Classe média e Ucrânia!
O termo “classes médias” não tem uma definição universal, mas sabemos que nas modernas sociedades são elas que pagam as contas. São os explorados de boa vontade e animados com a fé de serem colaboradores dos ricos.
A classe média é um grupo social em que o trabalho foi substituído pela colaboração. A doutrina do neoliberalismo separou os seus elementos dos trabalhadores (assalariados) ao convencê-los que o seu bem-estar futuro se deve à sua iniciativa individual, à sua agressividade, à sua disposição para fazerem tudo, à certeza de que os fins justificam os meios, da inutilidade de ações coletivas, de políticas sociais, da solidariedade.
O medo que o comunismo conquistasse os trabalhadores e as classes médias europeias fora a razão da criação do estado de social na Europa, conduzido pelas sociais-democracias e pelas democracias cristãs. Uma das causas da II Guerra Mundial, da ascensão do nazismo e da complacência da Inglaterra e dos EUA foi o medo que o comunismo destronasse o regime de domínio dos patrões. O fim da URSS ditou o fim desse medo e abriu caminho ao neoliberalismo, ao fim do Estado social a que estamos a assistir, juntamente com o fim dos partidos tradicionais na Europa continental.
A destruição da classe média tem sido conduzida com requintes de perversidade: é a própria classe média que, de jeans de marca, bronzeada, intitulada de “famosos” nas revistas, televisões e redes sociais, passou a trocar três refeições por dia por uma ida a um bar da moda, a um ginásio, que “posta” uma foto no FB ou no Instagram e se suicida com uns shots!
O mimetismo da imagem da classe média ao surgir mascarada de classe privilegiada (as oligarquias) fá-las ter a mesma leitura da realidade que os poderosos. Passam a pensar como os donos. (Síndrome de Estocolmo: afeto pelo agressor.)
A guerra na Ucrânia é um excelente revelador deste tipo de transferência de afetos e de leitura da realidade, em que o “colaborador” segue o dono e vai com ele até à sala de ordenha para lhe extraírem o leite, no melhor dos casos, ou para o matador para ser hamburguizada.
A guerra na Ucrânia tem por finalidade defender um mesmo modelo de sociedade de exploração e acumulação pelos dois contendores, os Estados Unidos, que têm o seu modelo em crise política (populismo), económica (pobreza) e social (racismo e etnicidade) e a Rússia que pretende passar de uma sociedade típica do terceiro mundo, exportadora de matérias-primas, para uma sociedade de capitalismo desenvolvido e de consumo.
O poder instalado no Kremlin promete aos russos os bens e os produtos desejados pela classe média — daí a relativa popularidade do poder de Putin e desta guerra feita em nome da grandeza da grande Rússia. E os EUA, depois de proletarizarem a sua classe média, necessitam de fazer o mesmo à classe média europeia, caríssima com os seus sistemas de segurança social, educação, saúde, preocupações ambientais. A classe média europeia tem de ser privatizada: pagar planos de reformas privados, planos de saúde privados, escolas privadas… Tem de ser privada de tudo. Americanizada.
Se eu vir Ucrânia como o forno crematório da classe média europeia, além de um campo de lançamento de foguetes sobre a Rússia, a classe média europeia responder-me-á que a Ucrânia é apenas um Club Méditerranée com todas as comodidades e liberdades, dirigido por um excelente animador e que os russos querem tomar para si. Que a NATO é uma respeitável empresa de segurança privada e a UE uma empresa de Cash&Carry.
A conta desta guerra irá, com a nova ordem de democratização da pobreza na Europa, irá certamente para a mesa da classe média europeia, que parece feliz por ir ver aumentar a sua fatura com armas, embora só refile por causa das do gás e da gasolina, do pão e do óleo de girassol… produtos de pobre. As armas têm outra dignidade!
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