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quarta-feira, 28 de julho de 2021

 Kohei Saito

Kohei Saito autor

Kohei Saito é professor associado de economia política na Universidade de Osaka, no Japão. É também membro do conselho editorial internacional do projeto Marx-Engels-Gesamtausgabe. Em 2018, venceu o Deutsche Memorial Prize com a obra Karl Marx's Ecosocialism: Capital, Nature, and the Unfinished Critique of Political Economy. É autor também de Hitoshinsei no Shihonron, obra que já vendeu 250 mil cópias no Japão.

 

O ecossocialismo de Karl Marx

Capitalismo, natureza e a crítica inacabada à economia política

Kohei Saito

R$ 83,00 Comprar

O ecossocialismo de Karl Marx
  • autor: Kohei Saito
  • tradução: Pedro Davoglio
  • prefácio: Sabrina Fernandes
  • orelha: Murillo van der Laan
  • quarta capa: Kevin Anderson e Michael Heinrich
  • capa: Maikon Nery
  • prêmio: Deutscher Memorial 2018
título original:
Karl Marx’s Ecosocialism: Capitalism, Nature, and the Unfinished Critique of Political Economy
edição:
selo:
Boitempo
páginas:
352
formato:
23cm x 16cm x 3cm
peso:
600 gr
ano de publicação:
2021
encadernação:
brochura
ISBN:
9786557170595

Quais foram as contribuições de Karl Marx ao que chamamos hoje de ecossocialismo? O pensador alemão analisava a relação entre homem e natureza? É possível construir o socialismo em planeta arrasado?

 

terça-feira, 27 de julho de 2021

 Wook.pt - Karl MarxWook.pt - Marxism After Marx

David McLellan

Traduzido de inglês-David McLellan é um estudioso inglês de Karl Marx e Marxismo. Ele foi educado na Merchant Taylors 'School e no St. John's College, na Universidade de Oxford. Atualmente, McLellan, de 81 anos, católico, é professor emérito e  também professor visitante de Teoria Política no Goldsmiths 'College, Universidade de Londres. Wikipedia (inglês)

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Karl Marx como patrimônio da humanidade: entrevista com David McLellan
Artigos / Articles
Novos Rumos, Marília, v. 58, n. 1, p. 21-33- Jan.-Jun.,2021
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KARL MARX COMO PATRIMÔNIO DA HUMANIDADE:
ENTREVISTA COM DAVID MCLELLAN
Henrique Wellen1
Resumo: Entrevista com o Cientista Poítico David McLellan, Professor Emérito da University of Kent
(Inglaterra). McLellan é considerado um dos principais biógrafos, comentadores e tradutores de Marx e de sua
obra no mundo anglófono. É autor de vários livros sobre Marx e o marxismo, entre eles destancam-se The
Young Hegelians and Karl Marx (1969); Marx antes do marxismo (1970); Karl Marx: vida e pensamento
(1973) e Marxism and e Religion (1987).
Palavras-chave: David McLellan; Karl Marx; marxismo.
Abstract: Interview with Political Scientist David McLellan, Professor Emeritus at the University of Kent
(England). McLellan is considered to be one of the leading biographers, commentators and translators of Marx
and his work in the English-speaking world. He is the author of several books on Marx and Marxism, including
The Young Hegelians and Karl Marx (1969); Marx before Marxism (1970); Karl Marx: life and thought (1973)
and Marxism and e Religion (1987).
Keywords: David McLellan; Karl Marx; marxism.
APRESENTAÇÃO
Num final de tarde frio, chuvoso e escuro, típico do inverno inglês, o professor David
McLellan nos recebeu em sua casa para esta entrevista. A humildade da recepção destoou da sua
fama pelas suas várias obras sobre a vida e o pensamento de Marx, que foram traduzidas e publicadas
em diversos países. De conversa simples e de jeito humilde, o professor intercalou, ao longo de quase
duas horas de entrevista, informações sobre a sua vida pessoal e análises sobre o seu principal objeto
de estudos.
Ele mora numa casa modesta, mas bem localizada na parte central da cidade de Canterbury
que, além de famosa pelo turismo histórico e pelas universidades, é conhecida por ser a sede religiosa
da Inglaterra. A sua casa se configura com um sobrado de dois andares, germinado em uma fileira
de casas que se distinguem quase somente pela cor. Às vezes, ela também serve de abrigo para alunos
e pessoas necessitadas, que precisam se abrigar durante alguns dias ou semanas por lá. Por ser
central, a localização lhe propicia ter uma vida independente para realizar as diversas atividades do
seu cotidiano. Mesmo com quase oitenta anos, ele busca, sempre que está por lá, o seu bisneto na
escola.
A primeira sensação ao entrar na sua casa é de ardência nos olhos, advindo principalmente
da lareira e dos aromas de cachimbo, que denunciam a permanência de um vício antigo. A imensa
quantidade de livros espalhados pela casa, em prateleiras, em cadeiras, mesas, janelas e também
amontoados pelo chão, indica outra paixão antiga e ainda bastante presente. Nas paredes constam
várias fotos (de familiares, amigos e acadêmicos), cartas e adornos religiosos (a maioria católica).
Também se destacam imagens satíricas contra o Brexit.
Com a sua convivência, se percebe um regramento de vida. Ele costuma acordar às cinco da
manhã e desde cedo inicia as suas leituras. Ainda que não tenha publicado livros recentemente, suas
análises aparecem em grande número em revisões de novas obras sobre Marx, em diversos sites
1 Realizou pós-doutorado (2018-2019) na University of Kent, supervisionado pelo professor David McLellan. Doutor em
Serviço Social pela UFRJ. Professor do Departamento de Serviço Social da UFRN.WELLEN, h..
Novos Rumos, Marília, v. 58, n. 1, p.21-33, Jan.-Jun.,2021
acadêmicos do Reino Unido. Ele também está costumeiramente acompanhando uma nova tradução
de alguma obra sua, e costuma realizar várias palestras ao redor do mundo. Da mesma forma, às
vezes participa de atividades acadêmicas na University of Kent, onde é professor emérito.
Juntamente com o professor Sean Sayers, longínquo amigo e parceiro acadêmico, ainda
organiza, em sua casa, um famoso seminário, o Lentils Seminar, que, mesmo depois de várias
décadas, mantém o nome do antigo prato que era servido aos seus participantes. A gastronomia
mudou, mas tanto o vinho fartamente disponibilizado, como vários dos antigos participantes, ainda
continuam presentes. Contudo, a plateia que lá aparece uma noite por mês não se resume à
academia. Além de professores e estudantes, participam diversos trabalhadores e camponeses, na
maioria aposentados.
Além dessas atividades caseiras, a agenda do professor McLellan costuma ser ocupada com
corriqueiras viagens, especialmente dentro da Europa e para a China. Mas, quando ele está em casa,
costuma receber alunos e pesquisadores de todo o mundo. Um dos temas mais abordados nestas
conversas refere-se ao pensamento e à biografia de Karl Marx. Desde o meu primeiro contato com
ele, quando eu ainda rascunhava a proposta da minha pesquisa de pós-doutorado, até as nossas mais
recentes conversas, o professor McLellan sempre foi bastante receptivo.
No decorrer dos nossos encontros, marcamos essa entrevista, que foi realizada no dia 07 de
fevereiro de 2019. As passagens a seguir referem-se aos principais pontos dessa conversa, por mim
traduzidas para o português2.
ENTREVISTA
Henrique Wellen (HW): Inicialmente, eu gostaria de agradecer pela sua disponibilidade.
Para a primeira questão, seguindo um pouco o movimento dialético, nós poderíamos começar pelo
fim. Você acredita que é importante estudar Marx hoje? Ainda é relevante o que Marx disse e
escreveu?
David McLellan (DM): Eu acredito que o pensamento de Marx é bastante relevante hoje.
Talvez, antes de tudo, seja relevante por causa da análise da crise financeira de 2008 e da sua
continuação. As melhores análises que li sobre isso, embora eu não seja economista, parecem ser
provenientes de Marx, explicando a ascensão do capitalismo financeiro e como o capitalismo
industrial tem a ver com o lucro e esse tipo de coisa. Eu acho que esse quadro de ganância ou algo do
tipo torna Marx extremamente relevante. Acho que outro ponto talvez seja o fato das análises de
Marx terem sido extremamente impressionantes sobre a maneira como o maquinário e a automação
tiveram impacto na vida dos trabalhadores. É verdade que ele apenas mencionou isso brevemente.
E realmente ele não aprofundou muito essa questão em obras publicadas. Mas ele faz isso nos
Grundrisse”. E isso foi extraordinário para alguém escrevendo em meados do século XIX. Ao pensar
sobre tipos de problemas sobre os quais as pessoas estão falando hoje em dia. Sobre o impacto da
automação ou quais efeitos ela terá no emprego. Sobre o desenvolvimento do tempo livre e o que
iremos fazer sobre isso. Eu acho que Marx tinha coisas a dizer ou poderia pensar e refletir sobre isso.
Esses assuntos são abordados por pessoas como Hardt e Negri. Na verdade, eu não concordo com
eles, mas eles tiveram um grande impacto recentemente e são inspirados por alguns escritos de Marx,
especialmente em partes dos “Grundrisse” sobre automação. E também é importante mencionar que
as pesquisas recentes indicam que Marx tinha um grande interesse, particularmente em seus últimos
escritos, com questões de ecologia e crise ambiental e a maneira como esses problemas foram
exacerbados pelo capitalismo, produzindo fenômenos como o aquecimento global. E, finalmente,
acho que, conforme estou escrevendo para uma palestra, sobre o conceito de comunismo de Marx3 ,
e pensando sobre o comunismo e o que o comunismo é descrito em sua afirmação “de cada um de
acordo com a sua capacidade, a cada um de acordo com a sua necessidade”. E, se pensarmos em uma
2 Agradeço ao amigo Paulo Denisar Fraga (que participou, em momento anterior, de reunião com o professor David McLellan) pela ajuda
no planejamento e na revisão dessa entrevista.
3 Uma exposição desse estudo do professor McLellan foi publicada no Brasil. Cf. McLELLAN, David. O comunismo de Marx: natureza,
contradições e relevância atual. Trad. Henrique Wellen. In: Problemata: Revista Internacional de Filosofia. v. 10. n. 4, p. 17-27, 2019.Karl Marx como patrimônio da humanidade: entrevista com David McLellan
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sociedade baseada na necessidade e não nos desejos, isso nos permite imaginar o tipo de sociedade
que supere os principais problemas dessa crise ambiental.
HW: Então, você acha que a atualidade de Marx não está apenas na crítica da sociedade
capitalista, mas também na possibilidade de construir uma nova sociedade? Nesses aspectos,
também é possível chamar essa nova sociedade do comunismo e pensar no comunismo como uma
palavra relevante hoje?
DM: Sim. Eu acho que comunismo é uma palavra relevante atualmente. As pessoas podem
ter diferentes definições de comunismo, mas Marx pensava (é claro que ele não escreveu muito sobre
isso), que claramente não se tratava de uma sociedade baseada em desejos, mas baseada em
necessidades. E as necessidades podem ser desenvolvidas de forma socialmente planejada, e os
desejos, utilizados de forma subordinada pelo capitalismo, são ilimitados como uma lei para
expandir ou morrer.
HW: Agora, podemos falar um pouco sobre sua história ou sua formação, e também sobre
sua família? Onde e quando você nasceu, e qual era a forma ou a configuração de sua família? Quais
foram e sobre o que eram os seus primeiros estudos?
DM: Podemos sim. Eu nasci em 1940, em Hartford, uma pequena cidade perto de Londres.
Meu pai era escocês. Ele era professor universitário e veio de uma família muito pobre. Meu avô era
uma pessoa muito pobre. Já minha mãe veio de um background não conformista. Meu pai era ateu
e, portanto, não ligava para a religião. Mas minha mãe pertencia a uma congregação que estava fora
do establishment, o que significa fora da Igreja da Inglaterra. Então essas pessoas nem sempre são
conservadoras, mas tendem a ser pessoas progressistas. E eu tenho um irmão e uma irmã. Ambos
têm dificuldades mentais. Meu irmão tem síndrome de Asperger e minha irmã tem hidrocefalia, o
que significa um desenvolvimento intelectual muito restrito. Mas isso não significa que ela não teve
uma vida decente. Ela teve três filhos maravilhosos e inteligentes. Mas, meus dois irmãos não
estavam muito bem equipados para o mundo, eram ambos de mentalidade limitada. A escola que eu
frequentava, minha escola secundária, era o que chamamos na Inglaterra de uma escola pública. O
que significa, paradoxalmente, uma escola particular. Eu tive uma bolsa para estudar lá e foi onde
estudei para os exames de entrada na universidade, como história latina, grega e antiga. De lá fui
para Oxford, com uma bolsa de estudos, onde tive o meu primeiro diploma. Foram quatro longos
anos. Os dois primeiros anos foram para a literatura latina e grega, e a segunda metade para história
e filosofia gregas e romanas. Eram estudos em filosofia antiga, mas também com alguma coisa em
filosofia moderna. E, quando eu estava em Oxford, o principal estudo nesta área foi a análise
linguística, especialmente Wittgenstein, que estudei bastante e que achava ser um dos filósofos mais
interessantes do século XX. Por lá, eu não me lembro de ter contatos ou atuações políticas. Acho que
eu não tinha nenhuma visão política, especialmente quando estava fazendo minha graduação em
Oxford. Depois disso, o meu plano era me tornar um jesuíta. Mas, como meus pais não gostaram
nada disso, o compromisso foi que eu ficasse um ano na França pensando nisso e, depois, se eu ainda
quisesse, continuaria com o planejado. E acho que, quando eu estava na França, pensei comigo
mesmo: o que posso estudar aqui que realmente não se pode estudar na Grã-Bretanha? E havia duas
possibilidades: existencialismo que, no final de 1960, foi muito influente por lá, ou, talvez, marxismo.
E, enquanto isso, e foi uma coisa puramente acidental, um amigo, que tinha estudado lógica comigo
em Oxford, foi a uma viagem de estudantes a Moscou. Esse amigo, na verdade, não estava muito
interessado no marxismo, mas sim em conhecer a União Soviética. Quando ele voltou, me disse que
tinha sido muito interessante e que eu deveria ir também. Assim, eu pensei comigo: eu também quero
ir. Então, eu fui lá antes de ir para a França e, bem, foi bastante interessante. Eu vi muitas pessoas
falando sobre marxismo, e fiquei me questionando como nunca tinha ouvido falar disso antes. Então,
pensei que, quando voltasse à França, eu iria pesquisar sobre isso. Em parte porque eu gostava,
naquela época, de pensamentos sistemáticos. E o problema com o existencialismo é que é muito
assistemático. E porque o marxismo me pareceu um pensamento sistemático, muito bem
organizado. E pensei comigo mesmo: talvez eu tente estudar sobre isso quando estiver aqui na WELLEN, h..
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França. Então, eu consegui alguns livros. Coincidentemente, o meu interesse aumentou quando
percebi que havia bons livros sobre Marx e marxismo escritos por jesuítas. Um deles era de Jean
Yves Calvez, “O pensamento de Karl Marx” que, ainda hoje, é um bom livro4 . O mais importante é
que eu li Marx e um dos livros que eu consegui foi “A ideologia alemã”. Era uma edição francesa,
apenas com uma parte do livro, cerca de cem páginas sobre Feuerbach. E isso realmente abriu meus
olhos. Eu pensei que isto era um relato da história do mundo, entende? Conduzindo-se ao cimento
da história. Essas ideias e o modo como elas se desenvolveram fizeram um sentido extraordinário
para mim. Pensei: sim, isso realmente faz muito sentido para mim. Assim, eu fiquei muito
interessado neste assunto. Depois voltei para a Grã-Bretanha. Mas, ainda tentei me tornar um
jesuíta, e permaneci por lá uns nove meses ou algo assim. Depois, saí e me questionei: o que vou
fazer agora? Aí pensei: bem, vou voltar para Oxford e retomar alguns estudos. E eu queria fazer isso
em alguns aspectos de Marx. E eu estava particularmente interessado, é claro, em marxismo e
religião. Então, conversei com muitas pessoas em Oxford, perguntando se elas me supervisionariam.
E então eu tive uma reunião com Isaiah Berlin, e ele disse, bem: você poderia fazer algo sobre Gorky
ou Lunacharski. Então eu lhe respondi que, para fazer isso, eu teria que aprender russo e que isso
seria muito difícil. Aí ele disse: bem, por que você não apresenta algo sobre os jovens hegelianos? Há
um livro de Sidney Hook5 , um americano que escreveu esse livro em algum momento do século
dezenove. E Hook queria dizer que Marx realmente passou pelos jovens hegelianos apenas rejeitando
um após o outro. Contra Feuerbach, Bauer, Stirner e os outros. E Berlin me disse: bem, você poderia
olhar pelo ponto de vista oposto. Você pode tentar perguntar o que Marx aprendeu com eles? Então,
foi o que eu fiz. Comecei a minha tese de doutorado6 , que se tornou meu primeiro livro7.
HW: Especialmente sobre essas análises, eu gostaria de lhe perguntar duas coisas. A
primeira é sobre seu professor Isaiah Berlin. Porque, embora Berlin seja famoso como um ensaísta
em assuntos bem variados, ele também era conhecido como um pensador conservador, no aspecto
político. Mas ele estimulou que você estudasse Marx. Você não acha que isso é uma contradição?
DM: Sim, acho que ele era conservador. Claramente ele não era de esquerda, ou um
socialista. Talvez um conservador liberal, para ser mais justo. Mas acho que ele não estava muito
interessado em estudar Marx naquele momento. Ele sugeriu esse tema para minha tese de doutorado
porque eu estava interessado nisso. Também é verdade que ele escreveu uma pequena biografia de
Marx em 1937. Então, ele estava obviamente interessado em Marx. Porque ele estava interessado em
muitos pensadores, particularmente os pensadores do século XIX. E, mais particularmente, nos
pensadores russos. Então ele estava interessado em Marx especialmente por causa disso. Ele
escreveu essa biografia de Marx. Mas acho que ele não fez um grande estudo sobre Marx. Como você
diz, ele foi um grande ensaísta. Ele não era um verdadeiro acadêmico. Ele não era uma pessoa para
notas de rodapé. E eu acho - não tenho certeza disso - mas acho que a primeira edição dessa biografia
não possui notas de rodapé. E ele pediu que algum aluno dele colocasse algumas notas de rodapé
para a segunda edição8 . E a opinião dele sobre Marx nesse livro é muito impressionista. Não possui,
necessariamente, nenhum erro, mas as suas opiniões sobre Marx eram sobre um importante
pensador do século XIX que não seria muito relevante hoje. Mas essa foi uma atitude comum que ele
adotou em todas essas figuras que ele analisou.
HW: A outra coisa é que você falou sobre a relação entre o marxismo e a religião. Eu acho
que você é uma pessoa religiosa, católica. Então você tem a sua religião e não é ateu, como era o seu
pai. Você acha que é possível conectar essas duas coisas: ser marxista e ter uma religião?
4 CALVEZ, Jean-Yvez. La pensée de Karl Marx. Paris: Editions du Seuil, 1956.
5 HOOK, Sidney. From Hegel to Marx. Ann Arbor: University of Michigan Press, 1962.
6 McLELLAN, David. The social and political thought of the young Hegelians and their influence of the origins of marxism. Thesis (PhD).
Oxford: University of Oxford, 1968.
7 McLELLAN, David. The young Hegelians and Karl Marx. London: Mcmillan Press, 1969.
8 BERLIN, Isaiah. Karl Marx: his life and environment. Second Edition. London, New York, Toronto: Oxford University Press, 1949.Karl Marx como patrimônio da humanidade: entrevista com David McLellan
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DM: De fato, eu acredito que seja difícil conciliar essas duas coisas. Quero dizer, em parte
porque tomo uma definição justa sobre esses dois termos. Obviamente, depende do que você quer
dizer sobre marxismo e sobre religião. Existem alguns pensadores, particularmente em sua parte do
mundo, que estão dentro do movimento chamado Teologia da Libertação, que tentaram combinar o
catolicismo, o cristianismo católico e alguns elementos importantes do pensamento marxista. Para
mim, é possível porque essas pessoas adotaram o marxismo como um tipo de sociologia. Bem,
parece-me, pelo que li sobre Marx, que Marx é muito mais do que um bom sociólogo. E também mais
do que um economista muito bom. Ele tinha uma visão completa da natureza humana e da história
da humanidade que impede qualquer referência ou qualquer ponto além dessa história específica;
qualquer coisa que se poderia chamar de transcendental ou não. É por isso que eu tenho uma visão
muito precisa do que o marxismo realmente consiste. E, portanto, acho que muitas pessoas que se
autodenominam marxistas não são fiéis ao legado de Marx. E isso se aplica a pessoas como Kautsky,
por exemplo. Obviamente, Kautsky era marxista, mas tinha uma versão do marxismo com uma
presença muito forte de um materialismo metafísico. Em alguns aspectos, Engels também gostava
disso, o que eu não acho que seja verdade para Marx. E claramente você pode combinar um tipo de
materialismo, ou você pode tentar combinar, com apelo à ética de uma fonte kantiana e juntar essas
coisas. Mas a razão pela qual eu acho que é inconciliável, suponho, é porque isso seria impossível
para o próprio Marx. Entende? É por isso que eu diria que, para o próprio Marx e para quem quer
ser fiel ao legado de Marx, que não se pode combiná-los. Novamente, não quero ir muito longe com
isso. Claro que depende também em que sentido se está usando a religião. Existem muitas definições
de religião, como uma definição durkheimiana de religião, de como a sociedade se desenvolve. Mas
não acho que essa definição de religião seja muito útil, porque com essa definição de religião todo
mundo é religioso. Nesse sentido, como membros da sociedade, todos passariam a ser religiosos.
Olha, eu não quero ser muito crítico com Durkheim, porque acho que quando ele olha para
sociedades que deram origem a isso, como a sociedade aborígene australiana, ele é muito bom. E é
muito bom também para a sociedade americana contemporânea, analisando a religião civil, a
bandeira. Nesse tipo de coisa, acho que Durkheim é muito bom. Mas, na verdade, ele não indica a
especificidade da religião.
HW: Para terminar esta primeira parte da entrevista, gostaria de saber se, durante o seu
tempo da formação acadêmica, você participou de algum movimento social ou de partido político.
Você falou sobre os jesuítas, mas, além disso, você participou de outros grupos sociais e políticos? E
atualmente, você ainda faz parte de alguma organização desse tipo?
DM: Não quando eu era estudante de graduação. Aí acho que eu não estava nem um pouco
interessado em política. Mas, pensando melhor, isso não é verdade, eu acho. Já simpatizava com
organizações progressistas neste país. Parte porque minha mãe era progressista. E, de repente, eu
fiquei interessado em coisas como as questões da crise de 1956 e tive opiniões muito fortes sobre
isso. Eu participei de debates em minha universidade, criticando as políticas britânicas imperialistas
que chegavam ao Egito. Portanto, eu não estava completamente desinteressado em política, mas não
participei quando era estudante de qualquer movimento político. O que eu fiz foi ingressar em um
grupo de católicos que estavam muito interessados no que na época era chamado de desenvolvimento
do terceiro mundo; ver como ajudar – não sei se “ajuda” é o termo certo –, ou melhor, interagir com
pessoas do terceiro mundo na África, seja no norte da África, na África subsaariana ou em outras
partes do mundo. As pessoas deste grupo eram muito internacionalistas e tinham muito interesse
nesse tipo de coisa, em como o mundo estava organizado e em como poderia ser melhor; em
combater a desigualdade econômica e esse tipo de coisa. Portanto, eu participei desse grupo de
pessoas que organizaram conferências na França e na Bélgica, por exemplo. Então, eu participei de
uma espécie de atividades políticas internacionais. Mas não era um movimento político no sentido
do mundo atual. O único movimento político em que entrei quando era estudante de doutorado em
Oxford foi o Partido Trabalhista. Obviamente, por causa dos meus estudos em marxismo, eu estava
interessado em política. Então, entrei para o Partido Trabalhista em 1963 ou 64, e ainda estou nele.
Então, eu estou na esquerda e tenho sido muito ativo em alguns aspectos, como com estudantes e
eleições, e esse tipo de coisa.WELLEN, h..
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HW: Em conversas com alguns professores da Universidade de Kent, eles me falaram sobre
a importância de um movimento no pensamento crítico nas décadas de 1960 e 1970. E alguns deles
falaram sobre você, Sean Sayers e Bernat Sharrat. Pelo que eu entendi, isso foi muito importante
para o desenvolvimento do marxismo aqui no sudeste da Inglaterra. Eles destacaram seu nome
algumas vezes. Você poderia falar um pouco sobre isso?
DM: Sim. Mas eu não acho que esse tipo de renovação no marxismo político tenha sido mais
importante aqui na Universidade de Kent do que em outras universidades. É claro que pessoas como
Sean Sayers, Bernat Sharrat, eu e outras pessoas também estavam interessadas em Marx. Mas não
acho que a Universidade de Kent tenha sido mais desenvolvida nisso do que outras universidades.
Porque, particularmente naquela época, no meio e no final dos anos 1960, foi uma abertura do
cenário intelectual no oeste da Europa em geral. E, de repente, neste país aconteceu o que passou a
ser chamado de nova esquerda. A velha esquerda significa o estilo soviético do marxismo e esse tipo
de coisa. Isso foi desacreditado por causa das revelações da década de 1950 e, é claro, por causa da
disponibilidade de alguns escritos de Marx, em particular de seus primeiros escritos, que antes eram
desconhecidos neste país. Isso mostrou um Marx muito mais humanista e uma versão diferente do
marxismo do tipo de materialismo dialético ortodoxo, do marxismo soviético. Então, foi aberto um
espaço aqui para um tipo de pensamento de esquerda, de uma fonte marxista, com uma volta aos
escritos de Marx e, eventualmente, a outros marxistas, particularmente Gramsci. Então houve um
novo movimento de esquerda, e essas referências obviamente foram introduzidas na Universidade
de Kent. Mas isso ocorreu em muitas outras universidades, tornando-se o que podemos significar
como uma teoria crítica. Não é como a Escola de Frankfurt. Era mais para estudar essas novas obras
de Marx, especialmente os seus primeiros escritos.
HW: E antes desse período, havia algum movimento ou grupo que estudava Marx na
Universidade de Kent e que causou algum impacto aqui?
DM: Não. Não houve. Mas havia marxistas que tinham cargos nas universidades, por
exemplo, em Cambridge. Mas eles geralmente eram economistas. E alguns deles estavam no Partido
Comunista e suas visões sobre política e filosofia estavam neste ponto de vista, que se aproximava
do materialismo dialético da época soviética. Então, quando eu estava pretendendo estudar Marx,
aquilo me parecia nessa direção, especialmente de análises econômicas e de uma filosofia próxima
ao marxismo soviético. Não existiam análises aprofundadas dos textos de Marx.
HW: Você teve livros com alguns professores marxistas famosos aqui no Reino Unido, como
Ernest Mandel, Eric Hobsbawm, Raymond Williams, Victor Kiernan e Tom Bottomore. Você teve
alguma relação mais próxima com esses professores, ou algumas conexões como grupos de pesquisa
ou de estudos ou movimentos políticos? Ou esses contatos foram somente para esses livros?
DM: Destas pessoas que você mencionou, as únicas duas pessoas que eu realmente conheci
foram Tom Bottomore e Eric Hobsbawm. Com Hobsbawm eu me encontrei duas ou três vezes e foi
somente isso. Mas com Bottomore, como a universidade dele não ficava muito longe daqui, a
Universidade de Sussex, eu tive mais encontros e conversas. Mas não tive nenhuma interação nas
formas que você disse, como grupo de estudos ou coisas políticas. E, na verdade, é logicamente
porque todas essas pessoas eram marxistas, e elas tinham essas atividades, como grupos de leitura
marxistas e eu não sou marxista. Então, eu não estava em condições de participar. E também porque
os locais desses grupos eram bem distantes daqui.
HW: Analisando todos esses casos, embora todos estivessem estudando o marxismo, havia
muitas diferenças políticas entre eles. Mandel era trotskista. Victor Kiernan estava no Partido
Comunista. Raymond Williams tinha uma forma muito pessoal de marxismo.Karl Marx como patrimônio da humanidade: entrevista com David McLellan
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DM: Sobre eles, eu sei que Hobsbawm era comunista. Mandel era um trotskista. Sobre os
outros, eu não tenho certeza. Williams provavelmente não foi do partido comunista. Kiernan era do
partido comunista. Mas os demais eu realmente não me lembro.
HW: Como você acha que, atualmente, estão as publicações, as análises, os estudos e as
pesquisas dentro da tradição marxista aqui no Reino Unido?
DM: Eu acho que, atualmente, de forma comparativa, isso ocorre de modo bastante positivo.
É importante indicar que, historicamente, o marxismo nunca teve muita influência no Reino Unido,
como teve, por exemplo, na Alemanha, na França ou na Itália. Assim, quando digo que os estudos
marxistas e o interesse em Marx estão em forma positiva nesse país, digo isso de forma comparativa.
Mas, mesmo assim, isso ocorreu talvez por causa da crise financeira de 2008, em que apareciam, em
mídias mais populares, coisas como “Marx está de volta!”. Isso despertou um interesse em pessoas
fora das universidades e que não eram pesquisadores dessa área, sobre o que Marx teria a dizer sobre
essa crise. Essas pessoas poderiam ter ouvido falar de Marx, mas não tinham interesse em ler suas
obras. Mas, ao mesmo tempo, eu penso que houve um bom desenvolvimento de análises mais sólidas
de bons analistas e estudiosos do marxismo nesse país. Acho que nunca existiram tantos livros
baseados no marxismo como hoje em dia. E se essa quantidade de livros está sendo publicada hoje
em dia, é porque deve existir um interesse comercial nisso. Devem existir várias pessoas interessadas
em comprar esses livros.
HW: Quando você se refere a uma forma positiva, isso quer dizer de forma quantitativa e
também qualitativa?
DM: Sim, eu acho que nos dois sentidos. Mas, eu penso mais em qualidade do que em
quantidade. A quantidade está se mantendo. Claro que hoje existe maior quantidade do que no final
dos anos de 1980 ou na década de 1990, quando o pensamento liberal era mais dominante. Essa
dominância, que durou uns 25 anos, afetou bastante na quantidade de obras baseadas no
pensamento de Marx no ocidente, em geral. E isso, claro, da diminuição da quantidade de obras
marxistas, tinha relação com o fato destas obras não serem, na época, comercialmente interessantes.
HW: Alguns dos seus livros foram traduzidos e publicados em diferentes países e alguns
deles foram também traduzidos e publicados no Brasil. Você alguma vez já esteve no Brasil ou
conhece alguma coisa a respeito do desenvolvimento do pensamento marxista nesse país?
DM: Infelizmente não. A América do Sul é a única parte do mundo em que eu nunca estive.
Então eu tenho muito pouco conhecimento sobre o Brasil e sobre outros países da América do Sul. É
claro que já li livros de escritores brasileiros, especialmente de autores que vivem e publicaram livros
aqui no Reino Unido. Mas as análises destes livros que li não foram especificamente sobre o Brasil.
Então, eu sinto em dizer que, infelizmente, a minha resposta precisa ser negativa. Talvez um destes
dias eu faça uma viagem ao Brasil para conhecer o seu país. Claro que atualmente eu tenho visto que,
infelizmente, o Brasil tem aparecido bastante nos jornais, que relatam os problemas políticos de lá.
HW: Sobre os seus livros, você publicou muitos títulos, especialmente sobre a vida e o
pensamento de Marx e sobre a tradição marxista. É possível, para você, indicar um livro que seja
mais importante ou algum que você goste mais? Ou algum livro que você gosta, mas não foi muito
analisado ou não teve a repercussão que você desejaria? WELLEN, h..
Novos Rumos, Marília, v. 58, n. 1, p.21-33, Jan.-Jun.,2021
DM: Eu penso que o livro mundialmente mais famoso que eu escrevi é sobre a biografia de
Marx, especialmente por causa das várias traduções que ele teve9 . Ele tem sido bem popular e com
alguma influência. Mas, em outra categoria, um livro que eu gostei muito de ter publicado foi o
referente a partes dos “Grundrisse”10. Porque eu acho que, quando eu traduzi esse material do alemão
para o inglês, ele teve um importante impacto aqui nas análises teóricas sobre o pensamento de
Marx. Isso aconteceu também um pouco com a tradução e a publicação dos textos juvenis de Marx.
Mas, com os “Grundrisse” a influência foi bem superior. Claro que, depois de alguns anos, os
“Grundrisse” tiveram uma publicação completa aqui na Inglaterra e isso ajudou na análise mais
geral. Mas, durante alguns anos, a tradução que publiquei foi a principal referência para a análise de
algumas categorias importantes, como a alienação. E se você me pergunta sobre os livros que eu
publiquei e que não tiveram o impacto que eu desejava, tem um livro sobre uma pensadora francesa
chamada Simone Weil, que eu escrevi uma biografia11. Esse foi um livro que eu fiquei muito feliz de
ter podido escrever. Contudo, ele não teve nenhuma recepção comparada a alguns livros mais
famosos que escrevi e publiquei.
HW: Esse livro sobre Simone Weil foi traduzido para outra língua?
DM: Não. Não foi traduzido para nenhum outro idioma. Apenas foi publicado também, por
outra editora, nos Estados Unidos.
HW: Provavelmente a sua obra mais famosa seja a biografia de Marx (sua vida e
pensamento). Você saberia dizer em quantos idiomas ou países ele foi publicado?
DM: Eu nunca contei, mas eu acho que em torno de 16 ou 17 idiomas. Eu fiquei feliz, por
exemplo, quando foi traduzido para o finlandês. Porque eu fico imaginando como uma região bem
distante, em que o meu livro está sendo lido. Outra publicação que me chamou atenção é a para o
chinês tradicional, em Taiwan, que deve ter uma versão diferente do chinês oficial, que já tinha sido
traduzido em tempo bem anterior.
HW: Sobre o trabalho de um biógrafo. Porque às vezes eu penso ser bastante difícil separar
qual é o seu pensamento sobre a pessoa que você está escrevendo e a vida dessa pessoa, por ela
mesma. Existem fronteiras ou limites entre esses dois pontos? Qual deveria ser o principal objetivo
de um biógrafo?
DM: Bem, quando eu escrevo sobre a vida de Marx, eu posso falar, por exemplo, como nos
“Grundrisse”, sobre a permanência de uma ideia que esteve presente durante toda a vida de Marx.
Mas, talvez você esteja me perguntando se algo aparece invisível ou explícito ou inevitável na
biografia, que é o ponto de vista particular do biógrafo sobre a pessoa que está sendo biografada.
Sobre a existência de alguns julgamentos pessoais do biógrafo, eu acho que alguns biógrafos de Marx,
especialmente os mais recentes, fazem exatamente isso, de impor alguns elementos na vida de Marx
que são, na verdade, seus próprios valores e preconceitos. Eu estou orientando, atualmente, uma
estudante chinesa de doutorado que está escrevendo a sua tese sobre a minha biografia sobre Marx.
E uma das questões que ela faz é: por que a minha biografia sobre Marx é tão popular na China,
enquanto outras biografias não parecem ser tão populares? E uma das razões que ela pensa para isso
é que, para as pessoas da China, a minha biografia parece ser objetiva. Isto é, que aborda realmente
Marx, não os valores de outra pessoa sobre Marx. Eu disse a ela que realmente eu vejo alguma
verdade nisso, mas que todo mundo, quando está escrevendo alguma coisa, deposita as suas visões
particulares. Que nada é simplesmente objetivo neste sentido e que as análises estão conectadas com
estes pontos de vista. Eu também ressaltei a ela que a minha relação com Marx, especialmente na
9 McLELLAN, David. Marx: vida e pensamento. Petrópolis: Vozes, 1990.
10 McLELLAN, David. Marx´s Grundrisse. London: Mcmillan, 1971.
11 McLELLAN, David. Simone Weil: utopian pessimist. London: Palgrave Mcmillan, 1989.Karl Marx como patrimônio da humanidade: entrevista com David McLellan
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análise da continuação do seu pensamento, assim como pela simpatia com a sua vida, tem muito a
ver com a minha proximidade pelo humanismo, como uma concepção de mundo ou algo parecido.
E que, nesse sentido, as partes da vida de Marx e as passagens teóricas que eu destaquei na minha
obra, que é uma seleção, comportam alguma tendência pessoal. Mas, claro, eu acredito que priorizei
bem mais as citações próprias de Marx. Então, eu tentei deixar “o homem falar por ele mesmo”. De
toda forma, eu tentei apresentar Marx da melhor forma que eu pude, pois eu acho que, se você está
fazendo uma biografia sobre alguém, você precisa ter simpatia com essa pessoa. Porque, de outra
forma, a hostilidade termina por afastar o entendimento da pessoa que está sendo biografada. Para
mim, o principal objetivo de um biógrafo é apresentar a pessoa que está sendo biografada da melhor
forma possível, para que o leitor possa entender da forma mais precisa e realista. Tentando entender
a pessoa dentro da sua realidade histórica e com as possibilidades e ideias da sua época específica. O
oposto de uma visão eterna ou natural. Mas dentro da sua sociedade particular.
HW: Sobre esse seu humanismo que várias vezes você fala, eu gostaria de entender de três
formas diferentes. Porque você está dizendo que Marx era um humanista, mas você também está
dizendo que você é um humanista. E tem outra questão, relacionada à qualidade do biógrafo: você
não pensa que todos os biógrafos deveriam ter uma visão humanista para mostrar a real
personalidade ou a real pessoa que ele está escrevendo sobre?
DM: Sim. Eu acredito que todo biógrafo precisa disso, para retratar bem a pessoa que está
sendo biografada como um ser humano, tanto nas suas virtudes como nos seus vícios, que são coisas
que todos os seres humanos possuem. Para isso, precisa iluminar a vida da pessoa da forma mais
humanista possível para poder ressaltar a relação da sua vida com os fatos históricos.
HW: Nas suas obras, é possível observar o destaque de algumas qualidades pessoais de
Marx. Existem várias referências sobre a genialidade de Marx e, nesse sentido, se salienta tanto uma
postura às vezes de difícil relacionamento, como uma preocupação meticulosa e científica muito
grande, com a necessidade de reescrever e reanalisar muitas coisas. Para você, quais seriam as
características mais marcantes de Marx?
DM: Bom, essa é uma pergunta difícil de responder, especificamente a respeito da
personalidade de Marx. Por um lado, ele poderia ser algumas vezes um pouco agressivo e mesmo
intolerante. E ele não se tornou mais suave com a idade. Mas eu acho que essa postura estava mais
relacionada com diferenças intelectuais. Eu me lembro do caso, relatado por Annenkov, da reunião
de Marx com Weitling, em que ele foi agressivo. Mas essa postura não era porque Marx não gostava
de Weitling, como pessoa. Não era uma coisa pessoal, como algumas pessoas gostam de indicar. E,
por outro lado, ele era uma pessoa extremamente boa, que sentia muito a situação vivida pela sua
família. Ele era muito próximo e demonstrava muito amor tanto pelos seus filhos como pela sua
esposa. Pelo que eu me lembre, só existe uma única carta que restou de Marx para a sua esposa, do
início da relação deles. E é uma carta muito bonita. E ele parecia sentir muito a situação que, por
causa da sua dedicação teórica e política, tinha atingido a sua família. Eles tiveram, principalmente
no começo da vida em Londres, uma situação terrível de vida, inclusive com a morte de alguns filhos.
E Marx se sentia muito culpado por isso. Essa seria uma das razões para aquilo que, na visão de
algumas pessoas, seria uma contradição, mas que eu entendo de forma diferente, que é a tentativa
de ter uma vida burguesa quando eles estavam em Londres. Eu entendo como uma tentativa de
prover uma vida melhor para a sua família. De superar a difícil condição que eles passaram. Porque
ele havia dito a si mesmo que não queria que as suas filhas passassem pela mesma difícil situação
que ele teria feito a sua esposa passar. E eu acho honrável essa preocupação que Marx tinha com a
sua família.
HW: Alguns analistas terminam fazendo julgamentos morais sobre Marx. Que ele queria ter
uma vida melhor e prover boas condições econômicas e sociais para as suas filhas. E aí, esses
analistas indicam o que pensariam ser uma contradição. Que Marx criticava a sociedade capitalista, WELLEN, h..
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mas queria ter uma vida em boa condição econômica. E o julgam, como se alguém quisesse ter uma
vida miserável, privada de condições econômicas. Esquecem que o comunismo objetiva socializar a
riqueza existente e não colocar todas as pessoas na pobreza.
DM: Sim, eu acredito que esta forma de crítica não faz nenhum sentido, pois está fora do
contexto. Além disso, existe a crença de que, para se colocar na posição de luta do proletariado se faz
necessário ter uma condição econômica proletária. Claro que existem esses casos e que são muito
importantes. Mas, também nesse caso, as pessoas desejam uma vida melhor. Assim, eu não vejo
nenhuma contradição nessa posição de Marx, em querer prover melhores condições econômicas
para a sua família. Eu sei que existem limites nessa condição, do tamanho da riqueza econômica.
Não sei qual é o certo, mas no caso de Marx isso era muito mais simples. Ele não queria uma vida
maravilhosa, mas apenas recursos suficientes para, por exemplo, pagar aulas de piano para as suas
filhas.
HW: Outra coisa que me parece ser difícil de ver em alguns biógrafos e que você indicou um
pouco na sua análise sobre Marx, é que ele não era uma pessoa muito organizada em relação aos
recursos econômicos. Na sua biografia, você apontou que, por exemplo, na lua de mel de Marx, o
casal distribuiu grande parte da herança que haviam recebido, colocando em uma tigela para que as
pessoas que os visitassem pegassem um pouco. Ele tinha esse problema de organizar as condições
econômicas, inclusive dentro da sua casa, com o uso dos recursos recebidos no trabalho nos jornais?
DW: Sim. Isso é bastante verdadeiro. Eu acho que ele deixava a maior parte do controle sobre
o dinheiro com a sua esposa Jenny. E, algumas vezes, eu imagino Marx pensando que estaria muito
ocupado com outras coisas para se preocupar com isso. “Eu tenho que terminar meu livro! Minha
grande obra sobre o capital. Preciso ir estudar no Museu Britânico”. Quando as pessoas batiam em
sua porta, cobrando as dívidas, ele poderia pensar que não era com ele. Que outras pessoas deveriam
resolver essas questões menores. Mas eu realmente penso que ele não tinha capacidade de
administrar o dinheiro. E a razão principal para isso é que ele sempre estava com a mente ocupada
em outras coisas, especialmente em seus escritos.
HW: Tem outra qualidade de Marx, que ficou mais explícita no tempo em que ele viveu em
Londres, quando ele ficava bastante tempo na Biblioteca Britânica, sempre estudando muito, que
era a sua dedicação à pesquisa. Eu acredito que Marx foi realmente um grande cientista. Tentando
fazer análises, da maneira mais séria, dedicada e profunda, principalmente sobre a economia
política. Mas, especialmente para pessoas de direita, e mesmo dentro da universidade, alguns
professores, já num primeiro e superficial contato, rejeitam o seu pensamento dizendo coisas como
se a obra de Marx fosse ideológica e que seria impossível utilizar suas obras dentro da universidade.
Você acredita que seria possível superar todo esse preconceito contra Marx dentro da universidade,
tornando possível uma consideração científica das suas análises?
DM: Eu penso que é possível superar isso de alguma forma, mas em uma pequena amplitude.
Ou, talvez, em uma amplitude um pouco maior. Mas eu não acho que seja possível superar
totalmente. E isso porque eu penso que os estudos econômicos marxistas não seriam, no sentido
acadêmico atual, puramente científicos. Isso porque eles estão sempre conectados com
consequências políticas. Essa condição difere bastante da forma, ao menos aqui na Inglaterra, em
como a economia, de maneira geral, indica ser a ciência. Como uma coisa separada da sociedade e
que precisa ser apresentada a partir de fórmulas e modelos matemáticos. E inclusive essa visão de
economia recebe, cada vez mais, críticas dos estudantes, que afirmam que esses modelos não
indicam nada sobre o que realmente está acontecendo na sociedade. E então demandam que o estudo
da economia nas universidades seja reformulado, para permitir uma análise profunda da realidade.
Porque, ao fazer isso, e adotar, por exemplo, as análises econômicas de Marx, então inevitavelmente
eles perceberão as consequências políticas dessas pesquisas; sobre os problemas, as crises e, em
último lugar, sobre a própria destruição do capitalismo. E isso não é o que ordinariamente os
professores contemporâneos e mais superficiais da economia vão querer analisar. Até porque, nesse Karl Marx como patrimônio da humanidade: entrevista com David McLellan
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tema, não de forma imediata, mas em médio prazo, isso levaria à análise do próprio desaparecimento
desse tipo de economia. E, com isso, os próprios sujeitos dessa teoria, estes tipos de professores
universitários, também iriam desaparecer. Mesmo assim, é difícil prever o que pode acontecer.
Talvez com as preocupações nos problemas ambientais, por exemplo, exista uma tendência em
refletir sobre esse tipo de economia. Com isso pode ser que, nos próximos dez ou vinte anos de
capitalismo, mais pessoas se aproximem do marxismo e isso crie uma revisão dos preconceitos sobre
a teoria marxista na universidade, ressaltando as suas qualidades científicas. A visão mais acurada
que os estudos econômicos marxistas possuem em relação à economia ortodoxa provavelmente fará
Marx mais presente na universidade. Mas isso não superaria totalmente os preconceitos sobre o seu
pensamento na universidade. De toda forma, não tem como se prever o que acontecerá daqui a vinte
anos. Mas eu ficaria surpreso se Marx passasse a receber muito mais atenção na universidade.
HW: Porque não se trata apenas do pensamento de Marx. Mas também da forma do que se
considera ser científico hoje em dia nas universidades. No tempo de Marx isso era bem diferente. O
caso de David Ricardo, por exemplo, que relacionava as suas análises econômicas com posições
políticas, como no caso ao combate da lei dos cereais. Era, então, um modelo diferente de ciência que
o desenvolvimento econômico e ideológico do capitalismo precisou alterar para ampliar a dominação
política.
DM: Exato. As análises econômicas atuais, não todas elas, mas a sua maioria, estão
conectadas com a agenda neoliberal. Na forma como você indicou bem, antes essa relação era clara,
como no caso de Ricardo sobre a lei dos cereais, assim como nas análises de Marx. Além disso, o
termo científico, aqui na Inglaterra, tem uma diferença em relação a outros países, como a Alemanha.
Se, na Alemanha, científico tem uma conotação mais ampla, aqui na Inglaterra está embasado,
historicamente, com as ciências naturais e, particularmente, com a física.
HW: Sobre outro tema. Eu vi uma entrevista sua sobre a influência de Shakespeare sobre
Marx, assim como outras questões de estética. É bastante comum, nas obras de Marx, referências e
citações literárias e poéticas e, como você demonstrou em sua biografia, Marx não somente gostava
muito de ler e estudar obras de artes, mas também de realizar atividades artísticas, como recitar
poesias e ensaiar trechos de peças de teatro com a sua família. Então eu gostaria que você falasse um
pouco dessa influência das artes sobre o desenvolvimento do pensamento de Marx.
DM: Inicialmente, eu destaco que Marx era muito interessado em artes, em estética,
principalmente em literatura. Shakespeare foi muito lido por ele. Acho que Marx leu todas as peças
de Shakespeare e praticamente todo ano ele relia algumas partes, junto com a sua família. Em outros
campos da arte isso aparece de forma pontual. Por exemplo, não acho que Marx fosse muito
interessado em música. Ou, pelo que eu saiba, ele também não foi muito interessado em pinturas.
Mas em literatura ele era muito interessado. E eu acho que a razão principal desse interesse é a
relação que a literatura tem com o humanismo, como uma forma de entender melhor as qualidades
dos seres humanos ao longo da história. Muitas pessoas que gostam de Shakespeare poderiam dizer,
por exemplo, que ele conseguiu apresentar qualidades bastante interiores da subjetividade humana;
que conseguiu manifestar essas qualidades nas suas obras literárias. Eu também acho que uma
pessoa da inteligência de Marx conseguiu, dentro do campo da literatura, destacar as figuras
artísticas mais grandiosas, como no caso de Shakespeare. Marx não escreveu muito sobre a relação
entre literatura e artes em geral com as relações sociais e econômicas, com o modo de produção, por
exemplo, ou como um modo específico de ideologia. Isso foi desenvolvido por outros pensadores
marxistas posteriores, com destaque para Lukács. Mas ele fez algumas análises e perguntas bem
interessantes sobre essa relação. No final da introdução dos “Grundrisse”, Marx situa a sua famosa
reflexão sobre a arte grega, questionando as razões dela ainda conseguir emocionar várias pessoas,
mesmo em um tempo histórico tão diferente. Ele apresentou poucas respostas sobre isso, como a
ideia de que a arte grega expressaria algo como a infância da humanidade e que todas as pessoas
amam as crianças. Como ele não desenvolveu essa ideia, não sabemos o real sentido da sua
afirmação. Mas, de toda forma, é uma questão muito interessante e Marx sempre apresentou WELLEN, h..
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questões corretas, mesmo que se tratasse de questões com respostas bastante difíceis de serem
respondidas em seu tempo histórico.
HW: Nesses diferentes temas e momentos do desenvolvimento do pensamento de Marx,
algumas vezes se destaca uma continuidade e, em outras, algumas marcas de mudanças. Você acha
que existe alguma linha de continuidade, com o destaque para alguma categoria ou temática, ao
longo de todo o pensamento de Marx? Você falou sobre o humanismo de Marx. Podemos ver isso
como uma linha de continuidade no seu pensamento? Existe outro destaque?
DM: Sim. Eu acho que sim. Se você pegar o conceito de alienação, ele é bastante comum nos
textos juvenis de Marx, assim como nos “Grundrisse”. Em “O capital”, ainda que apareça a categoria
de fetichismo da mercadoria, e eu acho que existem diferenças em relação à alienação, essa temática
já não está presente. Mas, mesmo assim, eu acho que, de uma forma implícita, como uma ideia que
está em pano de fundo, Marx nunca abandonou a categoria da alienação. Claro que você poderia
dizer que se trata de uma categoria presente nas obras juvenis e que, nas análises maduras de Marx,
ela tenha perdido a sua atenção. Mas, nos “Grundrisse”, isso está bem presente, tanto na crítica a
uma especialização técnica do trabalho, como na análise da economia política. A economia política
não é um campo de estudos em que a categoria da alienação seja usada como uma forma de
galvanização de conceitos. Também por isso eu acho que, depois, o uso dessa categoria tenha sido
mais implícito, como um guia de análise vinculado ao background humanista. Contudo, ao mesmo
tempo, Marx mudou a sua posição em relação a algumas coisas importantes, como na sua relação
com David Ricardo ou sobre o papel do Estado em uma sociedade pós-revolucionária, diferindo da
visão apresentada no “Manifesto comunista”; de que o Estado precisaria ser abolido e não poderia
ser algo a ser usado de forma permanente para desenvolver a sociedade. Então, ele também mudou
a sua mente em relação a algumas coisas. Qualquer pessoa inteligente muda de pensamento às vezes,
eu acho. Mas eu não acho que ele tenha rejeitado, mesmo que de forma implícita, a categoria da
alienação. Por isso eu não concordo com pensadores como Althusser que apresentam uma ruptura
profunda e real no desenvolvimento do pensamento de Marx. Como se existissem duas coisas
totalmente diferentes, antes e depois de 1845, ou em torno desse momento histórico.
HW: Especificamente sobre esse debate a respeito da alienação. Porque, de um lado tem a
posição de Althusser que, provavelmente, é a mais famosa e, por outro lado, tem outra posição mais
extrema, próxima de alguns pensadores da Escola de Frankfurt, como Erich Fromm, por exemplo.
De um lado, existiria essa grande ruptura e a rejeição da categoria da alienação. Do outro lado, a
categoria da alienação seria a categoria mais importante do pensamento de Marx. Já para outras
pessoas, isso é menos extremo e, mesmo com algumas mudanças, a categoria da alienação
permaneceria presente no pensamento de Marx. Em qual desses grupos você poderia se encaixar?
DM: No do meio, eu penso. Eu acho que Fromm apresenta um tipo de humanismo que é
retirado de Marx apenas do que ele escreveu em 1844 e que transforma isso na fundação de todas as
análises de Marx. Eu não sei se isso vale para todos os integrantes da Escola de Frankfurt, mas que
é bem presente em Fromm. E eu acho que, para ser bem fiel a Marx, é preciso levar em consideração,
até de forma básica, a sua formação na concepção materialista da história. E isso me conduz,
inclusive, às questões do começo da entrevista, sobre aquilo que mais me chamou a atenção nos meus
primeiros contatos com o pensamento de Marx, através da leitura da “Ideologia Alemã”. E o ponto
de vista de Fromm não leva isso em consideração. Assim, essa posição era a de Fromm, não era
realmente a de Marx. Então, se você desejar prestar contas com o pensamento de Marx, é necessário
levar em consideração a sua totalidade.
HW: E sobre a alienação. Você pensa que é possível superar a alienação? Qual seria o
fundamento da alienação? É a propriedade privada? O mercado? A divisão social do trabalho? Qual
seria o sentido real da alienação nas obras de Marx?Karl Marx como patrimônio da humanidade: entrevista com David McLellan
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DM: Bem, eu presumo que o sentido dessa superação seja a forma como a sociedade poderia
se organizar livremente para poder se desenvolver. Porque as condições de desenvolvimento do ser
humano, dentro de algumas sociedades, terminaram sendo dominadas pelas forças econômicas.
Então, aquilo que deveria ser próprio do ser humano passou a ser dominado por uma força externa,
que é a organização econômica. O controle da produção baseada numa organização coletiva e com a
participação das pessoas se encontra dominado pela propriedade privada e pela divisão social do
trabalho. Então as relações sociais próprias da propriedade privada, que marcam relações privadas
dentro da sociedade, depreciam as possibilidades de florescimento das potencialidades de
desenvolvimento da humanidade. Por isso, a alternativa seria uma organização produtiva, coletiva,
baseada no controle da humanidade e direcionada para as necessidades e interesses da própria vida.
Essa seria uma visão bem geral sobre a alienação, como categoria implícita, que se apresenta no
pensamento de Marx.
HW: Finalmente, eu gostaria de lhe agradecer mais uma vez por sua disponibilidade em

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