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sexta-feira, 18 de março de 2016

A União Europeia perante a encruzilhada:
Voltar-se para este ou para oeste?

Wim Dierckxsens*
17.Mar.16 :: Outros autores
Segundo o autor, Wim Dierckxsens, a crise estrutural do capitalismo e a forma como se confrontam os monopolistas europeus, particularmente os alemães, reflectem-se na luta que se trava entre os defensores de um Estado Global (EUA) e os apologistas de um mundo multipolar (China/Rússia).
É isto que explica as hesitações da Alemanha e o balancear entre continuar com os olhos nos EUA e na OTAN ou voltar-se para o crescente poder da Eurásia, dominada pela aliança China-Rússia, onde estão os seus melhores e maiores clientes.


Em 2016 está em jogo a sobrevivência do petrodólar. Para muitos autores a pergunta já não é se sobrevive ou se será substituído, mas quando acontecerá e o que o substituirá. A Rússia e a China sabem bem que o Ocidente, particularmente os EUA, está na bancarrota e sabem que está a ficar sem ouro para apoiar uma futura moeda internacional. O que há aqui de novo é que, desde Dezembro de 2015 com a subida das taxas de juro pela Reserva Federal, o próprio capital globalizado sediado em Wall Street está a procurar acabar com o próprio dólar. Há uma pirâmide invertida de crédito que conseguiu até à data manter à tona o esquema de Pizzi. Todos estes novos créditos mantêm o sistema a flutuar, ao mesmo tempo que a dívida parece incrementar-se. Os novos credores querem participar na riqueza supostamente produzida pela economia real. No entanto, os novos créditos desde 2008 que não são investidos na economia real. Os títulos para participarem nos lucros sociais, desta forma, vão vendo com o passar do tempo que, cada vez menos, os ditos lucros se geram na economia real.
Foi possível sustentar a pirâmide invertida do crédito até finais de 2015, com as taxas de lucro em baixa até chegarem a negativas. Desta forma a pirâmide invertida de crédito pôde crescer incessantemente até fins de 2015. É o cidadão comum que recebe juros cada vez mais baixos até chegarem a negativos. No entanto, ao continuar com taxas de juro mais negativas cada vez mais actores questionam esse sistema. E não têm interesse em receber juros negativos para os seus depósitos.
Além disso, continuar a baixar a taxa de juro tem um limite. Ao elevar a taxa de juro em Dezembro de 2015, as obrigações de pagamento que implicam a pirâmide invertida de crédito vão em crescendo e põem em perigo iminente a capacidade de pagamento de cada vez mais devedores, incluindo as grandes corporações, sobretudo naqueles sectores em que os preços estão em despique com a indústria petrolífera. A bancarrota do sistema financeiro não só está à vista, como ela é provocada pelos juros do capital financeiro globalizado melhor representado em Wall Street e na City de Londres.
O que Wall Street quer evitar a todo o custo é ser acusado de ter provocado o colapso financeiro e monetário, e por isso procuram afanosamente um culpado. Durante o Fórum Económico Mundial de Davos, em finais de Janeiro de 2016, George Soros, um especulador mundial por excelência e com o seu capital alinhado com os interesses de Wall Street, afirmou que a economia chinesa estava perante uma aterragem brusca, já que o seu crescimento económico estava a cair a pique e a dívida chinesa estaria já insustentável, facto que teria provocado a fuga para o exterior de quase um bilião de dólares, fuga que, provavelmente, ele mesmo teria provocado. (Ver Alessandro Bruno, Economic Collapse: This Is Keeping George Soros Up At Night, 28 de Janeiro de 2016, (http://www.profitconfidential.com/economy/economic-collapse-this-is-keeping-george-soros-up-at-night/).
É necessário recordar que, na primeira metade do ano 2015, a bolsa de valores chinesa teve uma enorme subida que revelava já uma acção do capital especulativo. Na segunda metade desse ano esta bolha esvaziou por acção das mesmas forças especulativas, mas o mercado bolsista revelava já números positivos se tomarmos em conta os 12 meses do ano. Apesar disso, Soros afirmou que a China recorreu à política de desvalorização do yuan para estimular as suas exportações, o que foi interpretado por aquele especulador como uma incapacidade da China em incrementar o crescimento doméstico do país. A baixa da taxa de crescimento da China seria a responsável pela contração económica no mundo inteiro. A leitura é que a China terá de aparecer como o país responsável pelo caos económico que aí vem.
Os próprios comentários de Soros revelam que ele está a especular contra o yuan e outras moedas asiáticas. O actual ataque de Soros ao yuan e às moedas asiáticas poderá ter como resultado o contrário. Depois do colapso do Baht da Tailândia em 1997, provocado pelo mesmo especulador bilionário, é muito provável que as manipulações de Soros não atinjam o objectivo desejado, mas perante as ameaças de desestabilização os países da Eurásia poder-se-ão ver empurrados para uma maior cooperação monetária em toda a região (Ver «Op-ed: Think twice before declaring war on Chinese currency», People’s Daily, Janeiro 27, 2016).
Com o colapso de uma pirâmide invertida em dívidas basicamente expressas em dólares dá-se também uma crise letal do dólar. É preciso para Wall Street que a alternativa ao dólar seja uma moeda manejada pelo Estado Global, dirigido pelos mesmos grandes banqueiros que, de facto, levaram o sistema ao colapso. Em termos económicos procura-se projectar a culpa na China e nos países emergentes, e em termos geopolíticos e militares já se pressente a projecção do caos que se aproxima da Rússia. A Rússia e a China são um obstáculo a este projecto por pretenderem a criação de um mundo multipolar sob a liderança da China e da Rússia tendo o yuan como moeda internacional de primeira linha.
A União Europeia é um jogador chave neste conflito geopolítico. Com o conflito da Ucrânia provocado pelos Estados Unidos, os interesses financeiros globalizados de Wall Street e da City de Londres procuram forçar o alinhamento da UE com o projecto de um Estado Global, e evitar que esta se identifique e comprometa com o projecto Euro-asiático, ampliado sob a liderança da Rússia e da China. A UE está cada vez mais inclinada a ser parte activa no Banco Asiático de Investimentos em Infra-estruturas (BAII), criado em 2015, com muita participação da banca europeia, como um projecto keynesiano da China para a construção da chamada «nova rota da seda», que integraria a Eurásia, incluindo aí a União Europeia. Ao mesmo tempo, observa-se na Europa uma maior reticência em assinar a Associação Transatlântica para o Comércio e a Inversão (TTIP na sua sigla inglesa). A cortina de fumo que rodeia estas negociações não consegue esconder os importantes confrontos relacionados com o status dos tribunais privados de arbitragem estadounidenses no sistema judicial europeu. Particularmente as transnacionais norte-americanas estão a pressionar para que os grandes consórcios possam interpor acções jurídicas contra os Estados europeus nos tribunais de arbitragem privados, no caso dos ditos Estados tomarem decisões que venham a afectar os seus interesses (lucros).Tudo isto não é diferente do que estabeleceu o Tratado Trans-Pacífico (TTP). No entanto, no caso do TTIP não são países periféricos que perdem a sua soberania, mas os próprios países europeus, inclusive a potência económica da União Europeia – a Alemanha. Isto representa para os Estados Europeus em geral, e para Alemanha em particular, um motivo de não alinhamento com o TTIP nem com a OTAN.
Desde Março de 2014, durante a reunificação entre a Rússia e a Crimeia após o golpe de estado na Ucrânia organizado pela OTAN que, como chanceler da Alemanha, Ángela Merkel se viu entalada entre a espada e a parede. Submetida a intensas pressões por Washington, teve de participar numa escalada de sanções contra a Rússia. O objectivo era, obviamente, evitar a todo o custo que a Alemanha e com ela a UE não virassem os olhos para a Eurásia. Aí, no entanto, estão os maiores interesses da Alemanha. Não é então estranho que os grandes industriais e as forças políticas alemãs se mostrem cada vez mais reticentes na manutenção das referidas sanções. As consequências desastrosas não são tanto para a Rússia mas sobretudo para a economia alemã. Não é de estranhar que até dois dos principais partidos políticos alemães, actualmente coligados no governo, protestem energicamente contra esse tipo de negociações sobre o TTIP. Inclusivamente, houve uma gigantesca manifestação pública contra o TTIP em Outubro de 2015, em Berlim.
A complicada decisão perante a encruzilhada (alinhar com os interesses de Wall Street ou antes com aos da Eurásia) provoca a indecisão, já que as duas opções são geopoliticamente opostas. As implicações geopolíticas não excluem o plano militar e não é por isso ocasional que os EUA estejam a colocar as suas ‘defesas’ militares cerca da fronteira da Rússia. Não é apenas para ‘se defender’ de uma ameaça russa, mas também para se defender da possibilidade de a Alemanha decidir vir a alinhar com o bloco Euro-asiático. A chancelaria alemã está a fazer um jogo muito delicado para manter a soberania europeia e só sobre temas secundários se submete formalmente às exigências dos Estados Unidos. O alinhamento da Alemanha e, provavelmente, o de toda a UE com o projecto euro-asiático significaria o fim das aspirações de poder criar um Estado Global. Tudo isto não deixa de ser a preocupação fundamental e de estar alinhado com as forças financeiras globalizantes, e inclusivamente com o capital financeiro mais nacionalista, ultraconservador e com fortes investimentos no complexo industrial e militar norte-americano.
É interessante que o próprio George Soros concedeu ao semanário económico Wirtschafts Woche uma entrevista em que criticava, explicitamente, a política europeia da senhora Merkel, sugerindo inclusive que «isso poderia custar-lhe o seu lugar de chanceler». Ao mesmo tempo apareceram no Twitter e circulavam de forma massiva a partir da costa ocidental dos EUA os slogans «Merkel para a Prisão» e «Merkel tem de sair». Num estudo de 19.000 tweetts originais realizado por Vladimir Shalak concluía que o grande êxodo para a Europa tinha sido organizado e concretizado por actores da costa ocidental dos EUA (Ver, Andrey Fomin, ¿Quem está interessado em desfazer-se de Ángela Merkel? www.voltairenet.org, 2 de Fevereiro de 2016)
Mais, a violência durante a Passagem do Ano provocada em numerosas cidades da Alemanha (como Colónia), pela última grande onda de imigrantes, alimentou uma intensa campanha via Twitter contra a senhora Merkel. O estudo indicado revela que a maior actividade destes militantes do Twitter corresponde ao horário diurno da costa Oeste dos Estados Unidos, ou seja, numa zona em que há 9 horas de diferença para a Alemanha. Toda a campanha política tendente a denegrir os refugiados estava e está organizada por agentes e robots com base na costa ocidental dos EUA. A campanha dirige-se contra Ángela Merkel com o objectivo político de a tirar do seu cargo de chanceler da Alemanha e impor o TTIP à Europa (Andrey Fomín, Ob. cit.).
Fevereiro de 2016

* Economista
Este texto foi publicado em http://mariwim.info/?p=45
Tradução de José Paulo Gascão
in O Diário info

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