«(...)
A primeira crítica recuperada por Lahire deriva justamente de ensinamentos das ciências sociais sobre a moldagem sociocultural da psique, ensinamentos integrados ao pensamento psicanalítico por figuras como Erich Fromm e Karen Horney. Por um lado, o acento freudiano sobre o peso decisivo das primeiras experiências infantis, em relações afetivamente carregadas com os pais no cenário familiar, já pode ser visto como um passo analítico importante na direção do social. Por outro lado, esse aceno permaneceu insuficientemente sociológico na sua falta de atenção tanto à variedade sócio-histórica de arranjos familiares quanto às influências socializantes que derivam da inserção da família em sistemas sociais mais amplos (por exemplo, em estruturas de classe ou étnico-raciais).
Grosso
modo, em sua teoria do Complexo de Édipo, Freud partiu da observação de
dinâmicas familiares características das classes médias no Ocidente do
século XIX para, daí, formular uma tese generalizante sobre a psique –
masculina, pelo menos – que ele julgava aplicável a quaisquer cenários
sócio-históricos. Contra esse pressuposto universalizante, autores como
Margaret Mead, Bronislaw Malinowski e Roger Bastide mostraram a especificidade histórica e cultural
dos esquemas de relacionamento familiar que engendravam a situação
edipiana: uma estrutura patriarcal que conferia significativo poder à
figura do pai, cuja atuação extradoméstica o tornava um tanto ausente na
experiência diária do lar, em relação com uma mãe socialmente colocada
em uma condição subalterna ao marido, mas que desempenhava um papel
crucial na organização da família. (...) »
Sem comentários:
Enviar um comentário