Novo contexto, novas exigências
Manuel Carvalho Da Silva*
Penso
que a maioria dos portugueses e portuguesas
que votaram nos partidos da Esquerda (ou esquerdas) em 2015, e depois
se regozijaram com os acordos parlamentares estabelecidos entre eles,
mantêm até hoje uma avaliação globalmente positiva deste ciclo de
governação e desejam a renovação de compromissos para novo mandato.
Entretanto, o contexto atual é radicalmente diferente do de 2015.
Em
2015, havia um rolo compressor a esmagar salários, pensões, direitos
sociais e emprego que era preciso deter. Exigia-se aos
partidos da Esquerda um entendimento mínimo que pudesse evitar a
institucionalização do "estado de exceção" como um novo normal.
Em
2015, surgia um ciclo de crescimento económico à escala global e na
União Europeia, e um BCE interveniente, fatores que favoreciam
a criação de emprego em Portugal e a queda das taxas de juro,
facilitando alguma conciliação entre "devolução de rendimentos" e
"ajustamento orçamental".
Em
2015, na composição do Parlamento que resultou das eleições, havia uma
coligação PSD-CDS capaz de bloquear qualquer iniciativa
do PS sozinho.
A batalha agora tem de ser por novas conquistas, o que em regra é mais difícil do que resistir.
Hoje,
embora os salários e as pensões se mantenham praticamente estagnadas em
termos de poder de compra, e alguns direitos sociais
- a começar pela saúde - continuem quase tão comprometidos como estavam
em 2015, não há a perceção de uma ameaça eminente, proveniente de
iniciativas do Governo, intencionalmente dirigidas contra as "classes
populares", os seus meios de existência e direitos
básicos.
Agora,
muitos dos que desejam renovação do mandato na Esquerda, pretendem que
se continue a reparar os estragos do "ajustamento",
mas querem também levar adiante um projeto bem mais profundo de
progresso, de mudança qualitativa do perfil da nossa economia, de
reparação mais estrutural das desigualdades.
Às
portas de 2020, existem fundadas preocupações e antevisões de um novo
ciclo recessivo, que pode emergir a partir de guerras
abertas ou potenciais, sejam elas bélicas, económicas ou financeiras.
Quadraturas do círculo, envolvendo reposição dos rendimentos e
investimento público a par de amortização da dívida em passo de corrida,
são muito mais difíceis no novo contexto global e
europeu que se perspetiva.
A
acreditar na bissetriz do conjunto das sondagens conhecidas, das
eleições de 6 de outubro não resultará uma bancada PSD-CDS
capaz de bloquear o PS-sozinho. O PS não será colocado em estado de
necessidade de negociações à esquerda. Mesmo sem maioria absoluta -
cenário indesejável por múltiplas razões -, a hipótese mais que provável
do crescimento do PS combinado com um descalabro
da Direita, produzirá um contexto favorável ao forte setor do PS que
sente urticária e enjoos com os acordos à esquerda e encorajam uma
solução PS-sozinho, agindo em geometria variável e caso a caso, de que
resultaria um viés de direita.
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