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quinta-feira, 20 de maio de 2010

AS MÃOS

Duas espécies de mãos se confrontam na vida,
brotam do coração, irrompem pelos braços,
caiem, e desembocam sobre a luz ferida
a golpes e punhadas.


A mão é a ferramenta da alma, a sua mensagem,
e o corpo tem nela o seu ramo combatente.
Levantai e movei as mãos num grande marulhar,
homens da minha semente.


Ante a aurora vejo surgir as mãos puras
dos trabalhadores terrestres e marinhos,
como uma primavera de ridentes afagos
de dedos matutinos.


Teimosamente povoadas de suores,
as veias retumbam desde as unhas partidas,
cobrem os espaços de andaimes e clamores,
relâmpagos e gotas.


Manejam utensílios, enxadas e teares,
mordem metais, montes, raptam machados, carvalhos,
e constroem, querendo, até mesmo no mar
fabricas, povoados, minas.


Estas sonoras mãos escuras e luzidias
revestem-se de uma pele curtida, invencível
e são inesgotáveis e generosas fontes
de vida e de riqueza.


Como se com os astros a poeira pelejasse,
como se os planetas lutassem com gusanos,
a espécie das mãos trabalhadora e clara
luta com outras mãos.


Ferozes e juntas num bando sangrento
avançam quando se afundam os céus vespertinos
umas mãos de osso lívido e avarento,
paisagem de assassinos.


Não tocaram nem cantam. Os seus dedos soltam roncos,
mudamente esvoaçam, multiplicam-se, propagam-se.
Não teceram o burel, nem nasceram os troncos,
e lânguidas de ócio vagueiam.


Empunham crucifixos e acumulam tesouros
que a ninguém pertencem se não a quem os labora,
e seus mudos crepúsculos absorvem os sonoros
caudais da aurora.


Orgulho de punhais, arma de bombardeios
com um cálice, um crime e um morto em cada garra:
executoras pálidas de negros desejos
que a avareza impõe.


Quem lavará estas mãos lodosas que se lançam
à água e a desonram, envergonham e estragam?
Ninguém lavará mãos que no punhal se incendeiam
e no amor se apagam.


As laboriosas mãos dos trabalhadores
cairão sobre as vossas com dentes e cutelos.
E aos pés de muitos exploradores
elas cairão cortadas.




Miguel Hernández


(tal como Lorca assassinado pelos franquistas)











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