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A política industrial não é bem uma política, se entendida como um conjunto de medidas relacionadas que visam prosseguir objectivos específicos. Trata-se antes de uma abordagem ao desenvolvimento económico que coloca o Estado como promotor das capacidades produtivas, utilizando diferentes instrumentos para influenciar a evolução da estrutura sectorial das economias.
A política industrial é mais velha que o capitalismo. O desenvolvimento económico da Inglaterra no período pré-revolução industrial fez-se com recurso à intervenção do Estado. Desde finais do século XV, os reis e rainhas ingleses adoptaram medidas proteccionistas para o sector têxtil, dificultando as importações de bens finais e facilitando a entrada de matérias-primas, subsidiando empresários nacionais e pagando a trabalhadores estrangeiros qualificados para se fixarem no país, abrindo assim caminho à revolução industrial que se seguiria.
A história dos EUA é semelhante. Alexander Hamilton, um dos pais da independência americana, percebeu bem que a prosperidade do seu país passava pela industrialização e que para tal era indispensável a intervenção do Estado. Seguiu-se mais de um século de proteccionismo alfandegário, subsídios à produção, investimento público e incentivos aos inventores. Os EUA, tal como a Inglaterra 100 anos antes, só se converteram em promotores do comércio livre no fim da Segunda Guerra Mundial, quando eram já a maior potência económica do globo. Depois disso, países como a Alemanha ou a França continuaram a apoiar o desenvolvimento das suas indústrias, tendo o Estado como actor central do processo.
Os Estados asiáticos estudaram bem a história de Inglaterra, dos EUA, da Alemanha e de outros. O seu desenvolvimento na segunda metade do século XX é indissociável das estratégias de política industrial que adoptaram. À protecção aduaneira e aos subsídios a empresas nacionais juntaram-se o controlo público do sistema bancário, a condução de grandes projectos por empresas públicas, os incentivos condicionais ao investimento estrangeiro, o apoio à investigação e à formação avançada, entre outras medidas que se revelaram cruciais para o desenvolvimento tecnológico de países como o Japão, a Coreia do Sul, Taiwan, Singapura e, mais recentemente, a China.
A partir da década de 1980, intervenções públicas com tais dimensões tornaram-se tabu. Na ideologia que se tornou dominante, o Estado é sempre visto como parte do problema, não da solução. Para ter a certeza de que ninguém voltava a pecar, as regras nacionais e internacionais foram reescritas, tentando manter o intervencionismo bem longe. Privatizaram-se as empresas públicas, os bancos centrais deixaram de responder ao poder político, a protecção aduaneira foi quase proibida, os Estados passaram a aceitar qualquer investimento estrangeiro sem restrições, as leis orçamentais foram refeitas para limitar o investimento público e, não menos importante, muitos governos desmantelaram as agências estatais capazes de influenciar o desenvolvimento económico.
Na verdade, o abandono da política industrial foi apenas parcial. Muitos Estados deixaram de recorrer a medidas directas de protecção comercial e financeira, é certo. Mas isso não impediu países como os EUA de continuarem a apoiar o desenvolvimento das suas indústrias, recorrendo a instrumentos menos visíveis, como as compras públicas (nos sectores da defesa e da saúde, mas não só), capital de risco público ou o financiamento de institutos de tecnologias avançadas, envolvendo empresas, universidades e agências governamentais. Na retórica oficial, no entanto, o Estado continuou a ser remetido a um papel de regulador distante, sem vocação ou legitimidade para influenciar a evolução das estruturas produtivas.(...)
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