Acabo de ler uma crónica do escritor moçambicano Mia Couto sobre os recentes tumultos populares no Maputo. Compreende-os e eu também os compreendo porque vivi toda a minha adolescência em Lourenço Marques. È verdade que saí de lá muito antes da independência e, portanto, muito mais ainda antes da chamada «guerra civil», esse terrorismo sem capote que a África do Sul do apartheid apoiou, armou e financiou, esse horror que, durante dezasseis anos (dezasseis anos!) devastou a pouca economia que haviam erguido, chacinou (decapitou!) milhares de homens, mulheres e crianças, horror. Deixei lá muitos amigos, que aida hoje o são, muitos condiscípulos dos antigos Liceus de António Enes e Salazar, alguns dos quais, negros, se tornaram figuras destacadas da Frelimo e dos sucessivos governos, não os nomeio, tão responsáveis dirigentes políticos eles são. Convivi com eles, discutimos política, reconheci em alguns uma certa arrogância (que bem caro custou a todos nos primeiros anos da independência), mas também uma rígida honestidade de princípios e de valores, aquela crença e militância política que os mais integros anti-fascistas e anti-colonialistas professavam com rigor e disciplina e sacrifício.
Há poucos dias as massas populares (de que eles tanto falavam noutros tempos) ocuparam as ruas, que são suas, e protestaram contra o custo de vida, os preços, os salários, provavelmente a escassez dos bens para uns e a abundância para outros.
Meus caros ex-condiscípulos, camaradas ou ex-camaradas das mesmas causas: onde guardais os ideais da nossa juventude?
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