« (...) Ao explicar lutas de fronteiras, às vezes introduzo a perspectiva de Karl Polanyi. Sem usar o termo, Polanyi estava realmente focado em lutas de fronteiras entre o que ele chamou de mercado autorregulado — a economia, podemos dizer assim — e a sociedade. O que é intrigante e fértil a respeito dessa abordagem é a ideia de que a luta não é apenas sobre como o valor excedente vai ser distribuído. É sobre o que vai determinar a gramática da vida. Sobre se, em dada comunidade, o capital vai ter ou não a autoridade de fazer o que quiser.
Isso faz emergir questões sobre quem na sociedade realmente tem o poder de moldar a gramática da vida. Em sociedades capitalistas, essas são as questões que são sub-repticiamente removidas da agenda política e são legadas, às nossas costas, para o capital e para aqueles que estão encarregados com a acumulação de capital.
Falar a respeito de lutas de fronteiras significa tentar ir além de questões de distribuição e chegar a questões de como a gramática da vida social é organizada. As lutas de fronteiras afirmam que há uma questão real e fundamental sobre onde nós traçamos uma linha entre sociedade e natureza, trabalho pago e outras atividades envolvidas no atendimento de relações comunitárias e de parentesco e assim por diante. Essas questões se resumem a: quais são as fronteiras legítimas dentro das quais os mercados podem operar? Quais são as coisas legítimas que podem ser compradas e vendidas? Eu penso que a razão de falar sobre lutas de fronteira envolve afirmar que essas coisas sempre foram contestadas em sociedades capitalistas. Não é que elas consistam em uma alternativa à luta de classes, é que a luta de classes às vezes toma a forma de lutas de fronteiras e as lutas de fronteiras — quando as coisas vão bem — às vezes tomam a forma de luta de classes.»
Nancy Fraser, entrevistada, Só um radical ecossocialismo democrático pode mudar o horizonte
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