O manual prático do socialismo
Confira o texto de orelha escrito por Fernando Sarti Ferreira para "Do socialismo utópico ao socialismo científico", texto clássico de Friedrich Engels responsável por formar gerações de militantes marxistas.
Por Fernando Sarti Ferreira
Na longa história do socialismo, e especialmente do marxismo, talvez o texto mais lido depois do Manifesto Comunista seja Do socialismo utópico ao socialismo científico. Esse sucesso editorial é mencionado pelo próprio Engels nos prefácios compilados nesta edição da Boitempo e pode também ser constatado na história das edições marxistas no Brasil. Segundo levantamento feito pelo historiador Edgard Carone, entre a Revolução Russa de 1917 e o fim do Estado Novo em 1945, o Manifesto foi publicado cinco vezes no Brasil, apenas uma edição a mais que as de Do socialismo utópico ao socialismo científico.
Apesar de compartilharem grande popularidade e um caráter eminentemente pedagógico e catequético, as duas obras possuem importantes diferenças, determinadas pelos contextos históricos nos quais foram produzidas. Se o Manifesto de 1848 tinha o intuito de ler no “espectro que rondava a Europa” o anúncio da irrupção revolucionária da classe operária industrial, a obra de Engels, cuja primeira edição veio à luz em 1880, tem um caráter muito mais organizativo do que disruptivo. Trata-se de um texto escrito às vésperas de o marxismo se tornar a principal vertente do movimento socialista europeu — e, quiçá, mundial —, bem como da consolidação da forma organizativa clássica da social-democracia anterior à Revolução Russa com os partidos de massa e os sindicatos estruturados nacionalmente. A urgência do “general das vanguardas”( Engels era conhecido então como "o general" pelos seus vastos conhecimentos sobre as ciências militares) nas barricadas de 1848 ( Engels combateu nas barricadas ) dá lugar, assim, à paciência do “professor das massas” de 1880.
Diversos temas e ideias enunciados no manifesto são retomados neste manual prático do socialismo, recebendo maior atenção e detalhamento, além de atualizações decorrentes do avanço das forças produtivas e da cristalização das novas relações sociais de produção após a Era do Capital. Depois de traçar uma breve história do movimento socialista — na qual Engels presta tributo principalmente a Charles Fourier e Robert Owen — e de apresentar uma contundente defesa do pensamento dialético e científico, é na terceira parte da obra que sua capacidade de síntese e didática alcança maior brilho. A condensação, em poucos parágrafos, de parte substancial dos avanços realizados por ele e Marx em suas investigações sobre os aspectos históricos e lógicos do funcionamento do modo de produção capitalista continua sendo um dos mais poderosos convites ao estudo do marxismo.
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Fernando Sarti Ferreira é doutor em história econômica pela USP.
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