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Classe em
Marx e Engels
Antologia de textos
Bruno Lamas
(...) 19. «Em frente! Em frente!»: um primeiro esboço da dinâmica histórica
do capital e seus efeitos na classe operária
Como age o crescimento do capital produtivo sobre o salário?
Se o capital produtivo da sociedade burguesa cresce no seu todo, então ocorre uma
acumulação mais ampla de trabalho. Os capitais aumentam em número e volume. O aumento
dos capitais aumenta a concorrência entre os capitalistas. O volume crescente dos capitais
fornece os meios para levar para o campo de batalha industrial exércitos mais poderosos de
operários com ferramentas de guerra mais gigantescas.
Um capitalista só pode pôr outro em debandada e conquistar-lhe o capital vendendo mais
barato. Para poder vender mais barato sem se arruinar tem de produzir mais barato, isto é,
aumentar tanto quanto possível a força de produção do trabalho. Mas a força de produção do
trabalho é sobretudo aumentada por meio duma maior divisão do trabalho, por meio duma
introdução generalizada e dum aperfeiçoamento constante da maquinaria. Quanto maior é o
exército de operários entre os quais o trabalho se divide, quanto mais gigantesca a escala em
que se introduz a maquinaria, tanto mais diminuem proporcionalmente os custos de produção,
tanto mais frutuoso se torna o trabalho. Nasce daqui uma competição generalizada entre os
capitalistas para aumentarem a divisão do trabalho e a maquinaria e as explorarem à maior
escala possível.
Ora, se um capitalista achou, graças à maior divisão do trabalho, graças à aplicação e
aperfeiçoamento de novas máquinas, graças à exploração mais vantajosa e maciça das forças
da natureza, o meio para criar, com a mesma soma de trabalho ou de trabalho acumulado, uma
soma maior de produtos, de mercadorias, do que os seus concorrentes; se ele puder, por
exemplo, produzir uma vara de pano no mesmo tempo de trabalho em que os seus
concorrentes tecem meia vara de pano — como irá operar este capitalista? 28
Ele poderia continuar a vender meia vara de pano ao preço até aí vigente no mercado; isto,
contudo, não seria um meio para pôr em debandada os seus adversários e aumentar as suas
próprias vendas. Mas na mesma medida em que a sua produção se expandiu, expandiu-se para
ele a necessidade das vendas. Os meios de produção mais poderosos e caros que pôs em acção
capacitam-no de facto para vender mais barata a sua mercadoria, mas ao mesmo tempo
obrigam-no a vender mais mercadorias, a conquistar para as suas mercadorias um mercado
muito maior; o nosso capitalista venderá, portanto, a sua meia vara de pano mais barata do que
os seus concorrentes.
O capitalista, porém, não vai vender a vara inteira ao preço a que os seus concorrentes vendem
a meia vara, embora a produção da vara inteira não lhe custe mais do que aos outros a de meia
vara. Se o fizesse, não ganharia nada extra, pois recuperaria apenas na troca os custos de
produção. A sua receita eventualmente maior proviria do facto de ter posto em movimento um
capital mais elevado, mas não do facto de ter valorizado o seu capital mais do que os outros.
Além disso, ele atinge o objectivo que quer atingir se fixar o preço da sua mercadoria alguns
por cento abaixo do dos seus concorrentes. Põe-nos em debandada, rouba-lhes pelo menos
uma parte do mercado, vendendo mais barato. E nós, por fim, recordamos que o preço
corrente está sempre acima ou abaixo dos custos de produção, consoante a venda duma
mercadoria coincide com a temporada favorável ou desfavorável da indústria. Consoante o
preço de mercado da vara de pano está abaixo ou acima dos seus custos de produção até aí
usuais, variarão as percentagens a que o capitalista que empregou meios de produção novos e
mais frutuosos vende acima dos seus custos de produção reais.
Contudo o privilégio do nosso capitalista não é de longa duração; outros capitalistas
concorrentes introduzem as mesmas máquinas, a mesma divisão do trabalho, introduzem-nas à
mesma escala ou a uma escala superior, e esta introdução torna-se tão generalizada até que o
preço do pano é feito descer não só abaixo dos seus velhos custos de produção, mas abaixo
dos novos.
Os capitalistas encontram-se, portanto, na mesma situação entre si em que se encontravam
antes da introdução dos novos meios de produção, e se com estes meios podem fornecer o
dobro do produto ao mesmo preço, agora são obrigados a fornecer o dobro do produto abaixo
do preço velho. Ao nível destes novos custos de produção começa outra vez o mesmo jogo.
Mais divisão do trabalho, mais maquinaria, maior escala a que divisão do trabalho e
maquinaria são exploradas. E a concorrência traz de novo contra este resultado o mesmo efeito
contrário.
Vemos como o modo de produção, os meios de produção, são assim continuamente
transformados, revolucionados, como a divisão do trabalho traz necessariamente consigo uma
maior divisão do trabalho, a aplicação de maquinaria uma maior aplicação de maquinaria, o
trabalhar em grande escala um trabalhar em maior escala.
É esta a lei que faz a produção burguesa sair constantemente dos seus velhos carris e obriga o
capital a intensificar as forças de produção do trabalho porque as intensificou, a lei que
nenhum descanso lhe concede e permanentemente lhe sussurra:
Em frente! Em frente! 29
Não é esta lei senão a lei que, dentro dos limites das flutuações das épocas do comércio,
necessariamente equilibra o preço duma mercadoria com os seus custos de produção.
Quaisquer que sejam os meios de produção poderosos que um capitalista põe em campo, a
concorrência generalizará esses meios de produção, e a partir do momento em que aquela os
generalizou o único êxito da maior frutificação do seu capital é o ter de fornecer ao mesmo
preço dez, vinte, cem vezes mais do que anteriormente. Mas como ele tem de vender talvez
mil vezes mais para compensar, pela massa maior do produto vendido, o preço de venda mais
baixo, porque agora é necessária uma venda mais maciça não só para ganhar mais mas para
repor os custos de produção — o próprio instrumento de produção, como vimos, torna-se cada
vez mais caro —, porque esta venda maciça, porém, não se tornou uma questão vital apenas
para ele, mas também para os seus rivais, a velha luta começa com tanta maior violência
quanto mais frutuosos são os meios de produção já inventados. A divisão do trabalho e a
aplicação da maquinaria voltarão, portanto, a processar-se numa medida incomparavelmente
maior.
Qualquer que seja o poder dos meios de produção aplicados, a concorrência procura roubar ao
capital os frutos de ouro deste poder reconduzido o preço da mercadoria aos custos de
produção, tornando por conseguinte, na medida em que se pode produzir mais barato, isto é,
em que com a mesma soma de trabalho se pode produzir mais, a produção mais barata, o
fornecimento de massas cada vez maiores do produto pela mesma soma de preço uma lei
imperativa. Deste modo, o capitalista nada teria ganho com os seus próprios esforços a não ser
a obrigação de fornecer mais no mesmo tempo de trabalho, numa palavra, condições mais
difíceis de valorização do seu capital. Assim, enquanto a concorrência o persegue
permanentemente com a sua lei dos custos de produção, e todas as armas que ele forja contra
os seus rivais se viram como armas contra ele próprio, o capitalista procura permanentemente
levar a melhor sobre a concorrência introduzindo incansavelmente novas máquinas — de facto
mais caras mas que produzem mais barato — e divisões do trabalho em substituição das
velhas e sem esperar que a concorrência tenha envelhecido as novas
Imaginemos agora esta agitação febril ao mesmo tempo em todo o mercado mundial, e
compreende-se como o crescimento, a acumulação e concentração do capital têm por
consequência uma divisão do trabalho, uma aplicação de nova e um aperfeiçoamento de velha
maquinaria ininterruptos que se precipitam uns sobre os outros e executados a uma escala cada
vez mais gigantesca.
Mas como actuam estas circunstâncias, que são inseparáveis do crescimento do capital
produtivo, sobre a determinação do salário?
A maior divisão do trabalho capacita um operário a fazer o trabalho de cinco, dez, vinte: ela
aumenta, portanto, cinco, dez, vinte vezes a concorrência entre os operários. Os operários não
fazem concorrência uns aos outros apenas quando um se vende mais barato do que o outro;
fazem concorrência uns aos outros quando um executa o trabalho de cinco, dez, vinte; e a
divisão do trabalho introduzida e constantemente aumentada pelo capital obriga os operários a
fazer uns aos outros esta espécie de concorrência
Que o juro do capital diminui na medida em que aumentam a massa e o número do capital, em
que o capital cresce, que por isso o pequeno rentier já não pode viver do seu rendimento, e
portanto tem de se lançar sobre a indústria, e portanto ajuda a aumentar as fileiras dos
pequenos industriais e, assim, os candidatos ao proletariado, tudo isto não carecerá de mais
explicações.
Na medida, finalmente, em que os capitalistas são obrigados pelo movimento atrás retratado a
explorar em maior escala meios de produção gigantescos já existentes e a pôr em movimento,
para este fim, todas as molas do crédito, nessa mesma medida aumentam os terramotos 32
industriais, nos quais o mundo do comércio só se mantém sacrificando uma parte da riqueza,
dos produtos e mesmo das forças de produção aos deuses das profundezas — aumentam,
numa palavra, as crises. Elas tornam-se mais frequentes e mais violentas pelo próprio facto de
que na medida em que cresce a massa de produtos, portanto a necessidade de mercados mais
extensos, o mercado mundial se contrai cada vez mais, restam para exploração cada vez menos
mercados novos, porque todas as crises anteriores sujeitaram ao comércio mundial mercados
até então inconquistados ou apenas superficialmente explorados pelo comércio. O capital,
porém, não vive só do trabalho. Senhor a um tempo elegante e bárbaro, arrasta consigo para a
cova os cadáveres dos seus escravos, hecatombes inteiras de operários que soçobram nas
crises. Vemos assim que: se o capital cresce rapidamente, incomparavelmente mais depressa
cresce a concorrência entre os operários, isto é, tanto mais diminuem, proporcionalmente, os
meios de ocupação, os meios de subsistência, para a classe operária, e, não obstante, o
rápido crescimento do capital é a condição mais favorável para o trabalho assalariado.
Trabalho assalariado e capital, 1849
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