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quarta-feira, 16 de junho de 2021

OPINIÃO

 A importância dos valores

Há no marxismo tradicionalmente uma certa tendência para enfatizar a determinação pela classe social (origem, pertença, consciência de classe "determinada" pelo interesse de classe) para as motivações individuais e colectivas dirigidas às lutas anticapitalistas, subestimando ou secundarizando os valores morais. Ora, os valores éticos ou morais que regem a conduta (interpretações, atitudes, acções) individual e colectiva são, em variadíssimos casos, igualmente determinantes; por vezes constituem os motivos primariamente determinantes. Particularmente nas camadas sociais intermédias e inclusivamente em indivíduos das classes dominantes. A indignação perante as injustiças sociais de que o indivíduo responsabiliza o Sistema, a sociedade capitalista (os monopólios e oligopólios, o neoliberalismo), a indignação perante invasões militares desencadeadas pelas grandes potências capitalistas, determinados boicotes económicos (contra o Iraque, que matou, segundo se apurou, quase um milhão de crianças), golpes de estados sangrentos que os EUA coordenaram conforme depois se demonstrou (como na Indonésia), e outros exemplos, empurram, digamos assim, não só indivíduos singulares para a luta antisistema, mas largos segmentos sociais (como se verificou em algumas revoluções do século passado). É a indignação moral que se torna indignação política e ambas vertentes compõem as coisas.

  Os valores morais têm desempenhado um poderoso papel nas mobilizações de massas do século passado, mas isso já se verificava no século dezanove.

  Indivíduos-família, privilegiados, das classes dominantes, envolvem-se nas lutas e filiam-se em partidos revolucionários; nalguns casos tornam-se os seus líderes, ou foram eles que iniciaram a organização da luta. Advogados, professores, jornalistas, grandes empresários inclusivamente se pensarmos em Engels...

  As lutas estudantis contribuíram inegavelmente para o golpe militar de 25 de Abril que derrubou a ditadura fascista e, a seguir, desempenharam um papel não menos importante (nem sempre positivo, digo eu) no processo revolucionário; e quem eram os estudantes universitários ao tempo da ditadura, senão, na sua maioria, filhos da média e grande burguesia? Fizeram-no por interesses de classe, da sua classe originária e de pertença? Por consciência de classe??

Há, pois, que sublinhar o papel dos valores morais. Da chamada consciência moral. Há que estudar mais e melhor a Ética. Encontramos no Marx dos Manuscritos de 44, juvenis, largos e fecundos exemplos desta maneira de ver as coisas.

  Criticamos determinadas "filosofias dos valores" que os desvinculam das classes sociais, dos modos de produção, das relações sociais historicamente concretas, mas não negamos a importância dos valores. Sejam eles morais ou estéticos. As lutas anticapitalistas necessitam de apelar para a indignação dos indivíduos que se regem por valores que o capitalismo espezinha e despreza. Valores que aprenderam na família, que os filósofos e os livros de doutrina liberal homenageiam, mas que na prática o capital nega. Valores que são mesmo incompatíveis com o império financeiro e o "livre" mercado. 

Não são exclusivamente os interesses de classe (que os sindicatos operários defendem) que mobilizam a conduta. As lutas de classes são mais complexas.

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