https://www.quefazer.info/blog?utm_source=so
Lutas Velhas, Tempos Novos
“Os Estivadores querem trabalhar” Acabem com o trabalho precário!
Nos
campos do Alentejo o operariado agrícola lutou durante décadas pelo
direito ao trabalho. Criaram as praças de jorna, não porque fosse a
melhor forma de organização mas, porque o fascismo tinha ilegalizado os
seus sindicatos, foi preciso criar novas formas de organizar o
operariado para que, em unidade, os operários defendessem o seu direito a
melhores salários, para que nenhum trabalhador ficasse mais vulnerável
perante a negociação individual com o patrão. A unidade e ação nas
praças de jorna elevou a consciência de classe para outros patamares da
luta, até que a sua luta heróica pôs fim às jornadas de trabalho 12
horas com a conquista das 8 horas imposta aos agrários a partir de maio
de 1962.
Com
o governo fascista ao serviço dos agrários, sempre que os trabalhadores
protestavam, lá vinha a GNR desancar, prender, torturar e até matar.
Nas avançadas mais simples a GNR (com a PIDE pelo meio) perguntava
“Então porque não vão trabalhar?”. A resposta era sempre a mesma: “Nós
queremos trabalhar, mas só as oito horas. Dêem-nos as oito horas e nós
vamos já trabalhar”.
Como dizia Brecht “ Os tiranos têm planos para dez mil anos” assim é!
Não
com a mesma força bruta, porque os tempos são outros, a PIDE e as
cadeias fascistas já não existem, a polícia não é a mesma. Tudo verdade.
Mas também é verdade que os trabalhadores continuam a ser vitimas de
repressão, e que as forças policiais não deixaram de ser, (quando para
isso são mandatadas) forças repressivas ao serviço do Estado.
Na
luta dos Estivadores, pela segunda vez, o governo do PS chama a polícia
para gerir conflitos de trabalho e, violando a lei da greve, protege
patrões, tenta quebrar a unidade de classe, dando cobertura a quem fura
greves. Uma vergonha para quem se intitula de esquerda.
Na
primeira vez, em maio de 2016, os fura-greves foram introduzidos por
via marítima, para não serem vistos pelo piquete de greve (sabe-se lá
com o apoio de que forças). Depois, para tirarem os contentores do cais,
chamaram a PSP.
De
novo os estivadores foram confrontados com “terrorismo psicológico”
dando cobertura aos patrões para continuarem a apostar no trabalho sem
direitos, para porem os fura-greves dentro da empresa violando o direito
à greve - o Governo PS manda um batalhão da polícia de intervenção que
cerca o piquete de greve e retira um a um todos os estivadores.
O servilismo do governo perante multinacional Auto Europa e os patrões da estiva é inaceitável.
Apelou-se
à intervenção do governo e o governo interveio: o MAI organizou as
escoltas policiais aos fura-greves. Alguém se esqueceu de que o governo é
um órgão do Estado capitalista, logo, também, o instrumento de
repressão do capital sobre a classe operária. O Estado voltou a
intervir: o Ministério da Defesa autorizou o armazenamento dos carros
produzidos e não escoados, na base aérea do Montijo.
Como
o conflito não estivesse resolvido, isto é, como as reivindicações dos
estivadores continuassem a não ser satisfeitas, o Estado interveio de
novo. Mandou a ministra do Mar, na posição de “árbitro”, chamar as
partes em conflito. O Estado mandou sentar as partes e disse-lhes que se
entendessem. Mas o conflito resumia-se à questão do simples cumprimento
da lei, mandando contratar com vínculo efetivo os trabalhadores
permanentes com vínculos ao dia. O governo, na sua posição aparentemente
neutral de propiciador de um entendimento, e não utilizando a sua
autoridade para exigir à entidade patronal que cumprisse a lei,
colocou-se objetivamente ao lado dela.
A
repressão sobre os trabalhadores da estiva exigia uma maior
solidariedade de classe do movimento sindical e do Partido dos
trabalhadores. O ensaio de violação da greve com apoio policial exigia
um protesto geral, com mobilização para o local. E a luta dos
estivadores merece ser tida em conta pelo movimento dos trabalhadores:
porque assume um caráter de luta exemplar contra o flagelo da
precariedade que atinge todo o mundo do trabalho; porque é corajosa e
determinada contra um inimigo mil vezes mais forte; porque demonstra o
poder da unidade dos trabalhadores; porque realça o facto de um elo
aparentemente fraco na cadeia da produção capitalista, quando unido, ser
capaz de pôr em causa o funcionamento de uma empresa tão poderosa como a
Auto Europa; porque mostra como, no quadro da globalização capitalista,
os trabalhadores se podem unir contra o inimigo comum – os estivadores
alemães ensaiaram o boicote às cargas da Auto Europa/Wolkswagen.
A
ação política do PCP perante está muito longe de estar à altura da luta
heróica de centenas de comunistas, entre os quais os que deram corpo à
luta do proletariado agrícola durante os tempos do fascismo.
A
solidariedade não é constituída só por palavras ou pela presença de
deputados junto do piquete de greve. A solidariedade não tem apenas, ou
pouco tem, uma vertente parlamentar mas, mesmo aí, a ministra deveria
ter vindo ao parlamento para dar explicações, além das perguntas
parlamentares feitas. A solidariedade tem um sentido de classe a que se
deveria ter dado muito mais atenção desenvolvendo ações de massas, tanto
mais que a precariedade é um problema de todos e não apenas dos
estivadores. Ainda não há muitos anos se mobilizava os trabalhadores e
as populações para irem apoiar trabalhadores grevistas nos correios, nos
transportes públicos, em empresas de tratamento de resíduos, por
exemplo.
Que
o BE só veja votos e lugares parlamentares ou governativos, não é para
admirar. O Partido que representa a classe operária e todos os
trabalhadores não pode partilhar esta conceção. E muito menos dar
suporte ao governo cuja política está na origem destas chagas que
atormentam milhões de trabalhadores. É uma hipocrisia e uma contradição
sob todos os pontos de vista. O que valem as “reposições” e o “fim dos
cortes” perante uma política que, no fundo, assenta sobre esta violência
de classe sobre todos os trabalhadores e não apenas sobre os
estivadores e continua a não recuperar o que é mais valioso como, por
exemplo a alteração das normas gravosas da legislação laboral?
Os estivadores nesta luta querem o mesmo que os operários agrícolas - direito ao trabalho!
Mas
cabia também ao Partido dos trabalhadores, perante os estivadores e
todos os outros, não apenas no parlamento, denunciar que uma das razões
principais que está na base deste conflito é a privatização do porto. E
relembrar que, com o impulso revolucionário do 25 de abril, a primeira
medida que os estivadores implementaram foi acabar com a Casa do Conto
(a praça de jorna de então) tendo sido estabelecidos vínculos laborais
diretos com as administrações dos portos, também na altura
nacionalizados. Obviamente que o governo do PS defenderá
intransigentemente a manutenção dos portos na propriedade capitalista
privada.
Sem comentários:
Enviar um comentário