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sábado, 7 de janeiro de 2023

Pelo Socialismo

 

Parte II/II

 

K. Borbotis

 

Para o movimento operário, isso significa que, na guerra como na paz, a burguesia procura perpetuar e aumentar a sua taxa de lucro. Assim como em tempos de paz milhões de trabalhadores são selvaticamente explorados em benefício dos patrões, em tempos de guerra milhões de trabalhadores são lançados nos campos de batalha por interesses alheios e não próprios.

 

 

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Exemplos semelhantes também se encontram noutros países europeus. O Império Alemão, por exemplo, também procurou entrar no negócio de repartir os espólios das colónias. Na verdade, até tentou envolver ativamente os trabalhadores nisso.

Um exemplo típico é a luta dentro do movimento operário alemão da época em torno do papel destrutivo do sindicalismo submisso.

Em 1884, o governo reacionário da Alemanha Imperial anunciou um programa estatal para construir novos navios para reforçar as suas frotas de guerra e mercantes num momento em que se desenrolava um grande conflito pelo controle das colónias e a subjugação dos povos estrangeiros.

Social-democratas e reformistas conciliadores saudaram a política imperialista, dizendo que, enquanto novos empregos forem criados, os trabalhadores não terão problemas com a política colonial do governo. De facto, um parlamentar social-democrata disse descaradamente que vê “1 000 razões” para apoiar o colonialismo e que os trabalhadores devem concentrar-se  nos benefícios económicos e nos melhores salários que puderem obter. Chegaram até a reciclar toda a ridícula propaganda imperialista  sobre os “benefícios humanitários e culturais” do colonialismo, e que os novos navios seriam “portadores da civilização mundial” (Kulturtraeger). Essencialmente, a social-democracia, com estes argumentos, tornou-se o melhor propagandista da política imperialista colonial entre os trabalhadores.

É compreensível que forças de classe coerentes denunciassem a política geral do imperialismo alemão e lutassem contra as visões reformistas. Mostraram que os trabalhadores devem lutar contra os planos imperialistas e que a classe operária só pode esperar deles o infortúnio. E elas estavam certas, porque foram os trabalhadores alemães que se viram arrastados em massa para a Primeira Guerra Mundial que eclodiu alguns anos depois por causa desses antagonismos imperialistas agudos.

No entanto, opiniões semelhantes são encontradas hoje. Já vimos isso aqui, nos estaleiros gregos onde o capital americano investe. E vemos o reformismo e o sindicalismo conciliatório dizendo "o que nos importa se construímos navios para a  NATO e se eles participam em intervenções imperialistas, se isso nos dá trabalho e bons salários?" É um exemplo que ilustra o trabalho complexo e exigente necessário para mostrar o "panorama geral".

A este respeito, recordemos um exemplo útil da história da FSM.

A própria fundação da FSM foi um ponto de viragem para o movimento sindical mundial, uma vez que a formação da FSM se baseou nos princípios da luta de classes e do internacionalismo proletário.

No congresso constituinte da FSM (que, sob a pressão da correlação formada pela heroica luta e vitória contra o fascismo da classe operária e dos povos de todo o mundo, contou inicialmente com a participação de forças do sindicalismo conciliador) o representante do TUC [Trades Union Congress (NT)] britânico recusou-se a reconhecer o princípio da independência dos povos das colónias, afirmando que isso não poderia afetar o movimento sindical. Ao mesmo tempo, de forma ainda mais reveladora, um representante dos sindicatos holandeses manifestou-se contra a luta pela independência do povo indonésio, então sob o jugo colonial holandês.

A fundação e subsequente divisão da FSM é um dos grandes exemplos do confronto de longa data entre essas duas linhas dentro do movimento operário.

Este facto foi marcado pela desfiliação dos sindicatos amarelos da FSM, em 1949, e a fundação do ICFTU [Confederação Internacional de Sindicatos Livres (NT)], que representava as forças de colaboração de classes.

Além disso, tal facto ficou evidente ao longo da história das duas organizações, que caminharam em direções diametralmente opostas. Desde o primeiro momento, a FSM lutou sob a bandeira da luta de classes e do internacionalismo proletário, e esteve na vanguarda de todas as lutas da classe operária.

O ICFTU apoiou todos os principais objetivos políticos das potências imperialistas, tentando encurralar o movimento operário. Desde os seus primeiros passos, apoiou a Doutrina Truman e o Plano Marshall, apoiou intervenções imperialistas como a Guerra da Coreia, promoveu a colaboração de classes e a parceria social.

A eloquência com que essas forças propagaram a colaboração de classes é evidente numa declaração  significativa de George Meany, presidente da AFL-CIO dos Estados Unidos. Quando em 1955 esta elaborou um "pacto de não agressão" geral com as grandes empresas, Meany declarou: "Nunca na minha vida fiz greve, nunca na minha vida dirigi uma greve, nunca na minha vida ordenei que alguém fizesse greve ... Eu não tinha experiência nesse tipo de poder."[5]

Um pacto semelhante foi promovido pelo Partido Trabalhista na Grã-Bretanha com o conhecido documento “No Lugar do Conflito”,"In Place of Strife", promovido em 1969, que foi uma primeira tentativa estruturada de limitar a atividade do movimento sindical por meios legais.

Foi também o governo trabalhista em 1974-1979 que, com o consentimento da maioria dos dirigentes sindicais, introduziu um sistema centralizado de controle salarial - o chamado "Contrato Social" - que, em nome do controle da inflação, enfraqueceu a negociação coletiva, um dos pilares da atividade sindical. Isso preparou o terreno para os ataques mais sistemáticos aos sindicatos que se seguiram nos anos posteriores no governo Thatcher.

                                                                       FIGURA

legenda: Partido Trabalhista na Grã-Bretanha 1969: documento "In Place of Strife", uma tentativa inicial de limitar o movimento sindical por meios legais
Governo Trabalhista 1974-1979: sistema centralizado de controle salarial, o chamado "contrato social" contra a negociação coletiva. Isso abriu o caminho para a investida violenta do governo Thatcher.

A linha de conciliação de classes foi expressa ainda mais claramente após os derrubes contra-revolucionários do início dos anos 1990 pelo então secretário-geral da TUC  britânica e quadro da CES, John Monks. Na apresentação do Instituto de Parceria da TUC (Trade Union Congresses Partnership Institute) - criado para promover a aproximação entre sindicatos e empresas -  ele afirmou enfaticamente que "os sindicatos podem dar um impulso às empresas. As parcerias ajudam os executivos a levar os trabalhadores com eles. Isto é não um obstáculo para as empresas, mas o segredo do sucesso. Sempre disse que os sindicatos devem ser parte da solução, não do problema."

No período 1989-1991, com os grandes derrubes contrarrevolucionários na URSS e noutros países socialistas da Europa, muitos grandes líderes sindicais do mundo subscreveram a opinião, ativamente promovida por várias forças social-democratas, de que a FSM deveria ser dissolvida e todos deveriam reunir-se sob a égide da CSI.

Naqueles anos o confronto entre as duas linhas dentro do movimento sindical internacional foi muito intenso. Aventureirismo e oportunismo encontraram ilusões social-democratas. Muitas grandes organizações sindicais retiraram-se sumariamente da FSM, levando os seus filiados a apoiar a velha falácia reformista de que os instrumentos sindicais da burguesia internacional podem supostamente ser mudados "por dentro",  de que eles supostamente os transformariam em "trincheiras de classe" e ferramentas de combate.

Existem muitos exemplos dessa experiência. E a maioria de vós que é mais velha conhece-os  melhor do que eu. A CGT francesa, a CGIL italiana e muitas outras entraram no “curral social-democrata”. Desde então, de 1995 até hoje, 27 anos se passaram. Não é pouco tempo para tirar conclusões. O que é que a prática tem mostrado? Quem foi que mudou? Quem finalmente assimilou quem? Isto lembra-nos o que a grande revolucionária Rosa Luxemburgo disse sobre a participação dos socialistas nos governos burgueses. Não há uma "tomada" parcial do Estado pelos socialistas, como diziam os partidos social-democratas na época, mas uma tomada dos partidos socialistas pelo Estado burguês.

Limito-me a recordar que a CGT de França, com a sua gloriosa e heroica história, veio hoje apoiar e acolher na CSI e na CES direções como as da CFDT. Chegou a apoiar lideranças que atuam essencialmente como ferramentas dos imperialistas nas guerras da Jugoslávia, Iraque, Afeganistão, Líbia, Síria, Mali e agora na Ucrânia.

Cada um de vós tem exemplos do seu próprio país. Factos e ações dão testemunho da verdade. E é útil aprender com essa experiência, porque esses exemplos confirmam o papel sujo da social-democracia dentro da classe operária.

Esta é a linha firme da corrente de conciliação: traição de classe aos interesses dos trabalhadores, defesa dos interesses do capital, cisão da unidade da classe operária.

E todo mundo tem muitos exemplos desse tipo no seu próprio país, na sua própria indústria, em experiências recentes e passadas.

Um último exemplo muito ilustrativo do trabalho de sapa da social-democracia e do reformismo:

Há não muito tempo atrás, os nossos camaradas militantes na França travaram uma grande batalha grevista nas refinarias que foi observada de perto pelo movimento operário internacional - uma batalha que serviu de exemplo e deu coragem a muitos trabalhadores ao redor do mundo.

O que disseram os representantes da CES a esta greve heroica? Lutaram contra a greve, afirmando que não havia "motivos suficientes", salientando que a solução se encontraria "através do diálogo social, que se revelou o único método eficaz".[6]

       b) A posição do movimento operário perante a guerra imperialista. Internacionalismo proletário contra os interesses imperialistas ou apoio à burguesia?
 
A guerra imperialista e a sua eclosão são uma das principais manifestações das consequências destrutivas do antagonismo capitalista. As contradições entre capitalistas, quando não podem ser resolvidas por "meios pacíficos", são resolvidas por meio do conflito armado. A ideia fundamental do grande teórico da guerra, Carl von Clausewitz, de que "a guerra é a continuação da política" é de grande importância.

                                                                        FIGURA           

                                   Legenda"A guerra é a continuação da política por outros meios"

Para o movimento operário, isso significa que, na guerra como na paz, a burguesia procura perpetuar e aumentar a sua taxa de lucro. Assim como em tempos de paz milhões de trabalhadores são selvaticamente explorados em benefício dos patrões, em tempos de guerra milhões de trabalhadores são lançados nos campos de batalha por interesses alheios e não próprios.

Mais uma vez, a experiência histórica nos ajudará a ver o papel de traição da social-democracia no movimento operário - no passado e no presente.

No período da Primeira Guerra Mundial, a grande maioria dos partidos social-democratas da II Internacional adotou a posição do social-chauvinismo, apoiando essencialmente os interesses da burguesia de cada país. A guerra foi travada pela divisão das colónias e esferas de influência entre as potências imperialistas. Cada governo, é claro, disse ao seu povo que a guerra se travava por interesses "nacionais", ou seja, pelos seus próprios interesses burgueses, batizando a rentabilidade do capital como "interesses nacionais".

Apenas uma pequena vanguarda, os bolcheviques russos, os espartaquistas alemães e algumas outras forças do movimento operário internacional, ergueu bem alto a bandeira da luta de classes e do internacionalismo proletário, denunciando a guerra como imperialista de ambos os lados. Essa vanguarda manteve o proletariado internacional de pé. Devido a esta linha consequente, o proletariado russo conseguiu alcançar a sua vitória histórica, em outubro de 1917.

Na Alemanha, a traição do SPD foi um duro golpe para o movimento internacional, já que era o partido mais antigo e forte da Segunda Internacional. Em agosto de 1914, o parlamento alemão votou a favor dos créditos de guerra e deu apoio total ao imperialismo alemão em nome da chamada "defesa da pátria".

Com a eclosão da guerra, o SPD subscreveu a doutrina do chamado Burgfrieden,  a paz de classes que dominava a vida política alemã, segundo a qual os partidos políticos se absteriam de atacar o governo durante a guerra, em nome da garantia da unidade nacional. Por outras palavras, adotou uma linha de retirada voluntária da luta de classes, uma linha de traição e compromisso. O mesmo fizeram as lideranças sindicais conciliadoras. Com efeito, os quadros sindicais assumiam um novo papel no contexto da economia de guerra. Tendo abdicado voluntariamente do direito à greve e às reivindicações, passaram a assumir efetivamente um papel mais importante no bom funcionamento dos negócios de forma a contribuir para a causa da guerra.

O frenesim nacionalista da guerra tomou conta dos social-democratas alemães a um grau repugnante. A título de ilustração, uma pintura descreve como, quando a guerra foi declarada, eles foram tomados por um “desejo ardente de se lançar na poderosa corrente da maré nacional geral”, concluindo: “poderiam, pela primeira vez em quase um quarto de século, juntarem-se, com o coração cheio, de consciência limpa e sem sentimento de traição, à cativante e tempestuosa canção: 'Deutschland, Deutschland über alles'”. [7]

Assim falavam os social-democratas aos operários alemães entre os quais tinham grande influência. Informaram-nos de que deveriam lutar pelos interesses dos capitalistas alemães.

Por outro lado, os social-democratas britânicos e os sindicalistas reformistas disseram aos soldados britânicos que seria do seu interesse travar uma guerra contra os trabalhadores alemães.

Sindicalistas trabalhistas, como John Bromley, secretário-geral do Sindicato Ferroviário, estiveram ativos na propaganda da guerra e do Império Britânico. O referido sindicalista foi citado como tendo dito: "Agora, para o trabalhador chamado a derramar o seu sangue, uma Alemanha vitoriosa certamente seria um desastre. Protegemos os bancos de riscos desnecessários; protegemos os lucros das ferrovias. Ambas as instituições fazem parte do nosso grande Império cujas necessidades devem ser protegidas."

Ambos traíram a fraternidade entre os trabalhadores. Aliaram-se aos interesses dos capitalistas dos seus próprios países contra os interesses comuns dos trabalhadores de todos os países, que nada separa.

Da distante Primeira Guerra Mundial passemos a exemplos mais recentes.

Recordemos o papel da social-democracia na intervenção imperialista na Jugoslávia em 1999, uma guerra da  NATO e da UE. Naquela época, nos EUA, o presidente era Bill Clinton do Partido "Democrata", o presidente da Comissão europeia era o social-democrata italiano Romano Prodi e o chefe da NATO era o social-democrata espanhol Javier Solana. Também na UE, naquela época, os governos de muitos Estados membros eram liderados por forças social-democratas. Na Alemanha foi Schröder, na Itália foi Massimmo D'Alema, na França Lionel Jospin, na Grã-Bretanha Tony Blair, na Grécia o PASOK.

                                                                                     IMAGEM

Legenda: Bombardeamento dos EUA, NATO e UE na Jugoslávia (1999)

E vamos ao presente.

Os social-democratas estão entre as forças que lideram a escalada do conflito imperialista na Ucrânia e a corrida armamentista.

O exemplo mais emblemático é a decisão do primeiro-ministro social-democrata alemão, Olaf Scholz, de anunciar um gigantesco programa de 100 mil milhões de euros em armamento para modernizar as forças armadas alemãs.

Os governos social-democratas de Espanha e Portugal, que se apresentam supostamente como um “modelo” de “governação progressista”, protagonizaram o envio massivo de equipamento militar pesado para a Ucrânia, tentando fingir, num primeiro momento, que apenas enviavam “ajuda humanitária”.

E não esqueçamos de que foi sob o selo dos governos social-democratas da Suécia e da Finlândia que se levantou a reivindicação da sua entrada na  NATO, isto é, da expansão e fortalecimento da aliança imperialista.

 c) O movimento operário preso no mito do capitalismo "pró-povo" e dos "governos progressistas"

 
As forças social-democratas e reformistas querem manter o movimento preso na ilusão de que pode haver um capitalismo com "rosto humano". É como dizer que pode haver um capitalismo em que tanto o patrão como o assalariado, tanto o operário como o industrial, o armador, o banqueiro, ganham por igual e ao mesmo tempo.

Dizemos que há um profundo abismo entre eles, uma profunda e irreconciliável contradição. Este é o princípio da luta de classes. Somente através das suas lutas os trabalhadores podem vencer, até que finalmente se livrem dos parasitas capitalistas.

O "mito" desse capitalismo "pró-povo", ou de um governo supostamente "progressista" que pode administrar o capitalismo de forma favorável ao povo em benefício dos trabalhadores, foi negado muitas vezes. E isso porque o capitalismo opera com as suas próprias leis. Pelas leis do lucro. E se isso não for anulado, não pode haver mudança a favor do povo.

Em primeiro lugar, recordemos que hoje, na UE, em mais de 10 países, os partidos social-democratas governam ou co-governam. Vimos o que fazem esses "governos progressistas" e qual é o seu papel na guerra imperialista.

Além disso, o que estão a fazer diante da enorme onda de pobreza que atinge os rendimentos do povo? Vejamos o setor de energia, por exemplo. Juntos, tanto os partidos liberal-conservadores como os social-democratas, têm promovido ao longo dos anos uma estratégia de liberalização energética, com base na qual enriqueceram os monopólios neste setor, os mesmos monopólios que agora estão num período de de ouro para os lucros devido aos altos preços. Também promovem o chamado "investimento verde", apresentando falsamente que os capitalistas se preocupam com o meio ambiente quando, na verdade, são eles que o destroem. Eles não se preocupam com investimentos ecologicamente corretos, eles preocupam-se  com novas áreas de investimento, onde colocar o seu capital para maior rentabilidade.

Afinal, a UE formou todo um quadro antipopular com o comércio de emissões e o mercado de ações de energia. É sempre o povo que paga.

Afinal, através dos antagonismos que existem entre os países capitalistas da NATO e da UE e a Rússia capitalista, há setores dos capitalistas que têm acumulado lucros enormes. Significativamente, um poderoso armador grego, presidente da Câmara de Comércio Internacional, declarou há alguns dias: "O embargo ao transporte de petróleo russo terá um efeito positivo sobre nós: os armadores ficarão ricos. Os custos de transporte, que já dispararam, subirão ainda mais depressa!"

Mas as forças social-democratas e reformistas não se contentam em manter o movimento operário preso na linha da colaboração de classes. Tão-pouco se limitam a desenvolver  mecanismos de apoio à burocracia sindical e ao sindicalismo patronal.

Muitas vezes procuram manipular a indignação popular e as reivindicações que podem surgir sob o peso dos problemas, para garantir a estabilização do sistema capitalista por meio da alternância governamental entre as forças que representam o capital. Ou seja, procuram fazer do movimento operário uma "cauda" e um colaborador dos planos de promoção governamental da social-democracia.

Claro que esta experiência não se limita à Europa, mas é essencialmente semelhante em todos os continentes. As forças social-democratas foram eleitas com grandes esperanças entre as camadas populares dos seus países, mas a sua trajetória revelou que essas esperanças eram falsas e completamente enganosas.

Eles não só dececionaram as expectativas das massas populares que os apoiavam, como as suas políticas geralmente estavam alinhadas com as exigências dos monopólios. Isto aconteceu repetidamente nas últimas décadas nos países latino-americanos.

 

Recordemos o caso do presidente social-democrata do Equador, Rafael Correa (2007-2017) que, embora tenha sido internacionalmente festejado como um suposto progressista radical, procedeu à privatização de setores estratégicos da economia, lançou ataques contra os sindicatos de classe do país e atualmente está escondido na Bélgica, país de origem da sua esposa, desde que foi condenado no Equador a 8 anos de prisão por corrupção e esbanjamento de dinheiro público.

Outro exemplo diferente, mas com semelhanças com a deceção das expectativas, é o caso do governo chileno de Michelle Bachelet em anos anteriores. Embora ela também tenha sido eleita com falsas promessas de que mudaria o seu país a favor dos trabalhadores, tudo isso imediatamente se revelou falso. E enquanto os trabalhadores lhe  viraram as costas, os Estados Unidos e os seus aliados recompensaram-na com a alta posição que ocupa atualmente na ONU.

Poderíamos citar também outros exemplos de outros países. Poderíamos mencionar aspetos da deceção das expectativas populares na Venezuela, mas não vamos entrar nisso. Limitar-me-ei a mencionar que, a meu ver, por muitos aspetos negativos da experiência, a perceção que todos temos do socialismo e do modo de produção socialista fica realmente abalada quando ouvimos oficialmente que a Venezuela está a avançar na construção de socialismo.

O que é que demonstram os casos dos países latino-americanos? Que várias forças social-democratas vêm e vão nos governos e o capitalismo vive e reina.

Deliberadamente, como dissemos desde o início, não nos referiremos a esses exemplos em detalhe, e vamos concentrar-nos na experiência europeia. Por isso, não poderia deixar de me referir à rica experiência que tivemos no nosso país durante a década anterior de profunda crise capitalista, uma década de grandes lutas e conflitos grevistas, mas também da tentativa do sistema capitalista de assimilar as mobilizações populares através da ascensão de um novo partido social-democrata ao governo.

Como este não é o lugar para uma aula de história política grega moderna, farei um breve resumo.

A Grécia foi particularmente afetada pela crise capitalista a partir de 2009. O Estado capitalista grego teve grandes dificuldades em geri-la. Tinha um alto nível  de dívida pública e de endividamento e tentava passar a carga da crise para o povo, com grandes reformas antipopulares, grandes cortes nos salários e nas pensões, cortes em escala colossal nos gastos  e uma grande deterioração dos serviços de saúde e bem-estar. Eclodiram grandes protestos populares e mobilizações grevistas. A PAME esteve na vanguarda das lutas da classe trabalhadora pela defesa dos seus direitos, mas também travou uma grande batalha pela orientação das lutas, para que o verdadeiro inimigo, o capitalismo, se manifestasse à luz do dia e o movimento operário não ser arrastado para explosões "inofensivas".

 

O sistema político encontrou várias dificuldades em administrar a ira popular, mas também grandes contrastes e contradições sobre o modo de administrar esta crise. Num período de cerca de 4 anos, 7 partidos diferentes de todo o espectro político mudaram um após o outro. Tentaram-se ainda soluções de governo de coligação, entre as mais diversas forças, desde partidos conservadores de direita até partidos de extrema-direita com forças social-democratas. Ressaltamos isto porque pode ser comum noutros países, mas não na Grécia, onde os governos maioritários de partido único são frequentemente formados com base no sistema eleitoral. A solução dos governos de coligação foi um dos meios para tranquilizar o povo.

Como os partidos mais tradicionais que governaram todos os anos anteriores estavam bastante desgastados, o capital optou por colocar um "novo" partido no comando, que pudesse integrar o protesto popular e tirar o capital da crise. Um partido que não tinha sido experimentado antes no governo e que, portanto, poderia mais facilmente semear ilusões no povo. O SYRIZA, partido que até então tinha uma cota eleitoral de 3%, apoiado pelo capital de múltiplas formas, disparou em poucos anos para se tornar um partido do governo. Recebeu forças e quadros dos antigos partidos social-democratas, recebeu crédito dos EUA-NATO e da UE e ascendeu ao governo.

O SYRIZA e as forças social-democratas, ao longo dos anos anteriores, tentaram enganar o povo sobre a natureza da crise. Disse que os culpados eram apenas os "maus credores estrangeiros" e que poderiam resolver todos os problemas da noite para o dia. O seu objetivo era esconder o verdadeiro culpado, ilibar a burguesia grega, impedir que o povo tirasse conclusões. A PAME e o movimento de classe travaram uma grande batalha não só pelas lutas e pelas massas, mas também pelo seu conteúdo e orientação. Demonstraram que o capitalismo é culpado e que os trabalhadores não devem  acreditar em falsas promessas. Que as soluções fáceis sem conflito não existem.

 

O SYRIZA e as forças social-democratas tentaram limitar as lutas e as mobilizações dos trabalhadores exclusivamente contra um determinado governo ("abaixo o governo"), apenas para permitir que o SYRIZA entrasse no governo. Na verdade, eles queriam usá-lo como uma alavanca para a rotatividade do governo. Por outro lado, a PAME e o movimento operário lançaram a palavra de ordem "chega de ilusões,  ou com o capital ou com os trabalhadores" para mostrar o caráter enganoso das promessas.

Então, o que é que o SYRIZA, a "nova" social-democracia, fez? Alimentou falsas esperanças, pois grande parte do povo grego acreditava que poderia alcançar grandes e fáceis vitórias sem conflito. Quando chegou ao governo, assinou novos acordos ainda piores com a UE e os credores (o chamado 3º Memorando); prometeu aprovar as medidas mais difíceis que já tinham encontrado resistência; co-governou com forças de extrema-direita para obter a maioria; colaborou com os EUA. O embaixador dos EUA na Grécia chegou a dizer que o SYRIZA foi o governo com o qual melhor colaborou de todos os anos anteriores.

O que fez ele ao movimento operário? Muito brevemente, ampliou a flexibilização das relações de trabalho, manteve a abolição da negociação coletiva do salário mínimo, que seria determinado por Portaria Ministerial e baseado na "competitividade" e na "produtividade" (ou seja, baseada na proteção dos interesses do grande capital). Por lei, fez cortes nos direitos da segurança social e, por lei própria, também desferiu um golpe no direito à greve, dificultando aos sindicatos a declaração de greve. Foi o que fez o chamado governo "progressista".

Naquela época, muitas pessoas diziam à PAME e às forças de classe que tinham de apoiar o SYRIZA e que as nossas críticas eram exageradas.

Esta experiência mostrou, na prática, quem tinha razão.

4. Resumo das conclusões

A experiência histórica e moderna confirma uma conclusão duradoura: a social-democracia e o reformismo são inimigos perigosos do movimento operário de classe. Eles demonstraram - em diferentes fases e condições de mudança - uma flexibilidade e capacidade distintas de promover os interesses do capital dentro da classe trabalhadora.

Concluiremos  sublinhando três pontos:

a) Ao longo do percurso histórico do movimento operário encontraremos duas linhas. A linha de luta de classes e a linha de conciliação de classes.

Nos vários acontecimentos, nas várias fases históricas, uma e outra vez, encontraremos estas duas linhas em constante confronto.

A social-democracia tem sido a expressão histórica, precisamente, dessa corrente de colaboração de classes.

E ao longo do seu desenvolvimento no século XX, até aos nossos dias, percorrendo toda a trajetória desde o reformismo até à subordinação e serviço aos interesses capitalistas, é hoje uma corrente política burguesa que constitui um pilar para a estabilidade do sistema e para a rotatividade do governo entre as forças ao serviço do capital.

  1. b) Em todas as questões importantes, as forças da social-democracia e do reformismo semeiam confusão e colocam grandes obstáculos à luta dos trabalhadores.

    Também vimos através de exemplos concretos a conexão multifacetada entre a social-democracia e as burocracias sindicais conciliadoras.

    Vimos que, em todas as principais questões da luta de classes, elaboram maneiras de manipular o movimento operário; tal é a sua atitude sobre a questão do imperialismo e da guerra imperialista, bem como sobre a questão da trapaça dos chamados "governos progressistas".

    Dessa forma, eles querem que o movimento seja encurralado, subjugado, incapaz de ver além dos limites da exploração capitalista.

    Querem alimentar as ilusões de um capitalismo supostamente “pró-povo”, para que os trabalhadores não escolham o caminho da rutura e da subversão.

    c) Mostra-se que só a linha da luta de classes abre caminhos. A luta contra a social-democracia e o reformismo é um pré-requisito para o fortalecimento do movimento operário classista, para que possa seguir em frente.

    Claro, devemos ser pacientes com os trabalhadores que são seduzidos por tais promessas; devemos teimosamente explicar, provar o nosso ponto de vista e, ao mesmo tempo, organizar a luta. Mas, também, devemos ser inflexíveis contra os sindicalistas vendidos e os líderes do sindicalismo patronal.

    Trilhamos com orgulho o caminho da luta de classes, do conflito de classes. Sabemos que não é um caminho fácil. Requer esforço e sacrifício. Mas é a única opção que a classe trabalhadora tem.

    Caminhamos com confiança no poder da nossa classe. Extraímos esta confiança da nossa história heroica, mas também das nossas lutas atuais, que nos enchem de tenacidade, vontade e esperança.

Porque é assim que cumprimos o nosso dever na missão histórica de lutar pela  libertação da classe operária da escravidão capitalista!

 

 

 

 

 

[5] New York Times, 10 de dezembro de 1955, citado em William Z. Foster, “Outline History of the World Trade Union Movement”, International Publishers, New York, pp. 546-547

 

[6] «Greve nas refinarias: la CFDT desaprova e prefere ‘’negociar’’», Le Figaro, 8.10.22

[7] A narrativa pertence ao social-democrata Konrad Haenish.  Citado em Carl Schorske, German Social Democracy, 1905-1917, The Development of the Great Schism,Harvard University Press, 1955, p. 290
 

Fonte: https://www.theoryandpraxis.eu/sp/article/103-el-hist%C3%B3rico-papel-traicionero-de-la-socialdemocracia-contra-la-lucha-revolucionaria-de-los-trabajadores-%7C-ponencia-central-de-k-borbotis-en-el-webinario-del-ioi, publicado e acedido em 23.12.2022

 

Tradução de TAM

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