A
sobrevivência deixou de ser meio para a vida e passou a ser o fim mesmo
da vida. Isto não foi possível sem um desligamento da sobrevivência
face ao mundo e que faz do mundo apenas um meio da sobrevivência.
Este livro fala sobre o desligamento do mundo, de que somos causa e de
que seremos efeito derradeiro se não pararmos para o questionar. O tempo
desligou-se dos acontecimentos para os poder medir, impassível. A
verdade desligou-se da realidade para poder ser usada sem embaraço. E as
emoções migraram para o circo online desligado da vida concreta cada
vez mais despovoada de sentir.
Desligamo-nos do mundo como se fugíssemos da sua materialidade, e assim é
o próprio mundo que se desliga, deslassando a sua substância. Dela
extraímos formas que são meros «espectros» ou «recursos». Nós próprios
também nos desligamos, tornados espectros ou recursos, correndo para a
desmaterialização dos corpos e dos espíritos, sem nos apercebermos de
que só somos humanamente, sendo parte do estofo do mundo.
O artifício da sobrevivência | O processo de desligamento | O mundo, a
Terra e a nossa desmaterialização | As máquinas e o seu futuro connosco |
O provável primeiro desligamento: a desanimalização | Os limites do
humano significam os limites das Humanidades | A matéria do religar | A
vida temporal comum | Tempo, dominação e violência política | O colapso
das metáforas ou o fim do humano | Frankensteins do tempo e o ciclo de
Prometeu.
Com este livro fecha-se um tríptico.
Depois de um quase manifesto contra a aceleração e fragmentação de um
tempo social em que somos cada vez menos sujeitos soberanos do nosso
próprio tempo (E se Parássemos de Sobreviver? Pequeno Livro para Pensar e Agir Contra a Ditadura do Tempo,
2018) e de um diagnóstico preocupado sobre os caminhos de abstracção e
fuga do mundo em que a modernidade obstinada nos precipita (O Desligamento do Mundo e a Questão do Humano,
2020) —, este terceiro livro arrisca os termos de uma revolução nos
caminhos, e de como os interpretamos, para que seja possível o regresso à
boa companhia do mundo. Não um mundo deserto de lugares, ou em que
todos se equivalham globalmente, não um mundo de matéria inerte e
relações imateriais, mas de relações de sentido que fazem lugares
ligando espaço e tempo na materialidade concreta que encontramos, neste
ou em qualquer outro mundo.
I. A rarefacção dos lugares
II. Para uma eco-topo-logia do mundo. Copernicando, revolucionando
III. A revolução relacional com a matéria
IV. Ao encontro do acontecimento, viver o irreversível.
V. Escafandros
VI. Lost in translations
VII. Elogio da errância.
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