Translate

terça-feira, 31 de dezembro de 2019


Centenário de “A Batalha”

Foram homens de vontades livres e não levaram toda a vida a meditar

Participantes na Conferência Anarquista de Lisboa de 1925, entre os quais estão dois dos responsáveis editoriais de “A Batalha”: Manuel Joaquim de Sousa e Manuel da Silva Campos [nº28] <span class="creditofoto">Foto BNP</span>
Participantes na Conferência Anarquista de Lisboa de 1925, entre os quais estão dois dos responsáveis editoriais de “A Batalha”: Manuel Joaquim de Sousa e Manuel da Silva Campos [nº28] Foto BNP
O ano mais incrível que possamos imaginar começa com uma (breve) restauração da monarquia. O movimento operário une-se e funda um jornal que é o único a ser publicado quando os tipógrafos fazem greve. Um projeto fruto do sonho de um grupo de homens e mulheres de vontades livres, que não levaram toda a vida a meditar
Texto Manuela Goucha Soares
“Atualmente, soa mal falar em propaganda”, mas há cem anos, quando os operários portugueses lançaram o primeiro número do diário “A Batalha”, não era assim. Nessa época “o jornal impresso em papel era a única, a mais barata e a melhor forma moderna de difundir ideias e dar a conhecer ao público a verdade de certos factos, bem como alguma das suas possíveis interpretações”, lembra o investigador João Freire.
O primeiro número de “A Batalha” foi publicado a a 23 de fevereiro de 1919, um mês depois de ter começado em Versalhes (arredores de Paris) a Conferência de Paz de onde sairia um acordo entre os beligerantes na Grande Guerra, que só em Portugal fez oito mil mortos e deixou o país mergulhado numa imensa escassez de alimentos e inflação brutal.
Primeira página do 1º número do diário “A Batalha”, publicado a 23 de fevereiro de 1919 <span class="creditofoto"> Imagem BNP</span>
Primeira página do 1º número do diário “A Batalha”, publicado a 23 de fevereiro de 1919 Imagem BNP
A crise económica era tão intensa que pôs em causa o próprio regime republicano. A 19 de janeiro — um dia depois de a Conferência de Paz ter começado em Versalhes — a monarquia foi proclamada no Porto e em Lisboa, e declarado o estado de sítio no território continental. Na capital, a revolta foi subjugada cinco dias depois, no Porto prolongou-se até 13 de fevereiro.
É neste contexto de profunda crise económica, social e política que o movimento sindical operário sente necessidade de criar “um grande veículo informativo e propagandístico das suas insatisfações, realizações e objetivos”, lembra o investigador João Freire: “Já o haviam tentado em 1908 com o diário “A Greve”, que muito pouco durara. Após a queda da Monarquia [em 1910], o tipógrafo Alexandre Vieira conseguira pôr de pé o semanário “O Sindicalista”, que se aguentou razoavelmente bem, apesar das perseguições a que foi sujeito, sobretudo a partir de 1913, com o governo de Afonso Costa”.
Alexandre Vieira não desiste do seu objetivo, apesar de os anos da guerra terem sido “difíceis para o movimento sindical”, acrescenta João Freire. O mundo estava a mudar e os operários portugueses não ficaram totalmente indiferentes aos ideais anarco-sindicalistas nem à Revolução russa de 1917.
O custo de vida e as greves dominam a primeira página do diário “A Batalha” publicado a 11 de maio de 1919 <span class="creditofoto"> Imagem BNP</span>
O custo de vida e as greves dominam a primeira página do diário “A Batalha” publicado a 11 de maio de 1919 Imagem BNP
É no contexto deste ano quase único, e “particularmente convergente de vontades e ideias que, a 23 de fevereiro de 1919, saiu à rua o primeiro número de “A Batalha”, porta-voz da organização operária portuguesa”, sob a chefia editorial do tipógrafo Alexandre Vieira, explica João Freire.
A redação de “A Batalha” funcionava na Calçada do Combro, 38 - A, 2º andar, no Palácio Marim-Olhão. Este diário que queria ser de “grande tiragem e expansão” custava dois centavos, como quase todos os outros 14 títulos diários que então se publicavam na capital.
A I Guerra Mundial fizera disparar o preço do papel de jornal, que antes da conflagração custava oito centavos por quilo, e que um ano anos de surgir o diário operário já ultrapassava os 50.
Primeira página do número do diário “A Batalha”, publicado a 1 de maio de 1925 <span class="creditofoto"> Imagem BNP</span>
Primeira página do número do diário “A Batalha”, publicado a 1 de maio de 1925 Imagem BNP
Nos primeiros meses o jornal era propriedade da União Operária Nacional. Em finais em setembro de 1923, com a realização do congresso nacional operário em Coimbra, nasce a Confederação Geral do Trabalho (CGT), que assume a propriedade de “A Batalha”.
A primeira série da vida deste jornal lançado há cem anos foi publicada até 26 de maio de 1927, um ano depois do golpe que institui a Ditadura Militar e abre caminho ao Estado Novo. Chegou a tirar 20 mil exemplares, e nesta fase o matutino tinha entre quatro e oito páginas em “grande formato”, lembra João Freire. O diário era feito com “base no voluntariado de quase toda a redação, de uma parte do quadro de compositores tipográficos e da integralidade dos seus correspondentes e difusores da província, foi uma obra homérica, pode dizer-se”.
A 27 de maio de 1927, a sede de “A Batalha” foi assaltada, vandalizada e destruída. Os tempos eram adversos a ideais operários. Apesar disso o título manteve-se vivo, passou à clandestinidade, teve várias séries, uma editora de livros e opúsculos.
O título contou também com a colaboração regular do escritor Ferreira de Castro e do cartoonista Stuart Carvalhaes. E teve um hino com música do maestro Del-Negro e letra de João Black, de que reproduzimos os primeiros versos: “Surgindo vem ao longe a nova aurora /Que os povos há de unir e libertar/Desperta, rude escravo, sem demora/Não leves toda a vida a meditar”.
in EXPRESSO 30/12/2019

domingo, 29 de dezembro de 2019


Como referenciar: "Dicionário" em Só Filosofia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2019. Consultado em 29/12/2019 às 09:17. Disponível na Internet em http://www.filosofia.com.br/dicionario.php

A IA pode aumentar a capacidade do cérebro humano infinitamente, mas a máquina precisaria sempre de socializar, isto é, agir e ser influenciada por outros seres sociais inteligentes.

Segunda - 23/12/19
Sumário
Entrevista
Max Tegmark, professor de Física
“Não há qualquer lei da Física que diga que o processamento que fazemos no nosso cérebro é o melhor possível”
Max Tegmark <span class="creditofoto">Foto Josh Reynolds/Getty Images</span>
Max Tegmark Foto Josh Reynolds/Getty Images
Nasceu em Estocolmo, vive no Massachusetts e fala português como se tivesse passado a vida toda no Brasil. Professor de Física no MIT, Max Tegmark é também responsável pelo Future of Life Institute, sendo uma das principais referências à escala mundial quando o assunto é o futuro da Humanidade e a sua relação com a tecnologia
Texto João Miguel Salvador
Não se espere de Max Tegmark, a quem chamam “Mad Max”, uma visão ortodoxa. A cada resposta que dá ao Expresso, o autor de “Life 3.0: Ser-Se Humano na Era da Inteligência Artificial” (Dom Quixote) faz jus à sua alcunha
Fala-se cada vez mais de inteligência artificial, mas a possibilidade de as máquinas se tornarem mais inteligentes que os humanos continua a ser vista como ficção. Como explica este ceticismo geral?
As pessoas são céticas quanto à superinteligência porque pensam na inteligência como algo misterioso, que apenas pode fazer parte de organismos biológicos, como o seu. A inteligência tem tudo que ver com processamento de informação. Não importa que essa informação seja processada por átomos de carbono nos neurónios do cérebro ou de outra forma.
Não há nada que o indique, que deixe em aberto essa possibilidade?
Não há qualquer lei da Física que diga que o processamento da informação que fazemos no nosso cérebro é o melhor possível. Achar isso é apenas arrogância humana.
A quanto tempo estamos de atingir a inteligência artificial geral?
É inevitável que se chegue à inteligência artificial geral dentro de alguns anos, a menos que nos destruamos primeiro, numa guerra nuclear ou por outros meios.
Mas de quantos anos estamos a falar?
Os trabalhos mais recentes, feitos com investigadores de inteligência artificial, mostram que obter formas de inteligência artificial geral será possível dentro de uma década.
A inteligência artificial é boa ou má?
E o fogo? O fogo é bom ou é mau? É uma tecnologia, como a inteligência artificial. Não têm valores, por isso tudo depende de quão boas são as normas sociais e as leis. A diferença agora é simplesmente o poder da tecnologia.
O que temos de fazer para garantir que a tecnologia é usada a nosso favor, por exemplo?
Temos de ensinar aos nossos carros autónomos que não podem atropelar pessoas. Que não podem obedecer se o condutor tentar acelerar contra pessoas. Isso pode impedir um massacre, por exemplo. Garantindo o controlo sobre a tecnologia, é possível desenvolvê-la de modo a beneficiar toda a gente. Pode mesmo ser a melhor coisa que já aconteceu à Humanidade.
Como é que a Europa pode responder ao desafio da inteligência artificial?
Devíamos construir um novo CERN para a inteligência artificial, focado na saúde global e com investimento de todos os governos europeus.
Que resultados teria uma decisão assim?
Se houver um verdadeiro centro de excelência na Europa, liderado pela Europa, este terá uma enorme influência. Vai levar os mais jovens a estudarem inteligência artificial e a criarem empresas europeias que se tornem líderes em inteligência artificial desde o início.
E enquanto raça, o que é que mantém os humanos no topo da cadeia?
Se pensar bem, só somos a espécie dominante na Terra por causa da nossa capacidade de aprender, de evoluir. Não é que sejamos mais fortes do que os tigres, ou que corramos mais rápido...
E em que ponto da evolução estamos agora?
Talvez já nos possamos chamar 2.1, com os nossos joelhos artificiais e implantes nos ouvidos, mas por enquanto ainda não podemos instalar um hardware no cérebro para ganhar uma memória 1 milhão de vezes superior.
É para aí que caminhamos?
Claro. A transição definitiva vai acontecer quando a vida se libertar dos grilhões da evolução e assumir o controlo sobre o seu próprio software e hardware.
in EXPRESSO

sábado, 28 de dezembro de 2019

Contra o revisionismo histórico: o pacto de não agressão germano-soviético e a Segunda Guerra Mundial

A verdade é que, se hoje o mundo não fala alemão e a escravidão racial aberta não campeia pelo mundo, se a barbárie colonialista sofreu duros golpes no século XX, devemos agradecer à União Soviética – seu povo, o Exército Vermelho, o Partido Comunista da URSS e seu líder máximo, Josef Stálin. É isso que a União Europeia quer ocultar, mas não vai conseguir.

Vyacheslav Molotov assina o pacto de não agressão germano-soviético em 23 de agosto de 1939. Ao fundo e ao centro, Joachim von Ribbentrop e Josef Stálin.

Por Jones Manoel.

Recentemente, no último dia 19 de setembro, a União Europeia aprovou um documento chamado “Sobre a importância da memória europeia para o futuro da Europa”. O escrito tem como objetivo indicar a história oficial da União Europeia (UE) e combater aqueles que supostamente solapam a democracia e o histórico de defesa dos direitos humanos do continente. Numa palavra, visam atacar de uma só vez a história do movimento comunista, a Rússia e a China.

Dentre os vários absurdos contidas no documento, a resolução defende que a UE nasceu da luta contra o “totalitarismo comunista” (stalinismo) e nazista e afirma categoricamente que a Segunda Guerra Mundial teria sido causada pelo Pacto de Não-Agressão Germano-Soviético, o famoso Pacto Molotov-Ribbentrop. Diz o documento:
“Salienta que a Segunda Guerra Mundial, a guerra mais devastadora da história europeia, foi o resultado imediato do infame Pacto de Não-Agressão Germano-Soviético de 23 de agosto de 1939, também conhecido como Pacto Molotov-Ribbentrop, e dos seus protocolos secretos, através dos quais dois regimes totalitários que partilhavam o objetivo da conquista do mundo dividiam a Europa em duas zonas de influência”.
Pedro Marin, em brilhante artigo, fez um mapeamento da institucionalização do anticomunismo nos diversos países da Europa e de outros continentes, inserindo a resolução da UE no seu contexto sociopolítico maior. Eu, considerando a existência do presente escrito, me coloco uma missão diferente: tentarei mostrar como é uma mentira grotesca essa noção de que foi o Pacto Molotov-Ribbentrop que causou a Segunda Guerra, procurando inserir esse acontecimento em seu devido contexto histórico, e debater os temas correlatos (como o uso do Pacto como uma suposta prova empírica da afinidade entre Hitler e Stálin, ambos dirigentes de regimes “totalitários”, como diria Hannah Arendt).

Livros ruins, comunistas malvados

Em seu livro de 2012 Stálin, os nazistas e o Ocidente, o historiador e documentarista Laurence Rees se propõe a analisar os bastidores da Segunda Guerra Mundial com foco na relação entre Stálin, Churchill e Roosevelt, discutindo como foi a articulação dos três no enfrentamento ao nazifascismo.
No decorrer do livro, Rees tenta mostrar seus talentos como analista e passa a escrever uma espécie de perfil psicológico de Stálin. O soviético é tratado como um louco, paranoico e psicopata; um sujeito que não confia absolutamente em ninguém, desconfiando até dos seus colaboradores mais íntimos e aparentemente amigos – segundo o perfil delineado por Rees, Stálin era paranoico demais para ter amigos. Porém, numa virada inexplicável, o ser humano extremamente paranoico passa a confiar cegamente que Hitler seria fiel ao Pacto de Não-Agressão Germano-Soviético assinado há pouco tempo.
Nosso historiador não vê qualquer contradição em descrever Stálin como o sujeito mais paranoico do mundo e afirmar que ele acreditava piamente em Hitler. No livro de Rees, não se encontra uma análise séria sobre o quadro geopolítico dos anos 1930 no mundo, em especial o da Europa, tampouco uma crítica do significado histórico e político do tal projeto nazista e soviético. Tudo é apresentado como se o Pacto Germano-Soviético fosse produto de uma atração entre dois ditadores, entre dois sistemas totalitários.
Hannah Arendt, assim como Rees, parece crer na existência de uma atração mística e uma plena confiança entre Hitler e Stálin. No trato que ela dá aos dos dois países em Origens do totalitarismo, a autora os assemelha, mas insinua que a União Soviética seria pior, visto que na Alemanha nazista o terror ainda conhecia um limite de raça. Diz ela:
“Por outro lado, a prática russa [soviética] é mais “avançada” do que a nazista em um particular: a arbitrariedade do terror não é determinada por diferenças raciais, e a aplicação do terror segundo a procedência socioeconômica (de classe) do indivíduo foi abandonada há tempos; de sorte que qualquer pessoa na Rússia pode subitamente tornar-se vítima do terror policial.” (p. 26)
Antes de entrar propriamente em nosso objeto de estudo, temos portanto de abordar um pouco do significado histórico do projeto soviético e do nazifascista e traçar uma análise histórica séria, ainda que não exaustiva, da geopolítica da época.
Charge do cartunista estadunidense Clifford Kennedy Berryman, datada de 9 out. 1939, satirizando o pacto de não agressão germano-soviético assinado semanas antes. Na legenda, lê-se “Quanto tempo será que durará a lua de mel?”

O nazifascismo e o socialismo soviético em seu significado histórico

A invasão da América foi o ato inaugural da modernidade. Modernidade e colonialismo estão intimamente ligados. Quando se estabelece o sistema mercantil tricontinental sob o comando dos países europeus, a América sofre o primeiro ciclo da história de destruição colonialista. Seus povos são exterminados, sua cultura inferiorizada e subjugada, seus sistemas produtivos são destruídos e substituídos por novos, criados de acordo com as necessidades do centro de comando europeu do sistema mercantil. Esse primeiro grande ciclo colonialista, mesmo tendo na América o grande palco da destruição criativa, criou também outra grande vítima: a população negra oriunda das regiões costeiras da África que serviu de força de trabalho escrava na nova estrutura produtiva da região.
A história do século XV até o século XVIII não pode ser compreendida se não forem levadas em consideração as transformações da Europa rumo ao sistema capitalista (inicialmente mais restrito às Províncias Unidas e a Inglaterra) na sua interrelação com as colônias na América. Houve grandes resistências ao colonialismo e todas as suas consequências. Desde as resistências de caráter local (como os quilombos das pessoas negras escravizadas) até as que tomaram proporções histórico-mundiais como a Revolução Francesa no período Jacobino e a Revolução Negra no Haiti. O fato, porém, é que a consolidação do capitalismo na Inglaterra e sua marcha triunfal pela Europa Ocidental não só manteve o colonialismo como o elevou a um patamar superior – a um novo ciclo colonial de proporções muito mais amplas que o primeiro.
V. I. Lênin demonstrou no seu clássico Imperialismo: etapa superior do capitalismo(1917) que, entre o final do século XIX e o início do século XX, a economia capitalista passou por profundas transformações. O processo de acumulação dos países centrais rumou a uma centralização e concentração cada vez maior do capital, e à fusão entre capital bancário e capital industrial – o nascimento do capital financeiro –, criando grandes trustes e monopólios de proporções e capacidade de controle sobre as economias nacionais impensáveis para os teóricos clássicos do capitalismo, como Adam Smith e David Ricardo.
O capitalismo monopolista proporcionava uma capacidade/necessidade de investimentos e domínio de territórios além dos marcos nacionais que impulsionou um novo ciclo colonialista em direção à África e à Ásia. Agora não se tratava de conquistar territórios para criar monopólios comerciais ou um mercado produtor de especiarias; a questão era obter zonas de controle e influência que garantissem nichos de investimento rentáveis para os grandes monopólios e fornecimento de matérias-primas para a indústria e para o mercado consumidor interno, numa divisão do trabalho em que os países centrais do capitalismo se especializavam na produção industrial e complexa e os territórios colonizados na produção de bens primários (como alimentos) e matéria-prima. Todo esse processo de condicionamento das economias africana e asiática às necessidades do capitalismo imperialista vinha acompanhado de uma violenta subjugação política pela capacidade militar maior dos Estados capitalistas europeus.
A dominação imperial em África e Ásia significou o extermínio de milhões de pessoas e a criação das técnicas mais bárbaras e avançadas de dominação. Theodor W. Adorno disse que era impossível escrever poesia depois de Auschwitz; mas, na realidade, para grande parte da população mundial, isso foi impossível durante toda modernidade!
O problema é que na corrida pela “partilha do mundo” alguns Estados ficaram para trás. Alemanha, Itália e Japão foram países de modernização capitalista retardatária (se comparamos com Inglaterra, Bélgica, França etc.) e no processo de afirmação do seu papel na divisão internacional do trabalho capitalista precisavam de suas colônias, suas zonas de exportação de capital, suprimento de matérias primas e influência política.  Só que já existia um sistema imperialista de divisão do mundo mais ou menos estável e a ascensão desses países perturbava o equilíbrio firmado.
A Primeira Guerra Mundial foi a explosão dessas contradições interimperialistas pelo domínio global. O fim da guerra não só não resolveu essas contradições como possibilitou sua elevação a nível superior. O projeto nazista da Alemanha expressa uma radicalização da tradição colonial-imperialista, que viu seu “espaço vital” dentro da própria Europa (isto é, no Leste Europeu) e pretendeu transformar o povo eslavo em seus escravos coloniais (o Japão se voltou para a China, Indochina e Coreia e a Itália para o Norte da África).
O racismo, o antissemitismo, os campos de concentração, o extermínio em massa e o terror disseminado do nazismo não eram nenhuma novidade à África e à Ásia. O nazismo traz para Europa todas as práticas coloniais realizadas por países como a França, a Inglaterra e Bélgica em suas colônias fora do velho continente. O Rei Leopoldo tem mais de Hitler do que supõe nossa vã historiografia eurocêntrica: a “solução final” do nazismo é a mais famosa do mundo, mas de forma não é de forma alguma a única existente no século XX*. O nazismo expressa portanto um projeto político do capital-monopolista alemão numa época de contrarrevolução (derrota da revolução proletária na Europa) em busca dos seus territórios coloniais e da liderança do sistema mundial capitalista.
Leandro Konder, em seu clássico estudo Introdução ao fascismo, caracteriza assim o fascismo (e o nazismo):
“O fascismo é uma tendência que surge na fase imperialista do capitalismo, que procura se fortalecer nas condições de implantação do capitalismo monopolista de Estado, exprimindo-se através de uma política favorável à crescente concentração do capital; é um movimento político de conteúdo social conservador, que se disfarça sob uma máscara “modernizadora”, guiado pela ideologia de um pragmatismo radical, servindo-se de mitos irracionalistas e conciliando-os com os procedimentos racionalistas-formais de tipo manipulatório […] Pressupõe […] a existência nele de certo nível de fusão do capital bancário com o capital industrial, isto é, a existência do capital financeiro”. (p. 53)
Já a Revolução de Outubro, o acontecimento político que inaugura o Século Soviético, surge como um gigantesco levante anticapitalista e anticolonialista de proporções mundiais. Focando apenas na Europa, é perceptível a existência de uma tradição democrático-radical encarnada no jacobinismo, que no seu auge (isto é, durante a grande Revolução Francesa) decretou o fim da escravidão e olhou com simpatia para a luta dos negros na colônia do Haiti (mas sem a radicalidade dos jacobinos negros, é claro). Da tradição democrático-jacobina até o surgimento do socialismo de orientação marxista, as lutas operárias na Europa se mesclavam, em muitos momentos, com as lutas de libertação nacional dos países como a Polônia e a Irlanda.
A Internacional Comunista, surgida em 1863, dedicou-se à luta pela libertação nacional dos países oprimidos na Europa mas olhou pouco para a dinâmica da luta de classe e as lutas de libertação nacional nos outros continentes. A II Internacional (1889-1916) apresenta uma regressão nessa questão. Seus principais teóricos estavam muito influenciados pelo mito do progresso e da exportação da civilização; de diversas formas, eles apoiaram os empreendimentos colonialistas até desembocar na adesão do chauvinismo da Primeira Guerra – o apoio do Partido Social Democrata Alemão, o maior da II Internacional, sela o fim dessa organização como um instrumento de luta.
Contudo, no seio da II Internacional surgiam tendências minoritárias que não só compreendiam o significado histórico do colonialismo em sua fase imperialista, como conseguiam unir na prática a luta anticapitalista com a luta anticolonial. O Partido Bolchevique e seu principal líder, Lênin, eram a maior expressão desse marxismo revolucionário que não se curvou ao social-chauvinismo (podemos destacar também Rosa Luxemburgo e seu grupo, socialistas italianos descontentes com os rumos do partido e que depois vão fundar o PCI, os social-democratas sérvios etc. Nas palavras do filósofo marxista Domenico Losurdo:
“Em relação a este mundo, Lênin representa uma ruptura não só no plano político, mas também epistemológico: a democracia não pode ser definida independentemente dos excluídos, ‘o despotismo’ exercido sobre ‘bárbaros’ obrigados à ‘obediência absoluta’ própria dos escravos e as infâmias da expansão e do domínio colonial lança uma luz inquietante sobre os Estados Liberais, e não só que respeita à sua política interna”.
Liberalismo, p. 18.
Os bolcheviques não apoiaram o chauvinismo das potências imperialistas em guerra e lançaram a palavra de ordem de transformar a guerra imperialista em uma guerra civil contra a burguesia de cada país. Os impactos da Grande Guerra na Rússia precipitaram os ânimos revolucionários, e o tsar é derrubado. O desenrolar histórico dos acontecimentos até a Revolução de Outubro é bem conhecido. O que vale ser destacado e que recebe pouca atenção é que a Rússia era um país subdesenvolvido e dominado pelo capital francês e inglês, e o Império do tsar mantinha uma férrea opressão sobre as minorias nacionais.
Ou seja, a Revolução de Outubro para se consolidar precisava liquidar a opressão sobre as minorias nacionais e, no plano internacional, apostou em duas frentes: a revolução proletária na Europa e a revolução democrático-nacional nas colônias. De imediato, não houve a revolução proletária na Europa nem as revoluções democrático-nacionais nas colônias, mas a Revolução de Outubro, a criação da III Internacional e a consolidação do poder soviético produziu uma alteração no quadro mundial e um abalo no sistema colonial-imperialista. Duas grandes citações são necessárias para delinear bem o que significou essa nova fase do movimento operário e os sentidos do leninismo.
“Difundiam-se, com certa regularidade, notícias da penetração da propaganda bolchevista nas colônias portuguesas, a exemplo da ‘mensagem aos trabalhadores brancos e negros’ assinada por Lênin e G. Thcitcherine e cuja cópia foi encontrada pelo chefe da circunscrição da Mossurize (então território da Manica e Sofala), em 1919, entre as mãos de um indígena de Johanesburgo. Circulam igualmente informações da passagem, em outubro de 1927, por Lourenço Marques, de um suspeito comunista, ‘o cidadão da Livónia russa de Bakin’ e no mesmo mês foi repercutido um telegrama confidencial do Ministério português da Colónias comunicando a intenção de dois ‘comunistas’ Dmitri Rodaien (ou Rodaiev?) e Senes Chapiro, acompanhados do português José Almendroa, se dirigiam à Guiné, Angola e eventualmente a Moçambique “em reunião de propaganda comunista, especialmente encarregados de ativar com elementos locais o desenvolvimento de incidentes graves intervencionais entre as nossas colônias e as colônias inglesas”
Andrade, p. 179
“Dezenas e centenas de milhões de homens dos povos asiáticos e africanos, que sofreram a opressão nacional de forma mais brutal e cruel, ficavam geralmente fora do seu horizonte visual [da II Internacional]. Não se decidiam a colocar num mesmo plano os povos ‘cultos’ e ‘incultos’, os brancos e os negros. De duas ou três resoluções vazias e melífluas, nas quais se escamoteava cuidadosamente a questão da libertação das colônias, era de tudo isso que podiam vangloriar-se as personagens da Segunda Internacional. O leninismo colocou a descoberto essa incongruência escandalosa, rompeu a muralha entre os negros e os brancos ‘cultos’ e ‘incultos’ do imperialismo e vinculou assim o problema nacional ao problema das colônias”.
Stálin, p. 76-77.
A União Soviética não representava “apenas” a primeira grande tentativa de construção do socialismo. A URSS combateu firmemente as teorias do “racismo científico”, foi o primeiro país do mundo a criminalizar o racismo (na Constituição Soviética de 1936), manteve em todos os âmbitos de sua produção cultural, educacional e artística uma ampla propaganda antirracista e anticolonialista, apoiou a luta dos povos coloniais de diversas formas, e as seções nacionais da III Internacional eram obrigadas a combater de fato o colonialismo e o chauvinismo – nenhuma conciliação era tolerada. A União Soviética representava a tentativa de ruptura com o capitalismo, mas também, e talvez até com mais sucesso, a ruptura com toda tradição colonial-racista da modernidade europeia e os elementos atualizados na fase colonial-imperialista.
“A União Soviética e os partidos aliados a ela desempenharam um papel crucial na formação política e ideológica dos quadros do movimento [de libertação africana], tendo sido crucial em Moscou no ano de 1930, a escola de Stálin, intuindo preparar quadros marxistas. As repercussões da crise econômica que sacudiam o mundo possuíam uma natureza favorável à tarefa do movimento anticolonial […] Após ter traçado os mecanismos e as vias para colaboração com os movimentos anticolonialistas, o mundo socialista engajou-se em um programa de apoio ativo à descolonização da África, sob a forma de uma assistência material e diplomática, oferecida em conformidade com o princípio do marxismo-leninismo, segundo o qual, o mundo socialista deveria ajudar àqueles que aspirassem à descolonização […] A URSS assinou acordos com cerca de quarenta países africanos. Um das mais interessantes dimensões desta cooperação dizia respeito ao ensino e à pesquisa: formação de quadros africanos na URSS, envio de professores e pesquisadores soviéticos às universidade e centros de pesquisa africanos. Aproximadamente 30.000 africanos formaram-se no sistema soviético de ensino superior.”
Thiam; Mulira; Wondji, 2010, p. 968-970.
Podemos caminhar para uma conclusão nesse ponto. Enquanto o projeto nazifascista representava uma radicalização do projeto colonial-imperialista por parte de países de desenvolvimento capitalista retardatário que buscavam alterar a partilha do mundo, reatualizando todos os métodos bárbaros do colonialismo-imperialista: terror sistêmico, extermínio em massa, campos de concentração, subjugação político-militar, estupros coletivos, destruição das economias locais etc., o projeto soviético convocava os povos das colônias, minorias nacionais oprimidas e o proletariado do mundo a quebraram suas correntes e construir um novo mundo sem exploração e opressão racial e nacional. Esse novo mundo não só era construído na prática na URSS, como o país e a III Internacional representavam um organizador ideológico e um apoiador prático (financeiro, militar, diplomático, logístico etc.) das diversas lutas de libertação do que veio a ser posteriormente chamado de Terceiro Mundo.

O Pacto Germano-Soviético em seu contexto histórico

A Revolução Russa ficou insulada. A revolução proletária europeia não aconteceu e para se consolidar o poder soviético teve que enfrentar uma violenta guerra civil organizada pelas forças internas da antiga classe dominante e por quatorze potências reacionárias. Os anos vinte do século passado marcam não só a consolidação do poder soviético, vitorioso na guerra civil, mas a criação de um cordão de contenção antissocialista e crescentemente nazifascista. Da Itália fascista até a Inglaterra liberal, era consenso o imperativo de destruir a União Soviética como objetivo estratégico.
Segundo Domenico Losurdo (2010, p.136) diferentes personalidades políticas do Estado soviético, como Zinoviev, Radek e Kamanev, estavam constantemente preocupados com ameaça perene de agressão. Essa ameaça só crescia. Em 1925, um golpe de estado na Polônia marca a subida de Pulsudki ao poder. O novo ditador rejeita a proposta de um tratado de paz apresentado por Moscou em 1926 e não esconde de ninguém que deseja destruir a União Soviética (Losurdo, 2010, p. 136).
Ainda no ano de 1926, a Grã-Bretanha (país que participou da coalizão de países que invadiram a Rússia durante a guerra civil) rompe relações comerciais e diplomáticas com a URSS, e o marechal Ferdinand Foch, convida a França a fazer o mesmo; a embaixada da URSS é atacada em Pequim e em Varsóvia o embaixador soviético é assassinado.
Ainda nos anos 1920, como é sabido, o fascismo ascende ao poder na Itália. Longe de haver qualquer retaliação das potências dominantes da Europa ou dos EUA, o fascismo é apoiado política e economicamente, e os EUA se tornam o segundo maior parceiro comercial da Itália de Mussolini. É lógico que não é surpresa para ninguém que o fascismo italiano também tinha como objetivo estratégico destruir a experiência de transição socialista soviética. Ludwig Mises, um dos grandes nomes do liberalismo à época, exprime-se assim sobre o fascismo:
“Não pode ser negado que o Fascismo e movimentos similares que miram no estabelecimento de ditaduras estão cheios das melhores intenções e que suas intervenções, no momento, salvaram a civilização europeia. O mérito que o Fascismo ganhou por isso viverá eternamente na história. Mas apesar de sua política ter trazido salvação para o momento, não é do tipo que pode trazer sucesso contínuo. Fascismo é uma mudança de emergência. Ver como algo mais que isso, seria um erro fatal.
Liberalism, 1985[1927], cap. 1, p. 47, citado por Leandro Dias em “Fascismo à brasileira”, Pragmatismo Político, 28 jan. 2014.
Essa constante intensificação do insulamento da União Soviética e a redução da influência política das seções nacionais da Internacional Comunista a partir de 1928, com forte queda do número de militantes em várias seções, condicionaram, inclusive, a mudança de rumo da política interna da URSS no abandono da NEP rumo à planificação, industrialização acelerada e coletivização forçada do campo:
“Num discurso pronunciado em 1931, Stálin lembrou que a Rússia ‘foi derrotada pelos beis turcos. Foi vencida pelos nobres poloneses e lituanos. Foi derrotada pelos capitalistas ingleses e franceses. Foi superada pelos barões japoneses. Todos a venceram – devido ao seu atraso… Estamos 50 ou 100 anos atrás dos países adiantados. Devemos superar essa distância em 10 anos. Ou fazemos isso, ou eles nos esmagam”.
Davis, p. 116.
Enquanto a União Soviética crescia em média 16% ao ano com o sistema de planificação socialista e a propriedade pública dos meios de produção, a situação internacional ficava mais difícil. No começo dos anos 1930, na Alemanha, o nazismo se consolida no poder. Assim como no caso do fascismo italiano, a postura das potências europeias, longe de ser marcada por uma hostilidade, caracterizou-se por uma leve desconfiança logo superada – afinal, o nazismo rapidamente deixou explícito que seu principal objetivo também era destruir o socialismo soviético.
Em 1935, é assinado o acordo naval entre Grã-Bretanha e III Reich. A Alemanha tinha reintroduzido o alistamento obrigatório, e sua indústria armamentista estava a todo vapor – descumprindo as regras impostas pelo Tratado de Versalhes –, mas a Grã-Bretanha não cogitava tomar qualquer medida seria contra o projeto nazista. Na Conferência de Mônaco, o embaixador estadunidense na França, William C. Bullit, afirmava que era de suma importância “isolar o despotismo asiático” e salvar a “civilização europeia” de uma guerra fratricida (Losurdo, 2010, p. 190). – em poucas palavras: jogar o nazifascismo contra a União Soviética:
“Norman Montagu, Governador do Banco de Inglaterra (que, sendo o banco central, foi também um banco privado até 1946), declarou numa conferência em Nova Iorque em 1934: Hitler e Schacht [Presidente do Reichsbank e Ministro da Economia de Hitler – NA] são na Alemanha bastiões da civilização. São os únicos amigos que temos naquele país. Defendem o nosso tipo de ordem social contra o comunismo. Se eles fracassarem, os comunistas chegarão ao poder na Alemanha e, nesse caso, tudo será possível na Europa.”
Jorge Cadima, “Nos 70 anos da Vitória de 1945”, O militante, 8 mai. 2015.
Losurdo sublinha que, na Conferência de Mônaco, a União Soviética foi o único país a desafiar o III Reich e apoiar o Governo de Praga (a Tchecoslováquia foi dominada pela Alemanha, e a conferência referendou esse domínio) e colocou 70 divisões em estado de alerta. O filósofo italiano sintetiza da seguinte maneira a questão:
“Portanto, os agressores nazifascistas tinham devorado sucessivamente a Etiópia, a Espanha, a Tchecoslováquia, a Albânia e, na Ásia, a China, graças à cumplicidade direta ou à passividade das potências ocidentais, propensas a dirigir contra o país nascido da Revolução de Outubro as ulteriores ambições e olhares expansionistas do III Reich.”
Losurdo, 2010, p. 191.
A diplomacia soviética fazia de tudo para isolar o Terceiro Reich e o fascismo italiano. Os soviéticos entraram na Liga das Nações e procuraram fortalecer a organização e usá-la como um instrumento de cercamento do nazifascismo (quando a URSS entrou na Liga das Nações, Leon Trótski afirmou que isso era uma prova da política burguesa imperante na direção soviética; evidentemente, a geopolítica, como sempre, escapou aos olhos do ex-grande líder do Exército Vermelho), mas essa manobra não foi bem sucedida graças à ação da Grã-Bretanha e França. Cumpre lembrar que na Guerra Civil Espanhola a URSS foi o único país que ajudou de verdade os combatentes antifascistas:
“Durante anos, a URSS desenvolveu uma ação diplomática intensa, visando criar um sistema de segurança coletiva com acordos de não-agressão e defesa mútua entre o maior número possível de países. Em particular, procurou acordos deste tipo com as duas velhas potências capitalistas europeias, Inglaterra e França, as principais potências coloniais de então, e com a maior das potências capitalistas (EUA). Esta política da URSS baseava-se numa análise sobre os perigos do ascenso do fascismo para a paz mundial e para os povos e sobre as possibilidades resultantes das rivalidades existentes.”
Jorge Cadima, “Nos 70 anos da Vitória de 1945”, O militante, 8 mai. 2015.
Todavia, a União Soviética tinha também que se preocupar com suas fronteiras orientais. O Japão também tinha um regime fascista com pretensões expansionistas neocoloniais. Ainda em junho de 1938, portanto antes de começar oficialmente a Segunda Guerra, tropas japonesas atacam a fronteira soviética numa batalha de grandes proporções (Medvedev, p. 323). As tropas japonesas mesmo repelidas causaram grandes perdas ao Exército Vermelho.
A União Soviética tentou até o fim evitar a Guerra e enfraquecer os nazistas. Segundo reportagem do jornal The Daily Telegraph, baseado em documentos recentemente liberados, duas semanas antes da Guerra, em 1939, numa reunião no Kremlin, os dirigentes soviéticos ofereceram aos ingleses e franceses uma aliança antifascista e colocaram à disposição de imediato um contingente de forças militares:
“A oferta soviética – feita pelo ministro da Guerra Marechal Klementi Voroshilov e o chefe do Estado Maior do Exército Vermelho Boris Shaposhnikov – teria colocado até 120 divisões de infantaria (cada uma com algo em torno de 19.000 homens), 16 divisões de cavalaria, 5.000 peças de artilharia pesada, 9.500 blindados e até 5.500 aeronaves e bombardeiros na fronteira alemã no caso de guerra no ocidente, como mostram atas do encontro que tiveram o sigilo levantado”.
Nick Holdsworth, “Stalin ‘planned to send a million troops to stop Hitler if Britain and France agreed pact’”, The Telegraph, 18 out. 2008 – tradução nossa.
As delegação da Inglaterra e da França não foram autorizadas pelos seus respectivos países a negociarem – apenas ouvir a proposta, e a resposta nunca veio. Ainda segundo o The Daily Telegraph, os dirigentes soviéticos estavam plenamente cientes do total desinteresse dos políticos britânicos e franceses, representando suas burguesias, no enfrentamento ao nazismo.
Antes de passarmos ao próximo ponto, é necessária uma recapitulação. A União Soviética enfrentava um difícil processo de modernização socioeconômico orientado pela planificação socialista durante toda década de 1920 e 1930 e se viu cercada, ameaçada e isolada na geopolítica mundial – a redução da influência da Internacional Comunista a partir de 1928, supracitada, deve ter sido assustadora aos dirigentes soviéticos. O cerco e as ameaças à União Soviética aumentaram ainda mais com a consolidação do nazifascismo na Itália, na Alemanha e no Japão. Não era segredo para ninguém que esses três países, em especial a Alemanha, tinham como principal objetivo político-estratégico destruir a pátria de Lênin.
As potências ocidentais comportavam-se de uma forma a jogar o nazifascismo contra a União Soviética. A Segunda Guerra Mundial seria uma frente única das potências liberais e nazifascista contra o socialismo soviético. Para fechar esse ponto, segue a visão de Churchill sobre o fascismo:
“Churchill era um grande admirador de Mussolini, que chegara ao poder em Itália em 1922. Saudava quer o anticomunismo de Mussolini, quer a sua forma autoritária de organizar e disciplinar os italianos. Visitou a Itália em 1927 […] e encontrou-se com Mussolini, sobre quem proferiu rasgados elogios numa conferência de imprensa […]. ‘Se fosse italiano, estou seguro que estaria de todo o coração ao vosso lado, desde o início até ao fim, na vossa luta triunfante contra os apetites e paixões animalescas do Leninismo’. Durante os dez anos seguintes, Churchill continuou a elogiar Mussolini.”
Jorge Cadima, “Nos 70 anos da Vitória de 1945”, O militante, 8 mai. 2015.

O Pacto de Não-Agressão e sua dimensão estratégica
A ideologia dominante afirma que depois do Pacto de Não-Agressão o governo soviético teria se aliado complemente e sem quaisquer restrições ao nazismo alemão. Na realidade, Stálin, em diálogo com um dirigente da Letônia, afirma que “por seis anos, os fascistas alemães e comunistas se xingaram reciprocamente. Agora […] verificou-se uma virada inesperada, mas não se pode basear nela. Devemos estar preparados a tempo” (Losurdo, 2010, p. 188). Stálin indica, de forma evidente, que sabe que o Pacto de Não-Agressão é temporário e a guerra cedo ou tarde virá.
Isaac Deutscher, historiador insuspeito de simpatia pela liderança soviética na época “stalinista”, afirma o seguinte sobre a postura comunista durante o Pacto de Não-Agressão:
“Enquanto Stalin exprimia a Hitler a sua confiança numa conclusão rápida da guerra, os seus enviados diplomáticos e seus agentes no exterior favoreciam toda forma de resistência à ‘nova ordem’. Os jornais de Moscou, que até então não tinham poupado observações irônicas ou de desprezo aos aliados, começaram a assumir um tom de simpatia na avaliação da batalha da Inglaterra e a encorajar os patriotas franceses na luta contra a dominação nazista. Anteriormente, também, o Ministro Exterior alemão se vira obrigado a protestar contra a propaganda antinazista desenvolvida pela senhora Kollontai, ministra da União Soviética na Suécia.”
Deutscher apud Losurdo, 2010, p. 194
Dimitrov, importante líder da Internacional Comunista, em diálogo com Molotov, um dos principais dirigentes do Estado soviético, afirma: “nós levamos adiante uma linha de desagregação das tropas de ocupação nos vários países e, sem alarde, queremos reforçar mais esse trabalho”. Isso não perturbaria a política soviética? E Molotov responde: “naturalmente, é preciso fazer isso. Não seríamos comunistas se não seguíssemos uma linha assim. Só que se deve fazê-lo sem barulho” (Losurdo, 2010, p. 194). O que percebemos nesse diálogo é que os principais dirigentes políticos da URSS estavam plenamente cientes que o pacto era um expediente tático para evitar o isolamento da URSS e a guerra em duas frentes, e que não significava, de forma alguma, abrir mão de combater o nazismo.
Um último exemplo sobre a questão. Nos primeiros meses do ano de 1941, Stálin recebe o embaixador da Iugoslávia em Moscou. Ambos conversam sobre a estratégia política de resistência do país à ocupação militar nazista e como a URSS pode contribuir. O embaixador iugoslavo, surpreso com a audácia de Stálin, pergunta o que ele fará caso os alemães, irritados com a colaboração, voltarem-se contra o país. A resposta de Stálin: “que venham” (Losurdo, 2010, p. 195).
Hitler evidentemente percebeu essa movimentação soviética. Já em novembro de 1939, o ditador alemão sabia que a URSS estava usando o tempo ganho pelo pacto para fortalecer-se militarmente e que a qualquer momento o acordo poderia ser quebrado (Losurdo, 2010, p. 193). O Führer, falando com um alto comissário da Sociedade das Nações em Danzig, diz:
“Tudo o que empreendo é voltado para a Rússia, se o Ocidente é demasiado estúpido e cego para entender isso, serei obrigado a chegar a um entendimento com os russos e a derrotar depois o Ocidente, de modo que após a sua derrota eu possa voltar-me contra a União Soviética com todas as forças por mim reunidas.”
Nolte apud Losurdo, 2010, p. 193
A mitologia política de Guerra Fria que afirma que existia uma atração ideológica e afetiva entre Hitler e Stálin e que ambos mantinham uma relação de confiança não resiste a uma análise histórica mínima. O mesmo vale para algumas mitologias que afirmam que com a assinatura do Pacto os comunistas soviéticos deixam de combater o nazismo.
No entanto, resta desmontar ainda uma mentira mais forte e com maior repercussão: a história de que, pela confiança em Hitler, Stálin não teria acreditado nos avisos do serviço secreto soviético sobre os planos de invasão da Alemanha e por isso foi surpreendido com o início da Operação Barbarossa. Essa confiança de Stálin em Hitler teria custado graves perdas ao Exército Vermelho e quase provocado a derrotada soviética. Está na hora de mostrarmos a falsidade dessa mitologia política.
Hitler aprovou o plano da guerra contra a URSS no dia 18 de dezembro de 1940. Em janeiro de 1941, Stálin já estava informado dos detalhes essenciais do plano, devido aos relatórios do serviço secreto soviético. Os soviéticos tinham um espião com importante cargo no Ministério da Economia alemã. Arvid Harnack, conhecido como o “Corso”, informou, através de um telegrama datado de 24 de março de 1941, que os nazistas escolheram o mês de maio para a invasão porque “presumiram que as tropas soviéticas em retirada não teriam tempo de queimar os cereais ainda não amadurecidos” (Medvedev, p. 291).
Merkulov passou a informação a Stálin, Molotov, Beria e Timoshenko. Segundo os irmãos Medvedev, não existe qualquer motivo para se deduzir que a direção soviética teria duvidado da informação – em especial considerando que outro espião de confiança, Richard Sorge, radicado em Tóquio, confirmou o relato. Stálin e seus comandantes tinham conhecimento da concentração de tropas alemãs ao longo da fronteira ocidental soviética (Medvedev, p. 291).
As dificuldades do fascismo italiano em conquistar a Grécia e o movimento popular ocorrido em 27 de março em Belgrado, levando ao poder um governo pró-soviético e o povo nas ruas gritando “três vivas a Stálin e Molotov” e “poder aos sovietes” (Medvedev, p.293), adiaram os planos nazistas. Para piorar a situação de Hitler, a URSS, em jogada diplomática brilhante, assina um Pacto de Não-Agressão com o Japão (abril de 1941) procurando garantir evitar uma guerra em duas frentes.
Enquanto os nazistas tentaram conquistar definitivamente a Iugoslávia e a Grécia como forma de garantir a operação contra a URSS, o país soviético aumentava sua capacidade militar. Os irmãos Medvedev afirmam que a indústria militar nazista não aumentava sua capacidade militar desde 1939 e já havia diminuído na altura de 1941. Enquanto isso, a produção industrial soviética crescia em ritmos constantes, e a pátria de Lênin já tinha mais tanques e aviões que a Alemanha nazista (cerca de 10 mil tanques e 8 mil aviões soviéticos) (Medvedev, p. 297).
Adolf Hitler, ao centro, estuda um mapa de guerra russo ao lado de oficiais alemães em 7 ago. 1941.
Na Operação Barbarossa, os nazistas esperavam destruir as indústrias de Moscou, Leningrado e Kharkov. A estratégia era bem simples: através de uma gigantesca Blitzkrieg (guerra relâmpago), esperava-se aniquilar em poucos meses a indústria soviética, o grosso das forças armadas e conquistar as principais capitais – tudo isso em uma grande e decisiva batalha. A direção soviética (e Stálin em especial) tinha consciência desses planos. Quando a Alemanha subjugou a Grécia e a Iugoslávia, membros da cúpula militar alemã foram convidados a visitar os Urais e a Sibéria Ocidental. Aos alemães foi apresentado o tanque T-34, um modelo soviético superior a qualquer tanque alemão. A estratégia era evidente: assustar os nazistas e tentar convencê-los a adiar a guerra e ganhar mais tempo. Enquanto isso:
“Em contraste frontal com o Estado-maior e os comandantes do Exército Vermelho, que se concentravam na situação da fronteira, o empenho de Stálin estava todo voltado para os acontecimentos do cenário internacional, recorrendo a todos os meios à sua disposição para evitar a guerra. Era evidente, na época, que Hitler e o Estado-maior alemão subestimavam gravemente o real poderio e o potencial estratégico da União Soviética”.
Medvedev, p. 300
Em 5 de março de 1941, acontece algo incomum: Stálin vai discursar para formandos da Academia Militar soviética. Com 1.500 pessoas convidadas e reunidas no salão do Kremlin, Stálin realiza um discurso invulgar: cita informações sobre o número de divisões soviéticas e o poderio militar do país e critica abertamente e de forma dura a política de Hitler. Supostamente, o discurso seria secreto. Contudo, é evidente que não há como manter em segredo um discurso para 1.500 pessoas. Os irmãos Medvedev afirmam que o discurso de Stálin disseminou informações falsas e sobrevalorizadas sobre o poder do Exército Vermelho. O jogo de gato e rato é claro: os nazistas se preparando para invadir a URSS, e a direção soviética reforçando seu poder militar enquanto espalhava desinformação para confundir o Estado-maior alemão.
Em 15 de junho de 1941, está quase tudo pronto para o início da invasão alemã. O alto-comando do Exército Vermelho insiste na necessidade de aumentar o número de divisões nas fronteiras. Stálin discorda. O Marechal Jukov achava que o pequeno número de divisões soviéticas nas fronteiras garantiria uma vitória fácil dos nazistas, perdendo de vista a estratégia alemã do grande Blitzkrieg. Anos depois, contudo, o militar reavalia sua posição em suas memórias:
“É comum criticar Stálin por não ter transferido as principais forças de nosso exército do interior do país a tempo de enfrentar e repelir o ataque inimigo. Hesito em ser dogmático sobre o que poderia ter acontecido se ele o tivesse feito – se o resultado teria sido melhor ou pior. Certamente é possível que nosso exército, com defesas antiaéreas e antitanques inadequadas e menor mobilidade que as forças do inimigo, não tivesse sido capaz de fazer frente aos vigorosos e potentes golpes de força blindada do ataque inimigo, vendo-se exatamente na mesma situação calamitosa que as forças que efetivamente estavam nos distritos de fronteira nos primeiros dias da guerra. E nesse caos, quem sabe qual poderia ter sido o resultado para Moscou, Leningrado ou o sul do país?”
Medvedev, p. 308
Os irmãos Medvedev citam que o Marechal Jukov, antes de escrever suas memórias, teve acesso aos planos estratégicos da Operação Barbarossa. A partir desses documentos o militar pôde rever seus erros. No calor dos acontecimentos do pré-guerra e mesmo sem ter acessos a esses documentos, Stálin e seus colaboradores mais íntimos, como Dimitrov, acertaram. A crença na ideia de que Stálin não teria acreditado nos relatórios da inteligência soviética e por isso o país teria sofrido muito no início da guerra é totalmente falsa. Senão vejamos.
Sabemos que a estratégia alemã era criar um grande Blitzkrieg para dizimar de um golpe só o poderio militar soviético. A partir disso os alemães se valeram de estratégias de provocação, visando atrair divisões soviéticas para as fronteiras, e de contrainformação sobre o nível de preparativos e o dia da inevitável invasão nazista. Os irmãos Medvedev narram que o Comissário de Segurança do Estado (soviético), Vsevolod Merkulov, em 17 de junho, relatou através de informes vindos de agentes secretos que as operações militares contra a pátria soviética estavam para começar. Stálin assim responde o informe de Merkulov: “Camarada Merkulov, pode dizer à sua ‘fonte’ no quartel-general da aeronáutica alemã que vá foder a mãe. Não trata de uma ‘fonte’, mas de alguém espalhando desinformação” (Medvedev, p. 311).
É a partir desse episódio que muitos historiadores cultivam a mentira sobre a confiança total de Stálin em Hitler e do desprezo pelas informações do serviço secreto soviético. Contudo, os irmãos Medvedev avaliam o episódio da seguinte forma:
“Há motivos para crer que nesse caso Stálin estava com a razão […]. Ao longo de junho de 1941, Stálin recebia dezenas de relatórios de agentes da inteligência militar com informações precisas e detalhadas, podendo facilmente distinguir entre as mensagens autênticas e as tentativas de desinformação. Nesse período, os serviços soviéticos de inteligência contavam com muitos agentes dignos de confiança na Alemanha e em outros países, sendo seus relatórios levados muito a sério por Stálin.
Medvedev, p. 312
Quando a invasão da barbárie nazista começou, a totalidade da direção política e militar soviética estava bem informada de tudo, as tropas na fronteira encontravam-se em mobilização permanente e mesmo com o grande poderio nazista foram possíveis pequenas vitórias, como salvar a vida dos pilotos mais experientes nas regiões fronteiriças. Porém, por que inicialmente os nazistas tiveram um sucesso tão esmagador? A questão, no fundo, é mais evidente do que parece:
“O ataque lançado pela Wehrmacht a 22 de Junho de 1941 foi a maior operação militar de que há registo histórico e ‘nunca, nem antes, nem depois, uma batalha foi travada com tanta ferocidade por tantos homens, numa frente de batalha tão extensa’. É impossível escamotear o facto histórico de que a grande maioria das forças armadas nazifascistas estava concentrada na Frente Leste, e que a sua derrota determinou a derrota final do nazismo em 1945. ‘Ao longo do ano 1942 o Exército Soviético combatia contra 98% do Exército Alemão operacional – 178 divisões concentradas na frente leste – enquanto que os britânicos combatiam contra quatro no Norte de África’.”
Jorge Cadima, “Nos 70 anos da Vitória de 1945”, O militante, 8 mai. 2015.
A invasão nazista à União Soviética foi o maior ataque militar da história da humanidade! Seria no mínimo curioso alguém pressupor que era possível resistir a esse ataque sem grandes perdas e até vitórias significativas dos nazistas. Além disso, os irmãos Medvedev relatam um erro estratégico de Stálin e dos comandantes militares: pressupor de que o centro inicial do ataque alemão seria a Ucrânia e o norte do Cáucaso (por conta das riquezas naturais da região) e não Moscou e Leningrado (Medvedev, p. 321). Esse erro estratégico, porém, não colocou a guerra a perder, como podemos constatar retrospectivamente.

A suposta depressão de Stálin ao início da guerra

Uma das maiores lendas políticas da Segunda Guerra Mundial é a história de que Stálin teria entrado em depressão ao início da guerra porque Hitler teria quebrado sua confiança e ele falhado como principal liderança do Estado soviético (considerando as primeiras vitórias nazistas). Essa lenda foi criada por Nikita Khrushchov na disputa pelo poder dentro do PCUS no pós-morte de Stálin. Khrushchov disputava com Beria a condução do poder e, como este se apresentava como sucessor direto e legítimo de Stálin, aquele viu como parte indispensável da sua luta pelo poder a destruição da imagem do georgiano. O XX Congresso do PCUS, quando Khrushchov denuncia os “crimes de Stálin”, inaugura a era do “culto à personalidade em negativo”: antes todos os méritos eram atribuídos à Stálin, agora todos os defeitos e problemas foram sua culpa.
A mentira de Khrushchov é repetida até hoje como uma verdade incontestável. Já vimos que a história da confiança de Stálin em Hitler era falsa assim como a lenda da ignorância soviética dos planos nazistas e da surpresa com a invasão alemã; logo, por tabela, a história da depressão de Stálin cai por terra a partir de uma dedução lógica, mas nem sempre a história segue a lógica formal e faz-se necessário derrubar esse argumento em seu âmago.
Os irmãos Medvedev citam que Khrushchov ao início da guerra estava em Kiev e simplesmente não teria como ter informações sobre o que se passava no alto comando soviético (p. 317). Além disso, as memórias do Marechal Jukov contêm vários documentos sobre as atividades, ordens e diretrizes de Stálin nos primeiros dias da guerra, provando que a história é totalmente falsa (p. 318).
Os Medvedev citam dados que demonstram que no dia em que, segundo a lenda de Khrushchov, Stálin estaria recluso e deprimido, ele emitiu 20 decretos e ordens e trabalhou praticamente as 24 horas do dia, participando de reuniões periódicas com todas as lideranças políticas e militares da URSS (2006, p. 319). A dedicação do supostamente depressivo Stálin era tão grande (aliada à característica centralização decisória soviética) que ele, segundo episódio narrado por Losurdo (2010, p. 34), liga para Akaki Ngekadeze, chefe do partido na Abcásia, reclamando da baixa produção de cigarros e afirmando que sem o produto a frente não funciona… “Os soldados precisavam fumar” – é difícil compatibilizar a lenda de um homem deprimido e atônico com a realidade de alguém que trabalhava quase 24 horas por dia e revela estar preocupado os mínimos detalhes do fronte.
Ainda segundo Khrushchov, Stálin não entendia absolutamente nada de estratégia militar e traçava seus planos militares em um globo escolar. Essa imagem de Stálin usada por Khrushchov ganhou tanta notoriedade que até no filme sobre Stálin lançado pela BBC ela aparece como verdade inquestionável – o filme se coloca como “baseado em fatos reais”. Bem, já podemos demonstrar que, no conjunto, Stálin tinha uma visão política da guerra melhor que seus generais e acertou, por assim dizer, no atacado, embora tenha errado algumas vezes no varejo. Numa análise de síntese, os irmãos Medvedev – declarados anticomunistas, nunca é demais lembrar – afirmam que:
“Examinando retrospectivamente todos os atos de Stálin e as decisões militares nos primeiros dias da guerra, é perfeitamente possível chegar à conclusão de que, dada a intensidade e a força do golpe infligindo à URSS pelo exército alemão e seus aliados, cujas forças em conjunto chegavam a quase 200 divisões, a decisão tática de manter as principais forças do exército soviético a uma distância de 200 a 300 quilômetros da fronteira foi absolutamente correta. Foi isto que possibilitou promover contra-ataques locais e, a 26 de junho, por ordem de Stálin, criar uma nova frente de reserva utilizando o 5° Exército. Logo depois seria criada uma terceira linha de defesa. O exército alemão continuou avançando, mas ao preço de pesadas perdas.”
Medvedev, p. 321

Conclusão

Como sabemos, foi a Alemanha que procurou a União Soviética para firmar o Pacto de Não-Agressão. A assinatura do Pacto teve grandes consequências políticas negativas, abalando profundamente as fileiras do movimento comunista. Mas ele foi justificado? Como vimos, existia um explícito movimento das potências liberal-imperialistas e nazifascistas para formar uma frente única contra o Estado soviético. A França e a Inglaterra, as principais potenciais liberal-imperialistas, deram todos os sinais imagináveis de que não estavam dispostos a confrontar o nazifascismo.
A prova maior disso é que, ao início da guerra, a Inglaterra e a França, de forma não surpreendente, esboçaram uma resistência ridícula. A França chegou ao fundo do poço da vergonha colaboracionista com os nazistas: a classe dominante do país decidiu não lutar, entregou-se aos nazistas, não forjou uma resistência digna – o crescimento do Partido Comunista da França no imediato pós-1935, fruto da nova estratégia da Terceira Internacional depois da “virada Dimitrov”, parecia mais assustador a classe dominante que a barbárie nazista.
Mesmo com o início da Segunda Guerra a classe dominante dos países liberal-imperialistas nunca deixou de jogar o nazismo contra a União Soviética. O livro de Laurence Ress, comentando no início do texto, traz depoimentos de ex-militares soviéticos que serviram durante a guerra e que têm certeza que a Inglaterra e os EUA não abriram a segunda frente, dividindo o poderio militar nazista quase todo concentrado na URSS pois esperavam que a Alemanha destruísse ao máximo a pátria de Lênin. Quando a URSS conseguiu conter e repelir os nazistas e avançou rumo à Europa Ocidental é que as potências imperialistas criaram uma segunda frente com e único e exclusivo objetivo: garantir a dominação burguesa nos países da Europa Ocidental. O Desembarque na Normandia, o famoso “Dia D”, não marca a vitória sobre os nazistas – ao contrário, é um símbolo do êxito da contrarrevolução frente ao Exército Vermelho em marcha triunfal.
O Pacto de Não-Agressão forçou a Inglaterra e a França a entrarem na guerra contra a Alemanha e proporcionou tempo hábil para que a União Soviética aumentasse o seu poderio militar; preparasse melhor as Forças Armadas formando mais oficiais e criasse uma estratégia de transferência de fábricas e quartéis para regiões afastadas do fronte, além de evitar que a totalidade da máquina de guerra alemã se voltasse exclusivamente contra a URSS (ainda que, como sabemos, a URSS tenha suportado o maior fardo da guerra).
Os irmãos Medvedev consideram que o Pacto de Não-Agressão foi uma medida tática acertada e indispensável para a vitória soviética na Grande Guerra (2006, p. 310). Os argumentos e os fatos apresentados nos levam a crer que essa análise está correta. Mesmo sendo difícil fazer futurologia, isto é, imaginar o que teria acontecido sem o Pacto, fica claro que nos seus objetivos imediatos a direção soviética acertou o máximo que pode dentro das possibilidades concretas.
Aliado a isso, é licito fazer um juízo moral do Pacto em alguns aspectos, como a divisão da Polônia. Mas algumas coisas não podem ser esquecidas: na parcela da Polônia controlada pela URSS, como lembra Annie Lacroix-Riz, “os soviéticos salvaram mais de 1 milhão de judeus das zonas reanexadas e organizaram uma evacuação prioritária em junho de 1941”. Sim, os soviéticos, graças ao controle sobre territórios da Polônia antes da Guerra, salvaram mais de 1 milhões de judeus. O juízo moral sobre esse aspecto do Pacto considerando esse número é o mesmo?
A verdade é que, se hoje o mundo não fala alemão, a escravidão racial aberta não campeia pelo mundo e a barbárie colonialista sofreu duros golpes no século XX, devemos agradecer à União Soviética: seu povo, o Exército Vermelho, o Partido Comunista da União Soviética e seu líder máximo, Josef Stálin. Essa é a verdade que a União Europeia quer ocultar, mas não vai conseguir. A verdade vencerá.

Notas

* Para um exemplo da “Solução final” no Canadá, ver Elaine Tavares, “A tragédia indígena no Canadá”, IELA-UFSC, 12 ago. 2015.
** Annie Lacroix-Riz, “O papel ‘esquecido’ da União Soviética”, Le Monde Diplomatique – Brasil, mai. 2005.



Referências bibliográficas

Annie Lacroix-Riz, “O papel ‘esquecido’ da União Soviética”, Le Monde Diplomatique – Brasil, mai. 2005.
Domenico Losurdo, Liberalismo: entre a civilização e a barbárie. Anita Garibaldi, 2006.
Domenico Losurdo, Stálin: uma história crítica de uma lenda negra. Editora Revan, 2010.
Hannah Arendt, Origens do totalitarismo: antissemitismo, imperialismo, totalitarismo. São Paulo, Companhia das letras, 2009.
Horace B. Davis, Para uma teoria marxista do nacionalismo. Rio de Janeiro, Zahar, 1978.
I. Thiam, J. Mulira & C. Wondji, “A África e os países socialistas”. em: Albert Adu Boahen (ed.), História Geral da África, Volume VII (África de 1930 até os dias atuais). Editora Unesco.
Josef Stálin, Fundamentos do Leninismo. Global, 1980.
Jorge Cadima, “Nos 70 anos da Vitória de 1945”, O militante (jornal do PCP), 8 mai. 2015.
Leandro Dias, “Fascismo à brasileira”, Pragmatismo Político, 28 jan. 2014.
Leandro Konder, Introdução ao fascismo. São Paulo, Expressão Popular, 2010.
Mário Pinto Andrade, Origens do nacionalismo africano. Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1990.
Nick Holdsworth, “Stalin ‘planned to send a million troops to stop Hitler if Britain and France agreed pact’”, The Telegraph, 18 out. 2008.
Pedro Marin, “Liberais e anticomunistas: ninguém solta a mão de ninguém”, Revista Opera, 3. out. 2019.
Zhores A. Medvedev & Roy A. Medvedev, Um Stálin desconhecido: novas revelações dos arquivos soviéticos. Rio de Janeiro, Record, 2006


***
Jones Manoel é pernambucano, filho da Dona Elza e comunista de carteirinha. Começou sua militância na favela onde nasceu e cresceu, a comunidade da Borborema, construindo um cursinho popular, o Novo Caminho, junto com seu amigo Julio Santos (ele, Julio e outro amigo, Felipe Bezerra, foram os primeiros jovens da história de Borborema a entrar em uma universidade pública). Depois de dois anos com o cursinho popular, passou a militar no movimento estudantil em paralelo ao seu curso de história na UFPE. Pouco tempo depois, ingressou nas fileiras da UJC (a juventude do PCB). Ativo no movimento estudantil até 2016, hoje atua no movimento sindical e na área da educação popular. Mestre em serviço social, atualmente é professor de história, mantém um canal no YouTube e participa do podcast Revolushow. Segue militante do PCB. Escreve para o Blog da Boitempo mensalmente, às quartas.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Um mundo afogado em capital: a queda global da taxa de juros e a nova rodada da crise estrutural do capitalismo

O desastre financeiro mundial está à espreita, resta saber se será antes ou depois do Banco Central dos EUA operar com juros reais negativos.

Por Maurilio Lima Botelho.

A taxa básica de juros no Brasil (Selic) foi ajustada para 5% ao no fim de outubro, atingindo o marco histórico de menor rendimento. A projeção de inflação para este ano é de 3,26%, enquanto a inflação anual acumulada em outubro foi de 2,54%.1 Deduzindo-se a inflação da taxa básica, o juro real seria de menos de 3% ano – nem todos os títulos de dívida emitidos pelo governo seguem esse percentual básico, mas mesmo assim estamos diante de um mínimo inédito em nossas terras. Nos mercados e nas indústrias, há gente elogiando a queda gradual e suave da taxa, contrastando a situação à de um passado recente em que tentativas de redução teriam sido “forçadas” pelo governo. Entretanto, quem elogia a queda dos juros se comporta como o médico que comemora a temperatura em baixa do paciente sem perceber que ele faleceu – há dois meses, por exemplo, tivemos deflação, indicação de uma situação econômica grave.

Para a lógica econômica keynesiana, esse cenário deveria estimular o investimento produtivo e afugentar o rentismo, mas a economia não parece indicar um movimento contrário ao dos juros e de retomada da atividade: a produção industrial brasileira, em setembro, acumulava queda de 1,7%. Mais investimento, para aproveitar o cenário de juros baixos, só agravaria o quadro de estagnação: mais de 25% do parque produtivo brasileiro está parado – a ociosidade tornou-se crônica. Em alguns setores, como de bens de capital (máquinas e equipamentos), há quase 40% de ociosidade. Na indústria automobilística, 3 em 10 máquinas estão paradas2. Com a situação econômica delicada na Argentina, isso deve piorar, pois trata-se do principal mercado consumidor de automóveis brasileiros. Talvez pareça fazer algum sentido o foco nos investimentos em infraestrutura de transporte e logística, tradicionalmente considerados “gargalos” na economia brasileira, mas aqui também a estagnação é elevada: os portos acumulam em média 50% de ociosidade. Ou seja, qualquer investimento novo promoveria ainda mais a capacidade ociosa e, no médio e longo prazo, reduziria empregos com a elevação da produtividade dos fatores de produção. Monetaristas e keynesianos estão imobilizados por uma realidade econômica falhada – e o problema não é apenas na “economia nacional”.
Temos um contexto inédito, no cenário global, de taxas de juros reais negativas. Já são 17 trilhões de dólares investidos em títulos de governos com rendimentos negativos ao redor do mundo – um quarto de todo mercado de dívida pública mundial. A Áustria foi um dos países pioneiros nesse sentido ao lançar 3,5 bilhões de euros, em 2017, em títulos com rendimentos a 1,7%. O detalhe é que os títulos teriam vencimento em 2117!3 Agora, uma boa parte da Europa opera com emissão de dívida soberana com rendimentos reais negativos ou em torno de 0%. O Japão segue o mesmo caminho. Recentemente, o ex-presidente do Fed, Alan Greenspan, advertiu que não seria surpresa se logo os Estados Unidos também começassem a operar com juros reais negativos em sua emissão de dívida.4
Enquanto isso não ocorre, os investidores (e os fundos soberanos) correm para o conforto dos títulos norte-americanos, mesmo que de baixíssimo rendimento: o mundo continua a financiar o endividamento sistemático dos EUA, sustenta seu déficit recorde – que deve chegar a quase 1 trilhão de dólares esse ano – e reforça o poder do dólar como última moeda hegemônica. O “ciclo virtuoso” de crescimento sob Trump deve-se mais a isso do que a qualquer efeito real de sua economia, que continua sendo uma voraz consumidora mundial de mercadorias e, mesmo com uma guerra comercial com a China, teve um déficit comercial de quase meio trilhão no primeiro semestre de 2019.
E não é apenas no setor estatal que há a tendência negativa: a consultoria Bianco Research calculou que, em apenas oito meses deste ano, ocorreu uma ampliação de títulos corporativos com rendimentos negativos de 20 bilhões para 1 trilhão de dólares em todo mundo. Um salto gigantesco e brusco.5 Nesse momento, tudo aquilo que já foi produzido em teoria econômica perdeu o sentido: ninguém sabe mais como explicar o paradoxo de uma situação mundial em que investidores procuram, cada vez mais, converter seu capital em títulos que serão revertidos em um preço final menor do que o adiantado. O único argumento, óbvio, é o de temor diante do futuro: “incerteza econômica global”, diz uma das principais porta-vozes do mercado financeiro.6
Mas essa é uma formulação banal, mais uma descrição da situação de enfermidade capitalista do que uma explicação para o quadro clínico do moribundo mercado mundial. Sem dúvida, o horizonte se tornou tão depreciado em termos de investimento que se tornou melhor apostar em títulos seguros de rendimento zero ou com pequena perda do que arriscar tudo em apostas sem futuro na indústria ou mercados de risco – a fuga de capitais verificada na bolsa de valores de São Paulo este ano mesmo diante do “choque de capitalismo” prometido por Guedes tem origem nisso.7 Mas se esse mecanismo de fuga de investimentos produtivos para a “superestrutura financeira” já é uma lógica bem conhecida, por que agora os próprios rendimentos financeiros estão se depreciando?
A explicação está longe dos livros de economia e deveria ser buscada naquele pensador maldito do século XIX que escreveu exatamente uma crítica da economia política, pressupondo que as categorias econômicas como valor, mercadoria, dinheiro e lucro são dotadas de uma “objetividade fantasmagórica” que escapa ao controle dos agentes sociais. Talvez isso fique didaticamente explícito hoje, pois de modo crescente muitos dos operadores do mercado financeiro já não conseguem mais “especular” de modo rentável, sendo portanto mais “suportes” das forças do mercado do que propriamente “mestres do universo”.
Uma das formulações culminantes da crítica da economia política de Marx foi o da “lei tendencial de queda da taxa de lucro”: a longo prazo, a tendência do investimento capitalista é incrementar de tal maneira os meios de produção que, em termos relativos, este se torna muito maior do que o montante de capital mobilizado em força de trabalho. Entretanto, o trabalho é a única fonte de valor e, quanto maior for o volume de capital convertido em máquinas e equipamentos, menor será o grau de acréscimo de nova riqueza no sistema. Como a economia capitalista funciona sob a compulsão ao lucro e o lucro nada mais é do que uma função dessa relação entre o volume total de investimentos realizados e a quantidade de valor produzida pelo trabalho, então a tendência é uma queda secular dos lucros capitalistas. Efeitos atenuantes poderiam ser experimentados ao longo do tempo, como o barateamento das próprias máquinas e equipamentos ou o desvio de capital para setores menos intensivos em tecnologia. Mas como o mercado é um todo de vasos comunicantes os preços em queda das máquinas e equipamentos levariam à sua própria generalização, o que teria efeitos sobre o custo do trabalho e a coerção da concorrência traria os lucros novamente para baixo. No fim, apesar de todas as “contratendências”, com a “tendência ao desenvolvimento absoluto das forças produtivas”,8 acabaria imperando a queda de lucros generalizada.
Com a revolução da informática e os avanços tecnológicos da Terceira Revolução Industrial, esse cenário parecia consolidado. Não se tratava apenas de uma desproporção meramente quantitativa de investimentos em máquinas e equipamentos diante da força de trabalho humana: a própria capacidade produtiva inédita da flexibilidade microeletrônica estava dispensando trabalhadores em levas crescentes, daí o desemprego em massa em todo o mundo. Mas os ganhos em queda nos investimentos produtivos forçaram uma corrida aos mercados financeiros e foi possível compensar, temporariamente, os lucros da produção com os juros dos investimentos. Juros em alta estavam em discrepância com os lucros em declínio.
Contudo, um dos pilares da crítica de Marx ao capitalismo é exatamente a decomposição de todas categorias econômicas a partir da figura do valor – assim como o lucro depende da produção excedente de valor para sua existência, o juro não tem vida autônoma e é mera dedução dos lucros da produção. É verdade que a formação de capital fictício poderia, principalmente numa economia sem lastro monetário (o fim do padrão dólar-ouro a partir de 1970), ampliar os ganhos especulativos e fazer parecer que o milagre da multiplicação de dinheiro, independente da produção de mercadorias, havia sido obtido. Entretanto, também a pretensa autonomia dos mercados financeiros com sua “acumulação monetária” (Marx) tem de se valer com a coação da concorrência: capital excedente em demasia buscando as “mercadorias financeiras” deve levar, a partir de determinado ponto, a uma queda geral dos juros. Mesmo que dissociadas pela ruptura básica entre dinheiro e mercadoria com o fim de Bretton Woods – resultado já da própria queda da taxa de lucro –,9 a produção e as finanças são carne-da-mesma-carne, funções sociais institucionalizadas da forma econômica geral do capital, portanto, devem sofrer sempre com suas leis internas e seus limites.
É o que vemos em todo o mundo nesse momento e que deve se encaminhar também para o “centro hegemônico”. A tendência secular da queda da taxa de lucros chegou a um patamar tão coercitivo que os próprios juros foram forçados a um mínimo pela massa histórica de capital monetária disponível globalmente. Não se pode afirmar mais que a “causa de rendimentos negativos em todo o mundo é excesso de capital sem oportunidades de investimento produtivo”10 – isso foi a base da “hipertrofia financeira” que começou há pelo menos 35 anos. O que se trata agora é um excedente de capital tão monstruoso (alimentado por injeções sistemáticas dos bancos centrais com a “flexibilização monetária”) que temos cada vez menos rentabilidade até mesmo nos investimentos especulativos. A “superacumulação absoluta de capital” (Marx) atingiu tal nível que a massa de capital fictício circulando é esmagadoramente gigantesca diante dos mecanismos de rentabilidade oferecidos. A queda da taxa de lucros, num mundo afogado em capital, aparece cada vez mais também sob a forma de uma queda geral da taxa de juros. O desarranjo histórico entre uma taxa e outra parece agora liquidado e as duas seguem a mesma tendência de queda. O desastre financeiro mundial está à espreita, resta saber se será antes ou depois do Banco Central dos EUA operar com juros reais negativos.
NOTAS
1 Daniela Amorim, “Inflação de outubro é a menor para o mês desde 1998”, Estadão, 7 nov. 2019.
2Maioria dos setores da indústria opera com ociosidade acima da média”, RBA, 22 abr. 2019.
3 Joy Wiltermuth, “That near–$17 trillion pile of negative-yielding global debt? It’s a cash cow for some bond investors”, MarketWatch, 22 ago. 2019.
4Greenspan não descarta juro negativo nos EUA”, Valor, 15 ago. 2019.
5 Joy Wiltermouth, “That near–$17 trillion pile of negative-yielding global debt? It’s a cash cow for some bond investors”, MarketWatch, 22 ago. 2019.
6 Maggie Fitzgerald, “Amount of global debt with negative yields balloons to $15 trillion”, CNBC, 7 ago. 2019.
7 Juliana Machado e Ana Carolina Neira, “Saída mensal de capital externo na bolsa é recorde”, Valor, 04 set. 2019.
8 Karl Marx. O capital: crítica da economia política, Livro III: o processo global da produção capitalista. São Paulo, Boitempo, 1986, p. 289.
9 Maurilio Lima Botelho. “Rumo ao desconhecido: endividamento mundial, crise monetária e colapso capitalista”, Blog da Boitempo, 23 jul. 2019.
10 FS Staff, “Jim Bianco Says Negative Rates Could Lead to Disaster”, Financial Sense, 19 ago. 2019.
***
Maurilio Lima Botelho é Professor de geografia urbana da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), e autor do artigo “Crise urbana no Rio de Janeiro: favelização e empreendedorismo dos pobres” que integra o livro Até o último homem: visões cariocas da administração armada da vida social, organizado por Pedro Rocha de Oliveira e Felipe Brito (Boitempo, 2013), e do artigo “Guerra aos ‘vagabundos’: sobre os fundamentos sociais da militarização em curso”, publicado na revista Margem Esquerda #30. Colabora com o Blog da Boitempo esporádicamente. Dele, leia também, “Rumo ao desconhecido: endividamento mundial, crise monetária e colapso capitalista“, “O suicídio da classe média” e “A aprovação do fim do mundo” (este último no dossiê “Não à PEC 241” do Blog).

Viagem à Polónia

Viagem à Polónia
Auschwitz: nele pereceram 4 milhôes de judeus. Depois dos nazis os genocídios continuaram por outras formas.

Viagem à Polónia

Viagem à Polónia
Auschwitz, Campo de extermínio. Memória do Mal Absoluto.