Sequelas do pós-4 de Outubro em Portugal
17 anos depois, o Expresso
volta ao «Arquivo Mitrokhin»
O Partido e serviços de informação
volta ao «Arquivo Mitrokhin»
Publicitada com grande espalhafato na sua primeira página, o Expresso dedica
hoje grande da sua revista para remexer nos chamados «arquivos
Mitrokhin» com o objectivo óbvio de difamar e enxovalhar o PCP e em que
não faltam desde velhas estórias da carochinha como o «desvio de
documentos da PIDE para Moscovo» ,
os financiamentos ao PCP, a história já uma vez inventada por Zita
Seabra de que o filho de Costa Gomes ( a mentiraZita disse mesmo que o
Presidente Costa Gomes era membro do PCP) influenciava o pai a favor do
PCP e da URSS) e tudo isto e mais com todos os ingredientes de sofismas,
truques e falsidades que de há muito são genéticas nas provocações anticomunistas que o desfecho político-governativo pós- 4 de Outubro veio obviamente agudizar.
Sobre esta operação, ainda com risco de cansar os leitores, quero salientar selectivamente o seguinte:
Informação de base (fonte Wikipedia):«O Arquivo Mitrokhin é uma colecção de manuscritos copiados pelo major Vasili Nikitich Mitrokhin (1922 – 2004) durante os anos de serviços prestados como arquivista
no KGB. Mitrokhin manteve os documentos secretos escondidos sob o
soalho da sua datcha até 1992, quando fez contacto com o Serviço Secreto
de Inteligência britânico para quem entregou as cópias. Os documentos
foram transformados em livro pelo historiador Christopher Andrew,
escritor e académico britânico.[ e colaborador do MI 6]
A primeira parte do livro fui publicada no Reino Unido em 1999, e foi escrito por Christopher Andrew e
Mitrokhin, A segunda parte do livro foi publicada em 2005, quando
Mitrokhin já tinha morrido, produzindo finalmente o Arquivo Mitrokhin.
Ao ser interrogado pelo Comité de Espionagem e Segurança do Reino Unido en 1999, Vasili Mitrokhin disse que não estava contente com o
modo como o livro tinha sido sido publicado, e disse que sentía que não
tinha conseguido o propósito que tinha quando decidiu escrever as
notas. Ele disse que tinha desejado ter tido «controlo completo sobre a
utilização do seu material”.
Importa
desde logo chamar a atenção para que o «Arquivo Mitrokhin» não se
sustenta em qualquer base documental autêntica pois apresenta-se como
constituído por alegadas cópias manuscritas pelo próprio de milhares de
documentos internos do KGB e que, depois do seu «negócio» com os
serviços secretos britânicos, foram por estes traduzidas e
dactilografadas. Ou seja, «negócio
fechado», tanto Mitrokhin como os serviços secretos britànicos puderam
muito bem inventar todas as fichas que lhes apeteceu ou consideraram
útil para os seus fins. É aliás estranho que o KGB, que não
brincava em serviço, em documentos a que tinha acesso um simples
arquivista colocasse os nomes verdadeiros dos seus agentes em vez de
nomes em código.
A propósito da fiabilidade desta documentação perguntava em Abril de 20o1 a American Historical Review :
« Mitrokhin si descrisse come un solitario con una crescente opinione anti-sovietica… Potrebbe forse un simile personaggio sospetto (dal punto di vista del KGB) realmente essere stato libero di trascrivere migliaia di documenti, contrabbandarli fuori dalle sedi del KGB, nasconderli sotto il suo letto, trasferirli nella sua casa di campagna, nasconderli nei contenitori del latte, fare numerose visite alle ambasciate Britanniche all’estero, fuggire in Gran Bretagna per poi tornare in Russia e trasportare tutti quei voluminosi documenti nuovamente in occidente, tutto questo senza destare l’interesse del KGB?… certo, potrebbe averlo fatto. Ma come possiamo saperlo? |
Relata a Wikipédia que «In 2002 the Italian Parliament, then led by Silvio Berlusconi‘s right-wing coalition, the Casa delle Libertà, created a commission, presided over by Senator Paolo Guzzanti (Forza Italia) to investigate alleged KGB ties to opposition figures in Italian politics. The
commission was shut down in 2006 without having developed any new
concrete evidence beyond the original information in the Mitrokhin
Archive. However, former FSB officer Alexander Litvinenko said that he had been informed by FSB deputy chief, General Anatoly Trofimov (who was shot dead in Moscow in 2005), that “Romano Prodi [???!!!] is our man [in Italy]”. Sobre
a Itália é ainda de referir que um dos visados foi o destacado
dirigente do PCI Armando Cossuta que uma ficha de Mitrokhin revelava
ter-se encontrado às tantas horas de tal dia com o Embaixador da URSS em
Roma. Cossuta matou assunto declarando apenas qualquer coisa do género: «Extraordinária revelação e grande novidade essa de que me encontrei com o embaixador soviético !»
Sobre
o alegado desvio – atribuido ao PCP por uma velha campanha então
animada por Pacheco Pereira – de documentos da PIDE para a URSS, para
além de referir que o tema está tratado entrevista de Álvaro Cunhal em
1994 ao Avante! que «linkarei» mais à frente não tenho outro remédio se
não republicar o seguinte texto que publiquei no Avante! de 25.11.1999:
Os arquivos da Pide e de novo as provocações contra o PCPToneladas de
calúnia e provocação
calúnia e provocação
Não apenas por falta de espaço mas sobretudo porque seria emporcalhar as páginas deste jornal, poupamo-nos a aqui reproduzir os recentes títulos e ilustrações de primeira página em torno do tema geral «O PCP ajudante do KGB» que, só por si, bastariam para evidenciar que aí está outra vez na imprensa portuguesa um fétido refogado de velhas calúnias e provocações contra o PCP e onde avultam aquelas torpes e ignóbeis qualificações individualizadas das quais, com razão, se costuma dizer que não ofendem quem querem porque só desonram e degradam os seus autores.
E
é assim que, desta vez a pretexto de umas fantasias constantes do livro
de um ex-arquivista do KGB que resolveu fazer-se pagar-se em dólares ou
libras pela sua conversão, aí está a reposição no essencial da revoada
de caluniosas acusações contra o PCP e os comunistas portugueses que,
para não ir mais atrás, tiveram largo curso mediático no Outono de 1994,
então em torno das alegadas «revelações» contidas no livro do espião
Oleg Kaluguin, também ele convertido em assalariado das campanhas
anticomunistas.
E
é assim que é ressuscitada a calúnia do envolvimento do PCP na alegada
entrega ao KGB dos «arquivos da PIDE» ( na versão de 94 exigindo o
recurso a um camião e, na de 99, identificados rigorosamente pelo peso –
«474 quilos») bem como de outra vastíssima documentação, umas vezes
identificada como «planos militares da NATO» e outras vezes reportada às
relações da PIDE com serviços secretos ocidentais.
Aos
animadores portugueses desta campanha (entre os quais a revista «Visão»
dirigida por Cáceres Monteiro que, se bem nos lembramos, há uns anos
arrumou expeditamente na prateleira do «já sabido» e das inutilidades o
explosivo livro de Rui Mateus sobre o PS), nada importa a não ser o
manter viva a calúnia, a suspeição e a provocação contra o PCP.
Sem
memória, nem escrúpulos nem ponta de seriedade, pouco lhes importa
reter, entre muitos outros exemplos de ridícula efabulação, que, na
operação de 94, o Sr. Kaluguin até se gabou de ter obtido «a lista dos
agentes portugueses da PIDE» e de ter sido o «Expresso» (8.10.94) a
cometer a infinita maldade de lembrar que essa lista tinha sido editada
em Abril de 1975… pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda!
Pouco
lhes importa a forma muito céptica ou incrédula, quando não
frontalmente discordante como responsáveis militares pela Comissão de
Extinção da PIDE-DGS [como o Cor. Sousa e Castro] sempre negaram uma tal «entrega» de «arquivos» tão volumosa e a natureza que lhes é atribuída nas «notícias« divulgadas.
Pouco
lhes importa que tenha sido o insuspeitíssimo General Pedro Cardoso a
contar, em artigo em separata da revista «Nação e Defesa», que «Em
Agosto de 1974, o membro da Junta de Salvação Nacional responsável pela
Comissão de Extinção da PIDE/DGS inquiria à 2ª Divisão do Estado Maior
General das Forças Armadas se haveria algum interesse no ficheiro ou
arquivo daquela organização, tendo ficado esclarecido que a únicas coisa
que teria interesse , e que deveria ser objecto de um tratamento muito
especial, eram os documentos respeitantes aos contactos estabelecidos
pela Direcção-Geral de Segurança com as polícias e serviços similares
estrangeiros, que a lei aliás previa. Tal documentação passou a partir
desta altura a beneficiar de um tratamento adequado.»
Sobre
a questão dos financiamentos ao PCP é verdadeiramente chover no molhado
quando é sabido que, também numa entrevista ao Avante! (não disponível
online, portanto anterior a 1996) Álvaro Cunhal assumiu honrada e
frontalmente que o PCP, (tal como outros partidos de outras fontes, é
ler «Os Contos Proibidos do PS» de Rui Mateus)), tinha recebido também
depois do 25 de Abril solidariedade material e financeira de alguns
partidos comunistas no poder, acrescentando porém que só revelaria os
detalhes quando os outros partidos também o fizessem.
Sobre
o ponto que mais pretende ferir e agredir a honra e a dignidade do PCP e
dos comunistas portugueses, ou seja, a colaboração com serviços
secretos estrangeiros, basta-me deixar aqui as palavras firmes, frontais
e esclarecedoras com que Álvaro Cunhal abordou o assunto na já citada
entrevista ao Avante! em 1994:
«Avante!» – Não é a primeira campanha de calúnias que se desenvolve contra o PCP. Nem é a primeira vez que se diz que os comunistas estão ao serviço do estrangeiro. Era o que diziam os fascistas antes do 25 de Abril e o que também dizem outros actualmente. Na actual campanha, há porém um elemento novo. A referência directa ao KGB (com o depoimento de um seu antigo dirigente, agora afastado e ligado aos Estados Unidos) e a supostas ligações do PCP a serviços de informação. Já disseste que não responderás directamente a afirmações provocatórias. Mas não queres fazer nenhum comentário sobre esta questão?
Álvaro Cunhal – Naturalmente
que quero. Não é uma questão menor. Pelo contrário. Relações com
serviços de informação é uma questão importante que se coloca a todos os
partidos e naturalmente também ao nosso. Em termos de princípios, de
orientação e de prática. No PCP essa questão foi e continua a ser
inteiramente clara. Pode resumir-se em dois pontos fundamentais. O
primeiro: o PCP nunca admitiu quaisquer contactos com serviços de
informação, seja de que país forem. O segundo: a ligação, informação ou
compromisso com qualquer serviço de informação é incompatível com a
qualidade de membro do PCP.
«Avante!» – O Partido soube ou desconfiou alguma vez de que um militante estava ligado a um serviço de informação? No caso afirmativo, que atitude tomou?
Álvaro Cunhal – Com
conhecimento comprovado, os casos foram raros. A medida foi a imediata
expulsão do Partido. Mesmo em casos de forte e justificada desconfiança a
decisão foi a mesma de maneira mais ou menos formal.
«Avante!» – É possível dares exemplos concretos?
Álvaro Cunhal – Esta
orientação não é de hoje, Vem de muito longe. Assim, no fim da 2ª
Guerra Mundial, em 1945, com a vitória da aliança da URSS-Estados
Unidos-Inglaterra-França sobre o fascismo hitleriano, geraram-se ilusões
acerca do papel progressista que os Estados Unidos poderiam desde então
desempenhar no mundo. Nos próprios Estados Unidos o Secretário-geral do
Partido Comunista, Browder, defendeu uma tal orientação e pretendeu
impô-la ao partido. No nosso próprio partido, numa reunião do Comité
Central em Maio de 1945, um camarada defendeu o browderismo. Tais
ilusões abriram condições favoráveis aos serviços de informação dos
Estados Unidos (tal como aos da Grã-Bretanha) para procurarem recrutar
informadores ou agentes seus entre pessoas de esquerda, nomeadamente em
membros do Partido, apesar de o Partido se encontrar na clandestinidade.
E conseguiram-no embora em casos raros. Tenho comigo exemplares do
boletim do PCP «O Militante» publicado clandestinamente. Nos números de
Setembro de 1946 e Janeiro de 1947 podem ler-se resoluções do
Secretariado do CC decidindo a expulsão de dois membros do Partido que
(por pretenderem aliciar outros) se soube terem tomado tais ligações e
compromissos.
«Avante!» – Tratava-se nesse caso de serviços de informação de um país imperialista. O que se questiona por razões óbvias é a eventual ligação ou compromisso com serviços de informação da União Soviética e outros países socialistas.
Álvaro Cunhal – A
orientação era a mesma em relação à URSS e outros países socialistas.
Antes e depois do 25 de Abril. E continua a ser a mesma. Nós sempre
comunicámos a nossa atitude aos partidos comunistas nesses países.
Solicitámos mais que uma vez que, estando como estavam no poder, dessem
indicações concretas para que os serviços de informações respectivos se
abstivessem de procurar informações ou tentar recrutamentos junto de
membros do nosso Partido. Naturalmente que o essencial é que um
camarada, se detecta junto de si diligências desse tipo, frontalmente as
repudie. Mas é bom evitar qualquer contacto, mesmo que ocasional, com
pessoas com tais actividades.
Relações com embaixadas
«Avante!» – Essa questão levanta uma outra. O PCP tem relações com missões diplomáticas em Lisboa. Ora estas, pelo menos os grandes países, têm, entre o seu pessoal diplomático, representantes dos serviços de informação cuja missão é obter informações e recrutar informadores e agentes. Tendo o PCP relações com tantas missões diplomáticas em Lisboa, não oferecem tais relações o perigo de serem estabelecidos contactos, mesmo involuntários, com esses serviços de informação?
Álvaro Cunhal – O
que dizeis é exacto e esse perigo existiria se não houvesse uma
orientação muito clara e firme. Se alguns desses elementos representam
oficialmente em Portugal, nas relações com o Governo, os referidos
serviços e são geralmente conhecidos, outros ocultam as suas funções.
Aparecem como secretários ou adidos militares, culturais ou comerciais. O
disfarce não consegue entretanto evitar que muitos acabem por ser
conhecidos pelo que são.
Depois
do 25 de Abril, o Partido estabeleceu relações com numerosas
embaixadas. Dezenas. A da URSS e as de outros países socialistas, mas
também as da Grã-Bretanha, França, Alemanha, Suíça, de países africanos,
americanos e asiáticos. Convidam para recepções. Houve sempre e
continua a haver encontros de dirigentes do Partido com embaixadores. A
Secção Internacional do nosso Partido tem contactos mais ou menos
regulares com as missões diplomáticas. A nossa orientação é porém
rigorosa e cumprida.
«Avante!» – Isso não evita que essas pessoas com funções especiais procurem também tocar gente do Partido.
Álvaro Cunhal – Naturalmente
que procuram. Conhecemos muitas tentativas desse tipo. Pela iniciativa
de contactos em recepções. Por convites para uma conversa ou refeição.
Pela pretensão de estabelecer contactos pessoais sob os mais variados
pretextos. Tem havido casos, aliás geralmente conhecidos, de alguns
serem muito atrevidos e operativos, como uma jovem atraente de uma certa
embaixada, um oficial muito condecorado e sociável de outra embaixada, e
numa terceira, um adido de imprensa cujo comportamente precipitado e
grotesco era só por si um cartão de identidade. Não sei se os outros
partidos têm a mesma atitude e a mesma cautela.
«Avante!» – É muito provável que as explicações que acabas de dar não impeçam que a campanha continue. Para concluir, queres adiantar mais alguma ideia?
Álvaro Cunhal – Só uma: o PCP tem uma orientação clara e segura e a consciência tranquila.
Via: o tempo das cerejas 2 http://ift.tt/1WgReZX
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