes e formações características de áreas desérticas.
As etnias não têm homogeneidade: na península da Somália, que os geógrafos conhecem como o «Corno de África», há predominância do grupo étnico banto, enquanto em outras áreas são encontrados muitos camitas, árabes, indianos e europeus. O contingente de habitantes da zona rural é numericamente maior do que a população das cidades. As cidades mais populosas da África Oriental são Nairobi, Mogadíscio e Adis-Abeba.
Os contactos entre os povos não se limitavam às regiões costeiras, uma vez que era no interior do continente que se encontrava a maior parte dos recursos que faziam parte de um alargado comércio: primeiro, o ouro, depois o marfim e, finalmente, os escravos. Por isso, a «região» incluiu sempre países como a fértil Etiópia, o rico Zimbabwe e o imenso Congo.
Com a colonização europeia a África Oriental passou a ser administrada fundamentalmente pelo governo britânico, embora com bolsas de dominação para os países que participaram na Conferência de Berlim de 1885: Portugal manteve Moçambique (África Oriental Portuguesa); a Alemanha o Tanganica (que, com outros países, veio a originar a Tanzânia); e a Bélgica o Congo Belga (hoje República Democrática do Congo) e também o Ruanda e o Burundi, após a derrota alemã na Primeira Guerra Mundial.
Na África Oriental de hoje a economia tem como base a agricultura orientada para a exportação, como o café e o algodão. Há escassez de recursos minerais, limitados a jazidas menores de ouro, platina, cobre, estanho e tungsténio. Ainda não foi atingida decisivamente pela industrialização.
Já quanto à África Centro-Oriental, ela é uma das regiões de maior pobreza e onde ocorrem mais conflitos. Os seus povos sofreram crises de seca e fome (Somália e Etiópia) e conflitos entre etnias. Morreram 800 mil hutus e tutsis no Ruanda e no Burundi.
A nação africana de Madagáscar, ao largo da costa do subcontinente, foi atingida por pragas de pneumonia e bubónica, na pior ocorrência dessas doenças mortais registada nos últimos tempos1. Apesar de nenhum caso novo ter sido relatado desde meados de Novembro de 2017, existem especulações sobre a possibilidade de ocorrer outro surto em 2018. Tais epidemias são um resultado directo do subdesenvolvimento da infraestrutura de saúde do país.
Os mesmos problemas são enfrentados nos estados membros da União Africana (UA) em todo o continente. A epidemia da doença do vírus do Ébola (EVD), desde o final de 2013 até aos primeiros meses de 2015, em vários estados da África Ocidental – com maior gravidade na Guiné, Serra Leoa e Libéria – foi detida com a assistência da comunidade internacional, incluindo a da República de Cuba: esta enviou centenas de profissionais de saúde que desempenharam um papel crítico na crise.
Ao longo da costa do oceano Índico encontra-se a antiga colónia portuguesa de Moçambique. O país nasceu em 1975, como resultado de uma prolongada guerra revolucionária liderada pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
O novo Moçambique foi co-fundador da Conferência de Coordenação do Desenvolvimento da África Austral (SADCC), entidade precursora da actual Comunidade de Desenvolvimento da África Austral Contemporânea (SADC), fundada em 1992 em Windhoek, República da Namíbia. A SADC tem agora 16 Estados-membros, com a União das Comores, a sua mais recente afiliada. Como resultado do legado da prática da escravatura e do colonialismo portugueses, Moçambique enfrentou enormes desafios socio-económicos na sua independência.
Outras complicações surgiram quando o treino da Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO) foi assumido pelo regime da Rodésia (agora Zimbabwe). Após a libertação do Zimbabwe (Abril de 1980) o regime racista de apartheid que governava a República da África do Sul também utilizou a RENAMO num esforço para destruir Moçambique como um Estado-nação independente. O declínio do apartheid obrigou a RENAMO a assinar um acordo de cessar-fogo com o governo da FRELIMO em 1992. Desde então, com a RENAMO como partido de oposição, ocorreram crises periódicas de violência provocadas pela organização, embora sejam hoje menos frequentes.
Embora Moçambique tenha sido citado pelo seu crescimento económico na última década, os problemas recentes, que envolvem a descida dos preços das commodities e as dificuldades no sector financeiro, dificultaram a capacidade do país se desenvolver. Um artigo publicado pela World Finance, do passado 22 de Dezembro, salientou que «o empréstimo do governo, mais alto do que o esperado, despertou a confiança nas perspectivas económicas de Moçambique, com o investimento directo estrangeiro a cair 20% no ano passado. Há, no entanto, sinais de melhoria. A descoberta de 20 mil milhões de barris de gás natural em 2011 promete transformar a economia, mas ainda há muitos desafios que devem ser superados se a economia do país se continuar a desenvolver».
A descoberta de recursos de gás natural e petróleo em Moçambique, bem como ao longo do oceano Índico, nos estados africanos do leste (Tanzânia, Quénia e Somália), ilustram as perspectivas de um vasto desenvolvimento económico. No entanto, com o controle dos preços da energia nas mãos dos países imperialistas, a existência desses recursos não se traduz necessariamente em maior independência e soberania.
Um caso bizarro ocorreu com a República da Zâmbia. Esta anunciou em Dezembro de 2017 que acolheria a convocação de uma Cimeira Israel-África. A Zâmbia mantém uma embaixada em Israel que inclui um adido militar. Essa declaração surgiu depois de uma tentativa de ser o Togo a albergar essa cimeira, em virtude da contestação interna do regime. No voto de 21 de Dezembro da Assembleia Geral da ONU contra a declaração do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de transferir a embaixada americana de Telavive para Jerusalém, reconhecendo esta como capital de Israel, a Zâmbia não esteve presente e o Togo votou a favor da atitude dos EUA. Benjamin Netanyahu ainda se deslocou à República do Quénia durante a cerimónia de início do segundo mandato do presidente Uhuru Kenyatta, para procurar ajuda de outros membros da União Africana a esse processo.
A atitude da Zâmbia ilustra as fraquezas dos estados africanos em relação à manutenção de sua longa solidariedade com o povo palestiniano e outras nações oprimidas a nível mundial. A realização dessa Cimeira poderia ser um revés colossal para o papel da África nos assuntos mundiais. Enquanto o continente permanecer dividido sob o domínio do capital imperialista, esses desafios continuarão. A África é potencialmente rica em minerais, energia, energia hidroeléctrica e agricultura, que só beneficiará os trabalhadores, agricultores e jovens quando a verdadeira independência e soberania nacional for alcançada.
Ao longo dos últimos quatro anos, a inundação dos mercados mundiais de petróleo e gás natural com os recursos energéticos produzidos nos EUA tiveram um impacto profundamente negativo nos países da África, como Nigéria e Angola. Isso implicará certamente, a necessidade de criar mercados alternativos e fontes de financiamento separadas das instituições bancárias baseadas nos EUA e na EU. Com toda a probabilidade esse parece ser um pré-requisito para o crescimento e desenvolvimento genuínos no continente
O Djibuti: a nova «porta de África»
O Djibuti está transformado num grande entreposto comercial com uma diversificada presença militar de vários países, por força da competição internacional na deslocação de petróleo e não só. No decurso das transformações que estão a ocorrer, o país poderá tornar-se numa nova «porta de África».A Etiópia tem no Djibuti, cuja economia abastece, uma saída natural para as suas exportações, que aumentarão com a potassa que será produzida em fábricas a instalar pela China.
Dos muitos acordos que o Djibuti tem com diversos países, os de maior envergadura são, de longe, com os chineses, com quem assinaram acordos para catorze mega-projectos no valor global de 8,9 mil milhões de dólares.
Num raio de menos de 30 km encontram-se a base dos EUA, (onde estão sediadas as suas operações clandestinas no Corno de África e no Iémen), a do Japão (a sua primeira-base no estrangeiro no pós-guerra), os campos e bases franceses, (resto da presença colonial daquela que aí foi potência estrangeira dominante) e a única base da Itália no estrangeiro. A Alemanha também está presente, mas sem este tipo de estruturas.
Obras de envergadura no porto, realizadas por americanos e chineses, coexistem com bases militares de ambos os países que farão deste entreposto milenar uma nova realidade geo-estratégica. É neste território, equivalente ao que vai do Algarve a Coimbra, que Pequim está a instalar a sua base militar mais afastada do Mar da China. Outros países ambicionam o mesmo: a Arábia Saudita assinou em 2017 um acordo com Djibuti para a instalação de uma base militar; a Rússia viu negada tal pretensão mas procura que aos seus navios seja permitido acostar no cais controlado pela China.
Estão projectados seis portos, entre os quais: um para exportar a potassa da Etiópia, outro para o gás natural do Ogaden (na região etíope, a ser explorado pela China) e outro gerido por italianos para a exportação de dromedários do Corno de África para a península Arábica. Provável é ainda a construção turística, com possibilidade de acostagem por grandes paquetes.
Os EUA tentaram, em Abril de 2015, através do Secretário de Estado John Kerry, deter as instalações militares chinesas no Djibuti. Sem êxito. Dias depois o presidente do país anunciou os acordos com Pequim que as incluíam.
A África Meridional
Atravessada pela linha imaginária do Trópico de Capricórnio, é composta pela África do Sul, Namíbia, Botswana, Ilhas Comores e Lesoto. No relevo da África Meridional são predominantes os planaltos que coexistem com as baixas altitudes da faixa litoral. As condições climatéricas variam entre a humidade tropical e o deserto da região do Calaári. Apresenta uma vegetação com grande diversidade: savanas, estepes e até mesmo florestas, no litoral do oceano Índico.As reservas de minério sustentam a economia da África Meridional. Os principais produtos do extracção mineral da África do Sul são: o ouro, o diamantes, o crómio e o manganésio – da Zâmbia provêm o cobre e o cobalto. Na agricultura a produção é de clima mediterrânico como vinhas, oliveiras e frutas, além de alimentos de clima tropical como cana-de-açúcar, café, e tabaco e algodão. A pecuária, extensiva, é exclusivamente de gado bovino.
No território da África do Sul a concentração das indústrias está localizada nas regiões metropolitanas de Joanesburgo, Cidade do Cabo e Durban. Na África do Sul o apartheid vigorou até 1994, tendo 15,5% da população (os brancos) mantido a segregação racial a todos os níveis. A brutal concentração de rendimentos e riqueza, consolidada a partir da instituição do apartheid não desapareceu completamente com o seu fim.
Aquela que é uma das maiores economias do continente enfrenta uma persistente crise, com um fraco crescimento e uma taxa de desemprego elevada. Vinte e três anos depois da derrota do regime racista e da chegada ao poder do ANC, persistem no país a pobreza e profundas desigualdades sociais, apesar dos avanços económicos e sociais alcançados. Sectores económicos fundamentais, como a indústria mineira, continuam a ser explorados por multinacionais sediadas no estrangeiro e a terra pertence, em grande medida, ao capital «branco», pese embora o esforço de eliminação das caracterizações políticas e económicas na base da cor da pele.
O novo presidente do ANC, Cyril Ramaphosa, antigo dirigente sindical mineiro, assumiu importantes compromissos aquando da sua eleição. Desde logo trabalhar para garantir a vitória, nas eleições gerais de 2019, da aliança progressista formada pelo ANC, pelo Partido Comunista Sul-africano (SACP) e pela central sindical COSATU. Mas também transformar radicalmente a economia, criar mais empregos, fazer aceder a maioria da população às riquezas do país, lutar contra a corrupção, a pobreza, as desigualdades e a repartição assimétrica dos recursos naturais, salientando-se a necessidade de uma reforma agrária e do confisco de terras usurpadas aos seus legítimos donos – o que exigirá uma alteração constitucional.
A Namíbia, que proclamou a sua independência em 1990, fez parte da África do Sul durante 70 anos. Depois da colonização alemã, a Namíbia foi classificada como colónia da África do Sul, depois da Primeira Guerra Mundial. O primeiro governante que a população da Namíbia elegeu após a proclamação da independência foi Sam Nujoma, que dirigiu o movimento guerrilheiro de libertação nacional durante cerca de 30 anos.
Notas finais
Ao longo dos últimos quatro anos, as consequências da inundação dos mercados mundiais de petróleo e gás natural com os recursos energéticos produzidos nos EUA tiveram um impacto profundamente negativo nos países da África, como Nigéria e Angola. Por isso, a necessidade de criar mercados alternativos e fontes de financiamento separadas das instituições bancárias baseadas no ocidente com toda a probabilidade, é um pré-requisito para o crescimento e desenvolvimento genuínos no continente.
Essa falta de independência real reflecte, como referimos atrás, a posição da República da Zâmbia, que anunciou em Dezembro de 2017 ir acolher a convocação de uma Cimeira Israel-África.
Para Abayomi Azikiwe, editor da agência Pan-African News Wire, embora se tenha verificado um crescimento económico no continente na última década, a reversão desse processo em quatro anos comprova que a dependência do investimento directo estrangeiro, sem planeamento estratégico de natureza socialista, que beneficie a maioria das populações dos países da UA, só pode dar origem a ciclos periódicos de crises da dívida, estagnação e recessão económica. Esta tem sido a situação nos principais estados africanos desde a Nigéria à África do Sul, de Angola ao Egipto.
Ao longo do ano que passou, diversos relatórios afirmavam que tanto a África do Sul como a Nigéria emergiram da recessão com mínimos de crescimento em dois trimestres. No entanto, esta recuperação limitada está subordinada ao ligeiro aumento dos preços das commodities e à extensão do crédito das instituições financeiras do Ocidente.
A integração dos estados da UA nos planos geográfico, económico e político é a única solução real para o crescimento e o desenvolvimento sustentáveis – defende Abayomi Azikiwe. A mesma deve ser acompanhada pela retirada das forças do Pentágono, presentes no continente através do Comando de África dos Estados Unidos (AFRICOM), e sua substituição por um Alto Comando Africano como fora previsto na década de 1960 pelo ex-Presidente da Primeira República do Gana, Kwame Nkrumah.
A África deve recuperar a visão dos primeiros líderes da independência revolucionária, que procuraram construir o continente como uma força importante nos assuntos mundiais. Isso pode ser feito sob a direcção de uma nova geração de líderes empenhados em libertar o continente e os seus povos do legado dos séculos de escravidão, colonialismo e neocolonialismo – conclui Abayomi Azikiwe.
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