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segunda-feira, 31 de maio de 2010

Portugal à venda

Um dos títulos do «Diário Económico» de hoje: «Gestores vendem Portugal em Wall Street». Sem comentários. Excepto lembrar o discurso do ministro das Finanças no mesmo local há dias atrás a tentar vender as empresas públicas. Edificante.

Ninguém meu amor

Ninguém meu amor
ninguém como nós conhece o sol
Podem utilizá-lo nos espelhos
apagar com ele
os barcos de papel dos nossos lagos
podem obrigá-lo a parar
à entrada das casas mais baixas
podem ainda fazer
com que a noite gravite
hoje do mesmo lado
Mas ninguém meu amor
ninguém como nós conhece o sol
Até que o sol degole
o horizonte em que um a um
nos deitam
vendando-nos os olhos

Sebastião Alba (1940-2000)

Tristeza

Perto de onde se ouvem as ondas azuis do céu
Acho que perdi
Qualquer coisa de muito valor.

Numa estação nitidamente do passado
Em frente do funcionário dos perdidos e achados
Senti-me ainda mais triste.

Tanikawa Shuntaro

domingo, 30 de maio de 2010

Filosofia da Prática

A Filosofia ou reflecte sobre as práticas sociais ou, então, limita-se a tecer a teia com a própria baba. Contudo, não se limita a interpretar o mundo, intervém com os poderes na transformação do mundo. Inventou mil maneiras para justificar o presente, mas inventou também mil e uma para criar um futuro diferente.
Hoje trezentos mil trabalhadores mostraram aos filósofos que têm de escolher. Quando o conflito é antagonista não há metafísica que os salve.

sábado, 29 de maio de 2010

ERAM TREZENTOS MIL

Eram trezentos mil! Derramaram-se pelas avenidas e pelas praças, vieram de muitos lados, são o povo, as massas sociais insubmissas que tiram razão aos cépticos e amedrontam os reaccionários.
Que os poderosos se acautelem quando o povo se levanta.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

100 mais um Contra o PEC - Petição de intelectuais

1. O Programa de Estabilidade e Crescimento 2010-2013 (PEC) não é uma lei nem virá a sê-lo. O que foi aprovado na AR, com os votos favoráveis do PS e a abstenção complacente do PSD, é uma resolução. Cada uma das medidas terá que ser discutida e votada quando o governo apresentar a respectiva proposta de lei. O PEC não é inevitável, a orientação política que consagra não é a única possível.



2. Numa Europa prisioneira, também ela, da crise dos modelos monetaristas e neo-liberais, e incapaz de uma estratégia de desenvolvimento, o PEC amarra Portugal a uma política económica subordinada à redução abrupta do défice orçamental, e que só levará à estagnação económica e ao agravamento das injustiças sociais, ao alargamento da distância que separa o nosso país dos países económica, cultural e socialmente mais desenvolvidos.


Estagnação económica: As medidas contidas no PEC insistem num modelo errado que pretende basear o crescimento, numa política de baixos salários e no aumento das exportações. As novas privatizações previstas traduzir-se-ão, tal como no passado, na alienação pelo Estado de importantes fontes de receitas, de instrumentos económicos e alavancas de uma política económica. A sua venda, num contexto de desvalorização bolsista, não reduzirá a dívida pública que, pelo contrário, continuará a crescer, enquanto baixará o nível de satisfação dos direitos e necessidades dos trabalhadores e das populações.


Portugal é já um dos países mais desiguais da União Europeia. As medidas propostas no PEC implicam o agravamento das desigualdades sociais. Significam congelamento dos salários e das pensões; uma política fiscal injusta que atinge os trabalhadores por conta de outrem e mantém intocados os elevados lucros da banca e as mais-valias provenientes da especulação bolsista; a redução do poder de compra das prestações sociais; o das dificuldades de acesso ao subsídio de desemprego.


As privatizações, e as políticas de desinvestimento público inserem-se numa lógica de desresponsabilização do Estado em relação às suas funções económicas, sociais e culturais, e agravam os importantes défices existentes em todas as dimensões do desenvolvimento nacional, sejam no plano económico, sejam nos planos social, educativo e cultural.

3. É urgente um programa económico que assente:

Em uma política que valorize salários e pensões com base numa mais justa e equilibrada distribuição da riqueza e a dinamização do mercado interno.

Na defesa da produção nacional, com o fomento de uma indústria baseada em produtos de alto valor acrescentado, que promova a qualificação e incorpore trabalhadores mais qualificados.

No reforço do investimento público, do sector empresarial do Estado e do cumprimento pelo Estado das suas funções sociais.

Em uma política fiscal que contribua para a justiça social, a satisfação das necessidades do Estado e o equilíbrio das contas públicas.

Na criação de emprego, o combate ao desemprego, o apoio aos desempregados, como forma de protecção e dignificação do trabalho.

Na iniciativa política do Estado português, junto da União Europeia, visando a renegociação do calendário de diminuição da dívida pública e a diminuição das comparticipações nacionais nos programas co-financiados, tendo em vista a potenciação das verbas disponíveis.

Na consolidação orçamental com base no crescimento económico.

Os signatários, trabalhadores intelectuais que desenvolvem as suas actividades no campo do ensino e da investigação científica, das artes e das letras, da saúde e da comunicação social, da arquitectura e da engenharia manifestam o seu compromisso com a construção de uma política democrática; a sua posição contra a repetição dos erros passados e pela concretização, para a qual este PEC em nada contribui, do projecto nacional que a Constituição da República Portuguesa consagra.

Primeiros Subscritores

Abel Neves - Dramaturgo
Abílio Fernandes - Economista
Albertino Monteiro -Músico
Alcino Soutinho Arquitecto
Alfredo Maia -Jornalista
Álvaro Siza - Arquitecto
Amândio Valente - Professor
Ana Cecília Simões - Jurista
André Levy - Biólogo
António Avelãs Nunes - Professor Catedrático Jubilado
António Cartaxo - Músico e Rádio
António Luís Carlos - Arqueólogo
António de Paula Campos - Médico
António Jara - Médico
António Leitão - Médico
António M. Nunes dos Santos - Professor Universitário
António Revez - Actor e Encenador
Armanda Carvalho - Directora de Som
Armando Silva Carvalho - Poeta e Romancista
Augusto Flor - Antropólogo, Investigador e Presidente da Conf. Portuguesa das Colectividades
Carla Santos Ribeiro - Jornalista
Carlos Antunes - Arquitecto
Carlos Roxo - Arquitecto
Carlos Vidal - Artista Plástico e Professor da Fac. de Belas Artes de Lisboa
Carmen Santos - Actriz
Catarina Morais - Economista
Catarina Pé-Curto - Artista Plástica
Cecília Cavaca - Arquitecta
Cláudia Dias - Bailarina e Coreógrafa
Claudina A. Marques Rodrigues - Professora Universitária
Daniel Ricardo - Jornalista
Deolinda Machado - Professora
Desirée Pedro - Arquitecta
Domingos Lobo - Escritor
Duarte Saraiva - Artista Plástico
Eduardo Chitas - Professor Universitário
Eugénio Rosa - Economista
Fernanda Lapa - Actriz, Encenadora e Professora Universitária
Fernando Correia - Professor Universitário
Fernando Jorge - Actor
Fernando Marques - Economista
Fernando Martinho - Médico, Hospitais da Universidade de Coimbra
Filipe Diniz - Arquitecto
Francisco José Paixão - Museólogo
Francisco Melo - Editor
Francisco Santos - Professor
Francisco Silva - Engenheiro de Telecomunicações
Gastão Cruz - Poeta, Crítico Literário e Encenador
Gisela da Conceição - Filósofa
Guilherme da Fonseca - Ex-Juíz do Tribunal Constitucional
Helena Serôdio - Professora Universitária
Hernâni Resende - Historiador
Hugo Capote - Médico Cirurgião
Isabel Allegro de Magalhães - Professora Universitária
Jaime Ferreira - Professor Catedrático Jubilado
João Valente Aguiar - Sociólogo
João Bizarro - Jornalista
João Freitas Branco - Filósofo
João Lucas - Músico
João Luís Lisboa - Professor Universitário
João Maria André - Professor Catedrático, Dramaturgo e Encenador
João Onofre - Artista plástico
Joana Villaverde - Artista Plástica
Jorge Feliciano - Escritor para teatro e Encenador
Jorge Leite - Professor Universitário Jubilado
Jorge Pinheiro - Pintor
Jorge Seabra - Médico Pediatra
Jorge Veiga - Professor Catedrático Jubilado
José António Gomes - Professor Universitário e Escritor
José Barata-Moura - Professor Universitário
José Carlos Oliveira - Conservador de Museus
José Casanova - Jornalista e Escritor
José Croca - Físico e Investigador
José Filipe Murteira - Professor
José Manuel Jara - Médico
José Viale Moutinho - Escritor
José Oliveira - Editor
José Paulo Gascão - Editor
José Peixoto - Actor e Encenador
José Robert - Maestro
José Russo - Actor e Encenador- Director do CENDREV
Laura Soutinho - Galerista
Leonel Borrela - Artista Plástico
Leonor Moniz Pereira - Professora Universitária da Faculdade de Motricidade Humana
Luís Alfaro Cardoso - Investigador Científico e Presidente Conselho Científico do Instituto de Investigação Científica e Tropical
Luís Francisco Carvalho - Economista e Professor Universitário
Luisa Mota - Bióloga
Luísa Veiga - Professora Aposentada do Ensino Politécnico
Manuel Augusto Araújo - Arquitecto
Manuel Coelho - Economista
Manuel Freire - Cantautor
Manuel Guerra - Professor Ensino Politécnico Aposentado, Encenador
Manuel Gusmão - Poeta e Ensaísta
Manuel Loff - Historiador
Manuel Lousã Henriques - Médico Psiquiatra
Manuel Pires da Rocha - Músico
Manuel Portugal - Jornalista
Manuel Ribeiro da Silva - Físico
Maria do Céu Guerra - Actriz
Maria Velho da Costa - Escritora
Mariana Avelãs - Tradutora
Mário de Carvalho - Escritor
Mário Nogueira - Professor
Modesto Navarro - Escritor
Nádia Bastos - Professora e Artista Plástica
Nozes Pires - Professor
Nuno Figueiredo - Músico
Nuno Góis - Actor
Nuno Nunes - Sociólogo
Nuno Pedrosa - Artista Plástico
Nuno Ramos de Almeida - Jornalista
Octávio Teixeira - Economista
Paulo Martins - Bolseiro de Investigação Científica
Paulo Martins - Investigador
Paulo Monteiro - Autor de Banda Desenhada
Paulo Ribeiro - Cantor e compositor
Pedro Carvalho - Economista
Pedro Maia - Filósofo
Pedro Tadeu - Jornalista
Raquel Bulha - Realizadora de Rádio
Rita Pais - Coordenadora Editorial
Rosa Martelo - Professora Universitária e Ensaísta
Ruben de Carvalho - Jornalista
Rui Namorado Rosa - Professor Universitário
Samuel - Músico
Sérgio Ribeiro - Economista
Sérgio Vinagre - médico
Silvestre Lacerda - Historiador
Susana Correia - Arqueóloga
Susana de Sousa Dias - Realizadora
Tânia Resende - Professora Universitária
Telo Faria - Médico
Teresa Villaverde Cabral - Cineasta
Tiago Cunha - Economista
Tiago Mota Saraiva - Arquitecto
Urbano Tavares Rodrigues - Escritor
Valdemar Cadinha - Economista
Valdemar Madureira - Economista
Virgílio Domingues - Artista Plástico
Zeferino Coelho - Editor

A condição pós-moderna

A condição pós-moderna, segundo alguns pensadores, é a condição do indivíduo sem «sociedade» pois que a «sociedade» não existe; do indivíduo não alienado pois que o conceito de «alienação» já não faz sentido; do indivíduo sem «classe» pois que as «classes» já não possuem estrutura nem identidade comum, a própria «identidade» já nada é, condição do homem à deriva, megrulhado num devir perpétuo, sem referências; o futuro não se conta, porque todas as narrativas são fábulas e todas as convicções são crenças. Arte do efémero, do prosaico, do trivial. A banalidade e a banalização constituem o espectáculo da pseudo-novidade.
Sem teoria, sem mundivisão, sem totalidades, sem rupturas, os próprios conflitos não são mais que irrisões, acontecimentos sem destinação histórica.
A condição pós-moderna é o niilismo da decadência sem esperança, que toma o capitalismo como o fim da História.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

O EURO

Hoje já se levantam vozes contra a entrada de Portugal na zona euro. As consequências oferecem sempre as melhores lições. Não foram poucos os que alertaram a seu devido tempo para estas e outras consequências, eram uma minoria política, apelidada de «velhos do Restelo» (insulto de ignorantes porque no Poema de Camões os «velhos do Restelo» desempenham um papel crítico que o Poeta não despreza), sistematicamente silenciada.
Na zona euro ficámos desarmados face às crises criadas pelos mercados financeiros, importámos muito e exportámos pouco.
Países ricos e estáveis como a Dinamarca recusaram o euro em referendo. Em Portugal a opinião pública vale o que vale, isto é, os partidos dominantes fazem-na valer o que quiserem.
Com o euro temos vivido permanentemente em déficit. O que, aliás, é sempre um óptimo pretexto para impôr salários baixos, cortes nos serviços sociais do Estado, «flexibilização» do emprego e privatizações.
Vozes sensatas haviam alertado, aquando da entrada para a ex-CEE (hoje UE), que Portugal devia mpôr as suas próprias regras; tal como deveria ter procedido assim quando entrámos para a zona euro. Em vez disso, submetemo-nos servilmente.

Bernard de Sciullo

O optimista

Está provado, dizia, que as coisas não podem ser diferentes: pois, uma vez que tudo é feito tendo-se em vista um objectivo, tudo é necessariamente feito tendo-se em vista o melhor objectivo. Notai que os narizes foram feitos para carregar óculos; sendo assim, usamos óculos. As pernas são visivelmente criadas para serem vestidas com culotes, e nós usamos culotes. As pedras foram formadas para serem cortadas e com elas serem construídos castelos; e assim o monsenhor tem um belíssimo castelo: o maior barão da província deve ser o mais bem alojado; e os porcos tendo sido feitos para serem comidos, nós os comemos durante todo o ano. Consequentemente, aqueles que proferiram que tudo está bem, disseram uma estupidez: era preciso dizer que tudo está o melhor possível.

Voltaire (escritor e filósofo francês, 1694-1778), Cândido ou O optimismo.

domingo, 23 de maio de 2010

Passagem

Percorri os corredores da vida tantos lanços

Com os pés nus que jovem eu era
Em cada patamar te via sempre outra
Nunca o mesmo teu olhar me fixava.
Vinham os Outonos e outro inverno se anunciava.
Tão breves as horas tão fugazes os instantes
Das auroras.
«Como vais?» perguntavam, «Menos mal» respondia
Nenhum bem perdura, isso aprende-se depressa.
Que bom que era, contudo, um longo dia de espera
E tu chegando, a mesma d´outrora
E eu todo me transfigurava no outro que sou eu mesmo.
Tão curta a vida para um corredor tão estreito.
De cada vez que eu subia
Mais longe eu ficava
Do outro que eu era.
Quem me roubou os sonhos?
«Ninguém mais senão tu!»







Hino

Portugal, Portugal



Da beira-mar arrancado


Para a Europa teu fado


Outro já foi


Navegante, conquistador


Dobra o Cabo


Adamastor


Não vás naufragar.


Voltas à açorda


Qual Papa


Qual carapuça


Torce o destino


E puxa


Puxa


Que pôrra!






Portugal, Portugal


Fia-te na Virgem e não corras


Levanta-te do chão insubmisso


Contra os ladrões marchar, marchar!


Varre-os a todos, ó pátria minha


Para as profundezas do mar.



A JUSTIÇA

Tais são os preceitos do direito: viver honestamente, não ofender ninguém, dar a cada um o que lhe pertence.
Ulpiano (jurista romano, séc. II d.C. -228)

Excesso de direito, excesso de injustiça.
Cicero (Escritor e político romano, 106-43 a.C.)

Se temes a solidão, não tentes ser justo.
J. Renard (escritor francês, 1864-1910)

Quem critica a injustiça o faz não porque teme cometer acções injustas, mas porque teme sofrê-las.
Platão (filósofo grego, 427-347 a.C. , A república.)

sábado, 22 de maio de 2010

Fado para um amor ausente

Meu amor disse que eu tinha
Uns olhos como gaivotas
E uma boca onde começa
O mar de todas as rotas
Meu amor disse que eu tinha
Uns olhos como gaivotas

Assim falou meu amor
Assim me disse ele um dia
E desde então vivo à espera
Que volte como dizia
Assim falou meu amor
Assim me disse ele um dia

Sei que ele um dia virá
Assim muito de repente
Como se o mar e o vento
Nascessem dentro da gente

(de Manuel Alegre?)

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Voto de protesto

Este blogue não trata apenas de política conjuntural nem de doutrinação ideológica. Contudo, a política compromete a nossa vida, os conteúdos e as formas do nosso modo de viver. Por isso, apresentada e rejeitada a moção de censura do PCP ao governo clarificaram-se as águas: quem é a esquerda e quem é a direita. Serviu para isso mas serviu, sobretudo, para legitimar a resposta da esquerda às políticas da direita. E essa resposta continuará a ser dada pela força maciça das portuguesas e dos portugueses nas ruas, nas praças, nos locais de trabalho, pelas petições e abaixo-assinados, por todas as formas de luta. O PSD ao abster-se na votação (mas ao apoiar as medidas pelo conluio estabelecido entre Sócrates e Passos Coelho) procura desmobilizar as massas populares. Todos eles procuram diminuir as possibilidades de Portugal vir a transformar-se numa segunda Grécia, isto é, numa resposta combativa em todas as frentes. O futuro o dirá. Se não se der uma resposta à altura, estamos lixados. A cobardia e a submissão não constituem um traço fatal da natureza humana e, portanto, dos portugueses. Que se faça de todas as tribunas livres um voto de protesto. Eu aqui deixo o meu.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

AS MÃOS

Duas espécies de mãos se confrontam na vida,
brotam do coração, irrompem pelos braços,
caiem, e desembocam sobre a luz ferida
a golpes e punhadas.


A mão é a ferramenta da alma, a sua mensagem,
e o corpo tem nela o seu ramo combatente.
Levantai e movei as mãos num grande marulhar,
homens da minha semente.


Ante a aurora vejo surgir as mãos puras
dos trabalhadores terrestres e marinhos,
como uma primavera de ridentes afagos
de dedos matutinos.


Teimosamente povoadas de suores,
as veias retumbam desde as unhas partidas,
cobrem os espaços de andaimes e clamores,
relâmpagos e gotas.


Manejam utensílios, enxadas e teares,
mordem metais, montes, raptam machados, carvalhos,
e constroem, querendo, até mesmo no mar
fabricas, povoados, minas.


Estas sonoras mãos escuras e luzidias
revestem-se de uma pele curtida, invencível
e são inesgotáveis e generosas fontes
de vida e de riqueza.


Como se com os astros a poeira pelejasse,
como se os planetas lutassem com gusanos,
a espécie das mãos trabalhadora e clara
luta com outras mãos.


Ferozes e juntas num bando sangrento
avançam quando se afundam os céus vespertinos
umas mãos de osso lívido e avarento,
paisagem de assassinos.


Não tocaram nem cantam. Os seus dedos soltam roncos,
mudamente esvoaçam, multiplicam-se, propagam-se.
Não teceram o burel, nem nasceram os troncos,
e lânguidas de ócio vagueiam.


Empunham crucifixos e acumulam tesouros
que a ninguém pertencem se não a quem os labora,
e seus mudos crepúsculos absorvem os sonoros
caudais da aurora.


Orgulho de punhais, arma de bombardeios
com um cálice, um crime e um morto em cada garra:
executoras pálidas de negros desejos
que a avareza impõe.


Quem lavará estas mãos lodosas que se lançam
à água e a desonram, envergonham e estragam?
Ninguém lavará mãos que no punhal se incendeiam
e no amor se apagam.


As laboriosas mãos dos trabalhadores
cairão sobre as vossas com dentes e cutelos.
E aos pés de muitos exploradores
elas cairão cortadas.




Miguel Hernández


(tal como Lorca assassinado pelos franquistas)











Poesia clássica

Meleagro
Antologia Palatina
(séc. II-I a.C.)

CEGUEIRA DE AMOR
(XII.60)

Um caso singular
mas sempre verdadeiro:
se poiso em ti o olhar
-abranjo o mundo inteiro!...

Porém, ó fado torvo e prepotente,
porém, ó sorte perra e negregada,
se tu não vens, e passa toda a gente,
     Cego de repente
     - já não vejo nada!...

trad.: Augusto Gil

Impérios

Estava eu a apreciar um bom documentário sobre o Irão e vejo claramente visto o programa imperialista norte-americano do pós-guerra. Nesse programa geo-estratégico figurava a intenção de ocuparem os países abandonados pelo extinto império britânico, o tal onde o sol nascia e se punha. O argumento ideológico, da propaganda, era conter a ameaça soviética. É certo que a URSS se prontificava a ajudar todos os países libertados do colonialismo e possuia o seu próprio programa de influência, recorrendo também à sua ideologia justificativa. Mas o seu modo de actuar era diferente: apoiava os partidos e movimentos de emancipação nacional, procurando a seguir trocas económicas com benefício mútuo e deixava para os próprios naturais as formas de acção política que preferissem (naturalmente que desejava que os partidos comunistas ou socialistas revolucionários tomassem o poder e constituissem regimes populares ou socialistas). Os EU recorriam como regra a intervenções militares e colocavam no poder fantoches que lhes permitiam rapinar os recursos com as suas multinacionais. Fizeram-no no Irão quando um governo nacional e democrático nacionalizou o seu petróleo e, com isso, atearam as convulsões que têm vindo a abalar esse país, incendiaram os ódios anti americanos. Armaram Israel para dominarem o médio oriente rico em petróleo. Armaram o Iraque e atiçaram a guerra deste contra o Irão. No extremo oriente invadiram a Coreia, o Vietnam (que os franceses abandonaram), o Camboja e o Laos e estabeleceram uma aliança tácita com aChina maoísta para promoverem os kmeres vermelhos. Na América Latina, «quintal das traseiras», a CIA e as multinacionais organizaram o golpe fascista de Pinochet, as ditaduras militares da Argentina, do Brasil, do Peru, e por aí fora, até à Guatemala e Nicarágua. O império norte-americano. O século vinte foi o século do nazi-fascismo, mas, na sua longa duração, foi o século dos EU e da URSS. Se o império dos EU foi o único que sobreviveu, não goza hoje dos seus melhores dias. Os impérios não são difrentes dos organismos vivos: acabam sempre por morrer.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

O DESASTRE

O ataque à Escola Pública fez-se em duas frentes: numa, promoveu-se uma campanha para desautorizar os professores e responsabilizá-la pelo insucesso; noutra, difundiu-se a doutrina das «novas pegagogias» de modo a desautorizar os professores e a promover o insucesso escolar. Na primeira frente estavam os privados interessados no negócio do ensino; na segunda, os «mestres» de professores que lhes ensinaram as «novas pedagogias». Mas há que incluir nestes ideólogos académicos (bem instalados em universidades públicas e privadas) um bom número de psicólogos e até pediatras (pelo menos aqueles que beneficiaram do carinho dos media) que pregam uma educação onde o valor da «autoestima» (das crianças e jovens) é intocável (ou seja, a criança é sempre «boazinha» e os jovens devem «trabalhar» quando querem»). Paradoxalmente (ou talvez não) nos senhores dos negócios encontram-se naturalmente a direita pura e dura e nos ideólogos reconhecemos superlativas individualidades ditas da esquerda política. Na melhor das hipóteses os primeiros aproveitaram-se dos segundos; na pior, os segundos foram os ideólogos dos primeiros. Há uma certa perversidade neste aparente complot.
O facilitismo, o laxismo, o poder atribuído aos pais (e às Associações de Pais, sobretudo daquela cujo presidente é um senhor que recebia subsídios do Ministério da Educação e que mais esteve ao lado da ex-ministra da Educação), a desautorização do professor na sala de aula, a conversão da escola em fábrica de cursos profissionais, o medo generalizado nos docentes por um sistema de avaliação provadamente impraticável (mas que funcionou e funciona com geradora de divisões e insegurança), um curricula recheado de disciplinas sem conexão entre si, a despromoção da Filosofia, a farsa dos exames, a sucessiva diminuição do financiamento e do investimento (sobretudo no ensino superior), a decapitação da gestão colegial e democrática, os parcos meios atribuidos aos serviços sociais (para os alunos mais pobres), conduziram a Escola Pública a um desastre em precedentes. Os responsáveis lavam as mãos e permanecem grudados em cargos académicos e os homens do negócio fazem negócio.
Por não quererem continuar a aturar alunos indisciplinados e pais mal-criados, nem serem paus-mandados de ministérios incompetentes, é que muitos professores pediram a reforma antecipada. Eu fui um deles. Sou pelo rigor na avaliação dos alunos e dos professores, sou pela disciplina e pela organização firme e tenaz do trabalho com e para os estudantes, sou por uma escola que não reproduza as desigualdades sociais, sou pelo racionalismo e pela cultura humanista e científica e contra o analfabetismo de adultos e jovens, sou contra uma psicologia e uma pedagogia que não ensine nem valorize o esforço individual, o trabalho em equipa coordenado e com projecto para cumprir e avaliar, sou contra uma psicologia e uma pedagogia que trate a criança e o jovem como uma «flor de estufa» e não como um ser em formação que aprenda a coloborar, a resistir às adversidades e ao trabalho às vezes penoso, fui e sou a favor, na prática, de uma Escola Pública como espaço de liberdade com diálogo crítico (subversivo sempre que necessário) e onde a Filosofia, as Artes, a Cultura, fosse conteúdo e combustível de atitudes intervenientes de cidadania e de formação de personalidades inteiriças.
E sou de esquerda.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Ensaio sobre a cegueira

Antecipando as conclusões da comissão parlamentar de inquérito à tentativa de aquisição da TVI pela PT (se se o primeiro ministro mentiu ou não ao país) o cidadão que acompanhou as sessões pela SIC- Notícias pode afirmar sem margem para dúvidas que sim, a PT tentou pela mão de dois, pelo menos, administradores executivos (nomes agora sobejamente conhecidos) e que o sr. Sócrates mentiu, pois claro. Dizer-se, como já ouvi, que todos os governos influenciam, ou tentam, a comunicação social, é desculpabilizar este em concreto que fez mais ou pior do que outros. Vamos é ver se no fim tudo fica em "águas de bacalhau". Suspendem-se alguns crápulas com chorudos ordenados e mordomias e o sr. Sócrates continua a mentir ao país como sempre o fez (já nem falo do andar às arrequas desde que perdeu a maioria absoluta). Lembra sempre aquele epifenómeno que garantiu um dia «jamais!» e, no dia seguinte, alterou o imperativo categórico. Mentiram no valor real do déficit como têm mentido sobre o número de desempregados. Juraram a pés juntos que não iam mexer nos impostos, mas com a ajuda salvadora do PSD (que combateu sempre com vigor guerreiro a subida de impostos) os impostos directos e indirectos vão subir. Já não chega congelarem os salários, querem-nos roubar uma parte deles e extorquir-nos o subsídio de férias e o 13º mês. A Direita (na qual insluimos o PS) está de acordo com todas as medidas que façam com que seja o Trabalho a pagar a crise e não o Capital. Esta é,de resto, a doutrina da UE das grandes potências, do FMI, do Banco Central europeu, dos sacrossantos mercados livres. Eis a prova provada de que o capitalismo é o sistema que mais refinadamente explora os trabalhadores. É para isso, aliás, que ele existe. É um expectáculo esclarecedor ver, ler e ouvir os senhoritos académicos das áreas das economias, alguns dos quais criticavam o governo por isto e por aquilo, engrossarem agora a  voz avisando que sempre o exigiram. O quê? estas e outras medidas para salvar o país. Onde páram os académicos de esquerda que se oponham a este PEC tão descaradamente discriminatório e injusto? Eis uma prova provada de que a comunicação social é a voz do dono. E muitos deste académcos são, eles próprios, as vozes dos donos.
É tudo tão claro que se aprende melhor e mais depressa do que ler um tratado de economia. E percebe-se porque a economia política é mais crítica. Quem não consiga ver mais do que aquilo que os economistas dizem não perceberá "jamais" os reais desígnios do capitalismo. Este poder de que eles dispõem para impôr o consentimento é deveras um instrumento poderoso.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Maio, trabalho, luta

Maio maduro maio


Maio maduro maio
Quem te pintou
Quem te quebrou o encanto
Nunca te amou
Raiava o sol já no Sul
E uma falua vinha
Lá de Istambul


Sempre depois da sesta
Chamando as flores
Era o dia da festa
Maio de amores
Era o dia de cantar
E uma falua andava
Ao longe a varar


Maio com meu amigo
Quem dera já
Sempre depois do trigo
Se cantará
Qu´importa a fúria do mar
Que a voz não te esmoreça
Vamos lutar


Numa rua comprida
El-rei pastor
Vende o soro da vida
Que mata a dor
Venham ver, Maio nasceu
Que a voz não te esmoreça
A turba rompeu






José Afonso


in «Poemas Maio trabalho, luta», edições avante!2010

O DESEJO

O meu desejo é não ter desejo
de tanto desejar
O meu desejo é fugir da maré
neste desejo de me afogar.

O meu desejo é ter desejo
de não me iludir.
É desejar que a dor
enlouqueça a rir.

Desejo-te como se a noite fosse o dia
e a lua acendesse no meu coração.
Desejo-te com medo de que a morte
venha disfarçada de solidão.

Quem ama de amor não cansa
se tu vieres nas asas do vento;
mas se a espera é desesperança
o desejo é apenas sofrimento.

Eu sei que virás
quem procura sempre alcança,
eu sei que virás
sobre as águas em passo de dança.
Como uma nuvem que poisasse
no beiral da minha janela
Como se a primavera brincasse
e as crianças com ela.

Virás sem ardis e sem culpas
para além de todo o bem e todo o mal.
Virás quando o silêncio d´hoje
for a canção de amanhã.
Virás
sobre os montes
sobre os vales
sobre os rios
com palavras ainda por inventar.
Prometo levar-te a lugares ignorados
onde não mora a dor
onde os amantes calados
escrevem no mar mensagens de amor.

Eu sei que virás
se a vida for um jogo
vamos então apostar.
Este medo que é desalento
este orgulho insensato
para quê?
se a vida é um fugaz pensamento?

Eu sei que virás
porque o meu é o teu desejo
Regresse a alegria nesse momento
se o teu desejo for dar-te um beijo.

Quem ama de amor não cansa
como quem dança
nas asas do desejo.

A Fé

O Banco central europeu empresta aos bancos a 1 por cento de juros para que estes emprestem à Grécia a três ou quatro vezes mais os juros. Bom negócio. Hoje a Grécia, amanhã Portugal ou outro. O capital financeiro anda contente. A dívida pública e o déficit aumentou porque o Governo injectou nos bancos milhões de euros. Estamos a pagá-los e continuaremos, nós, os trabalhadores, os pequenos empresários, em suma o povo.
E a chantagem continua: se não cumprires o PEC não levas ajuda nenhuma.
E o Governo, tadinho, desculpa-se e aplica o PEC, carregando forte e feio sobre o Trabalho e os contribuintes honestos que não têm culpa nenhuma da crise.
O PSD apressou-se a dar uma mãozinha ao Governo para acalmar os mercados. Acalmar, dizem eles na sua despudorada e obscena fraseologia. Não foram os mercados financeiros que provocaram a crise internacional?
Valha-nos o Santo Pontífice que nos vem fortalecer a fé no paraíso onde não não há, espero eu, mercados, roubalheiras, máfias, negociatas, corrupção e mentiras.

domingo, 9 de maio de 2010

Poema

4.
ainda adormeço e os factos não cessam de acontecer
a vida continua lá fora sob as estrelas penso em ti ao longe
no falatório da razão erguem-se agora histórias individuais
e há pedaços de raízes arrancados à vida mundana

desencorajas o regresso que nunca foi possível
debruças-te sobre os cambiantes da loucura oculta
alegas franjas pendentes nos discursos imaginados
não fui subtil romântico para te seduzir na tua sedução

sonho recordo. um pressentimento de fim apodera-se
da tua vida vês os refúgio onde pernoitas na dormência?
nas fissuras da pele podem ler-se os ventos soprados como
no deserto retirado se descobre a passagem do sonhador?

Paulo Alexandre e Castro

Sentença

Quando o passado nos persegue, não é a ele que receamos, mas ao futuro. A única fuga possível é projectarmo-nos para diante.

A FILOSOFIA

Se queres a verdadeira liberdade, deves fazer-te servo da filosofia.
Epicuro 341-270 a.C.

Para muitas pessoas, os filósofos são noctívagos inoportunos que os perturbam durante o sono.
A. Schopenhauer 1788-1860

A filosofia ensina a agir, não a falar.
Séneca 4 a.C.- 65 d.C.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

A 7 de Maio termina a 2ªGuerra Mundial com a derrota do nazi-fascismo. O exército vermelho liberta os prisioneiros dos campos de extermínio e entra em Berlim. Há 65 anos. Não esquecer.

Psicologia, seu Objecto.

«Visto que o nosos conceito do problema psicofísico, do qual parte a nossa psicologia, afirma a unidade, mas não a identidade, do psíquico e do físico, a investigação psicológica que não é redutível à fisiológica, pressupõe, necessariamente, a análise fisiológica dos processos psíquicos (psicofísicos) e muitas vezes inclui-os. (...) ...deve rever-se toda a investigação de orientação dualista na psicologia tradicional das sensações e dos movimentos: deve mudar-se radicalmente todo o sistema de investigação psicofísica e realizar-se, concretamente, o princípio geral da unidade psicofísica.
3. Dado que os fundamentos materiais da psique não podem reduzir-se aos seus fundamentos orgânicos, porque o modo e o tipo do pensamento humano é determinado pela sua forma de vida e o seu tipo de consciência pelas práticas sociais, os métodos da investigação psicológica que chegam ao conhecimento psicológico do ser humano e que para isso partem da sua actividade e das suas realizações devem apoiar-se na análise histórico-social da actividade humana (Para isso, o psíquico não deve ser socializado, isto é, não deve ficar reduzido ao social. (...) O princípio da individualização da investigação deve ser um princípio primordial da nossa metodologia. (...) Na nossa psicologia deve ser fundamental o princípio da individualização da investigação e a descoberta das leis reais, e isso em vincado contraste com todas as concepções para as quais o essencial é o estabelecimento de valores tipo e trabalhar com métodos estatísticos.(...O O princípio do desenvolvimento é um princípio essencial da nossa metodologia.» S.L. Rubinstein, I vol., «Objecto da Psicologia».

Estes princípios foram, quantas vezes, esquecidos por determinadas correntes da Psicologia. O «princípio do desenvolvimento» que Rubinstein aconselhava há mais de cinco décadas, é hoje regra geral seguido pelos Psicólogos. O mesmo não se pode dizer quanto à análise histórico-social da actividade humana (respeitando o «principio da individualização») nos estudos dos fenómenos específicos do psiquismo (internos e externos). Ou seja, o(s) indivíduo(s) é estudado como um sujeito abstracto, a-histórico, desinserido da história das práticas sociais (em primeiro lugar do trabalho, do lugar e papel na organização do trabalho).

Psicologia- S.L. Rubinstein

S.L. Rubinstein foi um dos mais eminentes psicólogos de sempre. O seu tratado, PRINCÍPIOS DE PSICOLOGIA GERAL, traduzido em boa hora pela Editorial Estampa em 1972, 7 volumes, é absolutamente obrigatório para todos aqueles qque estudam ou se interessam pela psicologia científica e exerceu uma duradoira influência em várias gerações. É lamentável que não haja sido reeditado e seja silenciado nas bibliografias académicas. Não surpreende: o autor, de categoria internacional, admirado pelos seus pares, foi um cidadão soviético e a sua orientação foi a filosofia marxista. As escolas e academias portuguesas obedecem servilmente às determinações norte-americanas. Basta consultar os tratados ou sites de origem norte-americana para se demonstrar esta ignorância meticulosa e voluntária: nunca, ou quase nunca, se cita os soviéticos Rubinstein, Leontiev, Luria, ou os franceses Henry Wallon (que antecipou Jean Piaget no estudo do pensamento e emoções da criança), Renée Zazzo, Pullitzer...Os psicólogos marxistas não reduziram a psicologia a uma ideologia política, contribuiram poderosamente para o desenvolvimento das investigações, a psicologia na ex-URSS alcançou enormes e irrefutáveis êxitos. De resto, o «pai» da psicologia experimental foi russo: Ivan Pavlov (com as suas descobertas sobre o comportamento inciou-se a psicologia norte-americana, quase sem se referir a ele...).

EPICURO ( 341-270 a.C.) - Máximas

XVIII
O prazer na carne não aumenta uma vez suprimida a dor da necessidade; depois disto, somente admite variação. O limite dos prazeres mentais, ao contrário, cresce (à medida que) reflectimos sobre estas coisas e outras do mesmo género que costumam causar os maiores espantos ao pensamento.

XXII
É preciso aplicar a reflexão ao fim proposto e a toda a evidência com base na qual formamos as opiniões. De outro modo, tudo permanecerá cheio de confusão e desordem.

XXIII
Se combates todas as sensações, não terás mais nada ao qual te possas referir (nos teus juízos) nem mesmo quando se trate de distinguir as que dizes serem falsas.

XXVII
Dos bens preparados pela sabedoria com vista a garantir a felicidade ao longo da vida, o maior é a posse da amizade.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Sabedoria árabe

Povo
Infeliz do povo que o tambor reune e o bastão dispersa.

O senhor de um povo é o que o serve (Omar bn al-Khattáb)

Poder
O poder é como o fogo: demasiado longe dele, não se tira qualquer vantagem, demasiado perto, há o risco de se queimar.
Tem cuidado com o poder do homem de carácter quando ele tem fome e com o poder do homem vil quando farto.
Quem não oprime os outros é oprimido. (Zaheir ibn Abi Sulmá)

 Amor
O amor impede de ver os defeitos, o ódio de ver as qualidades

terça-feira, 4 de maio de 2010

PRECONCEITOS

Estereótipos e preconceitos mantêm entre si relações estreitas. Os psicólogos têm tentado defini-los como dois compostos de um mesmo processo, a categorização, que consiste em esquematizar e simplificar a realidade social. Nestas condições, o preconceito pode ser definido como uma atitude que comporta uma dimensão avaliativa frequentemente negativa, a respeito de tipos de pessoas ou de grupos, por razões que se prendem com a pertença social dessas pessoas ou grupos. O preconceito é uma predisposição adquirida cuja finalidade é estabelecer uma diferenciação social. É uma forma de discriminação mental que pode desembocar numa discriminação comportamental.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

As primeiras impressões

Estratégias cognitivas

As relações sociais constituem a essência de cada indivíduo. Estabelecemos com os outros relações várias e de conhecimento uns dos outros. Algumas das estratégias são inatas (Desde Darwin à etnologia e antropologia contemporâneas que se conhecem algumas), outras são aprendidas no processo de socialização. Nas relações, desde a infãncia, recebemos, filtramos e assimilamos um vasto conjunto de informações, a cognição social consiste em receber, seeccionar, memorizar, transformar e organizar as informações, construir representações da realidade social, elaborar saberes e comunicá-los.
Nas interacções com os demais formamos imediatamente a «percepção da pessoa»: uma impressão é a organização da informação disponível acerca de uma pessoa de modo a integrá-la numa categoria significativa para nós. Formamos, assim, opiniões sobre os outros, tenhamos ou não observado as características (simpatia/antipatia) que atribuimos aos outros. Criada uma impressão positiva ou negativa temos tendência a captar preferencialmente as características que sejam consistentes com a impressão anteriormente formada («efeito de halo»). No juízo imediato sobre o outro relevamos os traços centrais considerados para nós os mais importantes.  Na formação de uma impressão há sempre um factor de ponderação ou de avaliação do que é mais ou menos favorável à interacção, num determinado contexto ou situação.

Mensagem

esqueceste um casaco no roupeiro
os lençóis ainda tépidos
um brinco debaixo da cama
Partiste com o meu corpo
amortalhado
fiquei esquecido de mim
à minha procura
num cais desamparado.

Fazes favor
Traz-me de volta.
Dei-te muito
mas não me dei todo.

Dança Contemporânea

domingo, 2 de maio de 2010

Os jovens

A manifestação do 1º de Maio em Lisboa organizada pela CGTP mobilizou dezenas de milhar de trabalhadoras e trabalhadores (9o mil, diz-se) e o discurso de Carvalho da Silva foi potente e acutilante, acessível e combativo. Manifestações como esta demonstram a certos intelectuais cépticos que a luta de massas é ainda o mais poderoso meio de combate democrático. Se dessemos ouvidos a certas teses que por aí circulam vindos da direita e engolidos por alguns de esquerda, baixávamos os braços e permitiamos que nos saltassem para a garupa, enquanto proferíamos entre amigos discursos críticos mas desistentes. O combate nas autarquias é incipiente ou não existe; os combates na Assembleia da República são derrotados pela maioria de direita; logo, a alternativa é o combate nas ruas e nos locais de trabalho.
O que é triste é observar que os jovens, estudantes sobretudo do Ensino Superior, futuros desempregados, futuros trabalhadores precários e a recibos verdes, futuros assalariados a receber muito abaixo das suas qualificações, continuem, em grande número, indiferentes, apáticos, passivos e despolitizados. Alguma coisa se passa nas escolas, alguma coisa de inquietante se passa com os jovens, quando ignoram o passado e evitam combater pelo futuro. Estou em crer que muitos já vão sentindo na pele os apertos do cinto lá em casa dos pais, onde foram habituados a satisfazer os seus caprichos. Muitos não compreenderam ainda que os pais não os podem sustentar a vida toda. Muitos não compreenderam que vão viver pior do que provavelmente viveram os pais na juventude. Sociólogos, psicólogos, advogados, gestores, jornalistas, artistas, e muitos mais diplomados, vão andar de porta em porta à procura de trabalho, qualquer que ele seja. Querendo, como é natural, sair dos ninhos paternos e morar noutros, onde vão arranjar dinheiro para pagar alugueres ou hipotecas, roupinhas, diversões (a que estão muito habituados), tecnologias de ponta para ocuparem as suas horas altamente culturais?
Se os jovens não ganham juízo, vai ser difícil ajuizar do futuro que os espera. Se não aprenderam a cidadania nas escolas e nas famílias, a vida ensiná-los-á da pior maneira.

Vem aí a porrada!

A União Europeia (isto é, as grandes potências que a dominam) concedeu, finalmente, um empréstimo de 120 mil milhões à Grécia. A Chanceler alemã avisou logo que Portugal se «ponha a pau» e aplique as medidas de austeridade antes que seja tarde. Vamos todos, portanto, obedecer à Senhora, às potências e aos bancos, com muito respeitinho e bom comportamento. Teremos, desde já, entre nós, portugueses, o discurso dominante: cumprir este PEC, ou antes, o PEC que vai ser agravado no Parlamento por via dos partidos da direita. O senhor Passos Coelho já combinou com o primeiro-ministro o seguinte em palavras rudes:«Vamos juntos lixar o povo!».
Esperemos que o dito povo os lixe a eles.

O ensino

Não estudamos para a vida, mas para a escola.

Séneca, 4 a. C.- 65 d.C., Cartas a Lucílio

O amor recíproco entre quem aprende e quem ensina é o primeiro e mais importante degrau para se chegar ao conhecimento.

Erasmo de Roterdão 1466-1536, Colóquios

Mestre-...depois de pai, é o nome mais nobre e mais doce que um homem pode dar a outro.

E. De Amicis, escritor italiano,1846-1908

sábado, 1 de maio de 2010

A PESTE

Assiste-se a um retrocesso civilizacional. Esta expressão já se ouve muito mas apenas a indivíduos das esquerdas. Num sentido amplo ser das esquerdas é recusar o neo-liberalismo. Ora, porque razão a maior parte dos comentadores da imprensa e das televisões não usam essa expressão? Ou o significado que ela contém? Porque razão se folheia um semanário ou revista, se segue um debate ou um comentador na televisão, e as reportagens, entrevistas e comentários soletram a cantiga do neo-liberalismo e nunca defendem uma alternativa socialista, ideias-chave do socialismo, um programa, um projecto de ruptura com o actual sistema financeiro, económico, político, cultural? Quando são professores universitários, que o são na sua maior parte, e não saem da roleta-russa que é este sistema, onde páram os socialistas, e até mesmo os sociais-democratas? Nada de confusões: não me refiro aos partidos socialistas ou sociais-democratas pois que disso só conservam o nome.
Importámos tudo: os bens materiais e imateriais. As coisas e os simulacros. As políticas e a ideologia. O endividamento externo é a ponta do icebergue. Por baixo acumula-se o atraso do ensino, da educação e da investigação. Respira-se na atmosfera as crenças, as normas e os valores que a élite dominante foi impondo ao país. Transformou-se a escola num centro de reprodução da ideologia anglo-saxónica. A hegemonia da língua inglesa não é inocente. Pertence ao habitus de que falava Bourdieu. Habituámo-nos a desprezar o passado (ou as conquistas civilizacionais que resistem no presente) e a correr como idiotas para o «moderno».
O cidadão-consumidor, o estudante, o professor, os quadros técnicos, os intelectuais, fomos todos contaminados pelo «consenso» neo-liberal. Pensamos através dos estereótipos que nos impingiram. E transmitimo-los aos mais novos.
O retrocesso civilizacional é uma espécie de peste. Vale a pena ler agora, ou reler, a «Peste» de Albert Camus.

VIVA O DIA DO TRABALHADOR!

Viagem à Polónia

Viagem à Polónia
Auschwitz: nele pereceram 4 milhôes de judeus. Depois dos nazis os genocídios continuaram por outras formas.

Viagem à Polónia

Viagem à Polónia
Auschwitz, Campo de extermínio. Memória do Mal Absoluto.