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sábado, 9 de março de 2019


PCP
Jerónimo garante saída limpa da liderança comunista
 Comunista lidera o partido há 15 anos <span class="creditofoto">FOTO Luís barra</span>
Comunista lidera o partido há 15 anos FOTO Luís barra
O secretário-geral do PCP quer desligar o fim da sua liderança de qualquer resultado eleitoral que o partido venha a obter

Rosa Pedroso Lima

A questão não está colocada no interior do partido”, garante Jerónimo de Sousa ao Expresso. Quando “ainda há tanto para fazer”, saber se o líder comunista vai ou não cumprir mais um mandato como secretário-geral é matéria ainda não agendada nos meandros da Soeiro Pereira Gomes. Mas foi o próprio líder a marcar posição, a admitir cansaço e a reivindicar fazer valer a sua “opinião” sobre o que vai ser o seu destino político. Na verdade, há muito mais em jogo do que apenas saber se Jerónimo permanece ou não mais um mandato à frente do PCP depois do congresso, marcado para final de 2020. Desde logo, é preciso tirar consequências do impacto eleitoral que os anos de ‘geringonça’ tiveram no partido. E, face a um eventual desaire eleitoral, Jerónimo já garantiu uma saída limpa. Isto é, pelo seu próprio pé.
O caminho para a sucessão está aberto, e foi o próprio Jerónimo de Sousa a fazer questão de lhe abrir as portas. Em entrevista à agência Lusa, falou esta semana no cansaço, na idade que pesa e na necessidade de preparar uma saída. Ele, que ao contrário de Álvaro Cunhal nunca indicou um número dois, sabe que entre os comunistas é ao coletivo que cabe a tarefa de indicar quem e quando assume funções dirigentes. Mas, ao cabo de 15 anos de liderança e com os efeitos da ‘geringonça’ a serem testados nas próximas eleições, abriu uma página nova no manual de comportamento do PCP. “Posso ter uma opinião, e tenho”, disse ao partido e ao país. O congresso de 2020 dirá se a conseguirá fazer valer.
Críticos exigem balanço
Não restam dúvidas de que a ‘geringonça’ deixou marcas entre as hostes comunistas, mas ninguém consegue adivinhar o real impacto que o acordo com os socialistas terá entre o eleitorado do PCP. As últimas eleições autárquicas foram um primeiro embate. Com a queda de 10 câmaras, entre elas os bastiões de Almada, Barreiro e Beja, Jerónimo teve a inédita tarefa de admitir a derrota. “É necessário não iludir que este resultado constitui um fator negativo”, disse numa noite que significou um autêntico duche de água fria para a direção do PCP.
Mas as eleições são diferentes e só nas próximas legislativas o partido terá oportunidade de fazer a prova do algodão dos custos de ter entrado na inédita solução política que levou António Costa ao poder. E Jerónimo de Sousa, que desde a primeira hora se atravessou por esta solução política, está também agora na linha da frente para enfrentar as consequências e assumir as responsabilidades.
Jerónimo de Sousa confessou cansaço e abriu a porta à saída da liderança do PCP em 2020. E já há quatro nomes na calha
E há sectores preparados para cobrar a fatura. O primeiro a levantar a voz e a pedir que se faça um balanço do deve e haver da proximidade com o PS foi Miguel Tiago, o deputado que, em julho, bateu com a porta no Parlamento. “Espero que todos sejamos críticos. Todos devemos refletir e, um dia mais tarde, fazer o balanço e reconhecer os aspetos positivos e os negativos” dos anos de ‘geringonça’, disse na altura ao Expresso. A delicadeza do acordo com os socialistas colocou os comunistas “numa situação que é crítica”, que comporta “muitos riscos” e que levantou “muitas dúvidas”, explicou o dirigente comunista.
Não é o único. No sector sindical, os representantes dos professores, dos enfermeiros e dos trabalhadores da administração pública — alguns deles membros do Comité Central do PCP — têm razões de queixa do acordo político que, na verdade, deixou de fora muitos dos pontos mais importantes dos seus cadernos reivindicativos. “O partido vai ter de refletir sobre esta aventura política em que aceitou entrar”, disse um alto dirigente sindical ao Expresso. E se, no arranque da ‘geringonça’, foi possível apresentar ‘serviço’ e calar algumas das vozes mais críticas, os crescentes sinais de intransigência dados pelo Governo no final da legislatura estão a servir para agravar as tensões internas.
Arménio de saída
No mundo sindical, onde o PCP sempre encontrou a sua força principal de intervenção, os tempos também não correm de feição. Os sectores com maior implantação (e força) estão desgastados, depois de quase dois anos de protestos de alta intensidade, sem resultados à vista. O caso dos professores é o mais significativo, com a séria ameaça de a legislatura fechar com menos de um terço do tempo de serviço reivindicado pelos sindicatos a contar para os bolsos dos docentes. Mas também no resto da Função Pública já foi abandonado o sonho de ver os aumentos salariais sempre prometidos alguma vez consagrados nos Orçamentos que o PCP ajudou a aprovar.
Mas a direção da CGTP, que poderia servir de elemento apaziguador da tensão interna, está de saída marcada. Arménio Carlos, que foi um dos apoios sólidos da direção comunista na construção da ‘geringonça’, atinge o limite de idade e está impedido de exercer novo mandato. O congresso da central sindical está marcado para fevereiro de 2020, e com o secretário-geral da Intersindical saem ainda, pela mesma limitação etária, dois altos quadros: Graciete Cruz e João Torres, que integram o Secretariado da CGTP e são, tal como Arménio, membros do Comité Central do PCP.
As mudanças — primeiro na direção da CGTP e depois na direção comunista — vão ser decididas no rescaldo das legislativas. Um mau resultado do PCP ditará, sem dúvida, o futuro de quem ajudou a criar a ‘geringonça’ com o PS. Até lá, Jerónimo garante para memória futura o que parece um ensaio de despedida: “Dei o melhor que sabia e podia. Não sendo perfeito, não sendo o suprassumo da batata, mas acreditando nesta causa, neste projeto, dando o meu melhor.”

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