O PAPEL HISTÓRICO DE TRAIÇÃO DA SOCIALDEMOCRACIA CONTRA A LUTA REVOLUCIONÁRIA DOS TRABALHADORES
Parte II/II
K. Borbotis
Para o movimento operário, isso significa que, na guerra como na paz, a burguesia procura perpetuar e aumentar a sua taxa de lucro. Assim como em tempos de paz milhões de trabalhadores são selvaticamente explorados em benefício dos patrões, em tempos de guerra milhões de trabalhadores são lançados nos campos de batalha por interesses alheios e não próprios.
Exemplos
semelhantes também se encontram noutros países europeus. O Império
Alemão, por exemplo, também procurou entrar no negócio de repartir os
espólios das colónias. Na verdade, até tentou envolver ativamente os
trabalhadores nisso.
Um exemplo típico é a luta dentro do movimento operário alemão da época em torno do papel destrutivo do sindicalismo submisso.
Em
1884, o governo reacionário da Alemanha Imperial anunciou um programa
estatal para construir novos navios para reforçar as suas frotas de
guerra e mercantes num momento em que se desenrolava um grande conflito
pelo controle das colónias e a subjugação dos povos estrangeiros.
Social-democratas
e reformistas conciliadores saudaram a política imperialista, dizendo
que, enquanto novos empregos forem criados, os trabalhadores não terão
problemas com a política colonial do governo. De facto, um parlamentar
social-democrata disse descaradamente que vê “1 000 razões” para apoiar o
colonialismo e que os trabalhadores devem concentrar-se nos benefícios
económicos e nos melhores salários que puderem obter. Chegaram até a
reciclar toda a ridícula propaganda imperialista sobre os “benefícios
humanitários e culturais” do colonialismo, e que os novos navios seriam
“portadores da civilização mundial” (Kulturtraeger). Essencialmente, a
social-democracia, com estes argumentos, tornou-se o melhor
propagandista da política imperialista colonial entre os trabalhadores.
É
compreensível que forças de classe coerentes denunciassem a política
geral do imperialismo alemão e lutassem contra as visões reformistas.
Mostraram que os trabalhadores devem lutar contra os planos
imperialistas e que a classe operária só pode esperar deles o
infortúnio. E elas estavam certas, porque foram os trabalhadores alemães
que se viram arrastados em massa para a Primeira Guerra Mundial que
eclodiu alguns anos depois por causa desses antagonismos imperialistas
agudos.
No entanto, opiniões semelhantes são encontradas hoje. Já
vimos isso aqui, nos estaleiros gregos onde o capital americano
investe. E vemos o reformismo e o sindicalismo conciliatório dizendo "o
que nos importa se construímos navios para a NATO e se eles participam
em intervenções imperialistas, se isso nos dá trabalho e bons salários?"
É um exemplo que ilustra o trabalho complexo e exigente necessário para
mostrar o "panorama geral".
A este respeito, recordemos um exemplo útil da história da FSM.
A
própria fundação da FSM foi um ponto de viragem para o movimento
sindical mundial, uma vez que a formação da FSM se baseou nos princípios
da luta de classes e do internacionalismo proletário.
No
congresso constituinte da FSM (que, sob a pressão da correlação formada
pela heroica luta e vitória contra o fascismo da classe operária e dos
povos de todo o mundo, contou inicialmente com a participação de forças
do sindicalismo conciliador) o representante do TUC [Trades Union
Congress (NT)] britânico recusou-se a reconhecer o princípio da
independência dos povos das colónias, afirmando que isso não poderia
afetar o movimento sindical. Ao mesmo tempo, de forma ainda mais
reveladora, um representante dos sindicatos holandeses manifestou-se
contra a luta pela independência do povo indonésio, então sob o jugo
colonial holandês.
A fundação e subsequente divisão da FSM é um
dos grandes exemplos do confronto de longa data entre essas duas linhas
dentro do movimento operário.
Este facto foi marcado pela
desfiliação dos sindicatos amarelos da FSM, em 1949, e a fundação do
ICFTU [Confederação Internacional de Sindicatos Livres (NT)], que
representava as forças de colaboração de classes.
Além disso, tal
facto ficou evidente ao longo da história das duas organizações, que
caminharam em direções diametralmente opostas. Desde o primeiro momento,
a FSM lutou sob a bandeira da luta de classes e do internacionalismo
proletário, e esteve na vanguarda de todas as lutas da classe operária.
O
ICFTU apoiou todos os principais objetivos políticos das potências
imperialistas, tentando encurralar o movimento operário. Desde os seus
primeiros passos, apoiou a Doutrina Truman e o Plano Marshall, apoiou
intervenções imperialistas como a Guerra da Coreia, promoveu a
colaboração de classes e a parceria social.
A eloquência com que
essas forças propagaram a colaboração de classes é evidente numa
declaração significativa de George Meany, presidente da AFL-CIO dos
Estados Unidos. Quando em 1955 esta elaborou um "pacto de não agressão"
geral com as grandes empresas, Meany declarou: "Nunca na minha vida fiz
greve, nunca na minha vida dirigi uma greve, nunca na minha vida ordenei
que alguém fizesse greve ... Eu não tinha experiência nesse tipo de
poder."[5]
Um pacto semelhante foi promovido pelo Partido Trabalhista na Grã-Bretanha com o conhecido documento “No Lugar do Conflito”,"In Place of Strife", promovido em 1969, que foi uma primeira tentativa estruturada de limitar a atividade do movimento sindical por meios legais.
Foi
também o governo trabalhista em 1974-1979 que, com o consentimento da
maioria dos dirigentes sindicais, introduziu um sistema centralizado de
controle salarial - o chamado "Contrato Social" - que, em nome do
controle da inflação, enfraqueceu a negociação coletiva, um dos pilares
da atividade sindical. Isso preparou o terreno para os ataques mais
sistemáticos aos sindicatos que se seguiram nos anos posteriores no
governo Thatcher.
FIGURA
legenda:
Partido Trabalhista na Grã-Bretanha 1969: documento "In Place of
Strife", uma tentativa inicial de limitar o movimento sindical por meios
legais
Governo Trabalhista 1974-1979: sistema centralizado de
controle salarial, o chamado "contrato social" contra a negociação
coletiva. Isso abriu o caminho para a investida violenta do governo
Thatcher.
A linha de conciliação de classes foi expressa
ainda mais claramente após os derrubes contra-revolucionários do início
dos anos 1990 pelo então secretário-geral da TUC britânica e quadro da
CES, John Monks. Na apresentação do Instituto de Parceria da TUC (Trade Union Congresses Partnership Institute)
- criado para promover a aproximação entre sindicatos e empresas - ele
afirmou enfaticamente que "os sindicatos podem dar um impulso às
empresas. As parcerias ajudam os executivos a levar os trabalhadores com
eles. Isto é não um obstáculo para as empresas, mas o segredo do
sucesso. Sempre disse que os sindicatos devem ser parte da solução, não
do problema."
No período 1989-1991, com os grandes
derrubes contrarrevolucionários na URSS e noutros países socialistas da
Europa, muitos grandes líderes sindicais do mundo subscreveram a
opinião, ativamente promovida por várias forças social-democratas, de
que a FSM deveria ser dissolvida e todos deveriam reunir-se sob a égide
da CSI.
Naqueles anos o confronto entre as duas linhas dentro do
movimento sindical internacional foi muito intenso. Aventureirismo e
oportunismo encontraram ilusões social-democratas. Muitas grandes
organizações sindicais retiraram-se sumariamente da FSM, levando os seus
filiados a apoiar a velha falácia reformista de que os instrumentos
sindicais da burguesia internacional podem supostamente ser mudados "por
dentro", de que eles supostamente os transformariam em "trincheiras de
classe" e ferramentas de combate.
Existem muitos exemplos dessa
experiência. E a maioria de vós que é mais velha conhece-os melhor do
que eu. A CGT francesa, a CGIL italiana e muitas outras entraram no
“curral social-democrata”. Desde então, de 1995 até hoje, 27 anos se
passaram. Não é pouco tempo para tirar conclusões. O que é que a prática
tem mostrado? Quem foi que mudou? Quem finalmente assimilou quem? Isto
lembra-nos o que a grande revolucionária Rosa Luxemburgo disse sobre a
participação dos socialistas nos governos burgueses. Não há uma "tomada"
parcial do Estado pelos socialistas, como diziam os partidos
social-democratas na época, mas uma tomada dos partidos socialistas pelo
Estado burguês.
Limito-me a recordar que a CGT de França, com a
sua gloriosa e heroica história, veio hoje apoiar e acolher na CSI e na
CES direções como as da CFDT. Chegou a apoiar lideranças que atuam
essencialmente como ferramentas dos imperialistas nas guerras da
Jugoslávia, Iraque, Afeganistão, Líbia, Síria, Mali e agora na Ucrânia.
Cada
um de vós tem exemplos do seu próprio país. Factos e ações dão
testemunho da verdade. E é útil aprender com essa experiência, porque
esses exemplos confirmam o papel sujo da social-democracia dentro da
classe operária.
Esta é a linha firme da corrente de conciliação:
traição de classe aos interesses dos trabalhadores, defesa dos
interesses do capital, cisão da unidade da classe operária.
E todo mundo tem muitos exemplos desse tipo no seu próprio país, na sua própria indústria, em experiências recentes e passadas.
Um último exemplo muito ilustrativo do trabalho de sapa da social-democracia e do reformismo:
Há
não muito tempo atrás, os nossos camaradas militantes na França
travaram uma grande batalha grevista nas refinarias que foi observada de
perto pelo movimento operário internacional - uma batalha que serviu de
exemplo e deu coragem a muitos trabalhadores ao redor do mundo.
O
que disseram os representantes da CES a esta greve heroica? Lutaram
contra a greve, afirmando que não havia "motivos suficientes",
salientando que a solução se encontraria "através do diálogo social, que
se revelou o único método eficaz".[6]
b) A
posição do movimento operário perante a guerra imperialista.
Internacionalismo proletário contra os interesses imperialistas ou apoio
à burguesia?
A guerra imperialista e a sua eclosão são
uma das principais manifestações das consequências destrutivas do
antagonismo capitalista. As contradições entre capitalistas, quando não
podem ser resolvidas por "meios pacíficos", são resolvidas por meio do
conflito armado. A ideia fundamental do grande teórico da guerra, Carl
von Clausewitz, de que "a guerra é a continuação da política" é de
grande importância.
FIGURA
Legenda"A guerra é a continuação da política por outros meios"
Para
o movimento operário, isso significa que, na guerra como na paz, a
burguesia procura perpetuar e aumentar a sua taxa de lucro. Assim como
em tempos de paz milhões de trabalhadores são selvaticamente explorados
em benefício dos patrões, em tempos de guerra milhões de trabalhadores
são lançados nos campos de batalha por interesses alheios e não
próprios.
Mais uma vez, a experiência histórica nos ajudará a ver
o papel de traição da social-democracia no movimento operário - no
passado e no presente.
No período da Primeira Guerra Mundial, a
grande maioria dos partidos social-democratas da II Internacional adotou
a posição do social-chauvinismo, apoiando essencialmente os interesses
da burguesia de cada país. A guerra foi travada pela divisão das
colónias e esferas de influência entre as potências imperialistas. Cada
governo, é claro, disse ao seu povo que a guerra se travava por
interesses "nacionais", ou seja, pelos seus próprios interesses
burgueses, batizando a rentabilidade do capital como "interesses
nacionais".
Apenas uma pequena vanguarda, os bolcheviques russos,
os espartaquistas alemães e algumas outras forças do movimento operário
internacional, ergueu bem alto a bandeira da luta de classes e do
internacionalismo proletário, denunciando a guerra como imperialista de
ambos os lados. Essa vanguarda manteve o proletariado internacional de
pé. Devido a esta linha consequente, o proletariado russo conseguiu
alcançar a sua vitória histórica, em outubro de 1917.
Na
Alemanha, a traição do SPD foi um duro golpe para o movimento
internacional, já que era o partido mais antigo e forte da Segunda
Internacional. Em agosto de 1914, o parlamento alemão votou a favor dos
créditos de guerra e deu apoio total ao imperialismo alemão em nome da
chamada "defesa da pátria".
Com a eclosão da guerra, o SPD subscreveu a doutrina do chamado Burgfrieden,
a paz de classes que dominava a vida política alemã, segundo a qual os
partidos políticos se absteriam de atacar o governo durante a guerra, em
nome da garantia da unidade nacional. Por outras palavras, adotou uma
linha de retirada voluntária da luta de classes, uma linha de traição e
compromisso. O mesmo fizeram as lideranças sindicais conciliadoras. Com
efeito, os quadros sindicais assumiam um novo papel no contexto da
economia de guerra. Tendo abdicado voluntariamente do direito à greve e
às reivindicações, passaram a assumir efetivamente um papel mais
importante no bom funcionamento dos negócios de forma a contribuir para a
causa da guerra.
O frenesim nacionalista da guerra tomou conta
dos social-democratas alemães a um grau repugnante. A título de
ilustração, uma pintura descreve como, quando a guerra foi declarada,
eles foram tomados por um “desejo ardente de se lançar na poderosa
corrente da maré nacional geral”, concluindo: “poderiam, pela primeira
vez em quase um quarto de século, juntarem-se, com o coração cheio, de
consciência limpa e sem sentimento de traição, à cativante e tempestuosa
canção: 'Deutschland, Deutschland über alles'”. [7]
Assim
falavam os social-democratas aos operários alemães entre os quais
tinham grande influência. Informaram-nos de que deveriam lutar pelos
interesses dos capitalistas alemães.
Por outro lado, os
social-democratas britânicos e os sindicalistas reformistas disseram aos
soldados britânicos que seria do seu interesse travar uma guerra contra
os trabalhadores alemães.
Sindicalistas trabalhistas,
como John Bromley, secretário-geral do Sindicato Ferroviário, estiveram
ativos na propaganda da guerra e do Império Britânico. O referido
sindicalista foi citado como tendo dito: "Agora, para o trabalhador
chamado a derramar o seu sangue, uma Alemanha vitoriosa certamente seria
um desastre. Protegemos os bancos de riscos desnecessários; protegemos
os lucros das ferrovias. Ambas as instituições fazem parte do nosso
grande Império cujas necessidades devem ser protegidas."
Ambos
traíram a fraternidade entre os trabalhadores. Aliaram-se aos
interesses dos capitalistas dos seus próprios países contra os
interesses comuns dos trabalhadores de todos os países, que nada separa.
Da distante Primeira Guerra Mundial passemos a exemplos mais recentes.
Recordemos
o papel da social-democracia na intervenção imperialista na Jugoslávia
em 1999, uma guerra da NATO e da UE. Naquela época, nos EUA, o
presidente era Bill Clinton do Partido "Democrata", o presidente da
Comissão europeia era o social-democrata italiano Romano Prodi e o chefe
da NATO era o social-democrata espanhol Javier Solana. Também na UE,
naquela época, os governos de muitos Estados membros eram liderados por
forças social-democratas. Na Alemanha foi Schröder, na Itália foi
Massimmo D'Alema, na França Lionel Jospin, na Grã-Bretanha Tony Blair,
na Grécia o PASOK.
IMAGEM
Legenda: Bombardeamento dos EUA, NATO e UE na Jugoslávia (1999)
E vamos ao presente.
Os social-democratas estão entre as forças que lideram a escalada do conflito imperialista na Ucrânia e a corrida armamentista.
O
exemplo mais emblemático é a decisão do primeiro-ministro
social-democrata alemão, Olaf Scholz, de anunciar um gigantesco programa
de 100 mil milhões de euros em armamento para modernizar as forças
armadas alemãs.
Os governos social-democratas de Espanha e
Portugal, que se apresentam supostamente como um “modelo” de “governação
progressista”, protagonizaram o envio massivo de equipamento militar
pesado para a Ucrânia, tentando fingir, num primeiro momento, que apenas
enviavam “ajuda humanitária”.
E não esqueçamos de que foi sob o
selo dos governos social-democratas da Suécia e da Finlândia que se
levantou a reivindicação da sua entrada na NATO, isto é, da expansão e
fortalecimento da aliança imperialista.
c) O movimento operário preso no mito do capitalismo "pró-povo" e dos "governos progressistas"
As
forças social-democratas e reformistas querem manter o movimento preso
na ilusão de que pode haver um capitalismo com "rosto humano". É como
dizer que pode haver um capitalismo em que tanto o patrão como o
assalariado, tanto o operário como o industrial, o armador, o banqueiro,
ganham por igual e ao mesmo tempo.
Dizemos que há um profundo
abismo entre eles, uma profunda e irreconciliável contradição. Este é o
princípio da luta de classes. Somente através das suas lutas os
trabalhadores podem vencer, até que finalmente se livrem dos parasitas
capitalistas.
O "mito" desse capitalismo "pró-povo", ou de um
governo supostamente "progressista" que pode administrar o capitalismo
de forma favorável ao povo em benefício dos trabalhadores, foi negado
muitas vezes. E isso porque o capitalismo opera com as suas próprias
leis. Pelas leis do lucro. E se isso não for anulado, não pode haver
mudança a favor do povo.
Em primeiro lugar, recordemos que hoje,
na UE, em mais de 10 países, os partidos social-democratas governam ou
co-governam. Vimos o que fazem esses "governos progressistas" e qual é o
seu papel na guerra imperialista.
Além disso, o que estão a
fazer diante da enorme onda de pobreza que atinge os rendimentos do
povo? Vejamos o setor de energia, por exemplo. Juntos, tanto os partidos
liberal-conservadores como os social-democratas, têm promovido ao longo
dos anos uma estratégia de liberalização energética, com base na qual
enriqueceram os monopólios neste setor, os mesmos monopólios que agora
estão num período de de ouro para os lucros devido aos altos preços.
Também promovem o chamado "investimento verde", apresentando falsamente
que os capitalistas se preocupam com o meio ambiente quando, na verdade,
são eles que o destroem. Eles não se preocupam com investimentos
ecologicamente corretos, eles preocupam-se com novas áreas de
investimento, onde colocar o seu capital para maior rentabilidade.
Afinal,
a UE formou todo um quadro antipopular com o comércio de emissões e o
mercado de ações de energia. É sempre o povo que paga.
Afinal,
através dos antagonismos que existem entre os países capitalistas da
NATO e da UE e a Rússia capitalista, há setores dos capitalistas que têm
acumulado lucros enormes. Significativamente, um poderoso armador
grego, presidente da Câmara de Comércio Internacional, declarou há
alguns dias: "O embargo ao transporte de petróleo russo terá um
efeito positivo sobre nós: os armadores ficarão ricos. Os custos de
transporte, que já dispararam, subirão ainda mais depressa!"
Mas
as forças social-democratas e reformistas não se contentam em manter o
movimento operário preso na linha da colaboração de classes. Tão-pouco
se limitam a desenvolver mecanismos de apoio à burocracia sindical e ao
sindicalismo patronal.
Muitas vezes procuram manipular a
indignação popular e as reivindicações que podem surgir sob o peso dos
problemas, para garantir a estabilização do sistema capitalista por meio
da alternância governamental entre as forças que representam o capital.
Ou seja, procuram fazer do movimento operário uma "cauda" e um
colaborador dos planos de promoção governamental da social-democracia.
Claro
que esta experiência não se limita à Europa, mas é essencialmente
semelhante em todos os continentes. As forças social-democratas foram
eleitas com grandes esperanças entre as camadas populares dos seus
países, mas a sua trajetória revelou que essas esperanças eram falsas e
completamente enganosas.
Eles não só dececionaram as expectativas
das massas populares que os apoiavam, como as suas políticas geralmente
estavam alinhadas com as exigências dos monopólios. Isto aconteceu
repetidamente nas últimas décadas nos países latino-americanos.
Recordemos
o caso do presidente social-democrata do Equador, Rafael Correa
(2007-2017) que, embora tenha sido internacionalmente festejado como um
suposto progressista radical, procedeu à privatização de setores
estratégicos da economia, lançou ataques contra os sindicatos de classe
do país e atualmente está escondido na Bélgica, país de origem da sua
esposa, desde que foi condenado no Equador a 8 anos de prisão por
corrupção e esbanjamento de dinheiro público.
Outro
exemplo diferente, mas com semelhanças com a deceção das expectativas, é
o caso do governo chileno de Michelle Bachelet em anos anteriores.
Embora ela também tenha sido eleita com falsas promessas de que mudaria o
seu país a favor dos trabalhadores, tudo isso imediatamente se revelou
falso. E enquanto os trabalhadores lhe viraram as costas, os Estados
Unidos e os seus aliados recompensaram-na com a alta posição que ocupa
atualmente na ONU.
Poderíamos citar também outros exemplos de
outros países. Poderíamos mencionar aspetos da deceção das expectativas
populares na Venezuela, mas não vamos entrar nisso. Limitar-me-ei a
mencionar que, a meu ver, por muitos aspetos negativos da experiência, a
perceção que todos temos do socialismo e do modo de produção socialista
fica realmente abalada quando ouvimos oficialmente que a Venezuela está
a avançar na construção de socialismo.
O que é que demonstram os
casos dos países latino-americanos? Que várias forças social-democratas
vêm e vão nos governos e o capitalismo vive e reina.
Deliberadamente,
como dissemos desde o início, não nos referiremos a esses exemplos em
detalhe, e vamos concentrar-nos na experiência europeia. Por isso, não
poderia deixar de me referir à rica experiência que tivemos no nosso
país durante a década anterior de profunda crise capitalista, uma década
de grandes lutas e conflitos grevistas, mas também da tentativa do
sistema capitalista de assimilar as mobilizações populares através da
ascensão de um novo partido social-democrata ao governo.
Como este não é o lugar para uma aula de história política grega moderna, farei um breve resumo.
A
Grécia foi particularmente afetada pela crise capitalista a partir de
2009. O Estado capitalista grego teve grandes dificuldades em geri-la.
Tinha um alto nível de dívida pública e de endividamento e tentava
passar a carga da crise para o povo, com grandes reformas antipopulares,
grandes cortes nos salários e nas pensões, cortes em escala colossal
nos gastos e uma grande deterioração dos serviços de saúde e bem-estar.
Eclodiram grandes protestos populares e mobilizações grevistas. A PAME
esteve na vanguarda das lutas da classe trabalhadora pela defesa dos
seus direitos, mas também travou uma grande batalha pela orientação das
lutas, para que o verdadeiro inimigo, o capitalismo, se manifestasse à
luz do dia e o movimento operário não ser arrastado para explosões
"inofensivas".
O sistema político encontrou várias
dificuldades em administrar a ira popular, mas também grandes contrastes
e contradições sobre o modo de administrar esta crise. Num período de
cerca de 4 anos, 7 partidos diferentes de todo o espectro político
mudaram um após o outro. Tentaram-se ainda soluções de governo de
coligação, entre as mais diversas forças, desde partidos conservadores
de direita até partidos de extrema-direita com forças social-democratas.
Ressaltamos isto porque pode ser comum noutros países, mas não na
Grécia, onde os governos maioritários de partido único são
frequentemente formados com base no sistema eleitoral. A solução dos
governos de coligação foi um dos meios para tranquilizar o povo.
Como
os partidos mais tradicionais que governaram todos os anos anteriores
estavam bastante desgastados, o capital optou por colocar um "novo"
partido no comando, que pudesse integrar o protesto popular e tirar o
capital da crise. Um partido que não tinha sido experimentado antes no
governo e que, portanto, poderia mais facilmente semear ilusões no povo.
O SYRIZA, partido que até então tinha uma cota eleitoral de 3%, apoiado
pelo capital de múltiplas formas, disparou em poucos anos para se
tornar um partido do governo. Recebeu forças e quadros dos antigos
partidos social-democratas, recebeu crédito dos EUA-NATO e da UE e
ascendeu ao governo.
O SYRIZA e as forças social-democratas, ao
longo dos anos anteriores, tentaram enganar o povo sobre a natureza da
crise. Disse que os culpados eram apenas os "maus credores estrangeiros"
e que poderiam resolver todos os problemas da noite para o dia. O seu
objetivo era esconder o verdadeiro culpado, ilibar a burguesia grega,
impedir que o povo tirasse conclusões. A PAME e o movimento de classe
travaram uma grande batalha não só pelas lutas e pelas massas, mas
também pelo seu conteúdo e orientação. Demonstraram que o capitalismo é
culpado e que os trabalhadores não devem acreditar em falsas promessas.
Que as soluções fáceis sem conflito não existem.
O SYRIZA
e as forças social-democratas tentaram limitar as lutas e as
mobilizações dos trabalhadores exclusivamente contra um determinado
governo ("abaixo o governo"), apenas para permitir que o SYRIZA entrasse
no governo. Na verdade, eles queriam usá-lo como uma alavanca para a
rotatividade do governo. Por outro lado, a PAME e o movimento operário
lançaram a palavra de ordem "chega de ilusões, ou com o capital ou com
os trabalhadores" para mostrar o caráter enganoso das promessas.
Então,
o que é que o SYRIZA, a "nova" social-democracia, fez? Alimentou falsas
esperanças, pois grande parte do povo grego acreditava que poderia
alcançar grandes e fáceis vitórias sem conflito. Quando chegou ao
governo, assinou novos acordos ainda piores com a UE e os credores (o
chamado 3º Memorando); prometeu aprovar as medidas mais difíceis que já
tinham encontrado resistência; co-governou com forças de extrema-direita
para obter a maioria; colaborou com os EUA. O embaixador dos EUA na
Grécia chegou a dizer que o SYRIZA foi o governo com o qual melhor
colaborou de todos os anos anteriores.
O que fez ele ao
movimento operário? Muito brevemente, ampliou a flexibilização das
relações de trabalho, manteve a abolição da negociação coletiva do
salário mínimo, que seria determinado por Portaria Ministerial e baseado
na "competitividade" e na "produtividade" (ou seja, baseada na proteção
dos interesses do grande capital). Por lei, fez cortes nos direitos da
segurança social e, por lei própria, também desferiu um golpe no direito
à greve, dificultando aos sindicatos a declaração de greve. Foi o que
fez o chamado governo "progressista".
Naquela época, muitas
pessoas diziam à PAME e às forças de classe que tinham de apoiar o
SYRIZA e que as nossas críticas eram exageradas.
Esta experiência mostrou, na prática, quem tinha razão.
4. Resumo das conclusões
A
experiência histórica e moderna confirma uma conclusão duradoura: a
social-democracia e o reformismo são inimigos perigosos do movimento
operário de classe. Eles demonstraram - em diferentes fases e condições
de mudança - uma flexibilidade e capacidade distintas de promover os
interesses do capital dentro da classe trabalhadora.
Concluiremos sublinhando três pontos:
a)
Ao longo do percurso histórico do movimento operário encontraremos duas
linhas. A linha de luta de classes e a linha de conciliação de classes.
Nos vários acontecimentos, nas várias fases históricas, uma e outra vez, encontraremos estas duas linhas em constante confronto.
A social-democracia tem sido a expressão histórica, precisamente, dessa corrente de colaboração de classes.
E
ao longo do seu desenvolvimento no século XX, até aos nossos dias,
percorrendo toda a trajetória desde o reformismo até à subordinação e
serviço aos interesses capitalistas, é hoje uma corrente política
burguesa que constitui um pilar para a estabilidade do sistema e para a
rotatividade do governo entre as forças ao serviço do capital.
- b)
Em todas as questões importantes, as forças da social-democracia e do
reformismo semeiam confusão e colocam grandes obstáculos à luta dos
trabalhadores.
Também vimos através de exemplos concretos a conexão multifacetada entre a social-democracia e as burocracias sindicais conciliadoras.
Vimos que, em todas as principais questões da luta de classes, elaboram maneiras de manipular o movimento operário; tal é a sua atitude sobre a questão do imperialismo e da guerra imperialista, bem como sobre a questão da trapaça dos chamados "governos progressistas".
Dessa forma, eles querem que o movimento seja encurralado, subjugado, incapaz de ver além dos limites da exploração capitalista.
Querem alimentar as ilusões de um capitalismo supostamente “pró-povo”, para que os trabalhadores não escolham o caminho da rutura e da subversão.
c) Mostra-se que só a linha da luta de classes abre caminhos. A luta contra a social-democracia e o reformismo é um pré-requisito para o fortalecimento do movimento operário classista, para que possa seguir em frente.
Claro, devemos ser pacientes com os trabalhadores que são seduzidos por tais promessas; devemos teimosamente explicar, provar o nosso ponto de vista e, ao mesmo tempo, organizar a luta. Mas, também, devemos ser inflexíveis contra os sindicalistas vendidos e os líderes do sindicalismo patronal.
Trilhamos com orgulho o caminho da luta de classes, do conflito de classes. Sabemos que não é um caminho fácil. Requer esforço e sacrifício. Mas é a única opção que a classe trabalhadora tem.
Caminhamos com confiança no poder da nossa classe. Extraímos esta confiança da nossa história heroica, mas também das nossas lutas atuais, que nos enchem de tenacidade, vontade e esperança.
Porque é assim que cumprimos o nosso dever na missão histórica de lutar pela libertação da classe operária da escravidão capitalista!
[5] New York Times, 10 de dezembro de 1955, citado em William Z. Foster, “Outline History of the World Trade Union Movement”, International Publishers, New York, pp. 546-547
[6] «Greve nas refinarias: la CFDT desaprova e prefere ‘’negociar’’», Le Figaro, 8.10.22
[7] A narrativa pertence ao social-democrata Konrad Haenish. Citado em Carl Schorske, German Social Democracy, 1905-1917, The Development of the Great Schism,Harvard University Press, 1955, p. 290
Fonte: https://www.theoryandpraxis.eu/sp/article/103-el-hist%C3%B3rico-papel-traicionero-de-la-socialdemocracia-contra-la-lucha-revolucionaria-de-los-trabajadores-%7C-ponencia-central-de-k-borbotis-en-el-webinario-del-ioi, publicado e acedido em 23.12.2022
Tradução de TAM
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