Para Domenico Losurdo, novo conflito mundial é possibilidade real
"A condução política de Washington corre
riscos de provocar uma nova guerra mundial, que pode até atravessar o
limiar nuclear", afirma à 'RBA' o filósofo italiano
por Redação RBA
publicado
27/05/2017 12h59
reprodução
Losurdo: esquerda deve perceber que a luta contra o imperialismo é parte integral da luta de classes para emancipação
São
Paulo – Depois que o fenômeno republicano e midiático Donald Trump
assumiu o poder nos Estados Unidos e radicalizou o discurso contra as
minorias e oponentes do imperialismo, algumas vozes têm dito que o mundo
pode estar a caminho de um novo conflito mundial.
Essa
é uma tese que soa falsa, dependendo da credibilidade ou fundamentação
de quem a afirma, mas nas palavras do filósofo italiano Domenico Losurdo
ela é real: "A condução política de Washington corre riscos de provocar
uma nova guerra mundial, que pode até atravessar o limiar nuclear",
afirma ele, em entrevista à RBA,
para quem os conflitos atuais, que colocam o Ocidente em oposição aos
países fora de sua lógica, nada mais são do que expressões do pensamento
tradicional colonialista.
A
falta de conhecimento de história, um problema sério no Brasil, mas que
atinge praticamente todo o mundo ocidental sob o furor consumista e
imediatista, permite que a mídia tradicional, sempre a favor do poder
instituído e dos ditames do capital, destile seu discurso conservador
com menos resistência e menos sentimento de indignação que ocorreriam à
luz da memória dos fatos. É o que se esforça por mostrar Losurdo.
"A
luta contra o neoliberalismo precisa estar unida à luta contra o
colonialismo, neocolonialismo e imperialismo", afirma o filósofo, que
nesta entrevista concedida por e-mail também desmonta a linguagem que se
mostra como nova roupagem para antigos conceitos. "Atualmente,
as guerras coloniais e neocoloniais são frequentemente realizadas em
nome dos valores e interesses ocidentais", sustenta o professor,
demonstrando que, historicamente, o século 20 se rebelou contra a
colonização, mas agora corremos o risco do retrocesso.
Nesta
entrevista, o leitor tem a oportunidade de verificar pelos menos dois
pontos: como o colonialismo continua vivo, portanto, com outras
denominações, e também como a luta de classes se expressa no
enfrentamento do neoliberalismo sobre os velhos conceitos de dominação.
Como o senhor descreve o colonialismo hoje? É um tipo de luta de classes, por que?
Desde
1989, o Ocidente, liderado pelos Estados Unidos, desencadeou guerras
contra Panamá, Iraque, Iugoslávia, Líbia e Síria. Apesar das diferenças
entre as guerras, esses países têm duas características em comum: eles
são importantes do ponto de vista da geopolítica e têm por trás deles
uma revolução feudal e outra anticolonial. Na verdade, frente a essas
guerras, os atacantes preferem falar de "operações políticas
internacionais". Mas essa linguagem vem da tradição colonial.
No
começo do século 20, o presidente dos Estados Unidos, Theodore
Roosevelt, uma referência do colonialismo, imperialismo e racismo,
gostava de justificar suas intervenções na América Latina precisamente
desse modo, referindo-se às "operações políticas internacionais".
É
verdade para os dias atuais que os Estados Unidos e seus aliados e
vassalos têm celebrado suas guerras como "humanitárias". E de novo somos
levados de volta para a linguagem da tradição colonial. Em seu tempo, (o colonizador britânico)
Cecil Rhodes (1853-1902) resumiu a filosofia do Império Britânico deste
modo: "filantropia, mais 5%". Atualmente, as guerras coloniais e
neocoloniais são frequentemente realizadas em nome dos valores e
interesses ocidentais. "Filantropia" tornou-se "valores do Ocidente" e o
percentual de 5%, tornou-se "interesses do Ocidente".
As guerras desencadeadas pelo imperialismo desde 1989 (depois da vitória na Guerra Fria)
causaram dezenas de milhares de mortes; são centenas de milhares de
feridos; milhões de refugiados; destruíram países e condenaram ao
subdesenvolvimento e ao desespero muita gente. É óbvio que a luta contra
essas calúnias é uma luta de classes pela emancipação. Marx apontou: a
barbaridade do capitalismo é manifestada primeiro nas colônias; por
isso, a luta contra a dominação colonial e semicolonial é uma luta de
classes por excelência.
O
senhor publicou no Brasil o livro "Esquerda Ausente". Qual o papel dos
partidos de esquerda e dos movimentos sociais nos dias de hoje? Como
eles podem se organizar?
Não
pode ser considerado realmente de esquerda um partido ou força política
que se limite a combater o neoliberalismo. Esta é a questão central. A
luta contra o neoliberalismo precisa estar unida à luta contra o
colonialismo, neocolonialismo e imperialismo. Especialmente em um
momento como o presente. A condução política de Washington corre riscos
de provocar uma nova guerra mundial, que pode até atravessar o limiar
nuclear. Muitos observadores, incluindo os conservadores, destacam um
ponto essencial: por algum tempo, o foco central da política externa
norte-americana se ateve à habilidade de infligir uma 'primeira ação
nuclear sem consequências' (para isso, sistemas antimísseis foram instalados nas fronteiras entre Rússia e China).
Bom, a esquerda deve perceber que a luta contra o imperialismo, contra
essa política de dominação e contra a guerra é uma parte integrante da
luta de classes para emancipação.
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