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sexta-feira, 6 de maio de 2022

O trabalho tem futuro

Em 1995, o economista norte-americano Jeremy Rifkin publicou um livro muito lido, muito discutido e com um forte peso nos prognósticos quanto ao futuro do trabalho: The End of Work. Tal título poderia indiciar uma utopia, mas o que ele prometia para depois do fim do trabalho não era um mundo feliz, como aquele preconizado pelo escritor inglês de ficção científica Arthur C. Clarke quando escreveu que “o objectivo do futuro é o pleno desemprego”.

O desemprego como um inferno ou um paraíso: em ambos os casos, a causa é a mesma, isto é, as máquinas, as novas tecnologias, a automatização generalizada. Segundo uma forte convicção induzida pelos arautos da “destruição criadora” como regra do capitalismo e garantia da sua vida perene, os empregos destruídos pelas máquinas num determinado sector seriam substituídos por outros, em novos sectores. A tese de Rifkin, pelo contrário, era a de que a “destruição criadora” destrói muito mais do que cria, sobretudo quando chegámos à fase do trabalho cognitivo. Assim, nas suas previsões, a ampliação da “sociedade automática” iria expulsar do mercado de trabalho milhões de pessoas, sem que fossem criadas alternativas à sociedade do trabalho, sem previamente reinventar o trabalho e construir a civilização do tempo livre, como tantas vezes havia sido reclamado.

Pouco mais de um quarto de século após a publicação de The End of Work, que está longe de ser uma reflexão solitária, parece que chegou a altura de conferir a adequação das suas profecias ao mundo do trabalho tal como ele hoje se configura e reconhecer que Rifkin se enganou, pelo menos no que diz respeito aos efeitos da automatização. É isso que podemos apreender nalguns livros, publicados nos últimos tempos, que se dedicam parcialmente ou totalmente a esta questão do trabalho e da automatização. Um deles chama-se precisamente Le futur du travail, foi publicado já este ano e o seu autor é o sociólogo francês Juan Sebastien Carbonnel. O que é que ele diz sobre a automatização e o proclamado fim do trabalho humano? Diz que a realidade está muito longe dos prognósticos do fim do trabalho; e que só raramente se dá a substituição directa e automática de um posto de trabalho humano por uma máquina ou um software; e que as novas tecnologias, permitindo muito embora economizar o trabalho humano em certas tarefas, têm servido muito mais para intensificar ou ampliar o grau de controlo e vigilância sobre os processos de trabalho e sobre as presenças. O que explica certamente uma verificação obrigatória: a introdução de novas tecnologias tem feito aumentar o volume de trabalho a que os trabalhadores, nos seus empregos, estão actualmente submetidos.

Conclusões semelhantes, encontramo-las em dois livros publicados em Inglaterra, em 2020: Automation and the Future of Work, de Aaron Benanav, e Smart Machines and Service Work: Automation in na Age of Stagnation, de Jason E. Smith. Estes dois livros fornecem não só dados e argumentos que desmentem os antigos prognósticos da aniquilação do trabalho por efeito da automatização, mas também uma atitude bastante céptica em relação às visões dos “automationists”. É verdade que ambos apontam para um futuro sombrio. Não por causa do chamado “desemprego tecnológico”, mas porque a experiência que temos tido é a de que o desenvolvimento da tecnologia não serve para libertar os trabalhadores, para promover a sua autonomia, mas para aumentar a servidão. Os desenvolvimentos tecnológicos têm reorganizado o trabalho humano, mas só muito parcialmente o têm substituído. É falsa a ideia de que estamos a caminhar para o desemprego tecnológico em massa e os trabalhadores vão ser completamente expulsos. O cenário de extinção generalizada de empregos, tal como foi anunciado por Rifkin e outros, tornou-se completamente improvável: é o que podemos ler em cada um destes três livros. E, além do mais, nem sempre as novas tecnologias cumprem o que prometem. Em 2019, Elon Musk prometeu que a sua empresa, a Tesla, colocaria na estrada, até finais de 2020, um milhão de carros sem condutor. Tal não aconteceu porque o piloto automático da Tesla esteve na origem de alguns acidentes. O tecno-optimismo tem certamente razões para se exprimir, mas a automatização total que chegou a ser anunciada (e da qual uns deduziam um cenário paradisíaco e outros a entrada no inferno) encontra constantemente barreiras que desaceleram a sua caminhada.

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