DIÁRIO DE MARTA – 7
A igreja de São Pedro, o seu tamanho de capela, a sua arte interior e a modéstia do seu exterior, apesar da bonita portada manuelina, agrada-me, acolhe-me sem vaidades e ostentação. Sinto-me mais recolhida, como em todos os templos pequenos, mais sossegadamente só, comigo mesma ou talvez com Deus, se acaso Ele existir. Eu quero crer que existe, eu gostava que existisse, necessitava que existisse, todo Ele bom, misericordioso, compassivo e compreensivo. A igrejinha de São Miguel também é assim, sóbria e discreta mais ainda, como se fosse uma igreja construída por pobres para os pobres. Eu sei que os pobres admiram as igrejas ricas, cobertas de oiro e esplendor, que os submete, intimida e parecem demonstrar o vasto e eterno poder da Igreja católica. Comigo não se passa assim. Nessas vejo somente o poder de uma instituição terrena, nas outras deixo-me invadir pela vontade de crer, pela comoção, e pela saudade depois da perda da minha filha. Nada peço, porque nada há a esperar após a morte de um ser tão querido, se não e apenas o luto. Refugio-me no canto mais discreto, longe das beatas que recitam orações e imploram curas milagrosas para os seus achaques de velhas, logo após as suas visitas perpétuas ao Centro de Saúde. No hospital chama-se por Deus e quem acode somos nós, os médicos, as enfermeiras.
À saída recebo uma sms da Carla, convida-me para tomar uma bica em Lisboa, respondo-lhe que aceito, no Centro Comercial do Saldanha, amanhã, pela tarde. Mesmo a propósito, pensava enviar-lhe um convite, gostava de saber quem é esse Carlos de que falou com suspeita ligeireza. Carlos há muitos evidentemente, mas desde que me pareceu vislumbrar o Carlos da minha juventude, passei a interessar-me por eles. Certamente que não é ele, mas quem sabe?
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